My Dream escrita por Susan Salvatore


Capítulo 8
Passado indesejado




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Era indiscutível dizer que o clima na casa estava tão tenebroso como a tempestade que antecede um furacão. Hayley trovejava, enquanto Elijah era como um milharal prestes a ser arrasado. Ela trovejava com seu silêncio. E nem sequer um olhar trocou com ele. Nunca mais visitou a biblioteca. Acordava, comia e dormia em horários diariamente diferentes para que não tivesse que vê-lo. Durante uma semana, ele só soube dela pelas empregadas.

Certa noite, enquanto lutava contra o sono que lhe fugia, Hayley escutou delicadas batidas na porta. Desnecessárias. Ele entrou sem permissão porque, afinal, a casa era sua. Fingindo não ter visto nada, ela virou-se na cama e fechou os olhos.

Foi a primeira vez que ele tentou pedir desculpas.

A segunda vez se deu quando a moça estava na cozinha preparando uma elaborada torta. Porção para um. Elijah observava-a trabalhar, o modo como seu cabelo sempre lhe caía aos olhos, o modo como mordia os lábios sem sequer perceber, como estreitava os olhos quando algo não lhe parecia perfeito o suficiente. E, principalmente, ele a observava cantar. Era baixo e quase inaudível, apenas um sopro de voz, mas era um som que guardaria com afeto. Uma canção de ninar.

– Eu queria falar com você – disse, por fim.

– Eu não. – respondeu ela, sem sequer se virar. É claro que há muitos minutos percebera que Elijah estava ali; seu cheiro era quase opressor de tão bom. Mas ela se recusava a deixá-lo mudar sua rotina de novo. Não era nada aquela repentina respiração entrecortada.

– Por que nem tenta me escutar?

– Porque já ouvi o suficiente.

Hayley reparou que ele não tentou convencê-la. Não tentou falar assim mesmo nem a obrigou a escutar. Ele não lutou. Covarde, sussurrou para si mesma. Então, como se pudesse ler seus pensamentos, ele se retesou. O repentino desprezo no olhar dela foi como um tapa na sua cara – porque não era totalmente mentira.

– Você me ofendeu com algo que não é verdade. Mas, considerando que não sabe por que eu agi daquela maneira, é justificável – disse ele, com um tom formal que só a irritou mais. Ele não se soltava – Se me der a chance, posso contar o motivo. Por favor, Hayley.

Algo no modo com ele disse seu nome, como suplicou por ela, a fez dominar sua própria armagura e ceder. O estraga já havia sido feito, então que mal havia em ouvir?

– Está bem. Prove-me que não é um covarde.

Elijah a conduziu para sua biblioteca particular. Lá, tinha certeza, ninguém poderia ouvir aquilo que iria confessar pela primeira vez. Klaus não poderia saber daquilo; essa era a prova de sua confiança em Hayley. Esperava que essa confiança não fosse só efeito da atração que ela exercia sobre ele.

– Pode começar a falar – disse ela, sentando-se numa poltrona com altivez. Ignorou o repentino enjôo.

– Quando eu tinha 17 anos, conheci uma garota alguns anos mais velha. Celeste, o nome dela. Pintava quadros para sobreviver, era independente e morava num subúrbio. Eu me apaixonei por ela. Foi bem nessa época que meus pais morreram e Klaus, por ter a maioridade, assumiu a tutela sobre mim. Eu mal podia esperar até completar 18 e poder fugir com Celeste. Coisa de adolescente, sabe. Encontrávamos-nos toda noite e ela me deu muito mais do que eu podia esperar. Mas, um dia Klaus descobriu. Veja, ele já era influente nessa época. Temia que minha relação com uma mulher “desqualificada” pudesse manchar sua reputação; palavras dele. Proibiu-me de vê-la. Isso, é claro, nunca me impediu. No dia em que tínhamos combinado de fugir, meu irmão nos surpreendeu. Trouxe a polícia e Celeste foi presa por pedofilia. Nessa época não tinha aquela coisa de que aos 16 anos, um menor poderia ficar legalmente com um adulto. Não. Também foi acusada de seqüestro, já que eu não levava nenhuma roupa e estava meio bêbado. Ela ficou furiosa, achando que eu tinha armado isso. Lembro-me bem de nossas últimas palavras: “eu amo você” “vá pro inferno, maldito”.

– Eu... Eu... – gaguejou Hayley, de olhos arregalados. Uma parte dela ficou com ciúmes do modo como ele pronunciava o nome da mulher.

– Mas esse não foi o ápice da maldade de meu irmão. Dois anos depois, eu consegui encontrar o presídio onde Celeste estava. Tentei falar com ela, mas sequer aceitou me receber. Fui embora de lá, planejando apresentar um nome falso da próxima vez. Tudo que eu queria dizer era que sentia muito e que ainda era apaixonado nela. Quando cheguei em casa, Klaus estava furioso. É claro que já sabia. E quando ele a chamou de vagabunda, eu lhe dei um soco no olho que arruinara qualquer plano dele de aparecer em público no outro dia. Ele não disse nada. Olhou-me friamente e sorriu e, pela primeira vez, fiquei assustado. Três dias depois o presídio foi incendiado. O nome e a foto de Celeste passaram no jornal, como as das outras cinco criminosas mortas, junto com a legenda “pedófila”. Ela não tinha família e seu corpo foi cremado. Desde aquele dia, nunca mais confrontei Klaus. Ele, a partir daí, sempre me olhou de forma superior, desafiando-me a acusá-lo. Nunca fiz isso.

– Meu Deus!– exclamou Hayley, horrorizada.

– Tentei achar os restos mortais dela, mas fora indicada como desconhecida, assim como milhares outras no departamento da funerária do governo. Eu realmente vivi um inferno depois daquela noite.

Inesperadamente, ela o abraçou. Ficaram em silêncio, apenas ouvindo a respiração um do outro. Um laço diferente foi criado naquele dia. Quando alguém partilha com você uma memória dolorosa, te dá um pedaço de sua alma. Não é qualquer fardo.

– Por que você não lutou, Elijah? – disse ela, acariciando seus cabelos.

– Não tive forças. Eu sei, fui covarde. Perdi a mulher que amava por medo de enfrentar meu irmão. Mas, sabe, havia uma parte de mim que se recusava a acreditar que ele era um monstro. Sempre tentei perdoá-lo. Só que ele sempre faz algo que deixa qualquer perdão fora de cogitação.

– Ah... – sussurrou, sem nada melhor pra dizer. Talvez, por rejeitar qualquer tipo de medo tão ferozmente, ela não pudesse entender. Nunca tivera uma família ou alguém que admirasse. Não podia compreender como era ver que alguém que você ama é terrivelmente cruel. A dor que Elijah sentia era algo além das possibilidades dela.

– Isso não significa que eu esqueci. Um dia ele pagará pelo que fez. Só preciso reunir provas o suficiente.

Essa declaração de justiça a fez olhá-lo com admiração. Se sua vida era um inferno por não ter ninguém, a de Elijah devia ser mil vezes pior por só ter alguém odioso. Isso só a fez querer mais ainda entrar na vida dele.

– Por isso, eu preciso que entenda. Hoje, tudo que eu desejo é estar com você. Mas não posso arriscar sua vida por isso. Imagine o que Klaus faria quando descobrisse que eu beijei a mãe de seu filho? Nós não podemos ficar juntos, pelo menos não agora. Entenda, por favor.

Ele não disse que a amava e nem que estava apaixonado por ela. Isso foi a primeira coisa que Hayley percebeu. Não havia sentimento amoroso o suficiente para fazê-lo lutar. Não, só havia uma preocupação com o bem estar dela. “Tudo o que eu desejo é estar com você”, sim, mas de que jeito? Como sua melhor amiga?

– Eu entendo, Elijah. Retiro o que disse; você não é um covarde.

– Obrigada, eu realmente...

– Mas, aprendi que nada que uma pessoa diz antes do “mas” realmente importa. Tenha uma boa noite.

Deixou-o lá, absorvendo o significado de suas palavras. Naquele dia, prometeu que a si mesma que esqueceria qualquer interesse romântico por Elijah Mikaelson. Ele era gentil, sem dúvida, mas sairia de sua vida como todos os outros. Não ia se permitir sofrer pela rejeição de algo que nem tivera chances de nascer. Sozinha, Hayley estava melhor.

...

Horas mais tarde, Elijah ainda pensava sobre aquelas palavras. Doeram como o inferno; mais ainda porque tinha a sensação de que ela desistira dele. Uma tristeza pesarosa o preencheu quando se deu conta disso e tudo que pode fazer foi lembrar dos dias de maresia.

Uma batida na porta interrompeu seus pensamentos. Desejando fervorosamente que fosse Hayley, ele a abriu o mais rápido que pode. Uma garota loira e esbelta o encarava com um típico tédio no olhar. Mas logo um sorriso quase infantil surgiu.

– Senti sua falta – falou ela, abraçando-lhe com força.

– O que está fazendo aqui, Rebekah? – perguntou ele, sem conter seu sorriso. Ela era de longe a pessoa mais agradável que já existiu em sua família. Não significava muito.

– Você não recebe a família muito bem, sabe. O que acha que vim fazer na minha própria casa? Comprar uvas?

– Por que não ligou? Poderia ter preparado algo...

– Eu nunca ligo – respondeu, cheia de sotaque e dando uma piscadela.

A irmã rebelde e teimosa que sempre o fez rir nas horas mais impróprias para isso. Porém, no meio da alegria de vê-la, veio um súbito pensamento cauteloso. Rebekah o conhecia melhor do que ninguém; qualquer tentativa de se aproximar de Hayley estava fora de cogitação. Com apenas um olhar, ela já perceberia o clima entre os dois. Se fosse de sua vontade, poderia muito bem contar tudo à Klaus sem nem pestanejar.

Com uma fúria repentina, Elijah percebeu que, do jeito que as coisas iam, iria realmente perder Hayley. Bem, perder o que? Sequer conseguia nomear o que sentia, mas tinha certeza que ela era importante para ele. Não ia conseguir ficar longe por muito tempo.

Rezando para que conseguisse mascarar suas emoções mesmo perto das duas mulheres que conseguiam decifrá-lo tão bem, ele suspirou fundo e acolheu sua irmã. Ia dar um jeito, sempre dava.

Nem sempre, lembrou-lhe uma vozinha má em sua cabeça.


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Notas finais do capítulo

Oe, leitores *-* O que acharam? Alguma sugestão?



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