Capítulo 33 — Lorraine Laufeyson

A sensação de que algo muito ruim estava para acontecer estava me deixando inquieta.

Desde que sai da casa de Scarlett, há várias horas atrás, tal sensação não me deixa. As palavras de Danielle antes de sair para sua missão no Japão continuam voltando em minha mente, e nada do que eu faça parece conseguir me distrair.

Tento colocar meus pensamentos em ordem, mas Thomas me impede antes que eu possa executar a tarefa. Ele entra na sala tão rápido quanto um raio, e quando levanto os olhos, ele já está sentado no sofá de modo despojado, me olhando com um sorriso sarcástico.

— Oi, Lorrie.

— Thomas. — Cumprimento-o rapidamente.

Me distraio por uma fração de segundos e já não o vejo mais no sofá. Quando me dou conta, Thomas já está do meu lado, com um pacote de M&Ms em mãos.

— Tá fazendo o que, gata? — Ele olha para mim. — Quer um?

— Onde achou isso?

— No armário da Danny, lá em baixo. — Ele dá de ombros, jogando um chocolate na boca.

— E onde está o William?

— Não sei, já deve estar chegando. Perdi ele e o Nate em alguma parte do Brooklin, eu acho. Apostamos uma corrida, mas você sabe, eles são muito lentos.

— Sei o que quer dizer.

— E só pra você saber, parte meu coração quando você pergunta sobre o Billy e não sobre mim. Deixa muito claro seu favoritismo.

Ignoro-o e me levanto, indo em direção à enorme janela da sala.

Paro de frente para a mesma, olhando atentamente para o exterior, onde as luzes dos outdoors iluminavam as ruas de Hell's Kitchen. Devo ter ficado mais tempo em silencio do que realmente percebi, pois logo Thomas me chama.

— Tudo bem, Lorrie? — Ele se aproxima, me analisando com seus olhos claros. — Você tá com uma cara preocupada. Sabe que pode me dizer o que tá rolando, sou seu amigo e, por mais que o Billy seja o bom ouvinte, eu posso tentar te ajudar. Ou, posso te enrolar com respostas padronizadas até ele chegar.

Rio de sua brincadeira, determinada a não deixá-lo também preocupado, mesmo que fosse difícil isso acontecer.

— Não é...

Não consigo completar minha frase, pois um barulho vindo da parte de baixo do apartamento me distrai.

— O que foi isso? — Antes que eu possa responder, Thomas some, deixando-me sozinha por dois segundos, reaparecendo com uma expressão séria. — Vamos precisar de você lá em baixo.

Não faço nenhuma pergunta, apenas sigo junto de meu amigo até a sala do primeiro andar, tomando um susto com a cena que encontro.

William e Nathan estão ao lado do sofá, onde há um rapaz praticamente semi morto deitado. Ele não parece ser muito mais velho do que eu, e sua roupa não indica nada sobre ele.

Do outro lado, vejo que há mais um garoto desacordado no chão. Este, ao contrário do outro, eu reconheço vagamente como um garoto que ajudei há algumas semanas, quando estava com Connor, que por acaso, está ao lado de Scarlett próximo à parede, de frente para uma Hazel em estado de choque.

Meio perdidos entre eles e o garoto loiro, estão uma garota fantasiada, ao lado de dois garotos altos, um igualmente fantasiado de modo estranho, e outro que me lembro de já ter conhecido, logo após o ataque dos ninjas a equipe de Scarlett e Connor.

— Lorrie, temos que ajudar ele. — William me fita rapidamente, agitado. — Eu teria feito isso, mas não sou nem de longe bom com magias curativas como você.

Me aproximo do rapaz ensanguentado, tentando avaliar o que acontecera com ele, enquanto começo a tentar curá-lo.

— O que aconteceu com ele?

— Nós não sabemos. — Nathan responde tão agitado como todos nós. — O encontramos caído nesse estado, perto de onde acabamos encontrando com eles.

Ele aponta com a cabeça para o grupo reunido na sala

— E o outro? — Questiono olhando para o garoto loiro no chão.

— Ele já estava assim quando o encontramos. — Scarlett finalmente deixa Hazel e Connor para se aproximar. — A única que parece saber o que aconteceu é a Hazel, mas ela não fala.

— Dá um tempo pra ela, ruiva. — O garoto alto, Samuel Barnes, diz de forma raivosa. — Desde que a encontramos você só fez perguntas! Para de encher o saco dela, isso aqui não é um interrogatório.

— Calma ai esquisitão — A garota fantasiada responde entrando no meio dos dois. — Ela tá certa em fazer isso.

Tenho certeza de já ter ouvido a voz da garota em algum lugar, mas não me recordo de onde.

— Quem são eles?

Scarlett sorri de forma divertida.

— Lembra da Mindy? — Ela aponta para a garota. — É ela e o namorado dela, Dave.

— Legal, só sou apresentado como "namorado da Mindy". — O rapaz de fantasia azul resmunga, mas Scralett não dá atenção.

— Eles são...

— Espera, não fala! — Thomas corta Scarlett com um sorriso no rosto, olhando para os dois fantasiados. — Eu sei quem você é! É aquele maluco dos vídeos, não é? Como era o nome mesmo? Ah sim! Kick ass! — Ele lança um olhar pra mim. — Esse cara fez sucesso há uns anos, eu era seu fã! Você é doido demais!

— Valeu — Dave parecia não saber como se comportar diante de tal fala. — Eu acho...

— Tem razão, vocês saiam por Nova York pegando uns bandidos, não é? — William completa o raciocínio do irmão.

— Saiam por aí dando uma de super heróis? Fantasiados no meio da noite pra pegar uns ladrões? Tava tentando copiar o Demolidor? — Nathan zomba, com uma postura um tanto superior. — Ou é só um idiota que curte apanhar?

— Olha só, grandalhão...

— Nathan, leva o outro garoto pro quarto da sua irmã. — Impeço Mindy de começar uma discussão, chamando a atenção do irmão de Danielle. — Acho que não precisamos nos preocupar com ele no momento.

Ainda com um sorriso provocante, Nathan concorda rapidamente, jogando o garoto nos ombros, como se ele não pesasse mais do que uma pena.

Assim que os dois somem, me concentro em terminar de curar o rapaz misterioso, na medida do possível.

— Ele vai ficar bem? — William me encara com seus olhos claros, preocupado, enquanto os outros se dispersam.

— Creio que sim, acho que consegui estabilizar ele, e com certeza consegui parar a hemorragia aqui. — Indico um dos cortes na lateral de seu corpo.

— Você não é médica, né? — Dave pergunta receoso, retirando a máscara que escondia seu rosto.

— Melhor, ela é uma feiticeira. — Scarlett responde por mim, dando de ombros.

Dave passa a mão pelo cabelo negro cacheado.

— Os amigos que você arranja são bem... Interessantes, Mindy. — Ele muda o peso do corpo para outra perna sem tirar os olhos de mim. — Foi mal a pergunta, mas, você tem algum parentesco com a Feiticeira Escarlate? Você me lembra um pouco ela.

— Eu? — Sorrio rapidamente. — Não, não tenho parentesco algum com ela.

— Nós é que somos parentes dela. — Thomas passa um braço ao redor do pescoço do irmão. — Filhos, se quer saber. Um pouco ofendidos por não ter percebido. Dizem que ele é a cara da mamãe.

Dave arregala os olhos.

— Vocês estão de brincadeira! — Ele olha para a namorada. — Você é amiga dos filhos da Feiticeira Escarlate e não diz nada?

— Eu nem conhecia esses dois.

— Cara, você lembra muito o nosso tio Pietro. — Thomas diz olhando atentamente para Dave. — Sério, são idênticos, não é mesmo Billy?

Deixo os dois conversando e começo a prestar atenção em Connor e Mindy, que ainda tentam falar com Hazel, que agora se mostrava agitada com a ausência do loiro desacordado.

— O que aconteceu com ela? — Questiono Scarlett, que estava estranhamente quieta, parecendo perdida em seus próprios pensamentos.

Ela demora alguns segundos para entender a pergunta.

— Hã, não sei. Desde que a encontramos ela não nos disse muita coisa, ela parece confusa.

— Como acharam eles? — Desta vez olho para ela e para William.

Os dois trocam olhares, então, Scarlett descruza os braços, sendo-se ao meu lado.

— Meu dia foi agitado, então se prepara pra história.

[x]

— E foi isso. — Scarlett termina seu relato sobre seu dia desde que nos separamos, passando por seu encontro com a ESPADA e a reunião dos Vingadores, finalizando em como ela, Sam e Connor encontraram Hazel e o garoto loiro, que agora reconheço pelo nome de Theodore, com a ajuda de Mindy e Dave em um armazém abandonado. — Ela diz que não sabe como foram parar lá, e não se lembra do que aconteceu para acabarem lá. Perguntamos sobre a mãe de Teddy, mas ela disse que só se lembra de ter ido até a casa dele, e ficou abalada quando a Mindy mencionou o assassinato da mãe dele.

Mesmo com muita informação para processar, tento ao máximo me focar apenas no problema imediato, ignorando o resto dito por Scarlett, que podiam nos trazer uma bela dor de cabeça pela frente.

— E quanto a este aqui?

— Nathan e eu o encontramos no beco atrás do mesmo armazém. — William diz. — Depois que o encontramos, esbarramos com eles e aqui estamos nós, com dois caras desacordados, um deles bem machucado, uma Hazel histérica e muitas perguntas sem resposta.

Nos três ficamos em silêncio, um olhando pro outro.

— No que você está pensado? — Olho para minha amiga, que continua inquieta.

Scarlett dá de ombros

— Em tudo o que está acontecendo. Quero acreditar em Hazel, mas... Tem muita coisa estranha na história dela, e depois do que soubemos hoje, não acho que devemos...

Subitamente, o rapaz segura meu pulso com força, chamando nossa atenção na hora.

Ele abre os olhos lentamente, revelando olhos tão escuros quanto ônix.

— Onde eu estou?

— Nova York. — William responde cauteloso. — Em Hell's Kitchen, pra ser mais exato.

— Quem são vocês?

— Somos as pessoas que salvaram sua vida. Mas ei, não se incomode em agradecer, fazemos isso de graça. — Scarlett diz com sarcasmo.

O rapaz solta meu pulso e tenta se levantar, fazendo uma careta logo em seguida.

— Eu não faria isso. — Impeço-o com a mão. — Você quebrou pelo menos umas quatro costelas, e se levantar agora, vai fazer o sangramento começar outra vez.

Mesmo contra sua vontade, ele se deita novamente.

— Porque estão me ajudando?

— Deveríamos ter te deixado morrer? — Sam questiona ironicamente.

Ele não responde, tossindo com dificuldade.

— Qual o seu nome? — Percebo que ele pergunta para mim em particular, e mesmo tentada a não revelar meu nome, acabo cedendo.

— Lorraine. — Devolvo seu olhar. — E você? Tem algum nome?

— Como posso saber que posso confiar em vocês, Lorraine?

— Simples. — Mindy cruza os braços, respondendo mais rápido do que eu. — Salvamos sua vida.

— Isso não quer dizer muita coisa...

— Estamos lidando com um desconfiado. — Thomas debocha.

— É o que parece. — Mindy concorda. — Então, que tal isso? Não te matamos ainda. E pelo que posso ver, não estamos te torturando, você não está amarrado e estamos tentando te curar.

— Gostei do seu ponto. — Ele resmunga com um leve sorriso.

— Pode confiar em nós — Scarlett incentiva. — Nós meio que trabalhamos junto com os vingadores, não sei se você conhece, eu até te mostraria meu distintivo, mas minha mãe...

— Eu ouvi sua história. — Ele corta minha amiga, que se mostra bem confusa. — Ouvi quando mencionou uma reunião com os Vingadores. Sei quem são.

— Então, se você conhece os Vingadores, sabe que não somos inimigos.

O rapaz nem da atenção para William, parecendo perdido em seus pensamentos.

— Também ouvi sobre um Nova no centro de Nova York, estou certo?

Scarlett estreita os olhos.

— O que sabe sobre isso?

— Eu conheço aquele Nova. Eu estava com ele, antes de sermos atacados.

— Atacados? — Meu primo da um passo à frente. — Por quem?

O rapaz se vira para Connor, como um olhar frio.

— Pelos mesmos monstros da história da garota. — Ele diz com uma voz sombria. — Skrulls fizeram isso conosco.

A sala ficou em completo silêncio por vários segundos.

— Okay — Scarlett é a primeira a voltar a falar. — Acho que você tem uma boa história pra explicar.

O rapaz apoia as costas com dificuldade no sofá antes de continuar.

— Não vou perder meu tempo explicando tudo outra vez, vejo que de acordo com você, ruivinha, Carol Danvers já deu a vocês um breve resumo sobre eles. Houve uma guerra Kree-Skrull e eles perderam. — Ele lança um breve olhar pra Scarlet. — Mas ao contrário do que você ouviu e disse, há uma parte deles sobreviveu e viveu escondida até agora.

— Típico... — Nathan, que havia retornado, resmunga, sendo ignorado pelo mais velho.

— Esses remanescentes vêm se escondendo há anos, se preparando nas sombras. Agora, eles têm um exército, que está cada vez mais forte.

— Eles têm um exército pra que, exatamente? — Mindy questiona de forma ríspida.

— O planeta dele foi quase destruído. Eles precisam de um novo.

— Ah tá, me deixa adivinhar. Eles estão sem um planeta, e então querem a terra? — Dave resume o pensamento coletivo. — Porque eles sempre querem a Terra? Nós nem somos tão legais assim!

— A terra tem recursos, e creio que há uma profecia deles envolvendo tudo isso.

— Você disse que seu amigo é um Nova. — Connor começa. — Me corrija se eu estiver errado, mas, não é dever deles cuidar de coisas assim?

— A tropa Nova não está tão forte quanto já foi um dia.

— Como sabe disso? — Levanto uma sobrancelha ao questionar.

— Não é obvio?— Ele estende a mão para mim. — Vocês queriam saber meu nome, sou Renly Rider, e sou um Nova também. Estou sem o uniforme, mas...

Scarlett começa a rir, chamando nossa atenção.

— Isso é brincadeira, vocês Novas são péssimos! Os dois que eu conheci são uma...

— Como vocês foram pegos pelos Skrulls? — Ignoro Scarlett, ainda olhando nos olhos de Renly, tentando descobrir se ele dizia a verdade ou mentia.

— Meu pai desapareceu há alguns dias. Meu amigo, Sam, e eu fomos enviados para avaliar a situação, e acabamos pegos em uma emboscada por alguns Skrulls. Nos separamos e, como podem ver, perdemos feio na batalha. Creio que eles não querem que nós fiquemos no caminho de seu objetivo. Mesmo que sejamos poucos, eles querem o caminho livre pra dominar a terra.

— Droga... — Ouço Samuel resmungar.

— Então, basicamente, estamos na linha de fogo de uma guerra alienígena? — Dave resume tudo. — Isso quer dizer que a gente tá lascado, certo?

— Basicamente.

— E como lutamos contra uma coisa dessas?

Renly faz uma careta.

— É complicado.

— Eles copiam as pessoas, não é? — Barnes gesticula com as mãos enquanto fala. — O poder deles é de copiar a aparência, estou certo?

— Exatamente, e esse é o problema. — O tom de Renly não me agrada. — Eles usam isso para Deixar os adversários paranoicos, pois eles vão se infiltrando entre nós sem que a gente consiga perceber.

— Essa parte a gente já sabe. — Connor parecia nervoso ao dizer isso. — Queremos saber como desmascarar esses desgraçados.

— Há alguns modos de identifica-los.

— Quais?

Renly parecia estar se esforçando para continuar.

— Eles não copiam os poderes até onde eu sei. Alguns têm o mesmo poder de todos os integrantes do quarteto fantástico juntos, mas só alguns, os soldados de elite, por assim dizer. E também acho que não copiam memórias muito antigas. Então resgatar memórias antigas deve denunciá-los.

— É um começo. — Mindy diz.

De repente, Renly começa a tossir, se deitando novamente, se mostrando muito fraco ainda.

— Você precisa descansar. — Digo a ele. — Não está completamente curado ainda, e está se esforçando demais.

— Eu... Posso ajudar vocês.

— Não nesse estado. Descanse um pouco.

Assim que digo isso, Renly fecha os olhos, caindo na inconsciência.

Quando volto a prestar atenção nos outros, todos pareciam não sabem o que dizer.

— Essa história é sinistra. — Thomas comenta, fazendo Dave e Nathan concordarem.

— Mas pelo menos, não estamos mais tão no escuro. — Sam diz, virando-se para Scarlett. — O que faremos agora, ruiva? A decisão é sua.

— Eu vou levar a Hazel pra SHIELD, a Jemma e o Leo devem estar mortos de preocupação. Enquanto isso, vocês reúnam a equipe, na base ou na torre, tanto faz, só me avisem. — Ela encara Sam e Connor. — Temos que contar isso aos outros.

— Como quiser chefe. — Samuel ironiza. — Mais alguma coisa?

— Na verdade sim, peçam pro Logan encontrar o máximo de informações que ele conseguir sobre o Renly, quero saber mais do que só o nome dele.

— E o que fazemos com ele e o loiro? — Connor olha de Scarlett pra mim.

— Vamos cuidar dele. — Eu digo. — E do garoto... Teddy também. Enquanto não soubermos qual é o envolvimento dele com tudo isso, acho melhor ele ficar conosco.

— Por mim tudo bem. — Scarlett concorda, suspirando pesadamente.

— E nós, fazemos o que, exatamente? — Dave pergunta confuso.

Scarlett olha para eles por vários segundos antes de responder.

— Vocês podem ir pra casa, ficar longe de problemas, ou podem escolher nos ajudar de algum modo. — Scarlett diz. — Vocês decidem.