Show Me Love escrita por noOne


Capítulo 63
Lost Inside


Notas iniciais do capítulo

Aeee, voltei o/ Ainda estão muito p*tos comigo? Espero que não.
Pra compensar, maior capítulo da história da fic... Praticamente 5 mil palavras...
Capa nova, tudo novo. Prometo sair dessa melancolia já, já... Fiquem tranquilos que eu não vou estragar tudo... e tentar parar de f*der a vida do vampiro .p



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POV Marshall

Depois de um pequeno intervalo de tempo, a enfermeira finalmente abriu a boca pra dizer algo:

– Sr. Marshall Lee – Ela olhou pra mim – Siga-me, por favor.

Hesitei no começo, olhei para os lados e vi que todos estavam tão tensos quanto eu. Me dei por vencido e a segui, já esperando pelo pior. O barulho de seu salto alto ecoava pelos corredores silenciosos do hospital e martelavam na minha cabeça. O nervosismo me consumia por inteiro e não existia remédio nenhum na medicina que pudesse curar isso.

A pontada no peito, o nó na garganta e o peso nos ombros... Estes eram os efeitos colaterais de ver o amor da sua vida morrendo e não poder fazer nada, eu não conseguiria suportar por muito tempo. Passamos direto pela ala da maternidade, olhei rapidamente para o quarto 6 e vi a sala vazia, a coelha não estava mais lá. Haviam tantas dúvidas torturando minha mente agora...

Chegamos até uma sala qualquer, de uma ala que não me importa. A enfermeira bateu três vezes na porta e aguardou, depois de um incontável tempo ela se abriu. O doutor de sempre estava lá, me olhou com uma cara não muito animadora e me mandou entrar, dispensando a moça.

– E então? – Me sentei e cruzei os dedos – Que seja uma notícia boa...

– Bem que eu gostaria de lhe dar apenas boas novas – Ele retirou os óculos e me fitou – Eu tenho duas notícias pra você: uma boa e outra ruim. Qual quer ouvir primeiro?

– A boa – Respondi sem nem pensar.

– A boa notícia é que seus filhos estão bem. Em todos estes anos como médico eu nunca vi uma coisa como esta... Eu podia jurar que Fionna carregava dois fetos deficientes e fracos, mas bem... Acho que me enganei – Ele sorriu – Então parabéns, você é pai de duas crianças perfeitas e saudáveis. Eu não acredito muito nessas coisas, mas acho que podemos chamar isso de milagre, não é mesmo?

O peso em meus ombros se foi, relaxei na cadeira e dei graças aos céus. Eu não conseguia conter o sorriso, mal via a hora de poder segurar Violet e Arthur em meus braços. Eu sabia que ia dar tudo certo! Palavras não são capazes de expressar minha imensa felicidade agora. Eu quase me levanto e abraço esse médico, choro e grito para o mundo todo ouvir, mas a razão me faz continuar ali sentado, esperando pela notícia ruim.

– A notícia ruim é sobre Fionna – Ele desfaz o sorriso – Nós fizemos de tudo para manter seu quadro clínico estável, mas infelizmente ele piorou. Nós tivemos que aplicar uma anestesia, mas por um erro banal, eu concordo, aplicamos duas. Ela já estava fraquíssima e agora entrou em coma. Nós lamentamos muito.

– Espera aí – Tentei me acalmar – Você tá me dizendo que encheram minha mulher de droga e agora ela tá em coma? – Cerrei o punho – E ainda diz que você sente muito? – Comecei a elevar a voz – Sente muito? Sente muito? Você vai sentir muito mesmo quando eu processar vocês, seus filhos da puta! Vocês estão matando ela!!! – Me levantei, batendo as mãos na mesa – Eu juro por tudo o que é mais sagrado: se ela morrer, por negligência desse hospital de merda... eu... eu mato você, seu desgraçado!

– Mantenha a calma, Sr Abadeer... – Ele pediu, inclinando-se pra trás.

– Não me venha pedir calma, seu resto de aborto! – Apontei o dedo na cara dele – Vocês têm merda na cabeça ou o que? Duas anestesias??? Puta que pariu, eu devo estar muito debilitado mesmo pra não voar o murro na tua cara! – Levei as mãos á cabeça – Ela não pode morrer, está entendo? Se não eu juro que você vai sofrer tanta dor quando eu estou sentindo agora... É uma promessa.

– Nós tentamos de tudo, foi um erro – Ele justificou.

– Você vai pagar por ele – Prometi, gritando – Que tipo de médico você é, porra?

– Eu sou o médico que está tentando facilitar as coisas – Ele se levantou

– Facilita isso aqui, então – Sem pensar duas vezes, com todo o meu ódio empenhado naquilo, fechei minha direita e dei um soco em sua face. Só depois fui pensar em meu ato.

O velho estava no chão, gemendo e com a mão ensanguentada no rosto. Eu estava de pé em sua frente, ainda com os punhos cerrados e sangue quente, pensando no que eu fiz. Fui surpreendido por dois seguranças atrás de mim, quase arrombando a porta e me segurando, cada um por um braço. Por impulso, minha primeira reação foi reagir e me debater. Eu mandava que me soltassem, xingava o que viesse a mente e berrava, como um louco. Aquele médico maldito deve ter chamado eles enquanto eu surtava, ou quem sabe eles tenham escutado a gritaria.

Me arrastaram para vários metros de distância, até a enfermaria, enquanto eu ia me acalmando. Fui praticamente obrigado a sentar e tomar um chá de maçã. Eu não quero porcaria de chá nenhum, eu quero acabar com a raça daquele doutorzinho, quero a Fionna aqui comigo, quero estrangular os gênios responsáveis por esta anestesia, quero matar a mim mesmo, por deixar isso acontecer. Quero muita coisa, menos chá.

Aos poucos a enfermeira boazuda que cuidava do Mertens (sim, eu a reconheci), conseguiu acalmar meus ânimos. Aos poucos minha pulsação voltou ao normal, o sangue esfriou, a respiração se estabilizou, mas a raiva não passou. Minha mão direita começa a doer agora.

– Marshall? – Escutei a voz de minha irmã ecoar na sala da enfermaria.

Não respondi, nem olhei pra ela, apenas continuei curvado, olhando pro chão. Minha expressão dizia para não se aproximar, mas ela fez mesmo assim.

– Os caras me deram a notícia – Ela se sentou ao meu lado e repousou a mão em minhas costas – Como é que você tá?

– Nunca me senti melhor – Dei um sorriso quebrado – Como você acha que eu estou?

– Foi mal – A mesma suspirou

– Foi péssimo

– Você não tá ajudando – Ela suspirou – Sabe, além de sua namorada, Fionna é minha cunhada, irmã da Cake, do Finn, do Beemo... Melhor amiga do Chris. Não é só você que está sofrendo.

– Bem... ela não é a mãe dos filhos do Chris, do Finn... – Falei comigo mesmo, mas ela escutou – Além do mais, nenhum deles são os culpados por isso.

– Nem você – Ela retrucou

– Sim, eu sou – Teimei - E todo mundo sabe disso. Qual foi a causa dessa complicação? Estresse. Quem a estressou esse tempo todo? Eu. É sempre culpa minha. Além do mais, ela não estaria passando por isso se não fosse essa gravidez. E quem foi que a engravidou? – Apontei pra mim mesmo.

– E a baixa imunidade, a pouca idade dela, o fato de serem gêmeos e a negligência médica não teve nada a ver com isso - Ela afirmou, com sua ironiazinha.

– Ah, foda-se, Marceline – Virei a cara – Não estou a fim de conversa. Será que dá pra você, por favor, me deixar em paz?

– Tudo bem, estressadinho – Ela se levantou – Só quis ajudar.

– Desculpe – Finalmente olhei pra ela – Eu sei que eu estou sendo um grosso e um puta idiota...

– Ainda bem que você sabe – Ela revirou os olhos – Mas eu perdoo dessa vez. Imagino o quanto deve estar sendo difícil pra você

– Você não faz ideia – Me levantei, abrindo os braços – Que tal um daqueles? Estou precisando muito.

– Daqueles acolhedores que irmãos amorosos dão um no outro? – Ela deu meio sorriso – Sentimental não é muito o meu forte, mas... – Ela curvou os ombros.

– Nah, vem aqui, sua anoréxica – A puxei pra mim e a abracei – Te amo muito, pentelha. Desculpa, viu?

– Eu sei, todo mundo me ama – Ela me apertou – Desculpa pelo que? Por ser o pior e mais ignorante irmão do mundo? Por me dar dor de cabeça todo dia?

– Por existir, basicamente – Respondi.

– Como você tá pra baixo, vou te dar uma trégua – Ela passou a mão nos meus cabelos – Eu também te amo, seu irritante. Isso tudo vai passar.

– Estou com medo, Marcy – Enterrei o rosto em seu cabelo – Eu nunca irei me perdoar se alguma coisa acontecer.

– Ei, que pessimismo é esse? – Ela segurou meu rosto com as duas mãos e olhou nos meus olhos – Haja o que houver, eu sempre estarei aqui. Nós todos estaremos, e vamos passar por isso juntos, certo?

Me perdi em seus olhos castanho-avermelhados por um tempo, eu parecia estar olhando para um espelho. Sua alma era transparente pra mim, eu a conhecia como ninguém. No fundo, ela também estava péssima, já esperando pelo pior, mas mesmo assim tenta se manter firme, para que eu permanecesse forte.

– Certo – A abracei novamente e tentei sorrir – Conte comigo também.

Continuamos abraçados por um bom tempo, eu sentia seu calor e fechava os olhos, enquanto ela mexia em meus cabelos e dizia palavras de consolo. Aquilo me ajudou bastante, me senti em casa novamente. Digo, na américa. A Inglaterra é incrível, os ingleses são ótimos (apesar de frescos), mas nada substitui o lugar onde eu passei minha infância. Tenho que afastar estas memórias, lembrar da infância me deixa depressivo. Depressão é tudo o que eu não preciso no momento.

Depois de um longo intervalo de tempo, Cake apareceu na sala da enfermaria e não escondeu o ciúmes. Me abraçou também, disse coisas acolhedoras e me olhou com uma carinha triste que me fez cortar o coração, pois seus olhos estavam cheios de água. Isso me fez pensar que talvez ela estivesse sofrendo tanto, ou até ainda mais do que eu. Ela sugeriu que fôssemos até a área da maternidade, para dar uma olhadinha nos novos bebês da família. Apesar da dor, eu estava ansioso pra vê-los. Uma ansiedade boa.

Ninguém me disse que seria tão difícil ser pai.

Caminhamos até o segundo andar, onde podemos ver através do vidro vários bebês enfileirados, cada um em sua caminha. Violet dormia tranquilamente na fileira B8 e Arthur ao seu lado na B9. Uma enfermeira que parecia um fantasma de tão pálida apareceu do meu lado, perguntando:

– Você quer segura-los?

Olhei para Marcy e Cake, que assentiram com a cabeça, como se estivessem me mandando ir. Acontece que eu não me sentia preparado para aquilo. Essa coisa de ser pai me assusta, e se eu deixar eles caírem no chão? E se eu machucar eles com esse meu jeito estabanado? E se eu a acordar e ela começar a chorar? E se...

– Sr. Lee? – A mesma me trouxe a realidade – Vamos?

Disse que sim com a cabeça, respirei fundo e fui. Ela abriu a porta e fez sinal para que eu entrasse. Pediu que eu a seguisse e assim eu o fiz, na medida em que eu me aproximava dos dois, meu medo aumentava. O casal de malucas me observava do outro lado do vidro.

O primeiro que eu peguei foi Arthur, que estava acordado. Segurei-o em minhas mãos e senti uma coisa jamais vivida antes, a sensação de ter um filho, só agora a ficha despencou de verdade. Olhei bem para o seu rostinho e ele sorriu pra mim, meu coração se aqueceu e eu não consegui segurar o sorriso também... Era a coisa mais pura que eu já vi na vida. Seus olhos eram negros como a noite, exatamente como os meus e suas profusas madeixas eram loiras, do mesmo tom de Fionna.

É certo o ditado que diz “Uma mulher vira mãe quando engravida... Porém um homem só vira pai quando segura seu filho nos braços”. Ouvi essa idiotice em algum lugar e agora pago na pele. Eu mal conseguia caber dentro de mim... E por um momento, me esqueci de qualquer problema.

Ele bocejou e eu senti o cheiro único que saíra de sua boca. Arthur nunca havia comido nem bebido nada na vida, não tinha cheiro de saliva, de leite, de água, de coisa alguma. Somente de vida. Meus olhos lacrimejaram, a felicidade quase não cabia em meu peito. O segurei por mais um tempo antes de coloca-lo novamente sobre sua cama. O cobri, me virando para sua irmã.

Violet era a princesinha mais linda do universo. Ela estava dormindo, então a segurei com todo o cuidado do mundo. Minha menininha, tão pequena, frágil e indefesa... Eu juro que nunca vou deixar ninguém relar a mão nela, nunca. E se alguém tentar machuca-la, eu não me responsabilizo pelos estragos. Ela dormia profundamente, sorrindo, sonhando. A coisa mais linda mais linda do mundo é ver uma criança dormir. Ainda mais quando é sua filha.

Minha vampirinha tinha os cabelos espessos, lisos e escuros, idênticos aos meus. Sua pele era quase tão pálida quanto a minha... Mal vejo a hora de ver suas pequenas presas crescendo. Ela era a minha cópia, sem tirar nem por. Espero que ela não dê tanto trabalho quanto eu.

A coloquei novamente em seu berço e a cobri, assim como fiz com Arthur. Cruzei os braços e sorri, observando aqueles dois, mal acreditando que esses anjinhos tão puros e inocentes são de minha autoria. Dá pra acreditar numa coisa dessas? Marshall sendo pai... Parece um sonho maluco.

Foi a partir daquele momento que eu soube o verdadeiro significado disso. E posso dizer com toda a certeza: eu daria a minha vida por esses dois.

Depois de um bom tempo, Cake e Marcy tiveram permissão para entrar na sala, se juntando a mim. Um pai coruja e duas tias babonas, era isso o que Arthur via... e ria. Alguns minutos depois todo o resto do pessoal chegou, para dar as boas vindas aos mais novos integrantes da família.

Christian fazia caretas que nem um bobo, para que o pequeno loirinho desse risada, Finn olhava para Violet com um sorriso bobo na cara, imaginando quando sua vez de ser pai chegará... Logo em breve, meu amigo. Flame se derretia com as risadas do bebê e acariciava a própria barriga enorme de 7 meses. Todos estavam muito entusiasmados com a ideia mais crianças entre nós. Só mais dois meses e Finn partilhará dessa loucura também. Espero que dê tudo certo com eles.

Deixei os mimadores de bebê alheio na sala da maternidade e discretamente me encaminhei até a recepção, sem que ninguém notasse. Perguntei para a atendente aonde é que eu poderia encontrar os pacientes em coma, ela disse que é uma área restrita. Eu criei paciência e expliquei para ela a situação.

– É uma zona restrita, já disse – Ela repetiu, com aquela cara de “não estou a fim de ajudar”.

– Puta merda, garota! – Exclamei – Você é a má vontade em pessoa, hein?

– Escuta, meu querido – Ela me olhou com um olharzinho de nojenta – Só estou fazendo meu trabalho.

– Ahh, atrasando minha vida? – Me encostei no balcão – Tá exercendo bem tua função.

– Somente funcionários e parentes, fofo – Ela voltou a olhar para a tela do computador

– E eu sou o quê, minha filha? – Indaguei nervoso.

– Vou saber... – Ela bufou – Tá bom... O que você é da paciente? – Ela perguntou com aquela voz enjoada e cara de desdém.

– Sou o noivo dela – Respondi, me esforçando pra não ser ignorante – Dá pra parar de me enrolar e me dizer onde ela tá?

– Terceiro andar, ala C – Ela digitava teclas no computador, enquanto mascava seu chiclete, como se estivesse mastigando merda – Sala 530. Tá bom, querido?

– Obrigado – Disse, dando as costas – Escrota...

– Eu recebo pouco de mais pra trabalhar nessa merda... – A mesma comentava consigo mesma – É cada um que me aparece...

Deixei a mal amada falando sozinha, ao reclamar de sua vida e trabalho e voltei meu foco para o que realmente importa. Eu poderia pegar o elevador, mas demoraria muito pra chegar do 9° andar até o segundo, onde eu me encontrava, e tempo é uma coisa que eu não tenho (muito menos paciência pra isso). Subi as escadarias em direção ao terceiro, passei pelas alas A e B, até chegar na C e virar no corredor, em busca do quarto 530.

Ao chegar lá, dei de cara com o velho doutor que eu esmurrei á uma hora atrás. Ele estava com alguns pontos na maçã do rosto e recuou, um tanto assustado quando me viu.

– Relaxa, eu só quero ver a Fionna – Disse, levantando as mãos – Mesmo estando puto da vida com você, não vou te matar. Por enquanto.

– Não é nada sábio falar estas besteiras, você só diz isso porque está nervoso – Ele se defendeu – No fundo, sabe que tudo o que fizemos foi pra salvar a vida dela.

– Fizeram um excelente trabalho – Ergui o polegar – Parabéns, doutor. Foi muito sábio aplicar o dobro de anestesia e levar uma paciente ao estado vegetativo, o senhor é um exemplo.

– Tudo bem rapaz, já pedi o seu perdão – Ele levou as mãos a cabeça – O que quer que eu faça?

– Quero que concerte a merda que vez, só isso – Respondi – O perdão vai vir no tribunal, quando eu processar vocês.

Ele não disse mais nada, apenas me deu licença para passar. Fui barrado por um alemão que mais parecia um armário de tão enorme, mais conhecido como segurança, me dizendo que o acesso era restrito. A mesma ladainha da recepção. Será possível que eu tenha que enfrentar toda uma burocracia, só pra ver essa mulher? Sinceramente...

– Pode deixar ele passar – O doutor disse, parando no corredor – É só um coitado que quer ver sua esposa antes de bater as botas.

– Cale essa boca – Rosnei

O armário alemão saiu da frente, me deixando finalmente adentrar no quarto.

– Você vai ficar aí na porta? – Indaguei á ele, que me encarava.

– Regras do hospital – Ele respondeu com sua voz medonha de tão grossa – Só pra garantir que você não vai mais criar problemas.

– Mereço... – Revirei os olhos e adentrei no quarto.

Suspirei, batendo a porta... É muita dor de cabeça para um dia só.

A primeira coisa que me deparei foi Fionna deitada, com os olhos fechados, como se estivesse dormindo. Como se estivesse sonhando um sonho que nunca termina, era o que eu temia. Tenho que encarar os fatos: ela pode nunca mais acordar. Enfraqueço só de pensar nisso.

Caminhei até ela, sentando-me ao seu lado, em um banco ao lado da cama. Segurei sua mão, que carregava em seu dedo médio o anel de noivado, que eu dei á ela no natal. Senti uma leve nostalgia. Agora suas mãos estão mais geladas que as de um morto, e muito pálidas, como as minhas. Perece que toda a vida que existia dentro dela está indo embora. Ela nem parece estar mais presente.

– Como eu queria que você estivesse do meu lado nesse momento – Disse, como se ela pudesse me ouvir – Tá difícil, fi. É quase insuportável passar por tudo isso sem você.

Eu não conseguiria continuar com aquilo sem desmoronar. Me debrucei sobre seu corpo e tive vontade de chorar, mas contive.

– Sabe... Violet e Arthur nasceram perfeitos, caso você queira saber – Ergui a cabeça – Nós fizemos um bom trabalho. São as crianças mais lindas do mundo... gostaria que você pudesse ver o rostinho deles também. Com certeza você choraria, do jeito que você é, toda manteiga-derretida.

Se bem que, quem está chorando durante todo tempo sou eu...

– Mas apesar de chorona, você sempre foi forte pra enfrentar essas situações, então... seja persistente, tudo bem? Lute contra a morte com todas as suas forças, porque nós aqui precisamos de você – Apertei sua mão – Você precisa ser durona agora, por mim. Por nós. Todo mundo depende de você aqui. Tu se tornou nosso alicerce, sem você tudo vai desmoronar.

Eu, por exemplo, já estou no chão.

– Mais tarde o pessoal vai vir te visitar, talvez eu traga Arthur e Violet aqui, pra você segurar eles... Bom, nem sei se você está me ouvindo, ou consegue me entender... – Suspirei, me levantando – Fica bem... te amo.

Fiz carinho em seu rosto e beijei sua testa. Antes de sair da sala, dei uma olhada pra trás, nenhum sinal de vida, continuava semimorta, pálida, fria. Já não era mais a Fionna que eu conhecia. Eu também mudei depois daquele dia.

Naquela mesma noite, pude levar os bebês para casa, mas ao invés de descansar fui surpreso com mais dor de cabeça. Acontece que Beemo não estava sabendo do estado de sua irmã, e ficou no mínimo muito nervoso ao saber que ela não voltaria pra casa tão cedo. Ignorei sua cara de bunda pra mim.

Coloquei Arthur e Violet no berço e apaguei a luz do quarto, ao virar me deparei com o adolescente revoltado, me encarando.

– Perdeu alguma coisa aqui? – Indaguei, já nervoso – Pare de me encarar e diga logo o que você quer.

– Eu quero minha irmã – Ele cruzou os braços – Aonde ela está e porque ninguém quer me contar o que tá acontecendo?

– Bem... Se seus irmãos não quiseram te contar, não sou eu que vou me meter. Eles acham que sabem o que é melhor pra você – Respondi, dando as costas.

– Eu estou cansado de vocês ficarem decidindo tudo por mim, como se eu fosse uma criança. Mas que droga! Eu tenho o direito de saber! – Ele exclamou, segurando meu braço – Me conte agora... O que tá acontecendo?

– Pergunta pro Finn, ou pra Cake... E tire a mão de mim – Pedi, com meu resto de paciência.

– Vocês adultos acham que sabem de tudo... Estão ocupados demais olhando para os próprios problemas e se esquecem que eu também sou gente – Ele revirou os olhos – Abre o jogo de uma vez, eu sei que eles não vão falar.

– Tudo bem, você quer que eu diga? – Elevei a voz. Minha calma se foi – Sua irmã tá em coma, no hospital. Satisfeito? – Puxei meu braço de sua mão, mas não me livrei.

– O-o que? – Ele indagou, me soltando – Não...

– Sim – Assenti – Agora me deixe em paz – Dei as costas e saí andando.

– Espera... como isso aconteceu? Ela estava bem até ontem! – Ele me seguiu pelo corredor

– Não te devo explicações – Continuei caminhando – Eu não sei como isso foi acontecer, mas agora não tem volta. Os médicos incompetentes disseram que ela era muito nova pra conceber gêmeos, e estava fraca... Além de ter sofrido muito estresse.

– O único aqui que estressava ela era você – Ele acusou – Se ela ficou grávida, a culpa foi sua também! Você tem que consertar a merda que fez!

– Eu não fiz nada! – Me virei pra ele

– Exatamente! – Ele abriu os braços – Você nunca faz merda nenhuma! Poderia ter impedido isso, mas não fez nada!

– Escuta aqui seu pirralho, eu fiz de tudo pra mantê-la bem! Você não pode chegar aqui me acusando... você nem sabe tudo o que eu passei pra chegar até aqui! – Gritei, no mesmo tom.

– Eu não quero saber pelo o que você passou, não me importo! Eu quero que você se foda, na verdade! – Ele elevou a voz mais ainda – Você é o culpado de tudo isso! Eu te odeio! Desde que você chegou, só tem feito mal pra Fionna!

– Cala essa boca – Dei as costas, pra não fazer besteiras.

– Não me manda calar a boca, seu infeliz! – Ele me empurrou

– Ei, o que tá acontecendo aqui? – Finn chegou na cozinha – Que gritaria é essa?

– Será que dá pra você segurar essa criança? – Apontei pra ele – O Beemo surtou.

– Você vai ver quem é o surtado! – Ele começou a distribuir seus socos em minha barriga e peito. Segurei seus braços, enquanto ele se debatia, tentando me acertar.

– Beemo! Para com isso! – Finn exclamou o segurando

– Não, me larga! – Ele se bateu até se soltar dos braços do irmão – Eu vou te matar!

Então o fraldinha voou em cima de mim novamente, por reflexo, o empurrei forte contra a parede, pra me livrar. O mesmo bateu a cabeça contra a quina e continuou por lá, esmaecido. Cake chegou em seguida, junto com Marcy e Christian que encontraram aquela cena deplorável.

É incrível como todo mundo só vê quando eu faço algo ruim, mas nunca o que causou isso. Pegam a situação na metade, porém só conseguem ver a parte onde eu errei.

– Você endoidou, cara? – Christian se esbarrou em mim, ajoelhando ao lado de Beemo – Ei, guri, você tá bem?

– Qual é o seu problema? – Cake me deu um soco no ombro – Porque fez isso?

– Eu... eu não sei! Foi um reflexo! – Tentei me defender, mas na hora do nervosismo ninguém sabe ao certo o que dizer.

– Reflexo de quê, seu animal? – Marceline me empurrou – Você não tá vendo que ele é uma criança? Porra, Marshall!

– Ai meu glob – Chris parecia estar sentindo uma vertigem – Isso aqui na cabeça dele é s-sangue?

Todos viraram seus olhares em minha direção, com suas fixas expressões de ódio sobre mim, que não tive culpa alguma.

– Pessoal, é sério... – O deus da frescura, rei da viadagem e príncipe do drama começou a entrar em pânico – E-eu não posso ver sangue... minha mão tá cheia de sangue!

– Mas meu amigo... tu não tá uma dentro hein – Finn comentou, ainda encostado na quina entre a sala e a cozinha.

– Será que dá pra você deixar de ser sardônico um pouquinho e vir me ajudar? Você viu o que aconteceu! – Implorei

– Argh, você arruma seus problemas e eu tenho que resolver – Ele revirou os olhos – Sai daí, Christian – Disse empurrando o embaixador do não-me-toque pro lado e pegando o adolescente problemático nos braços – Eu levo ele pro pronto socorro se Cake me der uma carona. No caminho, eu explico o que aconteceu. Acabou a festa.

– Obrigado – Disse dando as costas

– Não pense que acabou – Marcy segurou meu braço – Seja lá qual foi o motivo, que eu prefiro nem saber, pra essa palhaçada, você não se livra da culpa. Afinal, qual é a tua? Só faz merda o tempo inteiro e ainda desconta na criança? Vê se toma juízo, meu!

– Claro que ninguém quer saber qual foi o motivo... Aliás, ninguém nunca procura saber, porque é mais fácil sair me culpando por tudo – Puxei meu braço – Eu sei que faço merda pra caralho, mas dessa vez eu só estava tentando me defender. Juro. Eu nunca faço cagada de propósito.

– Sei... você é um anjo bem intencionado – Ela cruzou os braços – Eu te conheço.

– Ahh, quer saber? – Explodi – Foda-se, pense o que você quiser. A merda já tá feita mesmo, todo mundo me odeia, minha vida tá uma bosta... Mas quem liga? É sempre bom jogar mais um fardo nas costas do Judas aqui... Então vamos lá, atire mais uma pedra. Julgue o quanto você quiser, brigue, me estapeie, tanto faz.

– Não aguento seus dramas desnecessários – Ela deu as costas – Tô indo junto com a Cake pro hospital... Mais um internado por sua causa. Quando eu voltar, conversamos.

– Não tenho mais nada pra conversar – Dei de ombros – Quando sair apague a luz e feche a porta.

A mesma não disse mais nada, apenas fez o que eu pedi. A única coisa que vejo agora é a escuridão, ainda posso escutar suas botas pesadas descendo as escadas de ferro apressadamente, trancando a porta da frente, abrindo a porta do carro e travando-a em seguida. Cake dá partida, enquanto eu os observo pela janela, descendo a avenida, até virar na rua da escola e sumir.

Agora estou sozinho novamente, mergulhado num poço de culpa, angústia e mais um punhado de sensações ruins. Espero que eles não voltem tão cedo, pois não estou com cabeça pra nada. Perdi completamente a ânsia de viver.

...

Depois daquela noite horrível, meu sono, assim como o apetite e todo o contentamento que um dia já residiu em mim se fora. Tranquei as portas e as janelas e me privei do mundo, e após alguns dias de insistência todas as pessoas nas quais eu me importava foram parando de tentar conversar comigo, já que eu nunca abria a porta pra ninguém.

Seriamente, tudo o que eu queria era estar morto. Nada mais era como antigamente, mas com certeza a coisa que mais mudou foi minha forma de ver o mundo.

Aos poucos fui me tornando mais velho, mais sério, mais triste. Sem cor, sem vida, sem nada. Raramente esboçava um sorriso ou dava uma risada espontânea como antes. As semanas que se passaram depois do nascimento foram chuvosas, tristes e acinzentadas. Mais um outono depressivo...

Atualmente, os maços de cigarro e as garrafas de whisky viraram minhas companheiras, no apartamento vazio e bagunçado. Eu estava tão vazio e bagunçado quanto ele. As olheiras surgiram, a barba cresceu, meu corpo enfraqueceu e emagreceu em escalas soturnas. Faz um bom tempo que eu não vejo a luz do sol.

Os gêmeos não merecem um pai alcoolizado, depressivo e destruído como eu, por isso os deixei com Marcy e Cake, que constantemente os trazem até mim. Eu sei que prometi á Fionna que eu cuidaria deles, que eu pararia de fumar, que eu seria mais responsável... Mas ela também me prometeu sempre estar ao meu lado, e não foi isso que aconteceu.

Como sempre, fodi com tudo. Agora eu já não sei bem o que é uma vida de verdade á um bom tempo.


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Notas finais do capítulo

Pois é, vampiro... A única coisa que te resta e se matar de vez.
Gente, eu sei que vocês queriam um final feliz (e vão tê-lo) mas parem te tentar achar meu endereço pra me matar, okay? Só acompanhem e fiquem na paz u.u
Beijo pra quem quiser, até semana que vem.