Caçada escrita por Gabi Gomes


Capítulo 36
Estou em Casa


Notas iniciais do capítulo

Hey, Tigers!
Eu disse que voltaria em breve não é mesmo?
Então aqui está uma enorme capítulo de Caçada cheia de Mishan e tudo o que vocês gostam!
Quero agradecer pelos favoritos e comentários lindos que me mandaram!
Espero que aproveitem o capítulo, e ouçam esse capítulo ao som de ONE LAST TIME, da Ariana Grande.
Boa Leitura



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Em todos os momentos pelos quais passei com Kishan, nunca antes vi aquela expressão em seu rosto. Ele estava estático, olhando para algo atrás de mim sem focar os olhos de pirata em nada, e as íris que viviam cheias de vida estavam sem brilho.

Eu sabia que minhas palavras rondavam os pensamentos de Kishan naquele momento, machucando-o tanto quanto a mim, mas nem mesmo eu sabia se aquelas palavras eram verdadeiras.

Eu queria mesmo ir para os EUA e deixar Kishan?

Grande parte de mim – que nem mesmo eu sabia existir – gritava para que eu esquecesse aquela loucura e abraçasse Kishan, para que aquela expressão em seu rosto nunca mais voltasse. Ele parecia desolado e perdido, mas eu mesma não estava em uma situação melhor.

Entretanto, a parte de mim que ainda era aquela garotinha que queria enviar uma carta ao melhor amigo no dia da morte de meus pais voltava a falar mais alto, e eu sabia que precisava me manter firme em minha escolha.

− Kishan? – Assustei-me com minha voz, rouca e grossa, então suspirei pesadamente e passei as mãos pelos cabelos antes de voltar a falar. – Eu não posso mais viver esse conto de fadas enquanto meu amigo pode estar morto.

Ele não respondeu, nem ao menos focou seus olhos em mim, e sua reação começava a me ferir, e só percebi que chorava quando minha própria visão ficara embaçada.

− Eu amo você, Kishan, mas eu não posso deixar meus sentimentos por você falarem mais alto dessa vez – murmurei, fechando as mãos em punho enquanto as lágrimas desciam por minhas bochechas.

Meus pés começaram a se mover, e quando vi já estava parada a poucos centímetros do corpo alto e estático de Kishan, que não expressava reação, e duvidei que ele havia escutado minhas palavras.

− Você vai sempre estar comigo – disse perto de seu ouvido, ficando nas pontas dos pés e apoiando minhas mãos em seus ombros largos.

Sem forças para continuar com aquilo, apenas apoiei minha testa em seu peito, permitindo-me sentir se perfume viciante pelo menos uma última vez, e guardar na mente os momentos em que passei com o príncipe de olhos dourados.

Soltei um ofego de surpresa quando mãos fortes prenderam meus pulsos, afastando-me do meu apoio. Kishan finalmente havia reagido, e sua expressão era de desespero quando ele focou seus olhos nos meus.

− Mia, por favor não faça isso – ele sussurrou, implorando para mim como nunca havia feito antes. Um arrepiou correu por meu corpo, e não consegui por mais nenhum segundo manter nossos olhares, e abaixei a cabeça. – Eu preciso de você, mais do que tudo.

Meu coração palpitou e meu corpo reagiu a suas palavras, querendo tomar seus lábios nos meus e abraçar seu corpo, mas eu me sentia mal por estar fazendo Kishan passar por aquilo e queria sair correndo daquele cômodo como uma covarde.

− Eu preciso ir – disse com firmeza, tocando seus dedos longos e soltando minhas mãos de seu aperto desesperador. – É meia noite e tenho que ir embora do baile.

Afinal, tudo o que eu havia vivido nos últimos dias era um verdadeiro conto de fadas, em que eu tinha meu próprio príncipe e o bruxo mal, mas minha atitude naquele momento não era de uma princesa corajosa.

E eu me virei em direção a porta, antes que eu não conseguisse mais fazer isso. Meu corpo pesava e cada passo parecia ser dolorido. Mas segui em frente até que a voz de Kishan me fez parar no batente da porta.

− Não me deixe, bilauta – A voz de Kishan era praticamente inaudível, e eu prendi minha respiração por longos segundos ao ouvir aquelas palavras.

− Não faça isso ser mais difícil do que parece, Kishan – eu disse, fechando os olhos e contanto até dez mentalmente antes de virar a cabeça e olhar para trás, mas para meu espanto Kishan já não estava lá, e tudo o que vi foi o vulto do tigre negro correndo na varanda de meu quarto, deixando-me sozinha com minha decisão.

Minhas pernas fraquejaram e eu escorreguei pelo batente até acabar sentada no chão. Tampei o rosto com as mãos e deixei que o choro corresse livremente por meu rosto, até o momento em que soluços tomaram conta do corredor escuro.

Passos vieram em minha direção e eu levantei a cabeça na esperança de encontrar o par de olhos dourados que eu amava, mas no lugar deles, olhos azuis cobalto que sempre me instigavam estavam me observando em silêncio.

O corpo esguio de Ren estava encostado na parede em minha frente, e percebi que agora ele usava roupas diferentes. Uma camisa branca cavada abraçava seu corpo junto com uma calça jeans e botas, e seu cabelo brilhava, o que me fez concluir que o tigre branco havia acabado de sair do banho.

− Você também veio criticar minhas escolhas? – Ataquei-o, querendo jogar toda a minha fúria sobre aquele belo homem parado em minha frente.

− Você é muito teimosa, nunca me escutaria – disse Ren, dando de ombros de um jeito relaxado, antes de vir em minha direção e sentar no chão ao meu lado, com as costas encostadas na parede.

Levantei a cabeça o mínimo possível apenas para observar o perfil tenso de Ren, e concluir que ele havia escutado minha pequena discussão com Kishan. Mas eu estava cansada de brigar, e simplesmente apoiei minha cabeça no ombro de Ren, deixando-o espantado por alguns segundos.

− Por que eu sempre faço as coisas erradas? – perguntei, fechando os olhos antes de sentir os dedos de Ren envolvendo minha mão na sua.

− Você faz o que acha certo, priya, mas as vezes tenta engolir o mundo com os braços, e esquece que nem todas as vezes isso não é possível.

Ficamos em um silêncio imaculado, e o único movimento entre nós era o de Ren brincando com nossos dedos juntos. Seu singelo carinho parecia conseguir tirar um pouco da tensão que me dominava.

− Nunca tive tempo de perguntar, mas o que significa “priya”? – questionei, tentando tirar o foco da conversa de mim.

− É um chamamento curioso, equivale a “querida” no inglês – ele respondeu, e percebi que Ren abria um enorme sorriso no momento em que entrelaçou nossos dedos, beijando a união de nossas mãos carinhosamente.

Meu coração palpitou e eu arregalei os olhos no escuro. Aquilo não parecia certo, e algo me avisava que era melhor quebrar aquele contado entre nós, mas eu estava cansada e derrotada, portanto simplesmente me permitir aceitar seu carinho.

− Eu não posso voltar a trás, preciso fazer isso por Matt – disse finalmente depois de alguns minutos em silêncio.

Eu dizia aquilo mais para mim do que para Ren.

− Essa casa vai ficar muito sem graça sem você. – Ele suspirou, fazendo-me abrir um pequeno sorriso.

− Só por favor não destruam a casa na minha ausência – respondi em um tom zombeteiro, o que resultou em uma risada anasalada de Ren, calma e rouca. – Eu até diria para você me mandar cartas, mas não sei se terei um endereço fixo quando chegar aos EUA.

Esse era o grande problema do meu plano: eu não sabia o que fazer ao chegar nos EUA, afinal, não tinha mais casa, nem ninguém para ficar.

− Prometa-me que ficará segura – ele sussurrou, e parecia mais sério do que nunca.

− Você sabe que vindo de mim, é impossível prometer algo do tipo – respondi, soltando finalmente nossas mãos antes de levantar do chão, mais uma vez pronta para descer aquelas escadas e ir até Kadam.

Antes de pisar no primeiro degrau, senti uma mão segurando meu pulso, fazendo-me girar sobre os calcanhares até parar de frente à Ren, que em um movimento rápido, puxou meu rosto para depositar um beijo demorado em minha bochecha.

Quando os olhos cobaltos me encararam mais uma vez, eu não sabia o que dizer, mas percebi que o príncipe tinha um sorriso de lado no rosto magro e num piscar de olhos ele voltava para a porta ao lado do meu quarto.

Minha cabeça martelava e eu desci pulando os degraus da escada. Já estava de noite e a casa permanecia na penumbra, meu corpo doía e eu sentia a necessidade de trocar aquelas roupas sujas do dia anterior, mas precisava falar com Kadam antes de tudo.

Bati três vezes nas grandes portas de madeira da biblioteca antes de abrir as portas. Lá dentro, encontrei senhor Kadam rodeado por milhares de computadores portáteis abertos em várias páginas de notícias, enquanto o velho homem falava no celular apressadamente em uma língua desconhecida.

Aproximei-me apenas para perceber que os sites mostravam reportagens do incêndio que ocorreu no circo, e uma foto do grande picadeiro rodeado por chamas fez meu coração palpitar de dor.

− Senhor Kadam, eu preciso falar com o senhor – murmurei, fazendo com que o homem de expressão cansada desligasse a chamada com algumas palavras rápidas, antes de voltar-se para mim com um olhar solidário.

− Eu sinto muito pelo o que aconteceu, senhorita Mia, mas não pararei até encontrar informações sobre o que aconteceu com seu amigo Matthew.

Eu queria abraçar aquele homem que parecia mais como um pai para mim desde que cheguei na Índia, mas eu sabia que desmoronaria se o fizesse, então simplesmente respirei fundo.

− Agradeço tudo o que tem feito, senhor Kadam, mas não é mais necessário, pois vou voltar para os EUA.

Os olhos castanhos do homem me encaram atônitos, e ele colocou o celular de voltar para a escrivaninha antes de se levantar da cadeira e vir em minha direção.

− O que você está falando, senhorita Mia? – ele perguntou, mesmo sabendo que ele entendera o que eu dizia.

− Eu quero voltar e procurar por meu amigo – murmurei, passando uma de minhas mãos pelo braço, olhando para todos os livros nas estantes altas da biblioteca. – Eu devo isso à Matt.

− E você tem certeza de quer fazer isso? – Sua voz era controlada, mas eu via em seu rosto que minha confissão o abalara.

− Eu queria ir o mais o rápido possível, caso o senhor conseguisse providenciar a viagem para amanhã, eu agradeceria profundamente. – A verdade era que eu queria sair daquela casa o mais rápido possível, pois não conseguiria olhar para Kishan sem desabar ou até mesmo para Ren sem me sentir confusa.

− Se é isso o que a senhorita deseja, considere-o feito – disse Kadam, aproximando-se alguns passos até sentar na ponta da grande mesa de madeira cheia de livros, a qual passamos horas pesquisando informações sobre a maldição. – Mas se permite me dizer, os irmãos precisam de vocês.

Aquela informação me pegou desprevenida, pois eu conseguia perceber os milhares de significados que aquela frase possuía, mas simplesmente escolhi me fazer de desentendida e manter meu escudo protetor.

− Vocês já têm as informações de como quebrar a maldição, não precisam mais de mim – disse, indo até a poltrona de couro que costumava ser meu lugar cativo, e deixando meu corpo descansar em seu estofado confortável.

− Não é sobre isso que falo. Os dois irmãos nunca tiveram uma relação boa depois da maldição, Kishan e Ren não conseguiam ficar em um mesmo cômodo sem acabar lutando, e agora eu vejo os dois irmãos convivendo novamente em uma mesma casa e tudo graças a você. Você devolveu a eles o amor, senhorita Mia.

Quis mencionar o fracasso meu em tentar fazer com que os dois tigres parassem de lutar na floresta, mas apenas fiquei em silêncio, absorvendo tudo aquilo com pesar.

− Você faz bem para todos nós nessa casa, e principalmente para Kishan... – Kadam faz uma pausa e olhou profundamente em meus olhos. – Aquele menino passou por muitas coisas e nunca teve ninguém ao lado depois da morte dos pais, você foi a única pessoa que conseguiu fazer Kishan voltar a ser o garoto que eu conheci.

Aquilo doeu em mim mais do que as palavras do meu tigre negro no quarto, pois eu sabia que era verdade. Quando tigre negro apareceu no Benzini Brothers pela primeira eu vira em seus olhos sentimentos dolorosos e humanos e tudo o que eu queria era acabar com aquele sofrimento.

Infelizmente como Ren havia dito, eu costumava ser muito teimosa, e sem pensar muito, dei a resposta que Kadam esperava.

− Eu vou embora, senhor Kadam – disse por fim, encerrando aquela conversa e deixando a biblioteca em um silêncio mortal.

− Então, amanhã assim que acordar, um jatinho a levará de volta para os EUA, senhorita Mia. – Foi tudo o que o homem disse antes de voltar a atenção para as telas de computador e para o celular.

Derrotada, arrastei-me em direção ás portas da biblioteca, parando um momento antes de sair apenas para me dirigir à Kadam.

− Eu sinto muito – murmurei, mexendo no amuleto que pousava gelado sobre minha blusa preta.

− Eu também sinto, senhorita Mia.

Com mais uma nova leva de choro preso na garganta, subi para meu quarto arrastando as pernas cansadas, e fui em direção ao banheiro, arrancando as roupas imundas e mergulhando em baixo da água fervente da banheira, esperando que a familiar sensação de alivio viesse, mas eu simplesmente fiquei mais tensa.

Minha cabeça pendia sobre a pedra gelada da banheira, e meus cabelos molhados colavam no meu corpo que não estava imerso em água. Assim que entrei no closet em busca de algo para vestir, encontrei meu sharara pendurado em um cabide solitários. A roupa de princesa me fez suspirar, e passei os dedos pelo tecido grosso antes de vestir uma camisola preta simples.

Meu quarto nunca pareceu tão solitário como naquele momento em que eu me encontrava deitada na cama grande. O cômodo enorme estava silencioso e tudo o que iluminava era a luz da lua.

Girei a cabeça até encontrar um enorme tigre negro deitado na espreguiçadeira do quarto, observando-me com os olhos dourados e tristes. Tentei sorrir mais o tigre continuou me encarando sem expressar movimento e eu soube que não o teria ao meu lado naquela noite.

Quando meus olhos estavam a ponto de se fechar, Kishan virou a cabeça e rugiu baixo, chamando minha atenção para o tigre branco que aparecia na varanda. Ren olhou para o irmão antes de se acomodar no chão perto das portas de vidros, observando-me com seus olhos azuis cobalto.

E foi sendo vigiada pelos dois tigres que acabei pegando no sono, tendo pesadelos perturbadores com o primeiro desafio de Durga e o resgate de Ren no prédio de Lokesh.

Ao abrir os olhos, o sol invadia as janelas do quarto, deixando todo aconchegante, mas meu corpo estava dolorido, e eu pulei da cama assim que lembrei que o avião deveria estar me esperando.

Olhei para a sacada, mas nenhum tigre estava ali, e tive que resistir ao impulso de procura-los. Não me demorei ao me arrumar, e peguei a velha mochila de lona que veio comigo do circo, com meus poucos pertences.

Aquelas roupas e presentes que recebi não iriam comigo, e assim que voltei para o quarto, caminhei até a penteadeira apenas para tocar as lâminas negras que repousavam inanimadas ali. Tracei o desenho do cabo das adagas antes de apertar as alças de minha mochila mais forte em minhas costas.

Desci as escadas olhando para meus velhos coturnos, o quais completavam uma calça jeans rasgada e uma camisa xadrez de flanela. Ao chegar à cozinha tudo o que encontrei foi Nilima com olheiras e o cabelo bagunçado em um rabo de cavalo.

Ela fazia café forte, e eu sorri com a imagem, correndo para abraçar a mulher que sempre me fazia sorrir com um novo prato ou roupa. Ela havia se tornado minha irmã.

− Você está mesmo indo embora? – ela perguntou com um sorriso, e eu apenas brinquei com o pote de creme de amendoim em cima da bancada.

− Onde está Kadam? – Desconversei, sem querem perguntar onde estavam os irmãos.

− Ele saiu apressado não faz muito tempo, não disse onde iria, mas aposto que foi arrumar os últimos detalhes para sua viagem. – Nilima entregou-me um copo grande de suco de laranja e um pratinho com bolo de chocolate, o qual comi como se fosse minha última refeição.

− Sentirei sua falta, Nilima – murmurei, recebendo um olhar solidário da mulher, antes de ajuda-la com a louça suja.

Estava perto da hora do almoço quando a porta principal da casa foi aberta com um barulho alto, e Kadam apareceu ofegante e suado de uma forma que eu nunca o vi. Ele carregava um celular completamente diferente na mão, pequeno e com poucas teclas, mas ele o segurava com um sorriso no rosto antes de vir até onde eu estava e o oferecer.

− Senhor Kadam, está tudo bem? – perguntei, assistindo assustada para a cena que se desenrolava em meus olhos.

− Pegue o celular, senhora Mia – ele disse, abrindo um sorriso cúmplice antes de passar o aparelho para mim.

Minha mente trabalhava rapidamente para entender o tudo, mas foi quando a chamada que Kadam fizera foi atendida, que meu cérebro parou de trabalhar e meu peito passou a bater mais forte.

Quem está falando? – A voz tão familiar para mim, fez com que lágrimas brotassem de meus olhos, e meus pernas não aguentaram meu peso. Teria caído no chão se Kadam não houvesse me pego e colocado em uma cadeira da cozinha.

− Você tem que falar “Alô” quando atende uma chamada, Mattie.

E eu sorria, sorria tanto que meus músculos faciais doíam, mas a sensação de ouvir a voz de Matt mais uma vez depois de dias, me fez explodir em emoções, e a constatação de que ele havia saído vivo do incêndio fazia meu coração dar piruetas.

Mia? É você? Onde você está? – Ele começou a fazer perguntas, e em uma situação normal eu o faria calar a boca, mas agora eu desejava que ele não parasse de falar nunca.

− Eu que deveria estar fazendo as perguntas, Matt! – ralhei de forma brincalhona. – O que aconteceu com o Benzini Brothers?

Um silêncio tomou conta da linha, e eu sabia que as notícias não seriam as melhores. Eu temia por Matt, mas me esquecera que haviam outras pessoas no circo que também estavam envolvidas no acidente.

Estávamos no meio de uma apresentação quando a plateia começou a gritar. Não vimos de onde o fogo veio, poderia ter sido um espectador desatento que fumava, mas só sei que o fogo tomou proporções catastróficas em pouco tempo – ele disse, parando rapidamente para tomar uma lufada de ar. – Tudo foi muito estranho, pois quando tentamos apagar o fogo com baldes de água, mais o fogo se alastrava e as chamas mudavam de cor constantemente.

Arregalei os olhos ao ouvir a última parte da história e estava prestes a pedir explicações para aquilo, uma pessoa veio em minha mente e eu agarrei o celular contra o ouvido.

− Seu pai...? – Não tinha coragem terminar a frase, apenas deixei que a pergunta pairasse entre nós.

Ele estava dentro do picadeiro, muitas pessoas que estavam ali dentro não conseguiram sair e morreram sufocadas, incluindo o Benzini. Eu estava do lado de fora com Lavander, e corremos para salvá-lo assim que as chamas começaram. Vai parecer loucura, mas as chamas pareciam me perseguir, felizmente conseguimos salvar papai, para finalmente fugirmos daquele caos. – As teorias se passavam na minha cabeça de forma acelerada e minha respiração ficou ofegante à medida que as palavras de Matt me atingiam.

−Onde vocês estão? Estão seguros? – perguntei, olhando para Kadam que me ouvia com atenção.

Fomos para a antiga propriedade da família de papai, uma fazendo bem afastada de uma cidade de fronteira com o México. – ele disse, e por alguns segundos eu ouvi vozes femininas no fundo da chamada.

E a lembrança de Lavander me ajudando a fugir do circo apenas me fez querer ainda mais ajudar Matt e ela.

− Matt, me escute. Não saiam daí e tentem ao máximo não fazer muito contato, se mantenham seguros – implorei, a ponto de chorar como um bebe no telefone.

Mia, o que está acontecendo? Onde você está? Depois que você fugiu do circo com aquele tigre eu venho procurando sua localização. Você pode vir para cá! – Matt estava afobado, e eu me xinguei mentalmente por não ter dado notícias desde minha fuga.

− Matt...Eu estou na Índia. – Tudo o que eu conseguia ouvir era minha própria respiração no telefone, e depois de alguns minutos fiquei com medo de que Matt houvesse desmaiado. – Você está aí?

Índia? Mia, como foi parar aí e o que está fazendo do outro lado do mundo? − A voz de meu amigo se tornava cada vez mais grossa, e eu sabia que ele estava a ponto de endoidar.

E eu quis contar a ele toda a verdade, entretanto se a hipótese que me perturbava estivesse certa, seria muito perigoso para Matt saber qualquer coisa da minha localização. Toda aquela história de incêndio era muito estranha, e eu precisava conversar com Kadam.

− Eu queria poder te contar, Matt, mas existem muitas coisas envolvidas, só saiba que foi o que precisava fazer no momento – disse, xingando-me mentalmente por dar uma resposta tão cretina ao meu melhor amigo. – Mas eu vou voltar, Matt, estou indo para os EUA e prometo que nada mais vai acontecer.

Percebi que mais uma vez eu estava chorando, e uma parte de mim concordava que nas últimas horas eu tinha acabado com o estoque de lágrimas, mas eu já não conseguia controlar meus sentimentos, nem mesmo queria.

Mia, ouça-me – disse Matt agora verdadeiramente sério, e eu soube que um sermão estava a caminho. – Tudo o que aconteceu foi muito estranho, mas não quero que você abra mão de sua felicidade para nos proteger, e eu sei que você gosta de fazer isso.

Nós dois rimos baixinho, e parecia que mais uma vez eu estava no circo, brincando de imaginar coisas com Matt. Ele me conhecia melhor do que qualquer um, e eu agradeci por ter aquele menino em minha vida.

Não estou feliz em saber que você não vai me contar nada, mas eu confio em você, e quero fazer apenas uma pergunta: Você está feliz onde está? – Aquela pergunta me atingiu de forma brusca, e meu coração começou a bater cada vez mais forte.

Eu estava feliz na Índia? Aquela pergunta era quase retórica, afinal, eu não poderia negar tudo o que aconteceu de bom comigo desde que cheguei naquele país, e encabeçando a lista de pontos positivos, estava Kishan.

Os olhos dourados e sorridentes do tigre negro tomaram conta de meus pensamentos, e sem perceber, eu estava ofegante.

− Eu estou, Matt. Desde o acidente, é a primeira vez que me sinto inteira novamente – respondi com convicção, sentindo os olhares de Nilima e Kadam recaindo sobre mim, mas apenas sorri para os dois.

Então me prometa que não vai sumir de novo, mande notícias. – Ele fez uma pausa, e parecia que alguém falava com ele do outro lado da linha. – E não desista da sua felicidade, fique na Índia.

Aquelas palavras foram tudo o que eu precisava ouvir, limpei as lágrimas e joguei a mochila no chão. Aquela casa era o meu lar agora, e era ali que eu ficaria.

− Eu amo você, Mattie – sussurrei, sabendo que ele abriria um enorme sorriso. – Não sei o que eu faria sem você.

Provavelmente já teria colocado o mundo abaixo – ele disse, fazendo com que mais uma vez eu risse. – Eu também amo você, Mia. Lavander está mandando um “olá” e dizendo que está com saudades. Mas agora eu preciso desligar e ajudar meu pai com o telhado da fazenda.

− Eu sinto saudades de todos vocês. Vá fazer seu trabalho, fazendeiro Matt. – Ouvi a risada alegre de Matt uma última vez, e o celular ficou mudo, sinalizando que a chamada estava encerrada.

Fiquei segurando o aparelho por mais alguns minutos nas mãos, antes de entrega-lo para Kadam com um sorriso de orelha a orelha.

− Muito obrigada, senhor Kadam. – Abracei o velho homem que me tomou em seus braços. – Como conseguiu achar Matt?

− Eu precisei ter certeza que era seguro fazer essa ligação, consegui algumas informações com amigos nos EUA e um celular que não fosse rastreado. – Aquelas palavras confirmaram minha tese de que Kadam sabia alguma coisa sobre o incêndio, e eu queria falar com ele sobre aquilo, mas algo me impulsionava para correr nos braços de Kishan.

− Eu nunca vou conseguir agradecer por isso – sussurrei, afastando-me de Kadam para olhar em seus olhos. – Onde está Kishan?

− É bom saber que a senhorita vai ficar conosco – ele disse alegre, pegando as chaves do Jeep que estavam em cima da bancada, ao lado de uma caneca de café. – Quanto a isso, acho melhor leva-la até ele.

− Não demorem, o almoço ficará pronto em breve – gritou Nilima, com um sorriso iluminado, e antes de seguir Kadam porta a fora, abracei a menina de pele oliva com força.

Pulei no Jeep com euforia, como se eu fosse uma criança pronta para o primeiro dia de aula. O motor do carro roncou e Kadam tomou uma trilha que eu nunca tinha visto, na parte de trás da casa.

Antes de adentrarmos na floresta, meus olhos captaram um movimento, e eu vi o tigre branco misturado entre as árvores, olhando-me de forma enigmática com seus olhos de cobalto. Um rugido alto invadiu meus ouvidos, e eu toquei o vidro gelado ao meu lado quando a imagem de Ren sumiu do meu campo de visão.

Poucos minutos se passaram quando o Jeep adentrou em um enorme campado, o qual me deixou sem ar. No topo de uma colina com uma grama verde reluzente, uma pequena casa de madeira e pedras se destacava.

Flores se prendiam nas paredes, e algumas árvores frutíferas rodeavam a propriedade como um pomar. Olhei questionadora para Kadam, mas ele parecia perdido em memórias. Aquela visão me lembrava de contos de fada, e jurei que Branca de Neve sairia daquela casinha simples.

O Jeep parou ao pé da colina, e Kadam sorriu para mim, apontando para a casa como se me estimulasse a ir até lá.

− Kishan está lá dentro, a porta está aberta, então a senhorita pode entrar – ele disse, antes de destrancar as portas e permitir que eu pulasse para fora do carro.

Quando dei os primeiros passos até a casa, Kadam ligou motor mais uma vez, e seguiu pelo caminho de volta, deixando-me ali sozinha.

− Kishan? − murmurei um tanto ofegante, quando cheguei até a porta do casebre. Tudo ali dentro estava na penumbra, e afastei a porta apenas para encontrar algo parecido com uma sala, sem nenhum aparelho eletrônico, apenas estantes cheias de livros empoeirados e divãs.

Aquela casinha parecia estar fechada por décadas, pois quando esbarrei em uma mesinha, uma nuvem de poeira fez meus olhos arderem. Olhei para onde uma pequena cozinha começava, mas o cômodo também estava vazio.

Um corredor levava até o pé de uma escadaria de madeira. Os corrimãos eram enfeitados, mas a sujeira encobria toda a beleza. Pisei no primeiro degrau vendo que ele não rangia, e prossegui confiante até chegar no segundo andar, que possuía apenas uma pequena porta.

Esta estava entreaberta, e pelo pequeno vão, consegui ver um homem sentado na cama do quarto, vestido de preto. E naquele momento, meu coração quase saiu do peito, pois eu estava vendo Kishan, e ele parecia chorar, com as mãos encobrindo o rosto.

Adentrei, surpresa por ele não ter me percebido com os instintos de tigre. Encostei a porta sem fazer barulho e permaneci parada, vendo aquela cena.

− Kishan? – chamei, fazendo com que o corpo do homem se tencionasse, antes de levantar a cabeça e olhar para mim espantado.

Alivio tomou conta de mim quando meus olhos se prenderam na imensidão dourada, que parecia um tanto inchada.

− Mia? Você está aqui? – ele perguntou, levantando-se com cuidado e vindo em minha direção. Percebi que ele considerava a hipótese de eu ser uma miragem, o que me fez colocar as mãos na cintura e sorrir.

− Eu vou ficar na Índia e é assim que você me recebe? – disse, mordendo o lábio inferior para segurar o riso.

− Você vai ficar? – ele perguntou, com o corpo já muito colado ao meu. Tive que levantar a cabeça para poder continuar olhando em seus olhos, que agora brilhavam da forma como eu amava.

− Percebi que aqui é o meu lar – disse, colocando a mão em seu peito, sentindo seu coração bater forte por baixa da camisa de algodão preta. – Acho que sempre foi.

Soltei um grito no momento seguindo, sentindo braços fortes rodeando minha cintura, me tirando do chão. Lábios carnudos tomaram o meu com amor, e eu envolvi o pescoço de Kishan com os braços, afundando-me em seu beijo. Nossas línguas se misturavam e pareciam se conectar mais uma vez.

Naquele momento não existia nada, nem maldição, nem incêndio, nada. Apenas eu e ele nos unindo.

− Por um momento achei que meus sentidos me enganavam, pois eu senti o seu cheiro maravilhoso – ele disse, separando nossos lábios e afundando o rosto em meu pescoço, deixando um caminho de beijos na pele sensível.

Fechei os olhos e deixei que o prazer tomasse conta de meu corpo, afinal eu estava nos braços do homem que eu amava, nada mais importava. Um gemido escapou de meus lábios quando Kishan beijou meu queixo de forma sedutora, apertando os braços contra mim.

− Eu não poderia deixar meu tigre – disse ofegante, agarrando os dedos nos fios pequenos de sua nuca.

Senti meu corpo sendo depositado em cima de um colchão confortável, e minhas mãos foram diretos para lençóis limpos. Queria questionar Kishan sobre aquele lugar, mas minha mente se desligou no momento em que o príncipe de olhos dourados se postou em cima de mim, antes de apoiar minha cabeça entres os milhares de travesseiros.

− Você prometeu que nunca me deixaria – ele disse, acariciando meu rosto com carinho. Fichei os olhos e deixei-me levar com aquele toque, sentindo meu corpo responder de todas as formas possíveis.

− Eu tive medo – confessei, finalmente abrindo meu coração. – A notícia do incêndio juntamente com tudo o que estamos passando, me fez ficar com medo.

Os lábios de Kishan beijaram minha testa, indo para a ponta de meu nariz e as bochechas, antes de selar nossos lábios mais uma vez. Minhas mãos acariciavam suas costas, e Kishan tocava a lateral de meu corpo com uma mão, enquanto a outra o apoiava contra o colchão.

− Você não precisa ter medo, Mia, eu sempre protegerei você – ele sussurrou, fazendo-me sorrir. Com as pontas dos dedos, acariciei o contorno de seu rosto perfeito, e consegui mais uma vez ver as manchinhas em preto nas suas írises douradas.

Algo em seu olhar fez um sentimento acordar dentro de mim, e meu corpo explodiu em desejo. Agarrei os ombros de Kishan e o puxei para perto de mim, iniciando um beijo quente que foi rapidamente correspondido por ele.

Meu corpo tremia de paixão; fechei os olhos e joguei a cabeça contra os travesseiros, no momento em que Kishan voltou a depositar beijos em meu queixo e pescoço, fazendo-me gemer baixinho.

Minhas mãos voaram para a barra da camisa preta que o príncipe usava, e adentrei meus dedos gelados em sua pele quente, fazendo com que um rugido animal saísse dos lábios do homem em cima de mim.

Naquele momento eu não conseguia distinguir nossos corpos, éramos apenas um e eu não queria que aquele momento acabasse.

O tronco de Kishan se levantou e ele permitiu que eu retirasse sua camisa, ato que eu não demorei muito para fazer.

Seu corpo moreno e forte se arrepiou com o contato de meus dedos, e percebi que ele fechava os olhos, respirando ofegante. Aquela foi uma das imagens mais bonitas que eu já vi, e quis guardá-la em minha mente. O beijo interrompido, rapidamente voltou, cada vez mais cheio de desejo e paixão.

Nossas línguas disputavam o controle, ao mesmo tempo em que minhas unhas arranhavam sua pele firme. Os dedos de Kishan começaram a abrir os botões de minha camisa, e quando o último foi liberado, eu prendi a respiração, observando os olhos de felino de Kishan passando por meu peito nu.

Agradeci mentalmente por estar usando um sutiã preto e rendado.

Os lábios de Kishan tocaram timidamente o vale entre meus seios e eu gemi seu nome. Ele tocou o amuleto que se distinguia em meio a minha pele branca, antes de deixar beijos famintos na pele de minha barriga.

Eu sabia que meu corpo ansiava por o que estava por vir, um sentimento animal tomou conta de mim e eu sabia que permitiria Kishan ter acesso a tudo de mim, entretanto, os beijos cheios de desejo cessaram, sendo substituídos por beijos lentos e carinhosos.

O rosto de Kishan ficou novamente em frente ao meu, e ele sorriu, acariciando meu rosto antes de selar nossos lábios por uma última vez.

Ele deitou-se na cama, e ficou olhando para o teto por breves segundos antes de passar um dos braços por meu corpo, trazendo-me para perto de si de modo protetor. Seus lábios foram até meu ouvido, e ele deixou beijos quentes ali antes de sussurrar.

− Eu amo você, Amélia Campbell.

Continua...


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