Só Que Platônico escrita por Gaby Molina


Capítulo 8
Capítulo 8 - Tarot, casacos e fogueiras


Notas iniciais do capítulo

E AÊ, SEUS PUTO (posso estar assistindo muitos vídeos do Cocielo. Talvez)
Cara. As respostas de vocês no último capítulo foram incríveis. Foram, tipo, muito diferentes umas das outras, achei foda demais. Poucos chegaram na linha de raciocínio que eu tava esperando. Sério, cês são fodas.
Então, como cês tão? Eu tô tomando no cu na escola e indo em shows de ruivos britânicos.
Realmente gostei desse capítulo, espero que vocês gostem também.



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Jared

— Ah, é, e eu sou uma macaca bailarina. Está vendo meu tutu rosa?

— Akio. Isso é sério.

— Tá bom, Dawson.

— Na moral, pode ser que ela goste de mim.

— Pode ser que eu goste de bosta de cavalo também se provar, mas não vou apostar nisso.

— Minha mãe acha que ela pode gostar de mim.

— Cara, ela é sua mãe, mães são obrigadas a falar essas coisas. Além do mais, perguntou à sua mãe?

— Eu não perguntei; ela opinou no jantar.

— Você tem consciência de que tem quase dezoito anos, não tem? Não está um pouco velho para brincar de bem-me-quer-mal-me-quer?

— Falou o virjão que só beijou uma garota na vida, e era a prima dele.

— Dawson, pode falar o que quiser, mas ninguém consegue ser mais virgem que você. Ninguém. Até um moleque de onze anos é menos virgem que você.

— Um dia você vai conhecer a garota e vai entender.

— Cara, se eu quisesse ser melhor amigo de uma pirralha de dez anos fã de boybands, eu seria melhor amigo de uma pirralha de dez anos fã de boybands. Não é para você se comportar como uma.

Não respondi, apenas o observei terminar seu sanduíche de atum.

—... Quer saber? Preciso de alguém que você vai obedecer quando te mandar ficar longe da Monroe — ele me encarou, sério. — Jerry, meu colega, nós vamos na macumba.

Arregalei os olhos.

— Ainda temos mais um período.

— Ah, quem diabos precisa de Linguística?

— Eu, se quiser entender as falas do Romeu.

— Desnecessário. Você tem a mim. Agora vamos.

* * *

Akio era um péssimo motorista — e quando digo péssimo, quero dizer péssimo —, mas não confiava em mim para dirigir até o centro de macumba. Eu já estava achando que era desejo de Deus que morrêssemos antes de chegar quando o japonês filho da puta parou o carro.

Em defesa de Akio, não era realmente um centro de macumba; estava mais para uma casa de tarot ou coisa que o valha.

— Eu sou católico — murmurei.

— Bela merda — ele desligou o carro e destravou as portas. — Vamos escolher umas malditas cartas.

Não sabíamos se deveríamos bater, então Akio decidiu apenas entrar. Passamos por uns penduricalhos que batiam no olho até chegarmos a uma sala que ardeu ainda mais do que os penduricalhos. Minha visão demorou pelo menos quinze segundos para se acostumar parcialmente com ela.

A parede fora coberta por um papel de parede florido meio descascado; havia cortinas verdes que cobriam as janelas, deixando o cômodo à meia-luz.

Eu queria dar o fora dali.

Uma mulher de meia-idade usando um vestido colorido comprido levantou-se.

— Ora, sejam bem-vindos! O que posso fazer por vocês hoje?

— Meu amigo aqui precisa de uns conselhos — Akio me empurrou para frente e eu acabei me sentando numa cadeira que rangia.

— Entendo... — ela me fitou com os olhos verdes contornados com delineador. — Qual o seu nome, querido?

— Você não deveria, tipo, já saber? — ergui uma sobrancelha.

Ela riu.

— Não é assim que funciona. Só vejo as cartas.

— Certo... Érrr... Meu nome é Jared.

— Jared. Nome bíblico. "Declínio", geralmente relacionado a linhagem, descendentes, pois acreditavam que este era um descendente próximo de Adão.

— Ah, eis algo que vocês têm em comum: Adão também se fodeu por causa de uma mulher.

— Cale a boca, Akio — revirei os olhos.

— Calei.

A mulher colocou vinte e duas cartas na mesa entre nós e pediu que eu escolhesse quatro. Não sei se deveria esperar algum tipo de sinal, mas virei-as quase aleatoriamente.

* * *

— Ela disse que você é uma vadia emotiva.

— Ela mencionou que eu tenho uma tendência a superestimar sentimentos.

— Desculpe, por que você repetiu o que acabei de dizer? Isso é rude.

Ignorei a provocação.

— Não acredito que perdi a aula de Linguística por isso.

— Ah, bela merda.

— Já estou afundando em Matemática, você sabe.

— A Senhorita Maravilhosa Perfeita não está te ajudando?

— Bem, sim, mas ela não faz milagres.

— Claro que também tem o fato de que ela te usa como um gigolô quando está carente.

— Você é meio mau às vezes, Akio. Sabe, passando um pouco a linha da sinceridade em direção à crueldade.

— Bem, todos temos nossos defeitos. Alguns ultrapassam a linha da sinceridade, outros são vadias emotivas, e outros são simplesmente vadias.

Parei o carro em frente à casa dele.

—... Dawson, sabe que não estou tentando ser cuzão.

— Beleza, cara, depois a gente se fala.

Akio suspirou e desceu do carro, entrando na própria casa.

Blue

— Já disse que não posso sair hoje — suspirei. — Minha mãe vai às compras com a mãe da Sloan, então ela vai saber que não estou estudando com a Sloan.

Brandon cravou os olhos claros em mim.

— Você não pode... escapar? — ele pôs uma mão em minha cintura, e eu a deixei lá.

— Vou ver o que posso fazer.

— Ótimo — ele sorriu, beijou minha bochecha e se afastou.

Peguei o almoço e fui até a mesa em que Jared, Akio e Sloan estavam sentados.

— Olá — sorri.

Jared e Sloan acenaram; Akio pediu licença e disse que ia ao banheiro.

— Ele não gosta muito de mim, não é? — murmurei, um pouco desconfortável.

— Ele só não te conhece — replicou Jared.

— Ah, e você é um expert em mim? — ergui uma sobrancelha.

— Eu não disse isso — ele recuou um pouco.

Suspirei.

— Não era para soar seco. Eu só... estou tendo uns problemas em casa.

— Que tipo de problemas? — Sloan indagou.

— Nada de mais.

— Bem, eu estou aproveitando o que provavelmente será minha última refeição decente do dia — Jared deu de ombros. — Minha mãe foi visitar uns tios em Fim-Do-Mundolândia.

Foi então que uma ideia brilhante me atingiu.

— Você pode jantar lá em casa, Jerry.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Logo depois de você dizer que está tendo problemas em casa?

— É. Não seria grande coisa. Acho que hoje é noite de yakissoba. Quer vir?

— Claro — ele deu de ombros.

* * *

Foi assim que acabamos na mesa de jantar dos Monroe, eu, pai, mãe, irmã e Jared (numa camisa social).

— Você é fã de comida chinesa, Jared? — indagou minha mãe, abrindo um leve sorriso.

— Não sou um grande entendedor — Jared confessou. — Mas o yakissoba está muito bom, sra. Monroe.

— Por favor, me chame de Simone.

Ele não a chamaria de Simone, mas assentiu mesmo assim.

— Então, garoto, gosta de esportes? — meu pai fitou-o.

— Acompanho um pouco de beisebol.

— Muito bom. Também não compreendo o fanatismo. É doentio. O que pretende fazer da vida?

— Bem — ele se remexeu na cadeira. — Eu gostaria muito de ser o Homem-Aranha, porém me dispensaram sob a alegação de que Jared não é nome de super-herói. Ainda não desisti da carreira de rapper, no entanto.

Fez-se silêncio por um momento.

— Pega leve na ironia — falei. — Seu humor é completamente desperdiçado com os meus pais.

Minha mãe apenas murmurou que eu não podia falar assim dos meus pais, mas logo voltou a encantar-se com Jared. Ele era exatamente o tipo de cara que pais queriam que sua filha namorasse: o tipo que ia falar por horas sobre o quão maravilhosa ela era e ficar com tanto medo de o pai ter uma espingarda que sequer tocaria nela.

— Então... Vocês dois estão namorando? — minha mãe perguntou.

— Não — respondi com calma. — Somos só amigos.

— Hoje eu vi a Blue falando com o B... — Kaya começou a falar.

— Kaya — cortei-a, séria. — O que eu disse para você não fazer hoje à noite?

Kaya recuou.

— Falar.

— Exatamente. E o que você acabou de fazer?

— Falar.

— Exatamente — fuzilei-a. — Eu já acabei de comer. Quer levar meu prato, Kaya?

— Se eu...?

— Que bom — sorri, entregando-lhe meu prato. Voltei-me para Jared. — Jerry. Já acabou também?

— Já, mas posso levar meu prato.

— Ah, Kaya não se importa.

Ele hesitou, mas, um pouco atônito, passou seu prato para Kaya.

Fez-se silêncio por um minuto antes de minha mãe quebrá-lo:

— Você está na peça da escola, não está, Jared?

— Sim, senhora.

— Gosta muito de teatro?

Jared engoliu um riso.

— Eu não colocaria desse jeito.

— E acha essa peça... apropriada?

— Mãe — pedi. — Não faça isso. De novo, não.

— Bem, não sei o que a senhora quer dizer com apropriada... — Jared recuou.

— O que eu quero dizer — o tom dela se firmou, perdendo a gentileza de um segundo atrás. — é se acharia apropriado sua filha agir como uma vadia no palco com um marmanjo passando a mão nela na frente de duzentas pessoas.

— Na verdade, são só um beijo ou dois, não é... — ele tentou ajudar.

— O que minha esposa quer dizer — meu pai interviu. — É que é bom que Blue tenha amigos como você, garoto, porque ultimamente ela tem andado com algumas companhias... questionáveis. E isso pode estar afetando um pouco o juízo dela.

Jared

Blue se encolheu na cadeira como eu nunca vira antes.

— Meu juízo está perfeito — ela murmurou. — Não ajam como se eu não fosse capaz de tomar minhas próprias decisões. Como se precisasse me apoiar em alguém. Em vocês, em Jared ou em quem seja. Eu queria que vocês acreditassem em mim, só isso. Acreditassem que não sou simplesmente uma marionete, apesar de vocês dois claramente me verem assim — ela limpou a boca com o guardanapo e se levantou, batendo a porta dos fundos atrás de si.

A mãe dela revirou os olhos e se voltou para mim:

— O que pretende estudar na faculdade, Jared?

Demorei uns segundos para perceber que ela estava falando comigo.

— Perdão — levantei-me. — Mas eu preciso ir lá. Com licença.

Caminhei pela sala com algo poético na cabeça, como "merdamerdamerda" e fui para o quintal. Blue estava sentada com as costas contra a parede, os joelhos contraídos, o olhar longe dali. Sentei-me ao lado dela.

— Oi — foi tudo o que eu disse.

— Oi — ela sussurrou, quase para si mesma.

Era uma noite serena, sem muitas nuvens, porém com algum vento. Ficamos em silêncio por pelo menos cinco minutos antes que ela dissesse algo. Não me importei. Gostava da companhia dela.

— Eu estou cansada de não ser ideal. De sempre fazer a coisa errada.

Aquele era o único momento de vulnerabilidade que eu testemunhava da parte de Blue desde que a vira sem querer tirando suas lentes de contato azuis há mais de seis meses. Notei que seus olhos estavam marejados, mas fingi que não.

— Você é ótima. E tão talentosa. Se a peça te faz se sentir bem, você não deveria se importar com isso.

— Você não sabe como é. Sua mãe é incrível. Você não sabe como é não receber apoio. Fica um vazio dentro de você, e não tem nada que possa preenchê-lo.

— Eu te apoio — soltei.

Ela puxou minha mão direita para si e a apertou com força.

— Obrigada, Jerry.

Um vento bateu nela e observei-a se encolher.

— Aqui — tirei meu casaco, o mais bonito que eu tinha. — Pega.

— Não precisa, Jerry, sério.

— Tudo bem. Eu não estou com frio.

Ela acreditou em mim, ou fingiu acreditar, porque a verdade é que 90% das vezes que um cara te dá o casaco dele... ele está com frio para caralho. De qualquer forma, ela pôs o meu casaco.

—... Ele fica bem em você — esbocei um sorriso. Ela sorriu também, por cima das lágrimas.

— Desculpe. Eu não queria te arrastar para isso. Eu só... queria que eles entendessem. Não tem nada que você pode fazer. Pode ir, já.

— Não, não vou te deixar aqui assim.

Ela franziu o cenho e me fitou.

— Por que não?

— Bem, porque eu gosto de você. E, acima de tudo, gosto de gostar de você.

Ela me abraçou. Foi um abraço bem longo. Com a cabeça no meu ombro, murmurou:

— E agora?

— Bem. Não me importaria se a gente conversasse, e ficasse de mãos dadas, e se abraçasse.

Ela assentiu e segurou minha mão. O silêncio alastrou-se até eu perguntar:

— Ei. É por isso que usa lentes de contato? Porque não se sente ideal?

Achei que ela fosse ficar brava com a pergunta, mas apenas murmurou:

— Apenas consertando o que a natureza errou.

— Você não precisa disso. Colocando nos termos mais simples, você é linda.

Ela ergueu uma sobrancelha.

— Eu... O quê?

Então disparei a falar.

— Olha, eu não sei por que você é linda. Você simplesmente é. Do mesmo jeito que nos sentimos atraídos por uma fogueira. Tipo, não sabemos por que as chamas são tão atraentes e bonitas e trazem uma sensação tão boa. Elas simplesmente... são. É assim que eu me sinto sobre você. Eu quero estar perto de você. Estar com você. Porque você é a pessoa mais incrível que eu poderia conhecer, e eu não dou a mínima para ninguém além de você, pra ser sincero.

Blue apenas me abraçou, e ali ficamos por algum tempo, com ela me contando sobre seus pais e eu ouvindo atentamente.


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Notas finais do capítulo

Essa parte sobre a fogueira não é de minha autoria, é do Guilherme (http://fanfiction.com.br/u/567177/). Ele não escreveu isso pra fic, ele disse mesmo de verdade. E eu gostei e pedi pra usar. Ele falou que eu não precisava colocar direitos autorais, mas tô colocando mesmo assim porque né, vamos respeitar as sábias palavras dos coleguinhas. Todas as piadas ruins são de minha autoria, no entanto.
P.S.: é, ele é um cara bem foda. Um escritor bem foda também.



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