Passado, Presente e Futuro escrita por Blue Butterfly


Capítulo 10
Presente de Cotidianos


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura



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Naquela manhã, Yukito voltou para sua casa para trocar de roupa e pegar seu trabalho inacabado de química, ele sabia que não tiraria nota máxima com o que tinha feito, mas era melhor do que um zero. Seu rosto estava belamente inchado e todo o corpo doía, mesmo assim ele foi para a escola, chegando a tempo para a segunda aula. Seu lugar estava livre quando ele entrou na sala e ele ficou ao lado de Touya, ignorando os olhares curiosos sobre seu rosto. Sako parecia muito calmo e feliz com o que acontecera e ia deixar Yukito em paz a partir daquele dia. Os avós já estavam em casa e ele não precisaria ir para a casa dos Kinomoto quando as aulas terminassem.

No almoço, os dois meninos fugiram do refeitório e acabaram sentados debaixo de uma enorme árvore, ficava um pouco afastada dos olhares curiosos e parecia um lugar bem calmo. Touya descobriu uma infinidade de alimentos diferentes que Yukito parecia adorar, a maioria de origem inglesa. Era para o moreno ficar triste por pensar na Inglaterra, mas quando viu Yukito comendo e oferecendo um pouco de tudo para ele, ele só sentiu felicidade e zombou de cada alimento estranho que apareceu na enorme lancheira do rapaz menor.

–Vocês comem carne crua de peixe – Yukito revidou quando Touya botou defeito no terceiro prato que ele oferecia – Não tem como ser mais estranho do que isso!

Yukito não tinha problemas em provocar e desafiar o outro garoto porque não se sentia intimidado com ele, como os outros se sentiam, quanto mais ele observava Touya, mais ele via o que o menino era e tirava suas próprias conclusões, e em nenhuma delas o moreno era intimidador. E Touya permitiu que Yukito zombasse dos tradicionais pratos japoneses, elogiasse o futebol brasileiro e ainda revelasse com toda a tranquilidade que sabia quem era o verdadeiro capitão do time do colégio.

–Como você descobriu? – Touya perguntou irritado, ele tinha mandado o time não contar a verdade – Higaka te contou?

–Touya, você também é um péssimo mentiroso – Yukito respondeu rindo.

Kinomoto baixou a cabeça, sem graça.

–Vamos fazer assim? Quando estiver pronto, você me conta suas coisas. Eu posso esperar. Só não minta, está bem?

–Está bem.

Touya percebeu que a proposta era diferente da que ele tinha feito, e gostou disso.

E eles criaram sua segunda rotina.

Todas as manhãs Touya encontraria Yukito pelo caminho, eles conversariam um pouco e Sakura tentaria chamar o máximo de atenção para ela, até que Touya a chamaria de monstrenga e eles se separariam de Tsukishiro, nunca, porém, antes que Sakura ganhasse seu doce e ficasse tão vermelha quanto um tomate. Com o passar dos dias, os meninos passariam mais tempo andando e conversando e se separando cada vez menos.

Durante as aulas, eles ficariam em silêncio, Yukito não teria problema com matemática, mas ficaria horrorizado sempre que o professor de química pedisse o resultado de uma reação, Touya sorriria para física e desistiria da vida quando chegasse a vez de literatura, mas no fim de cada dia, eles ainda estariam vivos.

Eles almoçariam todos os dias debaixo da mesma árvore e Touya começaria trazer diferentes pratos japoneses, até aprender que Yukito comeria qualquer coisa que lhe oferecessem, embora peixe cru só se fosse acompanhado por pêssego. Aliás, ficaria muito claro que Tsukishiro era completamente viciado em pêssego em conserva e fazia as combinações mais absurdas do mundo com isso. Yukito contaria coisas sobre a Inglaterra e falaria de flores – ele ficou muito feliz quando soube o significado do nome de seu amigo.

Quando achou que estava pronto, Touya falaria de Oka-san, foi muito breve, apenas como o sorriso dela era bondoso e que sentia sua falta. Quando achou que deveria compartilhar algo, Yukito revelaria que perder os pais deveria ser doloroso, ele não tinha certeza, pois a ideia de perder os pais não doía, o que doía era ideia de perder alguém que ele amava. Ele perguntou se aquilo era muito estranho e Touya respondeu que não, o que fez Yukito confiar ainda mais nele.

Depois do almoço eles voltariam para a sala e teriam as mesmas aulas, treinariam futebol três vezes na semana e Yukito melhoraria cada vez mais, não tão bom quanto Higaka, mas o suficiente para tranquilizar o time.

Durante esses dias, Sako faltou uma semana sem avisar ninguém, alguns comentaram que ele estava doente, outros que o time de futebol tinha acertado algumas contas pendentes com ele e sua gangue, Yukito não perguntou nada a respeito, mesmo que o sorriso de Higaka e o olhar de Touya gritassem a verdade para ele. Também houve comentários sobre a amizade de Kinomoto e Tsukishiro, um evento inédito que tinha deixado muitos confusos sem saber o que estava acontecendo. Entretanto, Yukito era sempre tão bom com todos que os alunos entraram em um consenso: o jovem sorridente tinha quebrado o coração de gelo do garoto sério.

Quando as aulas ou o treino acabassem, eles voltariam para a casa juntos até que seus caminhos se separassem. Nesses percursos, Touya se surpreenderia ao ver Yukito reagir como uma criança que vê o mundo pela primeira vez como quando descobriu um ninho de passarinho com um ovo em uma das árvores do trajeto, ou o dia em que a chuva os alcançou e Yukito simplesmente parou de andar, olhando com surpresa para o céu.

Eles começaram a estudar juntos. No começo era no almoço, depois no intervalo entre o fim das aulas e o treino, mas quando as primeiras provas chegaram, Touya convidou Yukito para estudar em sua casa e eles fizeram disso um hábito. Algumas vezes eles iriam para a casa de Yukito, principalmente se Sakura estivesse com alguma amiga em casa, e o moreno perceberia com certa indignação que os avós nunca estavam presentes. Numa dessas vezes, Kinomoto perguntou:

–Não fica chateado por eles viajarem tanto?

–Não – Yukito respondeu com sinceridade – Quando tiver a idade deles, espero muito poder viajar pelo mundo assim como eles.

–Para onde você iria? Voltaria para a Inglaterra?

–Não – e seu rosto ficou sério – Eu fui muito feliz e infeliz lá. Não quero voltar.

E Touya entendeu exatamente o que ele queria dizer.

Havia duas Inglaterras para o moreno: uma que tinha levado Kaho e outra que tinha lhe dado Yukito. E com o passar dos dias, a segunda Inglaterra foi se tornando cada vez maior.

Trabalhar juntos foi quase inevitável. Yukito demorou para entender qual era a ideia de trabalhar e Touya precisou de toda a paciência do mundo para entender porque o menino pálido estava tão surpreso por Touya não ter um pote de dinheiro em casa. O primeiro emprego deles foi numa padaria, Tsukishiro se comportou muito bem, não devorando todos os pães como queria fazer – embora quando o expediente terminou ele gastou tudo o que recebeu comprando pães e doces e dando metade de tudo para o moreno.

–Yukito, você não tem que fazer isso…

–Mas eu quero. Aceite, por favor – e seus olhos se tornaram tão doces que Touya não conseguiu negar.

–Está bem. Mas amanhã eu pago seu almoço.

E aquilo também virou rotina, muitas vezes eles gastariam tudo o que recebiam com o outro, fosse com comida, livros, jogos… A ideia é que sempre um compraria algo para os dois e o outro retribuiria, não por obrigação, mas pelo simples prazer de obter um sorriso de Yukito ou um olhar mais terno de Touya.

Quando o torneio de futebol começou, eles treinaram com mais afinco, ficando depois do treino para melhorar o chute de Touya a distância e a defesa de Yukito quando a bola ia para as extremidades. Os primeiros jogos foram fáceis, Higaka assumiria o gol até o meio do segundo tempo quando o goleiro reserva assumiria, isso servia para que ele se acostumasse com a competição sem estragar o resultado final do jogo.

O colégio Seijo avançou com calma pelo torneio, teve alguns empates e muitas vitórias, e a cada partida a chance de ir para a final se tornava mais real. Os olhos escuros do capitão observavam com cuidado os outros times, principalmente o time do colégio Kondu, seus jogadores eram fortes, ele venceu todas as partidas com uma grande diferença de pontos, seu segredo estava em dois atacantes, alunos de intercâmbio vindos da Inglaterra – Brad e Darwin – que faziam maravilhas com a bola.

–Você está preocupado – Yukito afirmou sentando ao lado de Touya quando o treino dos dois terminou.

–É o torneio. Acha que vamos ganhar do Kondu?

–Temos chance – Yukito garantiu com um sorriso esperançoso – Higaka está treinando muito para defender o gol da melhor maneira possível, Kondu não tem uma defesa forte, sua força está no ataque, se Higaka e os outros cuidarem do gol e você marcar os pontos, podemos ganhar.

O olhar de Touya ficou enternecido.

–Você bota muita fé em mim – ele falou como se aquilo não significasse grande coisa.

–Não. O time inteiro bota fé em você – Yukito corrigiu com respeito – Se você disser que vamos ganhar, nós vamos acreditar que é possível.

–É melhor o Higaka estar pronto então – Touya ficou de pé, estendendo a mão para o outro rapaz e o ajudando a levantar – Porque nós vamos acabar com o colégio Kondu.

#####

Touya arquejou sentindo as pernas arderem, ele olhou com desolação para seus oponentes, sem ter certeza de como levar o jogo adiante. Chegar na final tinha sido fácil comparado com o que estava acontecendo naquela partida. Eles estavam com uma vantagem de três gols a dois, o time do colégio Seijo começou bem, marcando três gols logo no primeiro tempo, Brad e Darwin não estavam se esforçando muito, pareciam cautelosos e deram espaço para que o time adversário marcasse, mas no fim do primeiro tempo eles resolveram atacar e em pouco tempo fizeram dois pontos.

E agora eles avançavam para o terceiro ponto. Higaka estava cansado, olhando com assombro o jogo aéreo que os rapazes faziam, a bola passava de um atacante para o outro em pleno ar, sem tocar o chão em nenhum momento. Era a primeira vez que Higaka via um jogo daqueles e ele não estava tendo sorte em defender o gol.

A bola veio, Higaka pulou para tentar agarrá-la quando cometeu um erro terrível e foi atingido no rosto pela bola, o impacto foi tão grade que o laçou para trás, fazendo com que ele batesse a cabeça na trave, a bola entrou no gol, marcando mais um ponto para o time adversário. Ele caiu no chão e não se levantou.

–Higaka – Touya gritou.

O goleiro não se moveu. O juiz apitou duas vezes, dando por encerrado o segundo tempo enquanto os jogadores dos dois times corriam para o goleiro inconsciente. Um pequeno grupo ficou ao lado dos dois atacantes, protegendo-os de qualquer revolta que o time adversário pudesse demonstrar. Paramédicos levaram o rapaz para a enfermaria sob o olhar atento dos outros jogadores e gritos da torcida, Yukito estremeceu quando o rapaz passou por ele, olhos fechados e boca meio aberta.

–Yukito.

Ele encarou Touya, viu o desespero no rosto de seu capitão e suspirou.

–Eu farei o meu melhor. Não sou tão bom quanto Higaka, mas vou proteger aquele gol. Eu prometo.

O garoto pálido ficou de pé, retirando a camiseta de reserva que usava sobre o uniforme oficial. Touya estremeceu, ele não sabia o que dizer ao outro rapaz, mas certamente não era nada parecido com o que Yukito tinha suposto. Ele queria vencer, é claro, mas depois de ver o estado com que Higaka tinha saído do campo, ele ficou na dúvida se a vitória seria assim tão importante a ponto de valer a pena seus dois goleiros saírem machucados. A ponto de Yukito sair ferido.

–Yukito – ele chamou de novo quando garoto se afastava para o gol.

–Sim – e olhou para o capitão.

–Tome cuidado. Por favor.

Yukito concordou com um aceno e foi para o seu lugar. Estava na hora dele ser o guardião do time.

No segundo tempo, Touya fez mais um gol, dando uma leve vantagem de um gol, o trabalho do time era fazer a maior marcação possível nos dois atacantes e proteger o gol, a defesa estava cansada, com exceção de Yukito, todos os jogadores estavam no campo há muito tempo e já sentiam as pernas tremerem e o cansaço chegar. A estratégia funcionou bem até a metade do segundo tempo, pois num deslize os dois atacantes conseguiram vencer a marcação e tomar posse da bola, iniciando seu jogo aéreo.

O capitão sentiu o sangue gelar ao ver o primeiro chute em direção ao gol ser dado, por um breve instante a imagem de Higaka voltou a sua mente, só que ao invés do goleiro alto e grande quem estava maca era um rapaz pequeno de cabelo claro, pele de gelo e um sorriso perpétuo, mesmo quando dormia. Ele não podia aceitar aquela visão, ele disparou pelo campo, não tinha noção do que faria, mas não deixaria mais um goleiro seu ser machucado.

Yukito respirou fundo, sentindo os músculos se contraírem dolorosamente enquanto um surto de adrenalina corria em suas veias. Ele viu seus colegas correndo numa tentativa de interceptar a bola, e viu todos fracassarem por não conseguir altura suficiente, quando o último chute foi dado, Yukito cravou os pés no chão para aumentar sua estabilidade e se preparou para o impacto. Ele só não estava preparado para o que aconteceu depois.

O capitão ficou entre o goleiro e a bola, recebendo o impacto do objeto em seu ombro esquerdo e caindo para trás. Quando a bola tocou em seu corpo seu ombro foi estranhamente deslocado e ele perdeu a respiração por causa da dor, entretanto a bola continuava pressionando seu ombro e jogando seu corpo para trás, de modo que se ele caísse no chão, seu ombro ficaria num estado bem pior.

Foi quando duas mãos o ampararam, segurando fortemente em suas costas para mantê-lo no lugar. A bola acabou subindo pelo ombro de Kinomoto, bateu em seu rosto e entrou no gol, marcando o quarto gol e empatando o placar. Quando se viu livre do objeto, o corpo do capitão caiu para frente e novamente foi sustentado, dessa vez num estranho abraço que o goleiro deu. Tudo aconteceu em segundos, num minuto só havia Yukito se preparando para o chute, no outro Touya era sustentado pelo goleiro enquanto seu ombro estava visivelmente machucado.

–Parem o jogo – Yukito berrou enquanto segurava Touya com cuidado.

–Yukito…

A voz de Touya saiu sufocada, o ombro estava doendo mais do que ele conseguia esconder. Tanto que quando os paramédicos finalmente chegaram, ele não insistiu muito para voltar a jogar, principalmente depois que o goleiro mandou:

–Cale a boca e vá para a enfermaria.

Yukito sempre tinha provocado e até mesmo tentado irritá-lo, mas jamais tinha dito algo semelhante, havia um respeito em cada uma de suas palavras, principalmente no campo, o menino nunca tinha deixado a amizade atrapalhar a relação de capitão e goleiro reserva, aceitava todas as ordens sem questioná-las, assim como resto do time, e mesmo se não concordasse, ficava quieto porque Touya era o capitão e ele lhe devia respeito. Entretanto, naquele momento não era a preocupação de um jogador, mas sim de um amigo, e isso Touya não podia ignorar, mesmo sabendo que assim que chegasse na enfermaria e a dor diminuísse um pouco, ele voltaria para pelo menos assistir o fim do jogo.

–Tome cuidado – Touya grunhiu mal-humorado.

Ele concordou e voltou para o campo só depois que Touya desapareceu. O time aproveitou o momento para trocar alguns jogadores, a maioria dos que saiu estava cansada e um pouco machucada. No time adversário várias substituições também foram feitas, o jogo não estava fácil para nenhum dos times e a exaustão estava cada vez mais perto. Quando o apito tocou de novo e a bola voltou ao campo, o goleiro repirou fundo, decidido a guardar aquele gol como a própria vida.

Na enfermaria, Touya encontrou Higaka e a namorada em um canto enquanto ela segurava delicadamente uma bolsa de água fria em sua cabeça e mantinha uma conversa boba com ele para que o menino não adormecesse. Ela ficou um pouco sem graça quando Touya entrou, mesmo assim continuou a conversar com o namorado. Uma enfermeira tentou ajudar o capitão a deitar, mas assim que se viu sem a maca e com o equilíbrio bom o suficiente para voltar a andar, ele escapuliu da enfermaria e voltou para o campo. Com um sorriso bobo, Higaka riu achando engraçada a fuga do rapaz e também o seguiu, ignorando os protestos da namorada e da enfermeira. Touya parou perto do campo, muitos jogadores olharam para ele em dúvida se sua presença era bem vinda ali ou não, mas como a regra era nunca desobedecer o garoto, eles o deixaram lá. O jogo continuou intenso, sem nenhum time progredindo, até que houve uma falta faltando pouco para a partida acabar e o jogo parou.

Yukito moveu sua cabeça, podia ouvir os gritos dos alunos na arquibancada, o movimento ritmado das líderes de torcida, olhou para o campo e viu os jogadores de seu time andar lentamente, todos esgotados, cansados demais para correr, para continuar aquele jogo. Alguns reservas ainda estavam assistindo, Higaka estava lá também, sentando em uma cadeira enquanto uma menina parecia cuidar dele, se Yukito não estivesse muito enganado, se tratava da namorada do goleiro. Touya estava de pé, olhando o campo, seu braço direito levemente flexionado, certamente sentindo muita dor. O olhar do goleiro encontrou o do capitão e eles congelaram, Tsukishiro queria tanto conversar com o moreno, perguntar o que ele deveria fazer, o que o time deveria fazer naqueles últimos 5 minutos, se ele devia desistir, se devia permanecer firme e ir até o desempate, mesmo sabendo que seus colegas de time não teriam forças para prosseguir muito além, ou se deveria fazer alguma coisa, qualquer coisa, para ganhar o jogo.

Kinomoto olhava seu goleiro, ele estava com o rosto vermelho, sujo de terra por todas as partes do corpo, cansado, visivelmente estressado. Aquele tinha sido um jogo brutal, ele, Higaka e tantos outros tinham se ferido. O time adversário era muito bom, muito forte, tinham um chute extremamente violento, o ombro dele estava lá para provar. Seu goleiro estava perdido, era impossível não sofrer a influência do resto do time e ficar desanimado. Eles iam perder, mesmo que o goleiro conseguisse defender o gol pelos próximos 5 minutos, no desempate eles perderiam, nenhum atacante estava bem o bastante para marcar um gol e o goleiro oficial do time rival estava muito descansado, sentado no outro lado do campo numa cadeira enquanto tomava um suco. Yukito ainda olhava para ele, uma pergunta silenciosa pairando em seus olhos, ele queria orientação, queria saber o que fazer. Touya balançou a cabeça, deixando que o menino escolhesse por si mesmo o que era melhor para o time, o capitão sabia que seu goleiro tinha feito o possível até ali, não podia pedir mais nada dele.

Yukito quebrou o olhar que mantinha com o outro rapaz, encarando Higaka. Touya e Higaka tinham se machucado tentando proteger aquele gol, tentando levar o time a vitória. Ele não poderia fazer menos que isso.

Há aquela jogada aérea

Por instinto, ele sabia que o último gol seria feito com aquela jogada. Ele estava pensando nela desde a primeira vez que a viu. Não era apenas chutes consecutivos, os primeiros eram chutes de força, para dar velocidade para a bola, o último chute era para direcionar a bola, até ele ser dado, a bola vinha em linha reta, sendo extremamente fácil prever a direção que o objeto teria.

O juiz apitou, reiniciando a partida.

Se ele conseguisse roubar a bola antes que o último chute fosse dado ele protegeria momentaneamente o time e seu gol, só não resolveria o placar empatado.

Brad tomou posse da bola e Darwin começou a correr para o ataque.

Não bastava roubar a bola, teria que passar para algum atacante do seu time.

Brad deu o primeiro chute, pulando no ar.

Ele tinha que ser rápido, faltava apenas 4 minutos.

Darwin deu o segundo chute.

Brad tinha força, mas era Darwin quem dera a direção nos dois chutes. Ele fez a conta quase que de imediato, a distância deles até o gol, o quão rápido ele podia correr, a força de um chute esquerdo… Higaka sempre elogiara seu chute de esquerda.

Darwin deu o segundo chute.

Faltavam 3 minutos e meio.

O goleiro deu um último olhar para o seu lado da torcida, viu seu capitão ainda olhando para ele, esperando para ver sua reação, preocupado com a hipótese dele se machucar com o chute. Respirando fundo, ele viu Brad pular e se preparar para o chute.

3 minutos para o fim da partida.

Yukito correu. Correu muito. Correu até não conseguir ver o que estava ao seu redor, a única coisa que chamava sua atenção era a bola que Brad lançava com toda a força do mundo, vindo reta para que Darwin completasse a jogada. O goleiro passou pelo atacante como um raio cruzando um céu de chuva, quando Darwin percebeu o que estava acontecendo Yukito já estava no ar, num pulo gracioso seu corpo se tornou mais leve que uma pluma e ele se pôs no caminho entre a bola e o atacante rival.

Vai doer”. Ele não duvidou nem por um segundo, mesmo assim jogou a perna esquerda para trás, movimentando-a com rapidez para frente e atingindo com toda a força que conseguiu reunir a bola de futebol. Assim que seu pé bateu na esfera, ele ouviu o estranho som de ossos sendo quebrados e uma dor aguda atingiu seu tornozelo, sem graciosidade e com muita dor ele caiu do céu, colocando o joelho direito e as duas mãos para servir de apoio em sua queda. Ele veio ao chão com um estrondo, as duas torcidas estava em silêncio, nenhum jogador se movia, tudo parecia ter sido congelado com o gesto inesperado do goleiro. Yukito olhou para frente, algumas lágrimas brotavam de seus olhos por causa da dor, só que naquele momento ele tinha que ignorá-la, precisava ter certeza se tinha ajudado o time ou apenas retardado a derrota. Junto com a torcida, ele viu a bola cruzar três quartos do campo como se fosse um pequeno míssil, completamente disforme, viu o goleiro adversário retardar sua resposta, pego de surpresa com o chute, e viu quando ele começou a erguer as mãos. As duas torcidas ficaram de pé, junto com os atletas que estavam no banco.

A bola roçou de leve os dedos do goleiro, quase se aninhado em suas mãos, porém no último instante pareceu preferir a liberdade da rede à proteção que as mãos do jogador apresentava e com toda a graça, tocou de leve a rede adversária.

Houve silêncio por meio minuto. Até que um juiz apitou uma vez e outro apitou duas. O jogo tinha acabado. O colégio Seijo vencera!

–Esse é o meu garoto!

O grito de Higaka pareceu quebrar o encanto do silêncio e a torcida começou sua confusão, gritos de vitória, assobios, aplausos, garotas histéricas declarando amor eterno aos jogadores, muitas delas jurando que Touya era a pessoa mais importante de seus mundos e outras tantas praticamente invadindo o campo para chegar até Tsukishiro. Mas longe de prestar atenção a tamanha demonstração de afeto, o capitão continuava no mesmo lugar, olhando para seu goleiro caído, uma multidão de jogadores avançara para o menino, além de uma enfermeira, no silêncio de sua brava tentativa de vitória, todos puderam ouvir o estranho som que a bola fez ao tocar seu pé. Um espaço se abriu no meio das pessoas e finalmente o rosto do goleiro apareceu, ele ainda estava no chão e parecia que não ia se levantar dele sozinho tão cedo. E o goleiro estava olhando diretamente para seu capitão. E o capitão sentiu vontade de correr até ele. E o goleiro pela primeira vez estava sério, apenas esperando uma aprovação. E o capitão fez algo que há anos ele não fazia: ele sorriu. Era o menor dos sorrisos, mas estava lá trazendo calma, doçura e ternura ao seu olhar normalmente frio. Touya assentiu para o garoto menor e Yukito sorriu de volta. Era a primeira vez que Touya via aquele sorriso, não que Yukito não vivesse sorrindo para tudo e para todos, só que seu sorriso habitual era apenas isso: um hábito, não indicava que ele estava feliz ou se divertindo, apenas que ele sorria para o mundo. Daquela vez era diferente, seu sorriso estava estampado em seus olhos, sua alegria atravessava o campo e atingia o capitão. Ele estava verdadeiramente feliz.

E ali, enquanto seu ombro doía e os gritos da torcida o deixavam surdo, ele jurou a si mesmo que faria tudo o que pudesse para ver aquele sorriso de novo.

–Onii-chan!!! Onii-chan!!!

Touya desfez seu pequeno sorriso e olhou para trás, Sakura pulava pelas arquibancadas, em total desespero para chamar a atenção de seu irmão.

–O que é, monstrenga? – ele provocou se aproximando da irmã.

Ergueu a mão boa e tocou na grade que separava o campo dos torcedores. Sakura ignorou a provocação e respondeu, o orgulho em cada palavra:

–Onii-chan, você foi maravilhoso!

Ele sorriu para a irmã, não era o mesmo sorriso que tinha dado poucos segundos atrás, era um sorriso mais moderado, um leve erguer de lábios acompanhado por um olhar paternal.

–Obrigado, Sakura. Vou ajudar o Yukito, está bem? – ele disse meio sem jeito.

–Está bem. Eu e Oto-san vamos esperar lá fora por vocês.

–Como assim por vocês? – Touya perguntou, sem entender quem mais estava na lista daquela noite.

–Yukito-kun também – e ela abriu um sorriso gigantesco, mostrando todas as suas presas de monstro – Eu preparei um bolo de chocolate gigante para Yukito-kun.

E com essas palavras ela voltou a saltitar entre a multidão. Ignorando plenamente os gritos de uma garota, o capitão se arriscou entre os jogadores, até chegar ao seu goleiro. Sem uma palavra, ele estendeu a mão boa para o rapaz, que a pegou sem hesitar, ele o ergueu do chão com facilidade, era incrível como mesmo depois de comer tudo o que ele comia ele continuasse leve.

–Precisa ir para a enfermaria – Touya disse no seu tom de ordem.

–Como quiser, capitão – Yukito respondeu dando uma risadinha de diversão.

Touya respondeu com um rápido sorriso antes que outros jogadores viessem ajudar Yukito também.


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Notas finais do capítulo

Bem, só para esclarecer...
—Touya significa flor de pessegueiro
—Provavelmente o Yukito da Clamp não tem problemas com peixe cru,mas o meu não gosta muito ^^
Comentem e me façam feliz ^^



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