O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 58
Capítulo Cinquenta e Oito




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Cinquenta e Oito

Oito dias depois, Artemis estava se despedindo de seu pai no aeroporto. Não poderia passar das cinco da tarde – não quando o voo de Sebastian era às quatro e meia – , mas o céu nublado parecia querer anoitecer de tantas nuvens. Chuva forte viria, e tudo o que isso significava para Artemis era uma noite no observatório; a cidade escura, Apolo molhado de chuva, eu acho que estou me apaixonando por você.

– Vai ficar bem, não vai? – Sebastian perguntou, interrompendo aquela lembrança amarga de tão doce. Era dos Guns ‘n’ Roses a camiseta, não era? – Você parece abatida.

Artemis balançou a cabeça, conseguindo abrir um sorriso.

– Não queria que fosse embora tão cedo.

Sequer saberia dizer se aquilo era uma mentira. Havia perdido noites imaginando possíveis encontros entre seu pai e Apolo, perguntando-se se David deixaria escapar alguma indireta maliciosa, esperando em agonia que Gabriel cometesse um deslize e colocasse tudo a perder... mas não.

Sebastian ficara por duas semanas em Boston, e precisaria de poderes supernaturais para descobrir alguma coisa entre os dois. O anticlímax desapontava qualquer coisa em Artemis, ocupando o lugar que deveria ser da sensação de serviço bem-feito.

– Cedo? – E pensar que você gostaria dele, pai... – Sinto como se conhecesse todos os seus amigos e professores há anos – e Sebastian riu, tão facilmente quanto Apolo, com aquela naturalidade carismática que ganhava fãs aos dois. – Gabriel, principalmente.

Artemis rompeu seu nevoeiro de desconforto para revirar os olhos.

– Eu sei, ele é um caso perdido. – Se pôs a observar o piso cinzento do aeroporto, incapaz de olhar para o homem que só lhe parecia agora com uma versão mais velha do seu namorado. Eu amo você.

– Artemis? – Sebastian apoiou a mão em seu ombro, abaixando-se um pouco para que pudesse olhá-la diretamente nos olhos. Agora as semelhanças com Apolo eram menores, e Artemis até pôde soltar o ar, devagar. – Você não está me contando alguma coisa. O que aconteceu?

Tudo. Do acho que estou me apaixonando por você ao eu te amo, tudo, tudo, tudo. Mais um pouco e talvez Artemis pudesse chorar, mas já havia chorado tanto naquela noite... Balançou a cabeça e abriu um sorriso pequeno, odiando-se ainda mais por mentir tanto assim, ainda mais sobre aquilo.

– Nunca passei tanto tempo longe de você desde a morte da mamãe – disse, a voz baixa.

A expressão de Sebastian se suavizou, e ele afagou seu ombro, incapaz de ver o pesar nos olhos de Artemis.

– Estarei de volta em dezembro. E eu te ligo sempre, não ligo?

– Claro, eu só... me sinto um pouco sozinha – Artemis mentiu de novo, desapontada consigo mesma.

– Sozinha? – Sebastian sorriu, educado demais para dizer qualquer coisa em voz alta. Artemis era esperta o bastante, contudo, e logo se mostrou o mais preocupada possível. (Mentiras, quantas mentiras...)

– Não vai levar a sério nada do que Andrew disse, vai?

Sebastian balançou a cabeça, com aquele sorriso complacente dos pais.

– São os genes da sua mãe – lhe disse, saudoso.

Parecia difícil de acreditar que Sebastian fosse o tipo enlutado de homem, mas, desde o falecimento de Elizabeth, Artemis não sabia de romance algum em que ele houvesse se envolvido. Inclinou a cabeça para o lado, tomando coragem para perguntar algo que queria saber há tempos.

– Ainda sente falta dela?

A pergunta pareceria boba para qualquer outra pessoa, mas Artemis tinha seus motivos. Nunca havia sido sincera com ninguém acerca da morte de sua mãe; suas lembranças eram tão confusas que não poderiam ser reais. Todos lembravam-se de Elizabeth O’Farrell como uma atriz virtuosa, de excelente humor e de um encanto sem igual, então por que ela seria diferente? Além do mais, fora apenas uma criança na época... quanto do que se lembrava não passaria de fruto da sua imaginação?

– Não – Sebastian disse, suavemente. Artemis levantou as sobrancelhas, surpresa, mas seu pai tinha um sorriso cheio de saudade nos lábios. – Eu tenho você, não tenho? – perguntou ele, acariciando seu rosto.

Então, talvez, Artemis não fosse a única com bons mecanismos de defesa. Abraçou seu pai por impulso, escondendo o rosto na curva do seu pescoço – porque os gritos de sua mãe eram altos demais em sua cabeça, o sangue muito vermelho e, quando com Apolo, aquele gesto de carinho sempre funcionava para afastá-la do mundo.

{...}

– Seu pai já foi embora?

Gabriel estava deitado de costas em sua cama, Moony sobre sua barriga. O garoto estivera apoiando o gato sobre as patinhas traseiras para, segurando o que chamava de “mãozinhas”, guiá-lo em um espetáculo de dança ao som de Safety Dance, até que Artemis havia o mandado parar com aquilo. Então, no momento, Moony ronronava em seu colo enquanto Gabriel coçava atrás de suas orelhas.

Parecia mais seguro, de toda forma.

– Essa tarde – respondeu, abraçando os próprios joelhos. – Por quê?

– Vou sentir saudade – Gabriel suspirou.

– Você nem passou tanto tempo assim com ele – Artemis contrapôs, incomodada. – Só o bastante para traumatizá-lo.

– Só não tivemos um caso porque ele é seu pai.

– ... dentre outros cento e quarenta e nove motivos – Artemis completou, com um suspiro. A chuva forte batia contra o vidro, como se para não deixar as lembranças de Apolo irem embora de forma alguma. – Notícias do David?

O olhar de Gabriel se perdeu por um tempo no pelo de Moony, até que ele encolheu os ombros (tanto quanto se podia encolher os ombros estando deitado).

– Não falou mais comigo desde aquele dia, mas eu o vejo por aí de vez em quando. – Hesitou. – Pedi a Apolo o número dele na semana passada – confessou. – Eu tinha apagado depois daquilo, mas achei que talvez... – a frase morreu ali, e Artemis levantou as sobrancelhas.

– Gabriel – disse, lentamente. – Não acredito que vai perdoá-lo.

Mas o garoto balançou a cabeça, erguendo os olhos para observar o teto.

– Não fiquei bravo com ele. Chateado, magoado, deprimido, arrasado... – voltou a olhar para Artemis, como se esperasse que ela achasse aquilo engraçado, mas a expressão da garota o fez voltar-se para o teto de novo. – Eu só pensei direito sobre o que aconteceu – disse, defensivamente. – De acordo com a minha vasta experiência, pessoas bêbadas dizem a verdade. Ele só falou tudo aquilo quando, de ressaca, caiu em si e percebeu que seria eticamente errado ter qualquer coisa comigo.

Artemis o encarou longamente. Não estava bem, não depois daquele eu amo você, daquela semana horrível sem Apolo e cheia de lembranças dele, da despedida de seu pai... queria pedir a Gabriel para que tivesse um pouco de orgulho, lembrá-lo do quão cruel David havia sido e lhe perguntar como havia levado tanto tempo para chegar àquela conclusão tão simples, mas não tinha ânimo algum para isso. Acabou suspirando, levando a mão aos cachos castanhos do garoto.

– Ele jamais teria o direito de dizer tudo aquilo – disse, segura. – Não que você não mereça uma repreensão de vez em quando, mas não daquele jeito.

– Você nem ouviu o que ele disse – Gabriel observou. – Está tomando minhas dores assim porque me ama demais, não é? – decidiu, com um sorriso irritante, para o qual Artemis revirou os olhos. – Se o Moony não estivesse dormindo, juro que me levantava para um abraço.

– Não quero abraçar você – Artemis recolheu a própria mão com uma careta, fazendo o garoto rir. – E também não sei se David realmente se importa com o que é eticamente correto ou não.

– Mais um item para a lista de coisas que temos em comum – Gabriel decidiu.

Artemis revirou os olhos.

– Você não pode ter uma lista de um item só.

– Ei! – Gabriel exclamou, indignado. Artemis o encarou, contudo, e ele encolheu-se um pouco. – Tudo bem, talvez seja um post-it, e não uma lista. Mas tanto faz, chega da minha vida amorosa. Conte-me da sua, você tem parecido meio para baixo há um tempo.

À despeito do tom coloquial do garoto, Artemis sentiu a própria expressão desmoronar um pouco, e desviou o olhar para o edredom claro que cobria sua cama.

Se dissesse a Gabriel que Apolo havia dito que a amava, podia até ver o escândalo que ele faria, antes de não compreender por que Artemis havia pedido para ficar sozinha, e não era como se ela pudesse explicar, ou até mesmo colocar em palavras. Mas ficar em silêncio também não era uma resposta, era? Não quando ele havia confiado nela ao lhe contar sobre a ligação para David, semanas atrás.

Suspirou, dando-se por vencida.

– Eu e Apolo não estamos muito bem. Não sei como ele está – corrigiu-se, o peso de uma semana inteira sem vê-lo a atingindo. – Mas me surpreenderia se estivesse bem – acrescentou, baixinho.

– O que aconteceu? – Gabriel perguntou, parando de acariciar Moony, aqueles olhos castanhos enormes voltados diretamente para ela.

Como contar aquilo?

– Nada.

(Não é nada, havia dito, quando tudo o que queria era lhe contar tudo e implorar para que fosse embora.)

– E por que é que “nada” está te deixando assim? – Gabriel perguntou, mas com cautela. – Foi naquela sexta?

Artemis sabia que, se confirmasse, o garoto iria, devagarzinho, conseguir todos os detalhes. Balançou a cabeça, recostando-se melhor na cama e voltando a abraçar os joelhos.

– Podemos não falar sobre isso?

– Claro – Gabriel disse, mais facilmente do que Artemis poderia ter imaginado, fazendo a garota até arregalar os olhos, surpresa. – Você quer chocolate quente?

É claro.

– Você não vai usar açúcar e gentileza para arrancar essa história de mim – Artemis avisou, estreitando os olhos.

– Droga – Gabriel declarou, com honesto desapontamento. Tirou, contudo, Moony do próprio colo, o pondo em cima dos pés de Artemis com cuidado. – Eu quero um – explicou, levantando-se da cama. – Açúcar é o segredo do meu sucesso. – Limpou de sua camiseta do Clark Gable os pelos cinzentos soltos. – Você tem algum problema com canela?

– Não quero um.

– E chantilly? A Bella acha que engorda, mas é bobagem.

– Não quero um chocolate quente – Artemis deixou claro, espaçando bem as palavras.

Gabriel encolheu os ombros, dirigindo-se à saída.

– Sem chantilly, então.

Mais alguns segundos e a porta estava fechada. Artemis nem se deu ao trabalho de deitar a cabeça para trás e revirar os olhos para a irritação bípede que era Gabriel; observou aquele quarto imenso e se sentiu terrivelmente sozinha. (A chuva caía de forma devastadora do lado de fora, e ela daria tudo pela camiseta de Apolo.)

{...}


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Notas finais do capítulo

E lá se vai Sebastian... eu sei, eu sei, estávamos todos o adorando, mas seu papel aqui era coadjuvante. Ainda mais quando temos Appirtie em crise, e Daviel na agonizante lista de espera de Afrodite. O que estão achando, meus amores? Só para que não reclamem, o próximo capítulo é pelo ponto de vista do Apolo, e esse é o maior spoiler que alguma vez já arrancaram de mim u-u
E, olhem, reza a lenda que cada review escrito é um urso polar salvo do Aquecimento Global. Não custa nada, né? Eles são tão peludos e fofos.
Beijinhos da Maeve.