O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 31
Capítulo Trinta e Um




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Trinta e Um

Artemis poderia franzir o nariz o quanto quisesse, mas Apolo venderia sua alma por um bom expresso da Starbucks naquele momento. Pelo visto, os cozinheiros da Academia preferiam fazer canapés de atum a investir em uma boa cafeteira, em um óbvio sinal de inversão de valores.

– Foi para cama com alguém ontem?

Apolo ergueu os olhos, reunindo de antemão toda a tolerância que possuía. Gabriel estava se fazendo confortável na cadeira à sua frente, desembrulhando um cupcake de maçã.

– Oi para você também. É assim que vai começar uma conversa? – perguntou, tentando beber mais daquela água suja, mas fazendo uma careta logo depois. Ew.

– Não fuja da minha pergunta – o garoto ordenou, para logo depois abrir um meio sorriso solidário. – E, é, o café daqui é uma droga. Os chás até são bons, se você não ligar de beber mato fervido em água. Agora, me responda.

– Por que está me perguntando isso?

– “Vá para o seu quarto, Gabriel” – o garoto disse, em uma voz afetada, erguendo uma mão no ar. – “Eu não quero falar sobre isso”, “vou arremessar esse travesseiro em você!” E, sim, ela arremessou – acrescentou, com cara de sofrimento.

– Ela quem? – Apolo perguntou, confuso. – Artemis?

– Quem mais? – Gabriel deu uma mordida grande demais em seu bolinho. – A vadia não quis me contar nada da noite de ontem, o que, é claro, só me fez chegar à conclusão óbvia.

Apolo juntou o histórico pervertido de Gabriel com a primeira pergunta, e suspirou.

– Não está realmente achando que transamos ontem à noite, está?

Gabriel pareceu ofendido.

– Claro que estou. Por que mais ela se recusaria a me contar tudo?

– E ela geralmente te conta as coisas? – Apolo perguntou, imaginando Gabriel e Artemis sentados na cama em uma festa do pijama, fofocando abraçados a travesseiros. (Tentou não imaginar Artemis falando dele, e falhou.) – Achei que ela não te suportasse.

– Artemis me adora – Gabriel o informou. – Sei de tudo do primeiro encontro de vocês, e já estou até pensando em um nome para o casal. É difícil porque vocês têm nomes esquisitos, mas Appy-Artie é o meu preferido até agora. Pode ser abreviado para AA – acrescentou. – Ou Appirtie.

– Appirtie. – Apolo repetiu, porque, honestamente. Appirtie. O que ele poderia responder àquilo?

– E é bom porque é, tipo, um nome meio que unissex para gente também – Gabriel contou, empolgado. – Eu já pedi o segundo filho de vocês para a Artemis, e vou totalmente chama-lo de Appirtie.

Apolo se viu rindo antes que pudesse evitar, se bem que parte do riso fosse de desespero. Gabriel havia aberto um sorriso e estava prestes a dizer alguma outra coisa quando algo atrás do loiro chamou sua atenção, o deixando de lábios entreabertos e olhar focado. Apolo se virou, vendo que David havia se aproximado.

– Walden, você tem aula no primeiro período – foi o que o professor disse, à guisa de bom-dia, sentando-se à mesa. – Está estragando meu café da manhã.

– Eu poderia ser o seu café da manhã se você já não tivesse chutado a minha bunda quatro vezes – Gabriel replicou, antes de lamber a cobertura do cupcake.

– Cinco – David o corrigiu, desdobrando seu jornal.

Gabriel fez um biquinho que, por trás do jornal, David não conseguiu ver. Apolo quis que Artemis estivesse ali para ver o que ele aguentava por ela, e então acabou suspirando, voltando-se para Gabriel de novo.

– Para encerrar o assunto, eu não transei com ninguém ontem. E não tem nada de estranho em Artemis não querer falar sobre o nosso encontro com você.

– Oh, então foi um encontro? – Os olhos de Gabriel brilharam com interesse. – Minha pequena Artie ainda está em negação.

Foi quando Apolo se lembrou, sentindo um gosto amargo na boca. Ninguém precisa saber.

– Não, não realmente – forçou um sorriso. – É só para irritá-la – disse, em tom de explicação.

– Ah – Gabriel fez, parecendo decepcionado. – Bom, eu não ligaria se você saísse por aí espalhando que saiu comigo. Embora eu preferisse sair com você de verdade.

– Imagino. Artemis realmente não te falou nada?

Apolo não havia pensado sobre aquilo antes, mas, de fato, Gabriel era a pessoa mais próxima de Artemis ali na Academia. E ela não havia dito nada nem ao menos para ele... Tinha tanta vergonha de Apolo assim? Namorá-lo seria mesmo tão ruim para a sua imagem? Deus, ela não poderia se achar assim tão melhor do que ele, podia?

– Bom, Artie estava realmente estranha ontem – Gabriel comentou, encolhendo os ombros e dobrando a embalagem de cupcake em triângulos. – Assim, mais estranha do que o normal, porque, convenhamos, ela é totalmente esquisita todo o tempo.

Apolo juntou as sobrancelhas, ignorando o último comentário.

– Estranha como?

– Ah, toda quieta. Eu insisti para ela me contar como tinha sido, e no fim ela se irritou tanto que arremessou o travesseiro em cima de mim – contou, arregalando os olhos de forma cômica. – ‘Tá, tudo bem, o travesseiro é fofinho, mas e se fosse o abajur? Aquela louca podia ter me matado.

– Não existe um prêmio para serviços prestados ao país? – David murmurou, divertido.

– Bom, eu realmente fiquei a irritando quanto a ser um encontro – Apolo mentiu, aproveitando que Gabriel não havia ouvido o murmúrio de David. – Talvez ela tenha ficado realmente brava, e descontado em você. Sei lá.

Gabriel balançou a cabeça, suspirando de forma trágica.

– Ela é louca. Você vai acabar tendo que namorá-la por trás do vidro do hospício, usando aqueles telefones, cada um de um lado. E a Isabella disse que não pode erguer a camiseta – contou, como se fosse uma informação importante. – Mamilos não são permitidos. Deveria ter transado com ela no telhado quando teve a chance.

Antes que Apolo pudesse responder, David deu uma risadinha de escárnio, sem erguer os olhos do jornal.

– Isso vale para prisões, não para hospitais psiquiátricos.

Gabriel não pareceu incomodado pela correção.

– Eu te namoraria por trás de qualquer um dos vidros – declarou, solene.

Outra risadinha. David costumava dá-las quando estava tão certo de sua vitória no pôquer que nem se dava ao trabalho de blefar.

– Em uma situação onde eu concordasse com isso, provavelmente seria o do hospício.

Gabriel fez uma careta.

– É incrível como você fica melhor nisso a cada dia. – Virou-se para Apolo, a expressão sofrida. – Estou indo para minhas aulas chatas. Quer que eu diga alguma coisa a Artemis?

Apolo fingiu uma expressão confusa.

– Por quê? – Forçou um sorriso. – Não aconteceu nada mesmo entre nós ontem. Eu só precisava usar o telhado para o aniversário da minha irmã, e ela tinha que ir junto.

– Aaah – Gabriel não poderia parecer mais decepcionado nem se tentasse. – Porque ela é monitora. Bom, é. Que chato. A gente se vê. – Suspirou, e então soprou um beijo para David antes de se afastar (quase correndo, provavelmente estando mesmo atrasado para as aulas).

No instante em que saiu para o corredor, o professor se virou para Apolo.

– Como consegue conversar com ele? O garoto pensa que é uma máquina sexual alimentada a açúcar, e o mais preocupante é que talvez seja.

Apolo teve que sorrir, ainda se sentindo desconfortável com a mentira.

– Você tinha que ter ouvido o que ele estava dizendo antes de você chegar.

– Algo interessantíssimo e inteligente, tenho certeza. Por que ele sequer veio falar com você?

– Ah, estava achando que Artemis estava escondendo detalhes sórdidos do nosso último... – se lembrou – uh, da noite de ontem.

Achou que houvesse se saído bem, mas então David balançou a cabeça, pesaroso.

– Seria engraçado se não fosse tão trágico. Você mente tão mal que dá até vergonha, eu não sei nem por que me preocupo em te ensinar pôquer. Nunca vai ser um bom jogador desse jeito. É claro que não me interesso pela sua vida amorosa adolescente, mas não tente mentir para mim.

E, com isso, David voltou ao seu jornal.

Apolo apoiou os antebraços na mesa e se afundou para apoiar o queixo neles, frustrado. Nunca fora mesmo um bom mentiroso (era surpreendente que Gabriel, de fato, houvesse sido enganado tão facilmente), mas suas chances eram injustas contra as de um profissional como David.

Apolo também não era bom em não contar as coisas para as pessoas. Anna era sua melhor amiga desde que se entendia por gente, e seus pais costumavam ouvir longas narrações de seu dia na escola durante o jantar. Era estranho esconder qualquer detalhe, ainda mais algo importante como o que havia acontecido na noite passada.

(Não havia alguma coisa sobre sigilo médico?)

– Nós nos beijamos – confessou, em tom baixo, olhando para a mesa.

Quando David não respondeu, Apolo voltou os olhos para ele, apenas para descobrir que o professor estava o encarando. Verdade seja dita, o homem parecia chocado, o que era estranhamente satisfatório.

– Não.

– Sim. – Apolo levantou e desceu as sobrancelhas, do jeito que havia aprendido com Gabriel, só porque sabia que isso irritava todas as células do corpo de David. – E eu não estou mentindo, você sabe que não.

O professor continuou o encarando.

– Como isso pode ter acontecido? – Perguntou, lentamente. – Não posso ter errado minha análise dela. Eu nunca erro.

O que, provavelmente, era verdade. David tinha tudo para ser o melhor psiquiatra da Costa Leste, se você relevasse a dificuldade de coexistência, o humor ácido e o tédio com a normalidade.

– Bom, eu contei um pouco dessa sua análise para ela – Apolo comentou, correndo os olhos pelo refeitório. – E pela forma como ela reagiu, pareceu que você havia acertado em alguma coisa.

– É claro que eu estava certo – David pareceu ofendido. – Artemis é uma mentirosa profissional, independente, confiante, sem o mínimo de empatia para com as pessoas ao seu redor – recapitulou tudo o que já havia dito a Apolo, deixando o loiro exasperado. – E despreza tudo o que não gosta ou não entende, desde rock a pessoas como você – completou, estreitando os olhos. – Não há nada que justifique essa anomalia.

– Está chamando nosso beijo de anomalia? – Apolo teve que perguntar, incrédulo. – Os três?

– Foi mais de um? – As sobrancelhas de David subiram. – Não, não me responda. Eu não quero saber.

Apolo encolheu os ombros, se sentando direito para se espreguiçar. Era um certo tipo de alívio ter contado a alguém. Fazia com que o que quer que estivesse acontecendo entre ele e Artemis parecesse mais real, menos... secreto, menos errado. (E o que estava acontecendo entre eles, afinal de contas? Teria que se encontrar com ela depois. A mera perspectiva lhe dava vontade de sorrir.)

– Não sei a que pé vocês dois estão, mas não peça pela minha bênção, ou qualquer idiotice do tipo – David voltou a falar, dessa vez em tom de indiferença. – Fiz a minha parte te avisando sobre aquela garota.

– De novo isso? – Apolo se virou para o professor, frustrado. David tendia a fazer análises negativas de todo mundo. Era simplesmente raro ele encontrar algo bom para dizer sobre alguém, mas, no caso de Artemis, a questão era simplesmente ridícula. – Eu sei reconhecer quando alguém não presta. Drew, aquele colega moreno da Artemis, a loira chamada Kate... – enumerou, a título de exemplo. – Artemis só é diferente. Ela não é uma pessoa ruim, só é difícil de lidar. Já te disse isso.

– Só o fato do Gabriel não estar nessa lista já prova que ela está errada – David não pareceu feliz por ter sido contrariado. – E não oponha a sua mísera opinião de adolescente apaixonado com a opinião de um profissional competente. Confesso que achei que seria bom você insistir na garota, mas só porque esperava que uma rejeição fosse te fazer amadurecer.

– A minha opinião não é de adolescente apaixonado – Apolo o corrigiu. – Eu só conheço Artemis mais do que você.

– É, deve saber todos os detalhes de sua vida particular, tenho certeza.

Apolo juntou as sobrancelhas, confuso.

– Ela me falou da vida dela. Estudava filosofia em Nova York, e é super feminista. Seu pai é diplomata, e está na Austrália agora.

David pareceu impressionado, mesmo que à contragosto.

– Outra falha – murmurou, desviando o olhar. – Eu não posso ter errado, posso?

Apolo franziu os lábios, pensativo.

– Eu acho que você não errou na análise. Juntou todos os pontos como deveria. – Aquilo pareceu chamar a atenção de David, e Apolo continuou. – Só que eram os pontos que Artemis queria que você juntasse. Isso faz sentido? Talvez ela queira parecer assim. Talvez você esteja vendo exatamente o que ela quer que você veja.

– Você acha, então, que ela se comporta como uma vadia insuportável por gosto? – o professor revidou, tediosamente descrente. – Não seja idiota. Arrogância é praticamente parte do sistema neurológico daquela garota, como um hormônio secretado de forma ininterrupta. Além do mais, ainda que a sua teoria insana estivesse certa, ela teria que ser muito inteligente para fazer esse tipo de jogo – acrescentou, em tom de alerta.

Apolo se viu pensando em seu sorriso esperto, na mão delicada apoiada em seu peito enquanto ela o beijava de leve. Assentiu para David.

– Ela é.

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Notas finais do capítulo

Apolo, David e Gabriel em um só capítulo, o que mais alguém poderia querer? *-* E, por meio deste, eu estou oficializando minha decisão de chamar Apolo/Artemis de Appirtie. Juntem-se a mim, ou riam eternamente. Ou façam como eu, ou seja, os dois. O que acharam, amores? Beijinhos.