O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 29
Capítulo Vinte e Nove




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Vinte e Nove

Artemis ainda estava meio em choque enquanto subia a escada. Apolo ter uma irmãzinha arranhava um pouco o estereótipo de filho único mimado, mas o mais surpreendente era que os dois não se pareciam em nada. Apolo era bronzeado e loiro, os olhos castanhos e traços do rosto marcantes. A garota era morena, de cabelo escuro e liso, olhos profundos e um rosto delicado.

Artemis odiava não ter certeza sobre algo, mas, quando abriu a porta e saiu para o telhado, perdeu o fôlego, as dúvidas esquecidas. O vento estava friozinho, o céu amplamente estrelado sobre eles, luzes da cidade os cercando. A garotinha estava dizendo alguma coisa, parecendo animada, e Apolo a pousou no chão, respondendo em tom baixo.

As nuvens que, dias antes, estiveram cobrindo toda a cidade como algodão doce em uma máquina, haviam desaparecido por completo. O céu azul escuro cintilava com estrelas incontáveis, a falta da Lua insignificante perante aquele teto incrível.

Artemis olhou para os dois Wright de soslaio, subitamente desconfortável. Eles pareciam próximos. Ela não havia notado que Apolo carregava uma mochila nas costas, mas agora o garoto a colocara no chão, a abrindo e tirando uma caixa comprida de lá.

Zoe começou a bater palmas, animada, e Apolo lhe estendeu a caixa, que ela abriu com voracidade. Artemis não pôde evitar sorrir quando Zoe ergueu a luneta prateada no ar, sorrindo, encantada.

– É o aniversário dela – Apolo comentou, se levantando e se aproximando de Artemis. – Oito anos.

Artemis assentiu em compreensão, a observando de longe.

– Ela é linda.

Apolo sorriu, orgulhoso, enquanto a garota abria e fechava a luneta, se divertindo.

– É mesmo. Ela tem pedido por uma dessas desde o ano passado, quando a minha mãe lhe deu um livro sobre estrelas que eu não sei o nome. Era infantil, mas bonitinho – ele deu de ombros. – Ela o adorou. – Apolo fez uma pausa. – Meus pais disseram que ela é muito nova e que vai quebrar a luneta logo, mas eu decidi tentar.

– Ela não vai quebrá-la – Artemis o tranquilizou, observando a garotinha mirar a luneta a esmo para o céu, andando pelo telhado à procura das melhores estrelas. – Vai ensinar as constelações para ela, então?

Apolo riu, parecendo sem graça.

– Como se eu soubesse.

Artemis balançou a cabeça, desaprovadora, lembrando-se do seu pai a ensinando, ligando uma estrela à outra com o indicador, criando desenhos que, para ela, não se assemelhavam em nada com os animais que deveriam ser.

– Hum, Artemis?

Ela se virou, espantada, encontrando Zoe subitamente ao seu lado, olhos enormes voltados em sua direção. Ela não fazia ideia de quando a garota se aproximara tanto, há meio segundo estivera do outro lado do terraço (crianças!).

– Sim, querida? – perguntou, suavemente, abaixando-se.

– Apolo disse que você é uma bailarina. – Zoe começou, em um sussurro nervoso. – É mesmo verdade?

– Ei! – Apolo protestou, indignado. – Eu nunca minto!

– E o Papai Noel? – Zoe revidou, em uma vozinha aguda.

Artemis nunca havia acreditado em Papai Noel.

Dessa vez Apolo não mentiu – prometeu, muito séria.

– Que legal – Zoe sorriu, encantada, olhando para Artemis como se ela fosse infinitamente mais fascinante do que qualquer Papai Noel.

Artemis sorriu de volta, desconcertada. Nunca havia tido muito contato com crianças, nem tivera jeito com elas. Apolo estava se encaminhando para um banco de madeira ali perto, e ela o seguiu, surpreendendo-se quando Zoe esgueirou sua mãozinha para dentro da dela. Era tão estranho, dedinhos tão pequenos envoltos pelos seus.

– Como Apolo não quer me ensinar – Zoe ia dizendo, enquanto Artemis se sentava –, eu vou aprender as constelações so-zi-nha – ela separou bem as sílabas, desafiante.

– Sozinha? – Apolo ergueu uma sobrancelha, divertido.

– Aham – Zoe confirmou, anuindo com a cabeça de forma convicta. – No meu livro diz que é só ligar para formar desenhos. É o que eu vou fazer.

– Tudo bem. Quando você terminar, a gente te mostra as constelações de verdade. Okay?

– As minhas também são de verdade – ela proclamou, indignada, mas saiu de perto deles sorrindo.

Artemis observou a menina correr pela cobertura, Apolo às vezes chamando sua atenção quando ela se aproximava demais da muretinha que margeava o lugar.

– Ela não tem medo de cair? – Artemis perguntou, ao ver Zoe subir na beirada, a luneta erguida.

– Nessa idade, ninguém tem – Apolo respondeu, passando um braço pelo encosto do banco.

Eu tinha.

{...}

– Ela... não se parece com você – Artemis finalmente reuniu coragem para comentar, hesitante.

Apolo havia tirado o casaco preto e o colocado no chão para que Zoe se deitasse. A garota agora encarava o céu a olho nu, um dedo erguido no ar se movendo e traçando desenhos em silêncio.

Apolo considerou a pergunta, reclinando-se no banco, o braço ainda passado ao redor dos ombros de Artemis, apoiado no encosto de forma despretensiosa. Uma de suas pernas estava dobrada casualmente sobre a outra, e ele parecia completamente à vontade.

– Ela é adotada – comentou, em tom baixo. Artemis assentiu, e Apolo continuou a falar, lentamente. – Meu pai visitou o Oriente Médio há alguns anos, como correspondente de guerra. Quando voltou, trouxe a Zoe. Ela era filha de um general muito rico, mas ele acabou falecendo. E eles têm uma tradição louca de que a mulher deva morrer junto com o marido, então ficou com medo do que poderiam fazer com a filha mais nova... é complicado explicar.

Artemis inclinou a cabeça para o lado.

– Não deve ter sido fácil adotá-la.

– Ele levou quase dois anos para conseguir – Apolo reconheceu, assentindo.

– Quantos anos ela tinha?

– Na época, uns três. Minha mãe a adorou de imediato, e foi quem lhe ensinou Inglês. A gente comemora o aniversário dela mais ou menos nessa época, porque foi quando a trouxemos para cá, mas não sabemos realmente quando é.

– Ela entende que é adotada?

Apolo deu de ombros, mirando a irmã com afeição.

– Tão bem quanto qualquer menina de oito anos. Não se lembra de quase nada da antiga família, mas às vezes me pergunta por que não se parece comigo.

Artemis observou o casaco debaixo da garota, e sorriu para Apolo.

– Você deve ser um bom irmão para ela.

– Eu tento. Você não tem irmãos, tem?

– Não.

Apolo assentiu, tombando a cabeça para trás e encarando o céu.

– Estranho o céu estar tão claro – Artemis comentou, ainda que olhasse para o garoto. – Ele estava muito nublado nos últimos dias.

Apolo virou os olhos para ela, surpreso.

– Não ouviu a chuva que caiu ontem à noite?

– Chuva? – Artemis franziu a testa, confusa. – Não.

– Foi uma tempestade – ele contou, ainda meio incrédulo.

Artemis virou-se para frente, esticando as pernas para se distrair.

– Bom, eu não vi. Por que contou para a Zoe que eu era uma bailarina? – perguntou, o olhando pelo canto dos olhos.

Apolo voltou a olhar para o céu.

– Eu não realmente falei de você para ela, se é com isso que você está preocupada.

– Eu não me importaria – ela disse, virando-se para observar as luzes da cidade. – Tudo fica tão mais bonito à noite – acabou comentando.

Quando não obteve resposta, voltou a se virar para ele, apenas para descobrir que Apolo estava a observando.

– Não acho – ele acabou concluindo. – Você não fica mais bonita.

– Isso não foi muito gentil.

– Você deve ter entendido errado, então – ele voltou a olhar para o céu. – Eu quis dizer que você é tão linda que não tem como ficar melhor.

Artemis sentiu o rosto esquentar, uma sensação estranha se formando no estômago. Como era aquela expressão boba? Borboletas?

– Vai precisar aprender as constelações se quiser ensinar a Zoe – comentou, erguendo a mão para corrê-la pelo próprio cabelo apenas para, frustrada, se lembrar de que o tinha preso.

Apolo deu uma risada breve.

– Pode começar.

Artemis o olhou de lado.

– Eu sou péssima em ensinar as pessoas.

Apolo não pareceu incomodado.

– Tente.

Artemis virou-se para o céu, respirando fundo. Percebeu Apolo se sentando direito ao seu lado, e não soube por onde começar. Qual seria a constelação mais fácil? Queria poder se lembrar de quando havia aprendido.

– Apolo?

Artemis se virou para Zoe ao mesmo tempo em que Apolo o fez, grata pela interrupção. A garotinha estava subindo no colo do irmão, ansiosa para mostrar "suas constelações". Apolo fez com que ela ficasse quieta para que pudesse fechar seu casaquinho, e sorriu ao cobrir sua cabeça com o capuz de bordas felpudas.

– Mamãe me mata se você ficar gripada – explicou-se, muito sério, fazendo a garotinha sorrir, aninhando-se mais em seu colo.

– Olha, eu li sobre uma Ursa, a grande e a pequena – Zoe começou a explicar, em tom profissional. Ursa menor e Ursa maior, Artemis sabia, mas não disse nada. – Mas olhei, olhei e olhei, e não vi ursa nenhuma.

– Hummm – Apolo fez, estreitando os olhos. – E o que você fez, então?

Zoe sorriu.

– Eu desenhei uma ursa enorme – sussurrou, em tom de conspiração.

Apolo levantou as sobrancelhas comicamente, fingindo um espanto teatral que fez Zoe sorrir, orgulhosa.

– É, ela é enorme. Liguei quase todas as estrelas, assim, olha.

O desenho de Zoe foi impossível de acompanhar, e, depois das vinte primeiras estrelas, Artemis desistiu de tentar. Seu dedinho apontava para uma estrela, percorria um arco enorme até outra, explicava sobre o pelo arrebitado da ursa ou sobre o formato do seu nariz e, então, traçava outro arco incoerente até outra estrela distante.

Bom, não se pode negar que ela é criativa. Seria um pecado se ela visse as verdadeiras constelações.

Artemis sabia que era decepcionante. A Ursa Maior não passava de um risco com algo quadrangular na ponta.

Entretanto, Apolo, por algum motivo, estava acompanhando o raciocínio da irmã muito bem. Ou ele era um excelente ator, ou realmente entendia o movimento rápido e incoerente do dedinho dela apontando para o céu. Artemis preferiu acreditar que, como bom irmão, ele estava ao menos se esforçando para compreender a ideia geral do desenho.

– É... – foi a conclusão dele, deliberadamente hesitante. – Interessante.

– Não é bonita a minha ursa? – Zoe perguntou para Artemis, olhos escuros brilhando e mechas de cabelo negro escapando do capuz.

– Linda, Zoe. Você deveria dar um nome para ela.

A garotinha deitou-se melhor sobre o irmão, acomodando-se de forma confortável enquanto olhava para sua criação, pensativa. Artemis reparou que Apolo a envolvera com os braços, suas mãos descansando em sua barriguinha coberta pelo casaco cinzento. O aperto não era forte, e ela teve a impressão de que aquela era uma posição comum para os dois.

Você vai ser um ótimo pai, Apolo.

O queixo dele apoiou-se brevemente sobre o capuz felpudo de Zoe, e Artemis se derreteu quando Apolo inclinou-se, de olhos quase fechados e com um meio sorriso, afundando o rosto no pescocinho dela enquanto a abraçava forte. Zoe soltou uma risada gostosa, e Apolo sorriu junto, beijando sua bochecha e ameaçando lhe fazer cócegas. Zoe contorceu-se em seu colo, ainda rindo.

– Não, assim não vale! – ela se defendeu, riso puro em sua voz.

Artemis teve vontade de chorar.

{...}


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Notas finais do capítulo

Sou tão linda que o próximo capítulo já está programado para ser postado na segunda-feira - a noite ainda não acabou ~pisca~ O que acharam?
Beijinhos