O Lado Escuro da Lua escrita por MaeveDeep


Capítulo 19
Capítulo Dezenove




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O Lado Escuro da Lua – Capítulo Dezenove

Gabriel acabou convencendo Artemis a aceitar a monitoria. Ao invés de argumentos coerentes e bem-elaborados, o garoto a venceu na base da insistência. (Se bem que o quarto reservado à monitora no fim do corredor fosse incrível, com uma banheira de mármore e uma enorme e macia cama de casal.) Ela só teria que supervisionar alunos, de qualquer forma, e Gabriel não havia exatamente errado quando brincara sobre Artemis amar o poder.

Só faltava confirmar com Michael. Aproveitando que era a hora do almoço, Artemis voltou para o dormitório, preparando um sanduíche na cozinha e se perguntando sobre as possibilidades de encontrar na internet um sequestrador profissional para tomar conta de Apolo naquela tarde.

(Você já está chamando de encontro?, ele havia dito, ou algo assim. Artemis rangia os dentes só de se lembrar. Estúpida. Tinha vergonha de se lembrar de como havia se rendido tão fácil na noite anterior, incapaz de arrumar sequer respostas às impertinências dele.)

Estava se martirizando sobre isso quando levou um susto; Michael estava descendo as escadas, gritando ao telefone.

— Pela última vez, você enlouqueceu?!

Enquanto ouvia a pessoa do outro lado da linha falar, o monitor se pôs a andar de um lado para o outro na sala, um vinco profundo na testa, sem nem notar Artemis – que, claro, não pôde evitar prestar atenção. Não que ela gostasse de ouvir as conversas alheias (esse era o departamento de Gabriel e Isabella), mas aquilo era com certeza melhor do que ficar pensando em Apolo.

— Jack, a mãe dela vai me matar se eu não disser onde vocês estão! – ele não demorou a voltar a falar, ainda exaltado. – Rose é tudo o que ela tem, claro que está desesperada! Pelo amor de Deus, vocês não têm noção do que fizeram?

Ele se virou para Artemis, parecendo surpreso, quando ouviu o barulho do copo de suco ao ser posto sobre a bancada de mármore. Adotando uma expressão inocente, Artemis balançou as pernas no ar, ainda comendo seu sanduíche natural.

O monitor a encarou por um tempo (a pessoa do outro lado da linha ainda falando) antes de respirar fundo, fazendo sinal para que a garota esperasse. Quando voltou a falar, parecia mais calmo.

— Jack, eu estou pedindo por favor. A última coisa que quero é te prejudicar, mas não posso deixar a mulher perder a única filha. – Ele ficou um tempo em silêncio, parado, olhando para a parede sem realmente vê-la. – Essa não foi mesmo a melhor hora, mas eu falei sério. Converse com ela mais uma vez, por favor. Família vem primeiro, certo? – Soltou um suspiro pesado. – Estou esperando sua ligação amanhã.

Michael desligou sem dizer tchau, e, quando ergueu os olhos para Artemis, pareceu ter envelhecido vinte anos. Ele não disse nada, contudo, e Artemis saltou do banquinho para ir lavar sua louça atrás do balcão.

Michael aproximou-se devagar, sentando-se em seu lugar desocupado e encarando o mármore claro da bancada, ainda em silêncio. Artemis pensou que talvez ele estivesse embaraçado, ou ainda com medo do que Artemis fosse pensar.

— É com isso que você lida quando vai para Long Island? – perguntou, em tom baixo.

 Ele era ligeiramente bonito, Artemis pensou, o estudando enquanto ele não a respondia. Mesmo com o vinco na testa, o nariz meio adunco e a expressão fechada, seus olhos azuis eram escuros, e o cabelo bem cortado lhe dava toda uma aparência de responsabilidade. Artemis podia vê-lo andando por bancos, vestindo um bom terno e apertando mãos para selar grandes contratos.

— É ainda pior do que parece – ele acabou dizendo, erguendo os olhos.

Artemis não era boa em consolar ou ajudar pessoas, mas qualquer coisa em Michael a fazia se lembrar de seu pai.

— Eu assumo que Jack seja seu irmão.

— Só dois anos mais novo, mas pior do que um adolescente – Michael suspirou, em tom de quem já havia repetido aquilo várias vezes para outras pessoas. – Somos de Long Island, e moramos na mesma casa desde que nascemos. – Ele parecia hesitante quanto a contar a história, mas acabou falando. – Essa mulher, a senhora Gardner, sempre foi nossa vizinha... era realmente estranha, e dizia-se por aí que era louca. Paranoica – resumiu. – Mas apaixonada pela única filha.

Artemis não soube o que dizer, então continuou o encarando, esperando pelo fim da história. Michael levou um tempo antes de voltar a falar.

— Meu irmão fugiu com a garota.

Artemis apoiou o prato na pia.

Fugiu?

— Eu nem sabia que ele a conhecia – Michael explicou, sua voz traindo um pouco da indignação que sentia. – Nunca havia visto a garota, a senhora Gardner quase a impedia de sair de casa. Não sei te dizer como foi que os dois sequer se falaram pela primeira vez.

Aquilo era irreal demais para ser verdade, e Artemis levantou uma sobrancelha, horrorizada.

— Como os dois fugiram?

— Ninguém sabe, um dia Rose simplesmente saiu para a faculdade e não voltou mais. Não ligaram o desaparecimento dela com o sumiço do Jack, porque não tinha motivo para ele estar envolvido. E eu só fiquei sabendo quando a nossa empregada me ligou e perguntou quanto tempo ele ficaria fora – contou, com amargura diante da traição do irmão. – Estava desesperado até ele me ligar, e isso há duas semanas. Depois de três meses sumidos – enfatizou, com aquele ódio que só irmãos mais velhos têm diante da inconsequência dos caçulas.

Artemis não fazia ideia do que deveria dizer. Teria adorado comentar algo sobre tragédia, Gabriel cantando Celine Dion e a coincidência dos nomes dos dois, mas se conteve.

— Eles estão bem? – acabou perguntando. – Ou ele te ligou para te pedir alguma ajuda?

— Bem? Estão ótimos – a risada saiu seca. – Jack pegou a parte dele da herança e levou os dois para o outro lado do país. Aparentemente, Rose nunca esteve mais feliz, Los Angeles é linda nessa época do ano e os dois querem adotar um cachorro.

Artemis inclinou a cabeça para o lado, se lembrando do que mais havia ouvido da conversa.

— E você sabe de tudo isso, mas não pode dizer nada à mãe da garota?

Michael assentiu, sem respondê-la.

— Oh. – Artemis arrumou a louça no escorredor e secou as mãos, embaraçada. – O que você tem dito a ela?

— Ah, a mulher tem certeza de que o meu irmão a raptou – Michael disse, com um drama que deixaria Gabriel com inveja. – O que é péssimo, porque Jack parece ter se esquecido de que isso é crime. A casa não fica um minuto sem policiais. – Em resposta ao olhar chocado de Artemis, ele balançou a cabeça, como quem pergunta o que se pode fazer. – Eu disse que Jack estava de férias no Caribe, porque foi isso que ele disse para a empregada, mas é claro que ninguém acreditou.

Artemis trocou o peso do corpo de um pé para o outro.

— Eu sinto muito. Deve ser horrível.

— Você não tem ideia. Não sei como contar aos meus pais, e até eu estou sob suspeita. Já perdi a conta de quantas vezes revistaram a casa. Talvez pensem que Jack tem mantido Rose debaixo do tapete.

Artemis tentou conter a risada diante do desabafo inesperado, mas o homem percebeu. Para seu crédito, contudo, Michael sorriu.

— Espero que isso ao menos sirva de lição para você.

— Eu nunca faria isso – Artemis disse, revirando os olhos para o absurdo. – Fique à vontade quando precisar voltar para casa – ofereceu, gentil. – Eu iria mesmo aceitar a monitoria, mesmo que sem a história trágica.

— Não foi por chantagem emocional que te contei – Michael se defendeu, parecendo talvez um pouco mais leve. Artemis assentiu, de repente incomodada com a presença dele. Não fazia nem vinte e quatro horas que o conhecera, e, ainda assim, ele havia lhe contado tudo aquilo. E estava perto demais, também, mesmo que do outro lado do balcão.

Foi quando as portas do dormitório se abriram, para logo depois baterem com força. Artemis se virou, sobressaltada, e viu Gabriel marchando até eles, parecendo furioso. (Era até adorável as sobrancelhas tão bem-feitas franzidas em fúria. Aquele cabelo de anjinho não combinava com uma expressão fechada.)

— Vocês não têm ideia do que aconteceu! – Ele anunciou, feroz, enquanto se sentava no banquinho ao lado de Michael. – Aquele hétero mal-resolvido quer uma audição!

Artemis encarou aquele rosto vermelho, sem entender.

— Quem quer o quê? – Michael perguntou, preocupado.

— Andrew, é claro! – Gabriel exclamou, parecendo chocado por não haver sido compreendido de primeira. – Ele quer disputar o meu papel na peça! Disse que não é justo não ter audições.

— Sempre tivemos audições – Michael deixou claro, como o perfeito monitor que era. – É a regra. Você sabe disso.

— Ele poderia desistir – Gabriel apontou, ainda chateado. – Seria legal da parte dele. Se bem que a desgraça ainda está aberta para todos os bailarinos – ele suspirou. – É a vadia da Victoria quem vai julgar, ainda por cima, e aquela malvadeza toda me odeia. O Andrew praticamente ganhou a vaga, o que não é justo.

Isso não faz sentido nenhum. Você sempre soube que teríamos audições.

Artemis lançou um olhar a Michael, que, obviamente, parecia estar pensando a mesma coisa. Ela se virou para Gabriel para lhe dizer isso, mas algo na expressão do garoto a fez entender.

Ele havia ido atrás de David na noite anterior.

E agora estava furioso e frustrado com algo aleatório.

Era só juntar os pontos; aquilo nada tinha a ver com a peça.

— Michael, você pode nos dar licença? – pediu, sem tirar os olhos de Gabriel, que levantou as sobrancelhas para ela, surpreso.

— Claro – o monitor disse, soando só um pouco confuso enquanto se levantava. – Obrigado por ter ouvido, e... por ter aceitado a monitoria.

— Não há de quê.

Foi só quando Michael subiu as escadas para seu quarto que Gabriel voltou a falar.

— Por favor, me diga que o que você ouviu dele foi uma saída do armário.

— Seria bom para você se fosse – Artemis inclinou a cabeça para o lado. – Eu suponho que as coisas com David não correram bem.

— Como você soube? – Gabriel perguntou.

Você é expressivo demais. Artemis mordeu o lábio inferior, sem saber como responder.

— Você é fácil de ler – acabou dizendo.

Os olhos de Gabriel eram castanhos como os de Apolo, mas mais claros. Talvez porque ela soubesse que o garoto era apaixonado por açúcar, mas aquele tom fazia com que Artemis se lembrasse de doces, como caramelo.

— As coisas não foram nada bem – o garoto resumiu, aparentemente ainda sem vontade de falar sobre aquilo.

Artemis se lembrou dele a abraçando no corredor, e se perguntou se deveria fazer o mesmo. Não era boa com contato físico, mas Gabriel parecia precisar de qualquer tipo de consolo.

— Quer me contar o que aconteceu?

— Não é nada que você não saiba – ele a respondeu, evasivo. – David sabe que eu gosto dele. Ele flerta comigo – disse, com ênfase, seus olhos além de qualquer consolo. – Ele é lindo e gostoso e cheiroso e me dá um pouco de corda só para depois me despejar o não mais horrível do mundo.

Artemis não teve coragem de pressioná-lo. Estendeu a mão por sobre o balcão, esperando tocar a dele para confortá-lo, mas não conseguiu. Era péssima com pessoas, e acabou olhando para aquele rosto triste sem saber o que fazer.

De algum modo, um aluno safado magoado pela recusa do professor a tocara bem mais do que a tragédia na vida de Michael. Talvez porque ela gostasse de Gabriel, ou talvez porque Apolo houvesse a deixado mais sensível para assuntos daquele tipo.

— Ele não te merece – acabou dizendo, usando a frase mais clichê do mundo, quando tudo o que queria dizer era aquilo mesmo. – David não tem metade do seu senso de humor. Da sua espontaneidade, das suas covinhas e do seu sorriso. Aposto que ele nunca assistiu Cantando na Chuva. Ele está brincando com você sem nem saber o quão maravilhoso você é.

E ouça bem tudo o que eu estou dizendo, porque não serei tão gentil com você tão cedo. Palavras doces não eram o forte de Artemis.

— Eu não ligo para nada disso – Gabriel deu de ombros, sem dar valor ao esforço de Artemis em ser uma pessoa melhor, como ele mesmo dizia. – Gosto dele mesmo assim.

Artemis queria gritar como, já que os dois mal se conheciam. Mas Gabriel acabou cruzando os braços no balcão e apoiando o queixo neles, encarando o mármore com ar pensativo.

— Ser rejeitado é uma droga. Ele podia dizer sim logo, só isso.

Artemis encarou os cachos castanhos, e se lembrou de Apolo.

{...}


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Notas finais do capítulo

Nossa, eu tenho um milhão de coisas para falar.

Hum, primeiro, sinto muito pela demora! Eu, a pessoa mais sedentária, preguiçosa e inútil da face da Terra, fui obrigada pela minha mãe a fazer academia. Tipo, sim. Desse jeito. Eu estava lendo no sofá quando ela me avisou que eu tinha avaliação física no dia seguinte, quando eu disse que iria detestar, ela me veio com "se eu te deixar fazer o que você gosta, você fica lendo nesse sofá o dia inteiro."

Bom. Fico mesmo.

Mas enfim.

Estou toda dolorida, o que é horrível, e não dá para escrever quando todos os seus músculos protestam contra a própria existência.

'tá, eu tinha outras coisas para falar.

Viram Hades e Perséfone lá em cima, viram, viram? *–-* Eu não resisti *0* E a coincidência dos nomes foi só uma bobagem em que pensei.

Agora, DAVIEL *UUUUU* A gente precisa de um fã-clube organizado para esses dois, porque sim. Quanto ao Gabriel, que se recusa a dar detalhes, não se preocupem, eu pretendo

a) explicar detalhes do que realmente aconteceu entre os dois no futuro

b) escrever um spin-off dos dois e postar separado

Ainda não me decidi.

O que estão achando?

Mil beijinhos