Um Cupido (quase) Flechado escrita por Gaby Molina


Capítulo 6
Capítulo 6 - Anjos despertam a boa vontade




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Heath

Serena estava sentada num banco em frente ao prédio. Ela sorriu quando encostei o carro.

— Você pode não ser uma advogada ainda — falei. — Mas está parecendo uma.

Ela torceu o nariz e sentou-se no banco do passageiro.

— Condição da minha mãe para me trazer. "Use uma roupa decente!".

Eu ri.

— Eu gosto das suas roupas. Gosto da falta delas, também.

Serena franziu o cenho, silenciosamente me censurando, mas não parecia irritada. Eu ri mais.

—... Infelizmente, acho que esse vestido não vai ser bom para os nossos planos.

Ela suspirou, parecendo ponderar a ideia.

— Tem razão. Precisamos passar na minha casa.

— Pelo menos lá eu sei chegar.

— É melhor decorar o caminho para a firma, pois parece que vou passar mais algum tempo nela.

E então ela me contou, animada, a história toda de Erica. Eu gostava de ver aquele entusiasmo nos olhos dela. Ela não ficava animada com muita coisa, a não ser música.

* * *

— Vire de costas — pediu Serena, segurando um shorts jeans e uma blusa nas mãos.

— Sabe que eu vou olhar.

Ela escondeu um sorriso.

— Pervertido.

— Só um pouco.

— Vire.

Fiz isso. Por uns... Dois segundos, talvez? Não é como se eu nunca tivesse visto Serena de sutiã. Ela sabia que eu estava olhando, mas decidiu ignorar enquanto rapidamente passava o shorts pelas pernas bonitas.

Serena era tão linda que às vezes era difícil acreditar que ela era realmente minha namorada. Ela afastou uma mecha dourada do rosto, o que me deixou perceber que estava enrubescida. Não era culpa dela. Eu a estava observando como se quisesse agarrá-la, jogá-la naquela cama e tê-la de todas as formas possíveis, e era exatamente isso que eu queria fazer.

Ainda havia algo que martelava no fundo de minha mente me dizendo que era errado querê-la desse jeito. Talvez o Céu tivesse me acostumado a pensar dessa forma, ou talvez o sangue angélico ainda interferisse em alguma coisa, mesmo que ele não fosse predominante.

— Argent.

— Sim? — ela tomou coragem para me fitar, arrumando a blusa azul que estava vestindo. Contrastava com os olhos dela, percebi.

— O que acha de sexo depois do casamento?

Ela deu de ombros.

— Acho que é uma grande merda.

Ela era tão errada, de todas as maneiras certas. Sorri com esse pensamento.

— Agora — ela disse, confiante. — Precisamos arrumar um skate. Thomas deve deixar o dele no quarto, vou procurar. Você pode olhar no quintal para mim?

— Claro!

Desci as escadas, e estava quase indo para os fundos quando percebi que não estávamos sozinhos. Thomas estava saindo pela porta da frente, vestindo uma camisa branca e jeans novos. O cabelo dourado estava arrumado.

— Vai a algum lugar? — ergui uma sobrancelha.

O garoto quase teve um AVC com o susto.

— Vou... sair.

— Com quem?

Ele me encarou por um momento.

— Vai contar à minha irmã, não vai?

— Depende. Só se for algo ilegal ou que vá colocar sua vida em risco.

Ele soltou um riso leve.

— Sabia que havia uma razão para eu gostar de você. Vou a uma reunião do Clube de Esportes.

Aquilo podia até enganar Serena, mas eu era um cara.

— Então as líderes de torcida também vão estar lá?

— É só uma reunião de boas-vindas. Nada de mais.

— Está bem. Divirta-se!

— E a minha irmã?

— Essa conversa nunca aconteceu. Com uma condição.

— Sim?

— Onde está o seu skate?

Serena

— Como você achou o skate atrás do sofá? — ergui uma sobrancelha.

— Intuição — Heath sorriu. — Como você aprendeu a andar de skate?

— Um cara me ensinou uns dois anos atrás.

Eu não gostava daquela frase, mas a usava muito. Querendo ou não, os caras que eu conhecia sempre me ensinavam coisas. Michael com o skate, Chad com o violão, Heath com o Latim...

Garotos se tornam Einstein quando querem impressionar você.

Eu não ia àquela pista de skate há mais de um ano, até porque eu não tinha um skate. Heath fitava o skate como se fosse algo de outro mundo. Sorri. Aquilo seria divertido.

— Suba — foi meu primeiro comando.

Heath subiu. Mas colocou os dois pés muito na ponta, o que fez com que o skate virasse e ele voasse um pouco.

* * *

— Meu Deus, Seeler, você é um desastre nisso!

— Eu estou tentando! — ele choramingou, segurando no corrimão e usando os braços para dar impulso.

— Tá, deixe eu mostrar. Sai daí.

Para deixar claro, eu não era nenhuma especialista em skate. Não sabia fazer manobras super complicadas, nem mortais, ou o que fosse. Sabia alguns truques, e conseguia controlar bem quando andava.

Subi na rampa e dei impulso, descendo com mais velocidade do que previra. Contornei os cones que uns skatistas profissionais sempre deixavam ali. Quando passei ao lado de Heath, senti o skate travar e eu voei... Direto no peito dele.

— Epa — ele sorriu.

Ergui os olhos, séria.

— Não se trava o skate das outras pessoas, Seeler. Não é educado.

Heath riu.

— Você não parece do tipo que anda de skate.

Dei de ombros.

— De que tipo eu pareço?

— Arrogante, presunçosa, impulsiva, perfeccionista, provavelmente anoréxica, fresca, egocêntrica... — ele listou, depois cravando os olhos dourados em mim. — E irresistível. Completamente irresistível.

Eu ri.

— Não sei se bato em você ou se te beijo.

— Eu trouxe comida.

Semicerrei os olhos.

— Certo, esqueça a história toda de bater.

Heath se inclinou e fechou os olhos, mas eu apenas ri e roubei sua mochila. Comecei a correr pela pista, enquanto ele me seguia gritando:

— Ei! Argent, volte já aqui ou eu vou alcançar você e jogar toda a geleia no seu cabelo!

Thomas

— Vi você jogar futebol — Eleanor Bynes sorriu para mim. Estava sentada ao meu lado no sofá da casa de Christopher Jacobs, e eu sentia seu cabelo castanho-claro roçando inconscientemente em meu braço às vezes. — Você é bom, Argent.

— Valeu — abri um leve sorriso e me voltei para Chris, que estava sentado com Layla Sonencler no sofá ao lado, com um dos braços em torno da cintura dela. — Ei, Jacobs, tem certeza de que a Miller não vem?

Eu adorava a Audrey, mas sabia que ela contaria tudo à minha irmã sem pensar duas vezes.

— Ela disse que estava ocupada — ele deu de ombros. Ouvimos a campainha tocar. — Eu atendo.

Chris soltou Layla e correu até a porta. Ele abriu um grande sorriso e disse:

— Ah, e aí, Celeste? Entra.

A menina linda de cabelos ruivos assentiu e entrou na casa, arrumando o vestido verde-claro.

— Lugar bacana — elogiou.

— Sinta-se em casa — ele sorriu uma última vez e voltou a sentar-se ao lado de Layla, que se afastou. Não entendi os murmúrios, mas ouvi quando ela disse "Você não disse que tinha convidado ela" e apontou com a cabeça para Celeste, que estava sentada na ponta do sofá, parecendo desconfortável e tímida.

— Eu tenho cerveja, quem quer jogar Verdade ou Desafio? — ofereceu Chris.

Todos concordaram e fizeram uma roda. Eleanor me fitou.

— Você vem?

Quando eu estava prestes a responder, Chris me interrompeu:

— Argent, você tem quatorze anos, nem fodendo que eu vou me responsabilizar por você bebendo.

— Não seja tão dramático — Layla revirou os olhos.

— Hum, eu também preferiria só assistir — confessou Celeste, olhando para baixo. — Se estiver tudo bem.

Todos começaram a protestar, mas Chris disse:

— Claro, como quiser. Sem problemas.

Celeste sorriu.

— Obrigada — e se sentou ao meu lado no sofá.

O resto do time de futebol e as líderes de torcida fizeram uma roda no chão, colocando uma garrafa fazia no centro.

— Por que não vai jogar? — indaguei Celeste enquanto uma menina chamada Amber beijava um cara chamado Sean.

— Eu... não sou muito fã dessas coisas — ela enrubesceu um pouco.

— "Não é muito fã"? — eu sorri. — Você está parecendo uma cristã fanática em uma casa de macumba.

Ela torceu o nariz, ficando da cor do próprio cabelo. Havia algo tão completamente fofo e puro nela que quase me fez repensar minha tese de que tinha alguma coisa muito séria entre ela e Chris. Mas não havia outra alternativa para a gentileza dele.

— Está chateado porque não deixaram você jogar? — indagou ela, parecendo genuinamente interessada na resposta.

Dei de ombros.

— Tá beleza, o Chris só está com medo de apanhar da minha irmã.

— Sua irmã... Ah, é. Christopher chamou você de Argent — ela ligou os pontinhos. — Seus olhos são iguais aos da sua irmã, chega a ser assustador. Eu gosto dela, mas não acho que ela goste muito de mim.

— Como ela pode não gostar de você? É, tipo, impossível não gostar de você.

Ela riu um pouco.

— Obrigada. Thomas, certo? — Assenti. — Sou Celeste.

— É um prazer.

Celeste

O jogo se estendeu pelo o que pareceu uma eternidade. Depois de um tempo, percebi que Thomas estava falando mais mole e rindo à toa. E, se tinha uma coisa da qual eu tinha certeza, era de que Argents não riam à toa.

— Thomas.

— Sim?

Fitei a latinha de Coca-Cola dele.

— Isso aí não é refrigerante, é?

Ele abriu um sorriso presunçoso.

— Misturei com cerveja sem que eles percebessem.

Inspirei fundo.

— Já está ficando tarde, sua irmã deve estar preocupada.

— Até parece. Serena não dá a mínima para o que eu faço, Celeste.

— Claro que dá. Sério, pare de beber ou vou ter de ligar para ela.

Ele revirou os olhos.

— Claro, mãe.

Thomas

Alguém berrou "Festa, porra!" e ligou o som no último em alguma música do David Guetta. Levantei-me.

— Vem, Dumont. Ou as pessoas na França não sabem se divertir? — abri um leve sorriso, estendendo a mão.

Ela hesitou, mas eu a puxei para o centro da sala, onde começamos uma dança desajeitada enquanto todo mundo berrava o refrão da música.

Até que ouvimos sirenes de polícia. Merda, merda, merda...

Celeste

Encarei Thomas.

— Você tem que dar o fora daqui. Se souberem que estava bebendo...

— Bem, mas isso não afeta a sua vida.

Suspirei.

— Suicida, exatamente como a irmã! Ligue para ela, ou eu vou ligar!

— Não, por favor. Ela vai me matar. Ligue... Ligue para o Seeler.

Ergui uma sobrancelha.

— Heath?

— Esquece, eu não tenho o número dele...

Enrubesci.

— Érr... Eu tenho. Só um segundo.

Thomas fez seu melhor olhar de "Por que diabos você tem o número do namorado da minha irmã?", cujo eu ignorei e comecei a procurar o número na lista. Aquele touch screen era uma porcaria bem complicada.

Apertei "Ligar" e deixei tocando até cair na caixa postal.

— Ele não atende. E não diga à Serena que eu tenho o número dele, tá?

Se precisar de qualquer coisa... Eu sei que é difícil no começo, então, se der alguma porcaria... Só ligar, Heath dissera. Bem, onde estava ele agora?!

Thomas continuou pedindo que eu não ligasse para Serena e, de qualquer forma, a polícia já estava cercando a casa. Usei minha última opção.

— Christopher! — corri até o rapaz. — Tem como dar uma carona para o Thomas? Ele está um pouco... Hum...

Christopher riu como se aquilo acontecesse o tempo todo.

— Eu não posso simplesmente deixar todo esse pessoal na minha casa...

Mordi o lábio.

— É uma emergência.

Ele suspirou.

— Vamos ter de sair pelos fundos.

— Obrigada!

Corri até Thomas e puxei-o comigo enquanto Christopher nos levava até a porta dos fundos. Entramos no utilitário preto. Sentei-me no banco do passageiro e Thomas no banco de trás.

— Argent, vou precisar que me diga como chegar à sua casa — pediu Chris.

Thomas assentiu e começou a dar direções um pouco confusas.

* * *

Parei em frente à casa dos Argent.

— Essa é sua oferenda de paz à Serena? — Thomas abriu um sorriso presunçoso. — "Olha, eu impedi seu irmão de ser preso, por favor, não me odeie tanto assim"?

Toquei a campainha.

— Talvez.

Serena abriu a porta logo depois, franzindo o cenho ao nos ver.

— O que...?

— Entrega especial. Estávamos com alguns poucos amigos na casa do Christopher, mas aumentaram demais o volume da TV e os vizinhos chamaram a polícia. Christopher ofereceu carona antes que Thomas fosse fichado.

Senti minhas mãos queimando por causa da mentira, mas tentei não transparecer. Não fiz um bom trabalho.

— Está se sentindo bem, Ruiva?

— Hã...

Serena se aproximou de Thomas.

— Você está fedendo a cerveja.

— Christopher não serviu cerveja a ele — falei. — Foi bem rígido quanto a isso.

Ela estreitou os olhos.

— Tá. Tchau. E você — ela encarou o irmão. — Para dentro. Já. Sorte que a mamãe ainda não chegou.

Thomas assentiu e entrou na casa. Serena bateu a porta.

— Ela é sempre educada ou é privilégio meu? — indaguei a Christopher, sentando-me novamente no banco do passageiro.

Ele riu um pouco.

— Não, ela é agradável assim com todo mundo, mesmo. Quer aproveitar a carona?

— Se estiver tudo bem por você...

— Bem, agora já estou aqui, mesmo...

— Eu não sei direito onde é a casa, mas fica perto de um lugar chamado Mc Donald's — relatei.

— Ah, já sei.

— Sabe onde é esse lugar?

Christopher abriu um leve sorriso entretido.

— Sim, eu sei onde é o Mc Donald's.

Ele deu partida no carro e o rádio ligou.

—... Olha, a única chance de você ouvir música francesa é se você cantar, ok? Se não vai acabar com Maroon 5.

Eu poderia ter dito que não fazia ideia de o que era Maroon 5, mas achei melhor não.

— Não vou cantar.

Ele fez biquinho, provocando.

— Nem se eu pedir por favor?

Eu sorri.

— Não!

— Tudo bem, pode só quebrar meu coração, então. Está de boa também.

— Britânicos dramáticos...

— Britânicos não são nem um pouco dramáticos, somos um povo sério.

— Estou vendo. Vamos, olhos na avenida.

Quando chegamos à casa dos Watson, Christopher correu para fora do carro e abriu minha porta.

Mademoiselle.

Abri um leve sorriso e desci do carro.

— Valeu pela carona, e pela carona do Thomas também. Sei que foi meio inoportuno, mas...

— Sem problemas — ele deu de ombros. — Acontece o tempo todo.

— Bem... Boa noite, Christopher.

— Boa noite, Anjo.

— Não me chame de Anjo.

— Não me chame de Christopher.

Sorri.

— Não vai acontecer.

Ele cravou os olhos verde-escuros em mim e afastou uma mecha de meu cabelo do rosto.

— Como quiser, Anjo.

E então apenas observei enquanto ele entrava no carro e desaparecia pela rua.


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