Um Cupido (quase) Flechado escrita por Gaby Molina


Capítulo 11
Capítulo 11 - This Argent Is On Fire


Notas iniciais do capítulo

Senti falta de um monte de gente nos comentários do último capítulo ;(



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Serena

— Aqui estamos, enfim — o sr. Oyler bateu uma palma, fitando todos nós, que estávamos dramaticamente em pé, esperando para ser divididos em duas equipes. Cerca de dez pessoas. Eu não sabia dizer aonde os outros haviam ido, mas provavelmente estavam fazendo uma atividade similar. — Vou dividi-los em dois grupos. Um grupo representará legalmente João e Maria, e o outro representará a Bruxa. Hmmmm... Srta. Argent — seu olhar cravou-se em mim e ele abriu um sorriso entretido. — Está com a defesa. E com isso quero dizer que vai representar a vilã. Não há de quê.

— Eu protestaria quanto ao termo prejudicial, sr. Oyler — repliquei, e ele assentiu como se estivesse satisfeito.

Minha equipe continuou se formando. O garoto de sobrenome italiano que respondera à pergunta sobre acusações criminais na primeira aula, um garoto baixinho com cara de intelectual, uma moça morena de vinte e tantos anos e um cara encorpado e caladão que sentou-se na ponta da mesa sem dizer nada.

— Olá — o garoto de sobrenome italiano sorriu para mim. — Matthew Coltello.

— Serena Argent.

— Então... Acho que somos os caras maus, hein? — o outro garoto, baixo e com óculos de grau, tentou esboçar um sorriso.

— Isso — Matthew apontou com a caneta para ele. — é uma questão de perspectiva.

O sr. Oyler nos liberou logo depois, mas Matthew sugeriu que ficássemos para adiantar ideias para a estratégia. Arrumei minhas coisas e disse:

— Não dá, tenho um primeiro encontro com o meu namorado hoje.

A garota morena ergueu uma sobrancelha.

— Espera... Você o quê?

— É complicado. Tchau, gente! Até amanhã.

Corri até a entrada da Evans & Grimmie. Minha mãe estava na porta, como prometera.

Heath

Provavelmente já mencionei muitas vezes que Serena era linda, mas o que posso fazer? Ela era. E, apesar de não ser seu atributo mais marcante, era nele que eu pensava enquanto ela descia as escadas. Os cabelos louros caíam soltos sobre o vestido preto. Notei que ela usava o sapato vinho que compráramos na Macy's há o que parecia uma eternidade. Ponderei se teria sido proposital. Aquela noite seria totalmente estranha ou totalmente incrível, porque eu sabia que aquela garota me maravilhava em um nível que não se atinge num primeiro encontro.

Ela riu ao notar que eu estava de terno. Preto, simples, do meu pai. A gravata também. Não que ela precisasse saber.

— Posso te elogiar? — perguntei quando Serena terminou de descer as escadas. Ela era muito mais dramática do que admitia.

— Meu Deus, Seeler. Todas aquelas temporadas de Gossip Girl não serviram para nada?

Corei. Como diabos ela sabia daquilo?

— Eu... Você sabe que eu só...

— É a única coisa que tinha na TV. Eu sei.

— Você não deveria saber disso.

Ela torceu o nariz.

— Certo. Então, sim, você pode me elogiar.

— Não sei se quero mais — provoquei. — Acho que perdemos a beleza do momento com o seu comentário presunçoso.

Ela abriu a boca, mas depois fechou. Uma raridade, realmente. E então esboçou um sorriso. Não era para ela sorrir. Era para eu ter soado rabugento, mas acho que acabei soando como uma criança mimada. Sorri também.

— Vamos, Argent.

Abri a porta da picape e ela entrou. Dei a volta e entrei também. Acelerei, tentando não me distrair com o rádio alto que ela sempre escutava.

— Argent. Pare de mexer no rádio de um cara que você nem conhece.

— Ah, não é nada pessoal. Eu mexo no rádio de todo mundo — ela deu de ombros e continuou cantando Drops Of Jupiter. Eu tinha de gravá-la cantando aquilo. Realmente tinha. — Então... Gostou de Train, hein?

Não é que eu não tivesse gostado de Green Day e Coldplay. Eram ótimas bandas, mas foi Train que realmente acertou aquele ponto. Aquele ponto no seu subconsciente que não dá para explicar, aquela coisa que você sente sempre que ouve sua música favorita.
E, é claro, tinha Drops Of Jupiter, que me lembrava Serena, e às vezes eu achava que a fazia lembrar de mim também. A música era simplesmente incrível.

So, tell me

Did you sail across the sun?

Did you make it to the Milky Way
To see the lights all faded
And that Heaven is overrated?
Tell me
Did you fall for a shooting star?
One without a permanent scar
And did you miss me while you were looking for yourself out there?

— É — respondi. — É legal.

Tem coisas que é melhor manter para si mesmo.

Serena

Heath abriu a porta novamente. No começo, ele só abriria a porta para me jogar rudemente no banco de trás como se eu fosse um saco de farinha. Agora ele abria a porta às vezes. Também diminuíramos a gritaria. Não que eu devesse estar pensando nisso. Era para ser um primeiro encontro normal, afinal.

Era um restaurante muito bonito. Heath disse seu nome ao garçom e o mesmo indicou a mesa reservada. Aparentemente, era uma noite popular para jantares românticos. Havia uma vela no centro da mesa que nos separava. Passei um minuto notando a forma como a luz da vela refletia nos olhos dourados de Heath. Eu me acostumara com eles. Às vezes eram uma lembrança de sua natureza não-humana, mas em momentos como aquele eram apenas alvo de admiração.

Para um casal que gritava tanto, ficávamos confortáveis no silêncio. Eu podia ouvir os murmúrios dos outros, o som de pratos sendo postos e tirados nas mesas, a porta do banheiro se abrindo ao longe... Heath também podia ouvir. Afinal, ele era Nefilim. Sua audição era muito melhor do que a minha.

Nunca perguntei se ele podia ouvir meu coração batendo. Batia rápido.

— Ah, merda, é um daqueles cardápios chiques — Heath deixou escapar um sorriso, olhando o cardápio. — Sabe, daqueles que têm a menor quantidade de palavras possível? "Sopa". "Frango". "Salada". Sopa de quê?!

Peguei o cardápio, mas não sei direito o que esperava encontrar.

— É, bem, acho que é uma loteria.

— Não. Nada disso. Faz ideia de quanto estou pagando?

— Hmmm... Na verdade, não.

Ele deu de ombros.

— Eu também não sei. Mas não deve ser barato. Então o maldito garçom vai vir aqui e vai me explicar de que é feita a maldita sopa. E no fim eu não vou querer a sopa porque fiquei transtornado.

Sorri.

— Às vezes você me faz duvidar da ideia de eu ser a paranoica do relacionamento — falei. — Quero dizer... A paranoica do... Que seja. Você entendeu.

Ele riu.

— Ei, foi você que começou com tudo isso. Garçom!

Um homem de trinta anos se aproximou de nós.

— Estão prontos para pedir?

Não, só te chamei aqui porque achei seu relógio bonito. É importado?, zombei mentalmente.

— Sim, sim — Heath abriu o cardápio. — Só uma coisa. O cardápio não estava muito claro... De que é a sopa?

— De milho verde, senhor.

Heath me fitou, claramente em um conflito interno.

— Eu amo milho verde.

Eu ri.

— Pede logo.

Ele assentiu e pediu a sopa. O garçom se voltou para mim e perguntou o que eu ia querer.

Olhei o cardápio. Camarão. Não, caro demais. Alguma coisa francesa com atum. Não, estranho demais. Por fim disse:

— O mesmo.

O garçom assentiu novamente e se afastou.

— Não sabia que você gostava de milho verde — comentou Heath.

Dei de ombros.

— Não sei se gosto. Nunca comi.

Ele riu, incrédulo.

— Está brincando! Eu moro aqui há um ano e já comi! Como você pode não ter...

— Bem, logo verei o que estava perdendo.

Heath

— Conte-me, como estão as coisas no estágio?

— Ah! — ela esboçou um sorriso. — Vamos fazer João e Maria. No caso, eu sou a advogada da bruxa.

Eu ri.

— Isso não é um pouco injusto?

— Só se você for um advogado medíocre.

— Sério, como diabos você pode culpar João e Maria pelo incidente?

Ela deu seu sorriso de queme estava tramando algo incrivelmente astuto.

— Você vai ver.

Depois de alguns minutos, a comida chegou. Fitei Serena com expectativa enquanto ela tomava um gole da sopa. Seu veredito levou alguns segundos.

— Nada mau.

Sorri e tomei a sopa também. É, estava boa.

— Já quer pedir o prato? — indaguei quando terminamos.

Ela assentiu e eu voltei a chamar o garçom. Acabamos pedindo carne, porque o resto das coisas tinha nomes franceses que Serena (cuja família materna era francesa, daí Argent) parecia estar traduzindo errado.

— Hmmm... Dedos de... Gato?

— Acho que gatos sequer têm dedos, Argent.

— Mas é o que está escrito!

Por fim acabamos não pedindo Dedos de Gato, ou o que fosse. Pedi alguma variação de bacon que Serena dizia conseguir identificar um animal mutilado no prato. Ela pareceu ultrajada quando isso não tirou meu apetite, mas, fala sério, ela não estava pagando.

— Anjos não deveriam comer carne, deveriam? Quero dizer, "Todos são iguais aos olhos de Deus" e tal.

Eu sorri, apontando-lhe o garfo.

— Argent. Eu sou um anjo de merda, quando você vai se conformar? Pergunte à Celeste, mas se prepare para o discurso do GreenPeace.

Ela torceu o nariz.

— É, deixa para lá.

Continuamos comendo. Serena não me deixou usar Charme Angélico para convencer o garçom a lhe servir cerveja. Lembrei-me de quando ela estava revisando comigo as normas de álcool para menores de idade e disse ao cara que ela podia beber se estivesse acompanhada de um maior de idade (eu). Ele riu da minha cara.

Então Serena bebia sua Coca e eu bebia Coca com ela porque é isso o que você faz, como naquele poema que ela gosta, daquele cara lá. E que passa naquele filme daquele cara louro bonitão.

Palavras dela, não minhas. Certo, talvez minhas também.

Como se estivesse lendo minha mente, ela citou:

— "Tomar Coca-Cola com você é ainda mais divertido do que ir a São Sebastião, Irún, Hendaye, Biarritz, Bayonne / Ou ter dor de estômago na Travesera de Gracia em Barcelona / Em parte porque em sua camisa laranja você torna São Sebastião ainda mais feliz / Em parte por causa do meu amor por você, em parte por causa do seu amor por yogurte..." — ela abriu um meio-sorriso.

Eu gostava de ouvi-la citando as coisas, se perdendo nas próprias palavras. O jeito que os olhos azuis brilhavam, contrastando com a luz de velas, o jeito que ela gesticulava sem perceber. Conheci vários caras que jamais notariam algo assim sobre suas namoradas, e fiquei me perguntando se eles eram idiotas ou se nunca tinham conhecido alguém como Serena. Alguém que você simplesmente sentisse prazer em observar.

Ela terminou a Coca e limpou os lábios com guardanapo, por fim colocando-o na mesa. A coisa toda desandou quando o guardanapo começou a pegar fogo.

Aparentemente, ela o colocara perto demais da vela*. Eu às vezes me esquecia de por que chamava Serena de Gato Preto.

Serena fez um movimento brusco e a vela tombou. Disse para ela levantar e ela o fez. Peguei a vela e a apaguei antes que ateasse fogo a mais alguma coisa.

Eu estava esquecendo alguma coisa.

Ah, sim. O guardanapo. Serena pegou o resto de minha Coca e tentou apagá-lo, mas errou a mira e acertou uma mulher que passava por ali. Joguei o guardanapo no chão e comecei a pisar nele até que apagou.**

Eu e Serena nos fitamos por um longo minuto, e eu soube que bem ali a coisa toda de ser formal fora por água abaixo. Então apenas alongamos um sorriso que se transformou numa crise de risos.

— Eu saio do papel de anjo da guarda, mas o anjo da guarda não sai de mim.

— É realmente uma maldição.

Nosso garçom se aproximou correndo. Aparentemente, alguém contara a ele que quase botáramos fogo na mesa (que era de madeira, falando nisso. Ops).

— Os senhores estão bem?!

— Ah, claro — eu ainda ria um pouco. — Ela já foi atropelada uma vez. E nem foi por um carro grande, foi por um March. Isso aqui não é nada.

O garçom não sabia muito bem como responder, então apenas disse:

— O senhor já vai querer a conta?

Eu e Serena nos fitamos por um minuto, cientes de que todo o restaurante nos observava. Por fim eu respondi:

— Nah, vamos ficar para a sobremesa.

Puxei a cadeira e Serena se sentou, ainda engolindo o riso. Sentei-me também. Ela pediu pudim, como se não conseguisse ser mais britânica, e eu pedi um "mousse". De quê? Sei lá. O cardápio não dizia.

Quando chegou, não soube de que era. Maracujá, talvez. Comemos lembrando de todos os nossos desastres, alfinetando um ao outro como sempre, e não tentamos fingir que éramos um casal comum num primeiro encontro, porque não éramos. O simples fato de estarmos ali tentando ter um primeiro encontro provava isso.

Havia algumas coisas que eu me lembraria mais naquela noite, e não eram nem de perto as que eu achei que me lembraria quando saí de casa para buscá-la. Acho que essa era a coisa com a gente: nunca se sabia o que ia acontecer.

Então talvez um dia contássemos a história daquela noite, e eu me lembraria de como ela estava linda, e de como o cardápio era uma merda, e de como ela pôs fogo no guardanapo e derramou Coca numa mulher que passava, das risadas que demos depois daquilo, do gosto daquele mousse desconhecido...

Eu só esperava conseguir me esquecer do tamanho da conta que veio logo depois. Paguei com o cartão de crédito que eu pegara emprestado com Frederick. Eu pagaria de volta. Eventualmente.

Levantamo-nos e saímos do restaurante. Demos dois passos na rua antes de ela me puxar pela mão em seu encontro e me beijar. Nos separamos, sorrindo por um momento.

Então, é, eu me lembraria dela, e do cardápio, e do guardanapo incendiário, e do vestido arruinado da mulher, e das risadas, e do mousse, e da conta, e do melhor beijo da minha vida, exceto pelo beijo mais longo que veio logo após aquele.

Eles diziam que você não podia ser melhor amigo da pessoa pela qual estava apaixonada. Eles estavam errados.

A lembrança de Damien deu uma pontada em meu estômago. Não, pensei. Agora não.

Entrelacei meus dedos nos dela e esbocei um sorriso.

— Vamos?

Ela assentiu, afastando o cabelo do rosto. Entramos no carro e logo o rádio alto estava de volta. Mas eu não liguei. Apenas gritei Living On A Prayer com ela (apesar de eu só saber o refrão e estar estragando completamente a música). Logo chegamos à casa dela. Desci do carro e abri a porta. Ela me fitou por um minuto, com um sorriso entretido nos lábios.

— O que foi? — perguntei, erguendo uma sobrancelha.

— Eu te amo para caralho, Seeler.

— Bom mesmo, porque eu estraguei meu sapato social para apagar o seu guardanapo.

Ela mostrou a língua.

— Isso lá é resposta que se dê?

Eu ri.

— Eu também te amo para caralho, Argent — eu a abracei, e poderíamos ter ficado ali para sempre.

— Quer entrar?

— Patricia não gosta tanto assim de mim.

Ela riu.

— Isso nunca te impediu.

* * *

Olha, subir na janela era bem mais fácil quando eu tinha asas, mas ainda dava para fazer sem elas. Serena abriu a janela. Havia tirado os sapatos, mas ainda estava com o vestido formal. Tirei a gravata (odiava aquela coisa) e os sapatos. Ela se deitou e eu me deitei ao lado dela, abraçando-a. Ficamos ali por vários minutos antes de ela dizer:

— Quer ficar?

Fingi estar ultrajado.

— Meu Deus, Argent, você está convidando um homem para a sua cama no primeiro encontro?

Ela tentou me sufocar com o travesseiro, e eu me ocupei rindo. Na primeira e única vez que eu dormira ali, achava que iria embora em breve. É, agora decerto era uma situação bem diferente.

Beijei a testa dela.

— Se quiser que eu fique.

— Que frase idiota. Se eu convidei, é claro que quero que fique.

— Você não pode deixar uma passar, não é mesmo?

— Jamais.

Sorri.

— Não seria a garota por quem me apaixonei se deixasse.

— Exatamente. E não iríamos querer que isso acontecesse.

— Sim, então continue sendo insuportável. Sei que não precisa se esforçar muito.

Ela me deu uma cotovelada no peito, mas estava de costas, então mirou errado, acertando bem no osso. Provavelmente doera mais nela do que em mim. Frustrada, disse:

— Boa noite, Seeler.

Sorri.

— Boa noite, Argent. Sonhe comigo.

— Se eu acordar gritando, já sabe o que aconteceu.

Deixei escapar um riso.

Serena

Eu havia fechado a porta? Acordei pensando nisso de manhã, se for ser sincera. Desvencilhei-me dos braços de Heath e caminhei até a porta, forçando a fechadura. Trancada.

— Já vai fugir? — ouvi sua voz sonolenta atrás de mim. Ele se sentou, afastando o cabelo dos olhos dourados. — Bom dia.

— Bom dia — esbocei um sorriso. — Te acordei?

— Não, já estou acordado há horas. Thomas esmurrou a porta há uma hora, falando nisso. Queria saber algo sobre "Que horas a mamãe volta hoje".

— Obrigada, Secretária Eletrônica. O que há com esse moleque? Ele está pior do que eu. De repente parece que eu sou a filha boazinha.

Heath apontou para si mesmo.

— Eu não teria tanta certeza disso. Além do mais, você está namorando comigo. Não pode ser tão boazinha assim.

— Ah, é, faça a pose de badboy — zombei.

Ele se levantou e se aproximou de mim. Sem dizer nada, me deu um beijo de bom dia.

Thomas

— Mãe, vou ao cinema, ok?

— Com quem?

Geralmente pais eram mais protetores com suas filhas mulheres, mas comigo era o contrário. Não sei se era porque eu era o caçula, mas Patricia não dava a mínima quando Serena voltava de madrugada de um encontro com o namorado, mas eu tinha que explicar detalhadamente minha ida ao cinema no sábado.

— Com um pessoal do time de futebol. Volto antes de escurecer, é só um cinema.

— Ah, Serena está indo também, você pode ir com ela.

Nisso, minha irmã descia as escadas, enfiando o celular na bolsa marrom com franjas.

— Serena, você vai ao cinema com o time de futebol? — recapitulei, erguendo uma sobrancelha. — Você?

— Audrey está me implorando para ir, algo sobre... — ela parou de falar. — Deixa quieto. É, eu vou. Não sabia que você ia. Bem, isso é uma merda.

Algo em que concordávamos.

— Diga à Audrey que não está se sentindo bem.

— Thomas, minha melhor amiga precisa de mim, então estarei lá por ela, capiche? Além do mais, tenho um fraco enorme por comédias românticas.

— Vamos assistir a uma comédia romântica? — repeti. — Está brincando, certo?

Ela sorriu.

— Estou. Vamos, maninho.

* * *

— Mas você não tem dezoito anos— lembrei Audrey na metade do caminho.

— Consegui uma carteira provisória mais cedo. É uma longa história. Ei, o baile dos calouros é na semana que vem, não é?

— É.

— Quem terá o prazer da companhia de Thomas Argent?

— Não sei ainda.

— Thomas está totalmente caidinho pela vizinha nova! — Serena provocou, rindo.

— Estou nada!

— Está si-im! — ela cantarolou.

— Olha a sua moral para falar!

— Ei, eu disse que você está todo apaixonadinho, e não que eu não estou. Argh, admiti mesmo isso?

— Ah, merda, você não me contou! — Audrey bateu no volante para enfatizar, acionando a buzina por engano. — Ops. Hehe. Como foi ontem?

Serena desviou o olhar, observando a paisagem. Eu a conhecia bem, sabia que estava perdida em devaneios. Ela deixou escapar um sorriso, o tipo de sorriso singelo que dava quando achava que ninguém estava olhando.

— Foi bem legal.

— Ah, qual é! O que você estava vestindo? O que ele estava vestindo? Ele abriu a porta do carro? Trouxe presentes? Aonde vocês foram? Ele pagou a conta, certo? Vocês chegaram a...

Serena deu uma cotovelada em Audrey para que essa parasse de falar. Audrey achou que era porque eu estava no carro, mas eu sabia que Serena não responderia aquela última mesmo se eu não estivesse lá.

— Eu pus fogo no guardanapo — contou minha irmã.

Audrey franziu o cenho.

— Isso é uma gíria para...

— Não, Audrey. Não é uma gíria para nada. Eu pus fogo no guardanapo.

Audrey continuou perguntando, mas Serena não respondeu.

Serena

Eu estava começando a me lembrar do porquê de odiar o time de futebol. Eles eram babacas.

Digo, não todos eles. Só... É, todos eles. Três deles faziam balança-caixão na fila do cinema, duas líderes de torcida conversavam alto sobre qual Hemsworth era mais gostoso, Audrey observava Chris ao longe com uma expressão que poderia ser considerada predatória... Em todos os sentidos, provavelmente. E Celeste estava grudada em mim como se eu fosse seu último resquício de oxigênio. Era difícil determinar quem estava me irritando mais.

Chris e Thomas pelo menos estavam longe, comprando pipoca, então eu não conseguia ouvir as asneiras que eles provavelmente diziam. Qual é, não é como se discutissem a origem do universo ou a autocracia. Às vezes olhavam para nós, provavelmente tentando decidir qual líder de torcida tinha a bunda maior.

Realmente, a única parte boa era que Leslie não viera conosco. Então foquei-me nisso.

— Ei — disse uma voz atrás de mim. Dei um pulo, e Chris abriu um leve sorriso constrangido. — Desculpe. Não quis te assustar. Quanta manteiga na pipoca?

— Muita — respondi.

— Ah. Ok. Eu... não achei que você fosse vir.

— Bem, aqui estou.

— Não me entenda mal, acho legal você vir.

— Ahã — abri um sorriso presunçoso.

Ele franziu o cenho.

— O que quer dizer?

— Você não vai com a minha cara, Jacobs, nós dois sabemos disso.

Ele recuou.

— Mas isso não significa que não possamos nos dar bem.

— É exatamente o que isso significa.

— Bem... Hmm... — ele corou levemente, cobrindo as orelhas com a touca cinza. — Muita manteiga. Está bem — e então se afastou.

Não pude evitar sorrir. Poderíamos ser amigos, em outro universo. Em um universo onde eu não fosse uma vaca controladora e ele não fosse o capitão babaca do time de futebol. Sim, talvez.

— Serena? — Celeste me chamou. Eu havia me esquecido de sua presença. — A fila andou.

Assenti e entramos na sala.


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Notas finais do capítulo

*Baseado em uma história completamente real.
*Desculpe, moça em quem joguei Guaraná. Seu vestido era bonito. E desculpe por foder a sua calça e o seu sapato, Guilherme. Você era um cara legal. Provavelmente deveria ter escolhido uma mesa melhor.