PARADOXO PERFEITO - Draco & Hermione escrita por AppleFran


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Olá leitores,Antes de mais nada, gostaria de alertar a todos que essa fanfic nunca foi profundamente revisada, portanto eventuais erros de digitação estão sujeitos a aparecer, mas nada que venha comprometer a compreensão da história. Essa foi a primeira fanfic desse casal maravilhoso que tive o prazer de terminar. Espero que todos tenham uma excelente leitura. :)



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A iluminação em seu quarto quase o cegou quando acordou naquela manhã fria em Dublin. Lembraria de fechar as cortinas da próxima vez. Olhou para o lado e reconheceu o corpo desnudo da mulher que conhecera na noite anterior na festa de premiação da Liga Internacional de Bruxos Fornecedores de Matéria-Prima na França. Não conseguia se lembrar do nome dela. Fechou os olhos e prendeu o ar enquanto apertava os olhos com os punhos. Piscou várias vezes até se acostumar com a iluminação e soltou o ar focando as horas no relógio em seu braço. Precisava ir trabalhar.

Sentou-se na cama e olhou novamente a mulher dormindo ao seu lado. Tentou se lembrar do nome e não obteve êxito novamente. Céus! Como ele odiava acordar ao lado de alguém. Isso lhe trazia lembranças muito desconfortáveis. Talvez estivesse realmente cansado. Nunca se permitia pegar no sono ao lado das mulheres que levava para a cama.

Jogou as pernas para fora do colchão e passou o olhar pelo quarto em busca de todas as suas roupas bolando rotas de qual delas buscaria primeiro. A mulher na cama se mexeu. Ele fechou os olhos frustrado ao saber que não poderia mais ir embora sem ser percebido. Sentiu seus braços gelados lhe cercar o tronco. O corpo dela colou em suas costas e ele sentiu uma respiração quente em seu ouvido.

– Bom dia. – ela sussurrou em uma voz muito melodiosa. A doçura o fez sentir raiva. Ele não a respondeu. – Alguém cortou sua língua?

Ele arrumou a postura buscando ar.

– Tem flu em cima da lareira se precisar que alguém venha lhe buscar. – ele foi frio.

Ela pareceu levar um tempo para processar as palavras dele, mas logo em seguida se afastou e puxou os lençóis para se cobrir.

– Não. – falou incerta – Eu posso aparatar.

– Ótimo. – ele apenas disse se levantando e passando a se vestir. Ela mantinha-se na cama olhando para ele como se tentasse entender o que havia acontecido com o homem que tinha a levado para a cama na noite anterior.

– O que há de errado com você? – ela quis satisfação.

– Estou atrasado. – ele vestiu a camisa, catou sua varinha na cabeceira da cama e depois bateu a porta deixando-a sozinha no quarto.

Quando desceu as escadas do prédio e se deu nas ruas turvas do mundo bruxo de Dublin percebeu que o dia já havia começado a um bom tempo por ali. Aparatou na porta de sua casa na Califórnia e o sol dava indícios que ainda nasceria. Ele entrou e trocou suas roupas, se alimentou e aparatou novamente. Dessa vez foi no enorme saguão principal da CMFM - Companhia Malfoy de Fornecimento Marítimo - no Triângulo das Bermudas. Das vidraças ao redor ele via os enormes jatos de água que cercavam sua edificação. Andou confiante pelo saguão e viu seus empregados lhe lançarem os costumeiros olhares tímidos enquanto esperavam o elevador.

Assim que chegou ao andar da diretoria foi recebido por sua secretária. Ela veio com um turbilhão de problemas sobre os níveis de pressão no fundo do oceano estarem começando a ficar imunes aos feitiços que ele havia criado e que isso acarretaria na falta de estoque para poções encomendado pelos milhares de hospitais do mundo inteiro. Ele pediu que mudasse de assunto enquanto caminhava para sua sala e ela apertava o passo para acompanhá-lo.

Sempre adorara a poltrona de seu escritório. Couro de dragão jovem, os melhores. Afundou-se nela enquanto ainda escutava sua secretaria falar sobre encomendas de escolas.

– Encerre contrato com as escolas. – ele disse tomando em seguida um longo gole de seu chá de canela que sempre o esperava em sua mesa.

– O que? – indagou surpresa a secretaria.

– Eles não pagam bem. – ele respondeu puxando o principal jornal da América do Norte.

– Mas nós somos os únicos fornecedores! – ela o alertou.

– Escute, Sra. Miller. Na minha época de escola eu também não tinha ingredientes desse nível de raridade pra brincar de poções. Nós gastamos milhões para tirá-los do fundo do oceano e vamos dá-lo a quem nos paga bem! – ele virou a página do jornal. – Cancele os contratos.

Ela revirou os olhos e deu meia volta.

– Meu Deus! Você precisa de uma esposa! – resmungou e bateu a porta.

Ele riu. Folheou o jornal e percebeu que tudo que lia não lhe interessava. Voltou para a página principal e viu que não lia o Profeta Diário. Revirou os olhos ao se lembrar de que Miller sempre organizava os jornais de modo que o fizesse desistir de assinar o insignificante jornal Inglês. Sorriu e tomou mais um gole de seu chá. Folheou novamente o jornal da América e numa de suas passadas de folha leu o nome de Harry Potter. Parou e voltou a página. Não havia imagens, mas lá estava o nome do famoso bruxo assassino de Lorde Voldemort associado com a palavra noivo e o nome de Hermione Granger. Ele não quis ler o título novamente e fechou com pressa o jornal. O focou fechado em cima de sua mesa por segundos e então o jogou no lixo. Focou o mogno lustroso a quem o jornal dera lugar e novamente e em sua mente passou a desenho das letras associando Harry Potter, noivo e Hermione Granger.

Olhou a pilha de jornais ao lado de sua caneca. Sabia que o Profeta era o último. Pegou o segundo jornal da pilha e logo na segunda página havia o nome de Harry Potter grifado novamente. Dessa vez havia sua imagem mais famosa estampada ao lado do enorme título que dizia novamente sobre Harry Potter, noivado e Hermione Granger. Ele fechou o jornal. Talvez na próxima folha houvesse alguma imagem que não quisesse ver. Jogou todos os jornais no lixo.

Puxou um velho telefone encardido para junto de si e apertou o botão que dava para a secretária.

– Miller. – ele a chamou.

– Sim, Sr. Malfoy. – ela respondeu em sua voz rachada.

– Marque reunião em minha sala com o departamento de criação de feitiços. Peça-os para que tragam os números correspondentes ao nível de pressão.

– Sim, senhor. Apenas isso?

Ele hesitou na linha.

– Cancele a assinatura com o Profeta Diário.

– Sim, senhor.

Ele desligou. Tomou o resto de seu chá em um gole só e focou por um bom tempo os jornais no lixo. Bufou e puxou o Profeta de lá. O abriu e lá estava a enorme matéria na primeira página: Harry Potter fica noivo de Hermione Granger.

Começou a ler as primeiras linhas e não pode continuar. Olhou a imagem enorme que estampava a matéria e finalmente a viu. Lá estava Hermione Granger em seu famoso, belo, discreto e casual vestido saindo de um pub no Beco Diagonal acompanhada de Harry Potter em seus trajes de auror. Ela o abraçava, passava a mão em seus cabelos e lhe dava um beijo nos lábios sorrindo. Ele a apertava forte pela cintura e então eles se despediam e seguiam caminhos diferente. Em uma imagem logo abaixo havia o zoom em sua mão quando ela a passou pelos cabelos dele. O anel estava lá. Ele gritava em sua mão.

Ele a olhou na primeira imagem novamente. Seus cabelos castanhos descendo em cachos largos e uniformes pelas suas costas, suas bochechas rosadas apertando seus olhos dourados quando estava sorrindo. Ele se lembrava de tudo aquilo. Se lembrava de como seu cabelo refletia o sol da manhã em contraste com a fronha branca de um travesseiro qualquer. Se lembrava de vê-la acordar, se mover devagar e o pegar a assistindo. Se lembrava de como suas bochechas coravam e de como ela sorria tímida perguntando o que ele estava olhando, e quando ele respondia que estava a observando dormir ela ria e pedia para que parasse com isso. Se lembrava de como ela se sentava na cama e de como suas costas se alinhavam sobre o fino tecido de uma de suas blusas ao se espreguiçar. Tudo se tornava sério e então ela se virava para ele e perguntava o que teriam para o dia. Eram tempos difíceis aqueles, mas ela ainda encontrava uma brecha para sorrir sempre que podia e era lindo. Ele se lembrava de tudo. Se lembrava de seus olhos dourados, de sua voz doce e de seu cheiro de rosas. Ele só se lembrava.

Levantou-se com raiva e amassou o jornal devolvendo-o para o lixo. A veia de sua têmpora pulsou. Ele se lembrou de como nunca a merecera. Pegou sua caneca e a lançou contra a parede. A porcelana esparramou-se pelo chão e a voz de Miller soou do telefone informando que os diretores do departamento de feitiços estavam a espera do lado de fora. Ele pegou o telefone e apenas gritou que precisava de dez minutos.

**

Seu olhar estava fixo nos vitrais da janela. Não tão longe ele avistava Hermione Granger de pé sobre a sombra de uma árvore à beira do extenso lago de Hogwarts. O movimento de seu vestido junto com seus cabelos indicavam o lado para o qual o vento soprava. Ele piscou. Se perguntava por quanto tempo seria obrigado a aguentar aquela sangue-ruim.

Toda a realidade daqueles dias estava jogada na mão de todos eles, a Ordem, mas para Draco Malfoy era diferente, ele só tinha uma missão: encontrar Régulus Black. Não para o bem da Ordem ou do mundo bruxo, mas para o bem de sua própria família.

Ele havia se tornado um Comensal da Morte. Por obrigação. A sombra de Voldemort sempre atormentara a família Malfoy. Era a única fonte de medo que os tirava todo o poder. Draco se lembrava bem de ter crescido em uma família que perdia o sangue e ficava muda quando se pronunciava o nome do lorde das trevas. Se lembrava do eterno medo que assolava a família apenas pela incerteza de um lorde morto ou vivo, a eterna questão de ser ou não submisso mesmo com sua ausência. Todo esse medo ainda era escondido por seus pais, mas quando o lorde ressurgiu, ele viu com todas as letras e pingos nos “is” a fragilidade dos Malfoy. O pavor de sua mãe, a fraqueza de seu pai. Eles estavam a serviço exclusivo do lorde, e se por um descuido pisassem fora da linha, minimamente que fosse, estariam por um fio de perder a própria vida. A família Malfoy estava de volta a ditadura, e Dumbledore soube exatamente como persuadir Draco Malfoy a livrá-lo dela.

O único problema era que encontrar Régulus Black, um homem que ele acreditou estar morto, não seria uma tarefa fácil de se completar. Ele era o único comensal vivo que sabia todos os caminhos possíveis para passar a perna em Voldemort. Era o único que conseguiria livrar a família Malfoy das mãos do poderoso lorde das trevas sem que eles perdessem a vida. Dumbledore precisava de duas mentes excelentes trabalhando em conjunto. Foi quando convocou Hermione Granger para acompanhar Draco Malfoy em sua missão. O pedido foi recusado, obviamente, por justa causa. Granger não prestaria serviço algum de ajuda a quem não perdia tempo em humilhá-la, ainda mais um serviço que a tiraria de tudo e de todos, sabe-se lá por quanto tempo.

Dumbledore não deu muitas esperanças a Malfoy de que ele poderia conseguir encontrar o antigo comensal fugido sem ajuda de uma mente brilhante como a da garota. Ele desistiu de escutar o velho e seguiu sua vida de comensal com seus planos de matar o próprio para que Voldemort não matasse sua família.

Claro que ele não foi capaz. Snape tratou de fazer o serviço na última hora, mas o que ele não sabia era que na verdade, tudo havia sido combinado. Snape conseguiu levar Draco em segurança para a Ordem antes que fosse morto por seus serviços ineficazes dentro do ciclo de comensais. Lá estava ele, vivendo em Hogwarts, agora fechada pelo ministério, com toda a tropa de Ordem da Fênix, estudando os pergaminhos que Dumbledore deixara para ele sobre como conter a ligação que tinha com Voldemort pela marca de comensal gravada em seu braço.

O que ele menos esperava dentro daquele castelo era a procura de Hermione Granger dizendo que o ajudaria a encontrar Régulus Black por Dumbledore e por Harry Potter. Snape tratou de convencê-lo em voltar ao plano e agora, ali naquela biblioteca, observando Hermione pela janela, ele selecionava os livros que deveria levar consigo. Ainda não conseguia saber o que seria pior, estar ali naquele castelo com todos os membros da Ordem o olhando torto ou ter que conviver com Hermione Granger todos os dias. Ele estava acreditando que ter que conviver com Hermione era pior.

Ele alinhou sua pilha de livros agitando sua varinha e olhou novamente Hermione pela janela. Ela parecia uma estátua ali de pé encarando o lago. Mesmo com todo seu ódio pela garota, não podia negar o quanto aquela mente era rápida, precisa, e incrivelmente esperta. Em duas semanas eles haviam conseguido refazer os últimos passos de Régulus Black e montar uma lista de lugares que deveriam visitar. Dumbledore estava certo sobre o trabalho em conjunto de suas mentes.

Amarrou seus livros e os colocou dentro de sua mochila. Usou um feitiço para fazer com que ela ficasse mais leve e abriu os pergaminhos que Dumbledore lhe deixara. Eram feitiços muito complexos e ele precisava dominá-los melhor porque a dor em seu braço era culminante quando vacilava com a magia de Dumbledore. Voldemort estaria furioso por ter um comensal fugido e vivo cuja a marca em seu braço não o tivesse matado por ter se tornado um traidor.

Voltou a encarar Hermione pela janela e dessa vez ela havia ganho companhia. Harry Potter agora estava ao seu lado com as mãos enfiadas no bolso das calças. Voltou para o seu pergaminho e começou a utilizar todos os seus conhecimentos sobre desintegrar magias para compreender os detalhes de Dumbledore. Quando finalmente voltou a olhar pela janela bufou e revirou os olhos ao encontrar os dois abraçados debaixo da copa da árvore, com as testas grudadas e uma troca nauseante de carícias. Ele certamente não precisava daquela vista. O casal trocou um beijo e Draco fez uma careta de nojo. E se diziam apenas amigos para todos. Se perguntou quantos benefícios aquela amizade tinha e riu consigo mesmo. Alguém como Potter merecia mesmo uma sangue-ruim.

Não demorou para que ela voltasse a ficar sozinha. Ele apenas estudava seus pergaminhos. E durante todo o tempo que ele esteve ali, ela também estava lá fora, encarando o lago, e deixando seu vestido apontar a direção do vento.

Ele finalmente se levantou jogando a mochila num dos ombros e apertando os pergaminhos de Dumbledore em sua mão. Olhou mais uma vez pela janela. Ela continuava lá. Ele respirou fundo e soltou o ar pela boca. Deu as costas e desceu para os jardins do castelo.

Já era meio de tarde e ele acreditava que ela pretendia ficar ali até depois do pôr-do-sol quando caminhou até ela pela grama do jardim bem cuidado. Tinha até uma idéia do que ela estaria fazendo ali, encarando aquele lago como uma estátua. Talvez ela estivesse se despedindo da proteção que o castelo lhe dava. Assim que saíssem para o mundo lá fora, tudo seria uma grande correria incerta. Voldemort o conseguiria encontrar pela sua marca de comensal facilmente. Ele tinha apenas um dia e algumas horas de atraso graças a magia de Dumbledore, por tanto não poderiam permanecer em um local mais do que isso. Sem contar que teriam que se deslocar pelo mundo dos trouxas para que pudessem confundir ainda mais os comensais que Voldemort mandaria a sua procura. Tudo ainda estava muito tranquilo enquanto estavam todos protegidos pelo castelo.

Ele se aproximou com cuidado quando finalmente ficou sobre a copa da árvore, juntando-se a ela.

Granger. – ele a chamou.

Ele a viu levar rapidamente as mãos para o rosto limpando qualquer coisa que estivesse ali, no entanto permaneceu-se de costas.

Malfoy. – ela disse em resposta, com a voz baixa e cansada.

Ele achava irritante a forma profissional com a qual eles haviam sido obrigados a se tratar para que o serviço que deveriam cumprir tivesse sucesso.

Vamos deixar o castelo hoje a noite. – ele informou.

Ele a viu suspirar, hesitar e assentir calada com a cabeça. Ele ainda deu tempo esperando que talvez ela fosse dizer algo discordando, mas ela apernas permaneceu calada em sua concordância. Draco deu as costas e seguiu de volta para o castelo, mas antes que pudesse deixar a sombra da copa da árvore ele parou e se voltou mais uma vez para ela.

Tem certeza de que quer fazer isso? – ele não soube exatamente porque se permitiu fazer essa pergunta, mas surpreendeu-se por vê-la assentir sem hesitar dessa vez.

No fundo de seu coração ele se sentiu de certo modo grato por ela poder proporcionar a ele a chance de salvar sua família. Suspirou e finalmente voltou a deixar a garota se despedir só.

**

Draco aparatou pela terceira vez naquela semana no centro mais movimentado do mundo bruxo da Inglaterra. Respirou cansado olhando o tumulto das ruas turvas do Beco Diagonal se estender pela sua frente. Andou com no mínimo 80% de pressa a menos do que as pessoas que circulavam por ali e ainda se achou rápido demais. Quando finalmente conseguiu desviar para dentro da Travessa do Tranco encontrou-se em casa. O barulho bem menos intenso, as pessoas andando sem pressa, as ruas quase vazias. Ele tinha saudade daquele lugar. Lembrava-lhe os tempos de Hogwarts, onde ele simplesmente se achava o rei de todo o país.

Seus pés o levaram quase que inconscientemente para o pub que costumava ir com seu pai quase todos os finais de semana. A pequena entrava na esquina, os vidros empoeirados, a fachada apagada e despretensiosa, tudo era exatamente igual quando o conhecera em sua infância. Entrou e viu o velho passando um pano encardido em um copo de vidro. O mesmo velho de sua infância.

– Olá, Draco. – o velho soltou assim que o viu passar pela porta.

Draco aproximou-se do balcão calado e estendeu a mão. O velho já sabia exatamente o que ele queria. Largou o copo que lustrava sobre a madeira velha do balcão e abriu um quadro de chaves embutido na parede. Tirou de lá uma chave enferrujada e entregou-a na mão estendida de Draco.

– Uma cerveja amanteigada. – Draco pediu e o velho tirou uma de baixo do balcão e entregou também a ele.

– O que te traz de volta a Inglaterra depois de tantos anos, Draco? – perguntou o velho que o conhecia desde sua infância.

Draco abriu sua cerveja, deu um longo gole e a encarou por um bom tempo em silêncio quando a devolveu ao balcão.

– Ainda estou tentando entender. – respondeu numa voz baixa. Encarou mais uns segundos sua cerveja ate respirar fundo e voltar a falar. – Não diga a ninguém que estive aqui novamente, por favor. – pegou sua cerveja e rumou para a escada mal feita no fim do recinto.

A escada rangia como nos velhos tempos, o corredor fedia a mofo e era completamente insalubre como sempre fora, o papel de parede já pendia por ela e a madeira do piso estava fofa. Draco amava tudo aquilo. Quando chegou ao quarto no fim do corredor teve a mesma sensação nostálgica dos outros dois dias naquela semana que estivera ali. Seu pai sempre o levava ali para fugirem da mansão Malfoy e passarem um divertido final de semana praticando tudo de errado que se podia haver no mundo.

Draco entrou e logo avistou seu smoking estendido sobre a cama exatamente como pedira. Ao lado havia um pedaço de pergaminho que ele logo tratou de pegar para ler. Era o convite para o encontro anual da alta corte do Ministério da Magia. Ele não podia entrar, claro, não trabalhava para o Ministério, mas sempre fora muito influente e conseguir aquele convite havia sido tão fácil quanto marcar ponto no Quadribol sem time adversário, goleiro e balaços.

Jogou-se sobre uma velha poltrona próximo a janela e observou o convite em sua mão enquanto dava uma breve gole em sua cerveja. Por que ele estava fazendo aquilo mesmo? O virou de um lado para o outro enquanto ponderava sobre sua estupides e finalmente desistiu de ficar encarando aquele convite.

Afundou-se mais na poltrona e fechou os olhos. As duas últimas vezes que estivera ali observara de longe Hermione. Uma em um evento no Ministério ao qual ela fez a abertura e outro em uma biblioteca nacional onde ela estudava em silêncio com um copo de café ao seu lado. Se perguntou o porque de estar fazendo aquilo e tomou mais um longo gole de sua cerveja agonizado por essa pergunta.

Sabia que ainda a amava. Como a amava. Havia sido a única em toda a sua existência e pra sempre seria ela a mulher destinado a amar. Ele duvidou por muito tempo desse pra sempre, mas dia após dia ele se provava permanente. Nunca a esquecera, achou que seria capaz, mas nunca foi. Então por que depois de todo esse tempo em que ele havia se acomodado a amá-la sozinho de repente foi tomado pela agonia de precisar vê-la?

Depois que todo o mundo bruxo tratou de estampar em sua cara o noivado da mulher que aprendera a amar ele precisou passar por um processo de aceitação um tanto quanto torturante. Sabia que a amava, mas aquilo não precisava lhe torturar naquele grau de agonia. Acordou uma noite como se alguém estivesse o sufocando e seu único alívio foi aparatar em Londres e a assistir ler um enorme texto na abertura de um evento qualquer dentro do Ministério. Vê-la foi como arrancar um monstro de sua hibernação. Ele ainda a queria com uma força ainda maior do que ele sentira há anos atrás.

Naquele dia passou a noite acordado no mesmo quarto em que se encontrava agora. A voz dela lendo aquele texto soava como uma fita gravada repetida vezes em sua cabeça. Se lembrou de todas as vezes que aquela voz havia sido direcionada para ele e então se encontrou em um estado lamentável largado naquele quarto com garrafas de bebidas esparramadas. Levantou-se, foi embora e prometeu nunca mais voltar, nunca mais vê-la, nunca mais sequer se lembrar dela.

Dois dias depois ele estava de volta. A observou por um tarde inteira na Biblioteca Nacional. Ela ainda tinha todas as manias das quais se lembrava quando estava lendo um livro e forçando seu raciocínio. Na mesma noite estava ele embriagado no chão daquele mesmo quarto torcendo-se de agonia. Ele precisava falar com ela, precisava olhar nos olhos dela, precisava escutar a voz dela ser direcionada para ele. Ele precisava! E ali estava ele, com o convite na mão. Talvez essa noite pudesse ter a chance, mas o que ele temia era que se ele se permitisse viver o que queria essa noite, sabia que começaria um avalanche que não poderia medir a dimensão. E sabia que todo esse avalanche cairia sobre ele sozinho no final das contas. Esse seria o certo.

Levantou-se da poltrona. Já estava atrasado. Pegou o smoking sobre a cama e pôs-se a se preparar para a festa anual do Ministério da Magia. Em menos de uma hora ele estava pegando uma carruagem nas ruas paralelas a Travessa do Tranco rumo a Gringotes onde tinha a entrada para o Ministério mais próxima de onde estava.

Sua chegada foi a mais discreta possível. O salão principal do ministério estava todo decorado em dourado e azul com bandeiras da Inglaterra por toda a parte e uma pequena orquestra regia toda a trilha sonora que compunha o lugar. Draco se lembrava bem de quando seus pais o levavam a festas ali. Ele era criança e costumava atentar a todos. Era seu único modo de diversão, afinal, ele geralmente era uma das poucas crianças.

O salão já estava cheio, as pessoas ainda estavam se presando a um nível de refinamento que a pista para as valsas estava vazia e as mesas estavam ocupada com longas risadas e histórias. Do mezanino Draco observou toda a festa. Procurou, claro, por Hermione, mas seus olhos ainda não haviam sido capazes de captá-la no meio de toda aquela multidão. Encontrou quase toda a família Weasley sentada em uma das mesas. Ao lado da mesa dos Weasley estavam de pé Luna Lovegood, que ele se lembrava bem, em uma conversa divertida com Ninfadora Tonks e Gina Weasley. Passou seu olhar mais uma vez por toda a festa e encontrou Harry Potter de pé em um circulo de homens bem afeiçoados trocando assuntos que pareciam ter um certo nível de seriedade pela feição de todos na roda. A mais alguns metros Draco foi finalmente capaz de reconhecer Hermione Granger no meio daquela multidão.

Linda e impecável vestindo um longo verde musgo de um tecido fino e opaco que lhe caia perfeitamente sobre o corpo ela provava a mulher que havia se tornado. Ele só se lembrava da garota que conhecera. Hermione quase brilhava em relação as pessoas que a cercava. Estava de pé próximo ao pé do palco onde a pequena orquestra se encontrava. Em sua mão havia uma taça com espumante e na outra um pequeno folheto. Ela estava rindo de algo que a mulher com ao qual conversava contara. Hermione entregou o folheto a ela, disse algo apontando para ele e se despediu da mulher tomando o caminho por entre as mesas para encontrar-se segundos depois com Lovegood, Tonks e a Weasley.

Draco manteve seus olhos grudados nela por muito tempo ali do mezanino. Umas dez pessoas vieram lhe tentar tirar a atenção puxando assunto ao reconhecer o dono da maior fornecedora de matéria-prima marítima de todo o mundo, porém ele era breve, frio e direto voltando sempre a perseguir Hermione com os olhos. Logo notou que o que colocaria tudo a perder estava começando a acontecer e se não agisse rápido ele logo se encontraria em uma situação muito mais desconfortável de trabalhar. As pessoas já estavam começando a comentar sobre a presença de Draco Malfoy e antes que isso chegasse aos ouvido de Hermione ele tinha que agir.

Desceu finalmente as escadas do mezanino para o salão saindo da recepção para a festa. O local estava cheio e as pessoas ainda tinham aquele ar profissional enquanto conversavam e a orquestra tocava músicas clássicas. Ele quase não tinha paciência para esse tipo de festa, sabia que bastava mais algumas horas e as pessoas estariam agindo como loucas, fazendo coisas absurdas e a orquestra estaria tocando músicas bem longe das clássicas.

Ele chegou no balcão do bar e postou-se bem ao lado de Hermione que esperava as bebidas que havia pedido. Seu cheiro o inundou e ele sentiu suas mãos suarem.

– Whisky de fogo, por favor. – disse ao bartender. Ao seu lado ele percebeu Hermione travar todos os músculos e parar de respirar. Ótimo, ela havia reconhecido sua voz. O bartender foi rápido enchendo seu copo. Draco o pegou e tomou uma golada. – Olá, Granger. – ele se dirigiu a ela quando voltou o copo para o balcão.

Ele percebeu a luta que foi para ela o olhar. Quando finalmente seus olhos dourados tiveram coragem de encarar o dono da voz Draco respirou calmamente, piscou e deixou os seus cinzas encontrarem os dourados dela. Eles se olharam em silêncio. Ele torceu seu lábio num fino sorriso de lado depois de tomar outro gole de seu whisky enquanto ela ainda tentava acreditar quem estava ao seu lado.

– O que está fazendo aqui? – ela disse tão baixo que quase foi um sussurro. Tinha um certo tom ríspido.

– Vim conhecer melhor o anel que está no seu dedo. – ele disse. – Você sabe, jornais costumam ser bem sucintos.

– Vá embora daqui, Malfoy. – ela disse dando as costas a ele.

Draco a segurou pelo punho e a fez voltar-se para ele novamente. Levantou a mão da mulher a altura de seus olhos e analisou de perto o anel em seu anelar.

– Bem caro. – ele comentou. – Não me lembro de Potter com tanto dinheiro.

Agora sim ela havia ficado brava. Fechou seu punho e o puxou de volta desvencilhando-se dos dedos de Draco. Ele sorriu. Ela fechou a expressão.

– Você não tem motivos pra voltar a esse país e me procurar. Por que está aqui? Por que agora? Por que? Vá embora e não volte, Malfoy! Esse foi o combinado! – vociferou com os dentes cerrados

Ela fez menção de dar as costas novamente, mas antes que pudesse ele a deteve segurando-a pelos dois braços. Colou seu corpo no dela e apertou seus lábios próximo ao ouvido da mulher. Sentiu todo o corpo dela fraquejar.

– Eu aposto dez sacas de galeões de que não vai conseguir pregar os olhos essa noite, Granger. – Hermione tentou se desvencilhar dele, mas Draco segurou seus braços com mais força. – Sei que não ama Potter. – ele a soltou finalmente e ela não fugiu. Segundos se passaram até que ele finalmente afastou-se dela. – Você tem uma semana pra me procurar. Sabe onde.

Hermione o encarava como se ainda estivesse processando tudo que ele havia dito, seus dedos fortes apertando seu braço, seu hálito quente sobre seu ouvido. Ela se sentira muito pequena perto dele.

– Vá embora, Malfoy! Nunca deveria ter voltado! – ela disse desconcertada e deu as costas.

– Não vá esquecer suas bebidas, Granger. – ele a lembrou antes que ela fosse embora.

Ela parou, respirou fundo, voltou-se para o balcão sem olhar Draco, pegou as duas bebidas que estava sobre ele e foi embora. Draco a observou sumir entre as pessoas. Suspirou e tomou o último gole de seu whisky, deixou o copo sobre o balcão e foi embora da festa.

**

Temos somente 24 horas aqui. – informou Draco quando entraram ele e Hermione no quarto do pequeno hotel de estrada que haviam conseguido.

Vamos precisar de menos. – Hermione disse sacudindo sua boina para tirar a neve.

Pelo amor de Deus, Granger! Nós não dormimos há dois dias! Eu preciso descansar.

Não podemos! As informações estão frescas no nosso cérebro e precisamos unir todas elas agora!

Me desculpe, garota, mas não posso pensar sem antes descansar. – ele foi irônico em sua rima e Hermione revirou os olhos enquanto se sentava na cama e puxava uma pilha de livros de dentro de sua mochila. – vou aquela loja lá em baixo buscar algo pra comer, quer algo?

Não. Eu estou bem. – ela disse abrindo um livro.

Você é humana? – ele perguntou horrorizado. – Tem ideia de quantas horas estamos sem comer?

Vá rápido, Malfoy! Vou precisar de você aqui! – Ela o apressou.

Foi a vez dele revirar os olhos. Deu as costas e saiu pela porta. Hermione passou a rabiscar freneticamente o caderno de anotações que carregava sempre consigo.

Draco não demorou. Quando voltou encontrou a garota sentada sobre a cama, da mesma forma como a deixara, porém dessa vez a pilha de livros estava esparramada pela cama toda aberta e ela lia um deles. Jogou sobre ela as embalagens de comida que havia trago da loja.

Coma algo. – ele disse.

Você demorou. – ela resmungou enquanto tratava de colocar de lado as coisas que Draco havia jogado em cima de seus livros.

Ele riu do absurdo do comentário dela. Olhou a cama e ficou animado em saber que finalmente dormiria em um lugar decente apesar de saber que aquele quartinho não estava na lista de algo decente, mas comparado aos lugares que eles foram obrigados a dormir nos últimos seis meses aquilo mais parecia um palácio.

Draco tratou de tirar logo os sapatos, o casaco e a camisa e cair em seu lado da cama. Hermione protestou algo sobre amassar seus livros e ele não deu importância. Como estava cansado.

Pegou uma embalagem das coisas que pegara na lojinha e a abriu. Enfiou o bolinho que encontrou todo na boca. Estava uma delícia. Pegou outro e comeu. Olhou Hermione e ela estava calada entretida com as anotações de seu caderno.

Você deveria comer. – ele insistiu de boca cheia.

Ela ergueu os olhos e o encarou. Suspirou e pegou uma das coisas que ele havia trago. Olhou a embalagem e fez uma careta.

O que é isso?

Comida trouxa. – ele disse pegando mais um bolinho. – Achei que soubesse sobre as coisas do seu mundo. – ele a viu fazer outra careta e largar o pacotinho de volta ao monte de porcaria que ele pegara. Ele suspirou impaciente, pegou o que ela havia largado, o abriu e estendeu pra ela. – Isso é comida, Granger! Vai te manter viva!

Ela cansou da insistência, tomou da mão do outro o saco de biscoito e enfiou alguns na boca. Voltou a rabiscar seu caderno mantendo seus olhos longe do garoto sem camisa ao seu lado. Malfoy já havia a tentado inconsciente por muitas vezes desde que tudo aquilo começara.

Veja bem. – ela começou depois de um tempo em silêncio. – As coisas não estão batendo. Se Eva foi a última pessoa com quem Régulos esteve no Lago de Grimma, como ela pode ter sido morta no mesmo dia no vilarejo de Holmeswood?

Bruxos podem aparatar, Sabia? – ele a lembrou

Mas ela foi morta durante o dia. O encontro de Eva e Régulos em Grimma foi durante a noite.

Alguém deve ter tomado polisuco e enganado Régulos.

Com que propósito? Se ele foi enganado, como conseguiu escapar e estar vivo hoje? Se o enganaram com polisuco durante esse meio tempo, a rota que refizemos de como ele conseguiu escapar de Voldemort vai por água abaixo.

O erro deve estar na cronologia das coisas então.

Ela suspirou rabiscando algo em seu caderno.

Talvez.

Vou dormir. Você deveria fazer o mesmo. – ele disse deitando de bruços e enfiando a cara no travesseiro enquanto o abraçava.

Precisamos ir a Holmeswood e saber se as pessoas se lembram do dia em que Eva morreu. Saber quando ela chegou ao Vilarejo e o que ela estava fazendo lá. – ela disse e ele não respondeu nada. Ela ergueu os olhos e o viu deitado. – Malfoy! Precisamos ir a Holmeswood.

Garota! – ele murmurou com a voz abafada pelo travesseiro. – Precisamos dormir!

Ela suspirou desfazendo toda a sua postura ao voltar a encarar toda a bagunça de livros ao seu redor. Seu corpo todo clamava descanso. Ela fechou seu caderno e encarou sua capa de couro. Precisava mesmo dormir. Mal se lembrava da última vez que dormira em uma cama. Sorriu de sua própria bobeira em querer deixar a oportunidade de descansar em um quarto de hotel para ficar estudando o que deveria. A ordem de prioridade poderia se inverter por necessidade de vez em quando.

Hermione empurrou todos os seus livros para o chão. Tirou seu casaco e o largou sobre eles. Esticou-se do seu lado da cama assim como Malfoy e fechou os olhos. Suspirou sorrindo. Aquilo era mesmo uma cama.

Depois de dormir em um banco de carro essa cama parece valer uma fortuna. – ela comentou.

Ele riu já embriagado pelo sono.

Não seja tão modesta.

Foi a vez dela rir. O silêncio se seguiu e em menos de um minuto ambos dormiam pacificamente.

A noite caiu do lado de fora rapidamente. No quarto eles dormiam sobre uma cama disputando com pergaminhos, embalagens de comida lacradas e outras já violadas. No chão havia suas mochilas, os livros esparramados de Hermione, seus sapatos e casacos. O silêncio era mortal que quase se podia ouvir a neve tocar o chão do lado de fora.

Poucas horas depois Draco saiu de seu sono incomodado. Sentiu seus braços em torno de alguém e ao abrir os olhos percebeu que Hermione estava encolhida contra ele. Havia ficado frio e o cansaço de ambos mal os fizera se dar ao trabalho de dormir debaixo do cobertor. Ele pensou que talvez o ar condicionado estivesse quebrado ou algo do tipo. Fechou os olhos novamente e cochilou, porém algo o trouxe de volta para a realidade. O corpo de Hermione estava gelado e ele sentia realmente frio. A apertou contra ele tentando de alguma forma passar qualquer tipo de calor que houvesse nela para ele, mas foi inútil. Algo estava errado com aquele frio. Ele decidiu se cobrir, mas assim que a soltou ela acordou em protesto pelo frio.

Está frio. – Hermione murmurou com uma voz abafada e rouca afastando-se dele que tateava pela coberta.

É, eu sei que está! – outra voz feminina respondeu em alto e bom som.

Draco e Hermione paralisaram-se. O sono de ambos foi embora num estalo e eles procuraram a dona da voz que já bem conheciam. Pansy Parkison estava apoiada na parede com os braços cruzados bem de frente para a cama dos dois.

Então quer dizer que agora Draco Malfoy e Hermione Granger dormem de conchinha? – Pansy riu. – Quem diria hein, Malfoyzinho! Você se torna um traidor e ainda começa a dormir com uma sangue-ruim. – ela fez uma careta para Hermione. – Ah, espere! Tem algo errado! – teatralizou – Pelo que eu bem conheço de Draco Malfoy, ela – apontou para Hermione – estaria sem roupa. – Pansy franziu o cenho e sacudiu a cabeça de um lado para o outro. – Ainda tem algo errado! – pausou – Ah, claro! Draco Malfoy dividindo a cama com uma garota só? Você está regredindo hein, Draco! Parece até a época que namorávamos.

Como conseguiu entrar aqui, Pansy? – ele perguntou confuso.

Ela apontou a janela aberta.

Muito inteligente da sua parte lançar feitiços protetores na porta impedindo que intrusos entrassem e se esquecer da janela. – ela desencostou da parede. – Esse jogo acabou, Draco! O Mestre tem muito o que tratar com você. Vamos voltar para casa. – ela abriu a porta pelo lado de dentro e mais três comensais entraram no quarto. – Quanto a sangue-ruim, talvez o mestre a faça de isca para atrair Potter, ou apenas a dê como alimento para Nagini.

Ele procurou sua varinha embaixo do travesseiro assim como Hermione, mas elas não estavam lá. Um dos comensais se aproximou e Draco pode ver sua varinha e a de Hermione nas mãos de Pansy. Estavam desarmados. O comensal que se aproximou veio para o lado de Hermione na cama e ela recuou com medo. Draco passou o braço por ela postando-se meio que a sua frente.

Fique longe dela. – ele pronunciou.

Todos do quarto pararam. O silêncio e então Pansy riu alto.

Sério mesmo, Draco? – ela indagou divertida. – Vai defender a sangue-imundo? Quem foi que trocou seu cérebro? – ela fez uma cara de nojo – Não sei se vou ter estomago pra isso. Pegue-a logo de uma vez!

O comensal puxou Hermione pelo cabelo para fora da cama. Ela lutou ao mesmo tempo que gritava por causa da dor. O sangue fluiu nas veias de Draco. Ele se levantou foi em direção a Pansy.

Me dê essas varinhas, Pansy! – seus dentes estavam cerrados.

Os outros dois comensais o deteve segurando-o pelo braço antes que ele chegasse a Parkison. Draco lutou, mas mesmo que fosse forte o suficiente, era ele contra dois comensais.

Pare com esse jogo, Malfoy! – ela apontou a varinha para ele. – Nós o pegamos, não tem mais para onde correr.

Me dê as varinhas! – ele gritou enquanto ainda lutava contra os comensais.

As suas costas Hermione conseguiu acertar o estômago do outro com os cotovelos e nocautear em seguida suas partes baixas. O comensal urrou de dor e a largou. Ela caiu no chão e Pansy desviou sua varinha de Draco para ela a estuporando.

Hermione bateu com as costas na parede e escorregou para o chão. Draco conseguiu se livrar das mão de um comensal e aproveitando o braço livre e a proximidade de Pansy, arrancou as varinhas de sua mão num piscar de olhos. No outro ele estuporou o comensal do qual se livrara e no outro tratou de acertar seu cotovelo com força no nariz do que ainda o segurava. Livre ele apontou uma varinha para Pansy e hesitou apenas um segundo em estuporá-la, mas no outro ele já havia feito. Jogou a varinha de Hermione para ela que a pegou ainda se levantando do chão.

As mochilas vieram parar na mão de Hermione no segundo seguinte que ela havia ordenado para que se arrumassem. Ela jogou a de Draco para ele. O comensal que tivera Hermione nas mãos já estava de pé e a segurou quando ela tentou pular pela janela. Draco que saíra pela porta o estuporou e ajudou Hermione. Logo estavam eles de mãos dadas correndo escada abaixo para o pátio de estacionamento.

Não consigo aparatar! – Draco informou quando Pansy veio atrás deles lançando maldições às cegas. – Eles devem ter protegido a área!

O carro! – Hermione o puxou para a direção contrária da qual estavam correndo.

Em meio minuto Hermione dava partida com sua varinha num carro velho que estava solitário no pátio aberto do estacionamento daquele hotelzinho de quinta na beira da estrada. Pegaram a estrada numa velocidade exagerada e na cola deles Pansy e os outros três comensais vinham com suas vassouras.

Tente aparatar, Malfoy! – ela gritou

Eu estou tentando! – ele usou o mesmo tom dela.

Ela olhou para trás. A velocidade do carro não era páreo para as da vassoura e ela tentou imaginar quantos quilômetros teriam que andar para sair da área de proteção. Ela esperava que não fosse muitos porque sabia que em menos de um minuto seriam alcançados.

Um dos feitiços de Pansy atingiu o carro e ele perdeu o controle. A velocidade que estavam inclinou o carro avisando sobre o capotamento que sofreriam. Draco agitou a varinha em resposta mantendo as rodas sobre o asfalto e movimentando-se em alta velocidade.

Hermione pensou em todos os feitiços possíveis que poderiam fazer aquele carro ganhar mais velocidade, entretanto não era nada fácil de se pensar em um momento como aquele. Olhou para o retrovisor. Estavam muito perto.

Malfoy! – ela o apressou em desespero.

Estou tentando, Granger! – ele gritou.

Quando menos esperavam o vácuo pareceu compacta-los. O ar faltou a eles e tudo ficou escuro. Quando houve luz novamente e o oxigênio invadiu seus pulmões eles ainda estavam dentro do carro que voava numa velocidade extrema, a frente deles o tronco de uma árvore impedia o caminho. Hermione pisou fundo no freio em reflexo e dois segundos depois o carro batia de frente com a árvore.

Estavam vivos. Era o que o silêncio dentro daquele carro gritava para os dois.

E isso é o que acontece quando mulheres estão no volante. – Draco murmurou enquanto checava se nenhum osso seu havia sido quebrado.

Cale a boca, Mafloy. Você não sabe nem como dar partida em um carro trouxa. – ela disse enquanto limpava o sangue que escorria por sua têmpora.

Às costas deles o som de quatro estalos ecoou pela floresta que haviam aparatado. Hermione olhou pelo vidro trincado e Pansy vinha em sua direção com a varinha em punhos. Hermione voltou-se para Draco, segurou seu braço e lá estavam eles novamente sendo compactados pelo vácuo.

Quando abriram os olhos estavam a beira de um lago. O silêncio da noite pendia floresta a dentro. Pronto. De acordo com os atrasos previstos por Dumbledore eles teriam 24 horas de sossego agora. Hermione caiu de joelhos e enfiou as mãos sujas de sangue dentro do lago. Fechou os olhos e respirou fundo soltando o ar devagar esperando fazer com que seu coração parasse de querer sair pela boca. Estavam salvos. Por enquanto.

Draco aproveitou-se também da água do lago para limpar seus cortes. Percebeu que havia fraturados algumas costelas e agradeceu mentalmente McGonagall por todos os resumos sobre primeiros socorros quando as concertou por si só. A água quase congelada e o frio ajudaram a adormecer a dor. Ao seu lado Hermione vasculhava sua mochila. Tirou de dentro dela um frasquinho redondo, tomou um gole e deu o outro a ele. Draco o tomou sem protestar. Minutos depois percebeu que seus cortes começavam a cicatrizar de uma forma acelerada.

Vamos. Conheço o lugar. – Hermione anunciou pondo a mochila sobre as costas.

Ele a seguiu enquanto vestia sua blusa e seu casaco. Eles se enfiaram na floresta e Hermione precisou acender sua varinha por causa do escuro. Depois de um período curto de caminhada se encontraram numa clareira perto de uma pequena casinha de madeira mal cuidada que parecia querer desmoronar.

Já estavam quase congelando quando passaram pela varanda e entraram na casinha nua e fria. Não havia móveis, nem separação de cômodos. Há única coisa que havia era uma lareira velha que Hermione tratou de acender com agilidade. Ela sentou-se sobre as pernas de frente para o fogo e fechou os olhos sentindo-se ser aquecida. Draco apenas a observou ao ser também inundado pela onda de calor. Deixou sua mochila escorregar pelos seus ombros e encontrar o chão.

O silêncio.

Eu não sei o que houve. – Draco começou baixo. Qualquer tom que usasse parecia alto demais para o silêncio que dominava o lugar. – Acho que consegui entrar num estágio do meu sono que fez com que toda a concentração que mantenho com a magia do professor Dumbledore se dissipasse...

Tudo bem. – ela o cortou ainda de olhos fechados diante da lareira.

Não. Não está tudo bem! Eles quase nos pegaram, Granger...

Malfoy! – ela exclamou mais alto que ele o cortando novamente. – Eu disse: tudo bem.

Draco Malfoy não entendeu.

Tem ideia do que fariam a você quando te entregassem a Voldemort?

Ela riu falsamente.

Como se você se importasse.

Ele torceu sua expressão em uma careta.

O que? Eu não estou falando de você! Estamos trabalhando nisso juntos...

E você se sente culpado por ter nos colocado em risco? – ela o cortou novamente. – Eu não estou te culpando!

Eu só...

Queria se desculpar?

Pare de me cortar, Granger!

Você me fez mal a vida inteira e está se importando com desculpas agora? – ele se calou. – Por que? – ela perguntou. Abriu os olhos e virou-se para ele. – Aliás Malfoy, desde quando você se importa em me alimentar, em me fazer descansar, em se por a minha frente pra me defender? Não precisa se prestar a esse papel só por que eu estou com você nessa! Sabe que não estou fazendo isso por você! Estou aqui por Dumbledore e por Harry!

O silêncio consumiu o lugar novamente enquanto eles trocavam olhares. Os olhos dela brilhavam num tom escuro e ele mantinha os seus naturalmente ameaçadores sobre ela.

Pensei que soubesse o motivo pelo qual eu estou aqui, Granger. – ele pegou sua mochila no chão, caminhou para a parede que intercedia a ladeira e sentou-se recostado a ela. – Nada do que eu faço é por você.

Hermione conseguiu encará-lo apenas por mais alguns segundos. Ela abraçou as próprias pernas e voltou a olhar para o fogo a sua frente. Draco observou a sombra das chamas sobre o perfil da garota.

Eu não preciso que me defenda. – ela disse tão baixo que foi quase um sussurro.

Mas eu vou. – ele retrucou. Ela piscou e desviou seus olhos para ele. – Eu preciso de você, Granger! Eu não acreditei que aquele velho tivesse razão sobre você, mas ele tinha! Não posso fazer isso sem você! – ela continuou com os olhos sobre ele – O mal que eu te fiz minha vida inteira faz parte de mim. Fui criado para odiar gente como você e te fazer mal me fazia bem. Não posso voltar naquele tempo e ser diferente para facilitar as coisas para nós agora. – ele se calou e ela piscou novamente enquanto mantinha seus olhos sobre ele igualmente calada. – As coisas são diferentes agora.

Diferentes como? – a voz dela saiu rouca.

Precisamos nos suportar. Temos interesses em comum. Um está usando o outro.

Ela piscou calma novamente. Assentiu. Suspirou e voltou a encarar o fogo. O silêncio durou muito dessa vez. O estalar das chamas corroía cada espaço vazio daquela pequena cabana no meio da clareira onde Hermione costumava passar com seu pai quando vinham pescar no verão em uma infância que lhe parecia ter sido há milhares de anos atrás.

Você ainda tem aqueles biscoitos aí? – ela perguntou depois de longos minutos em que o silêncio reinou.

Ele abriu um sorriso fino.

Eu sabia que estava com fome.

Eu não estava! – ela insistiu e Draco revirou os olhos jogando sua mochila pelo chão para ela. Hermione a abriu e pôs-se a procurar dentro do espaço infinito que havia ali dentro. – Merlin, Malfoy! Ninguém nunca te ensinou como se organiza uma mochila de viajem, não?

Draco suspirou impaciente. Foi até a garota, tomou a mochila de sua mão, vasculhou dentro dela e logo tirou o pacote de biscoito que havia aberto para ela horas atrás.

Tem casacos extras aí também? – ela perguntou e ele pode notar que ela ainda morria de frio. Seus lábios estavam roxos e sua estava pele pálida.

Não. – ele a respondeu. – Achei que eles ensinassem garotas a conjurar essas coisas naquelas revistas femininas.

Ela fez uma careta.

Acha mesmo que eu leio esse tipo de coisa.

Ele riu.

Horas depois o sol refletia na neve acumulada do lado de fora. No chão frente a lareira que ainda estalava fogo estavam deitados Draco e Hermione. Ele a abraçava cobrindo-a com seu casaco. Ela dormia. Ele não. Tinha medo de que perdesse novamente a magia de Dumbledore. Ele ainda precisava estuda-la melhor, precisava dominá-la de modo que qualquer estágio de sono que atingisse não os colocasse em risco novamente.

Ele sentiu a respiração ritmada dela contra a dele. Respiravam juntos. Estava a usando para conseguir ajudar sua família, mas antes que pudesse pensar nisso no momento em que viu aquele comensal por as mãos nela, a única coisa passou por sua cabeça foi que por favor não a machucassem.

**

Ele soltou um urro ao mesmo tempo que se sentava ao acordar num pulo. O suor lhe escorria todo o corpo, sua respiração estava ofegante e seu braço queimava numa dor excruciante. Apertou com a outra mão a marca negra viva em seu braço tentando conter a dor que o cegava. Por um minuto ele não teve ideia do que pensar, de como agir ou onde estava nem do que estava acontecendo a ele. Cambaleou para fora da cama e entrou para dentro do chuveiro. Deixou a água gelada lhe escorrer pela cabeça enquanto ofegava tentando concentrar-se.

A dor mal o deixava pensar em todas as vezes que praticara a magia de Dumbledore, mas ele se esforçou, não parecia querer ir embora, mas em pouco tempo ou ele estava se acostumando ou sua concentração estava funcionando. Ele manteve-se ali até que sua respiração se acalmasse e a dor amenizasse. Quando destampou a marca em seu braço viu que sua pele estava em carne viva. Ardia, porém nada comparado ao que havia sentido antes. Abriu e fechou a mão deixando o sangue voltar a circular e bufou soltando o ar aliviado. Fechou os olhos e ergueu a cabeça sentindo a água gelada cair contra seu rosto tendo tempo finalmente para se situar.

Estava na Irlanda. Lembrou-se do porque estavam ali, lembrou-se de estar na casa de um casal idoso e hospitaleiro, trouxas, lembrou-se de Hermione girando em um vestido engraçado emprestado pela velha da casa com uma guirlanda feita de flores pequenas no topo da cabeça durante o jantar da noite anterior quanto o velho tocava suas músicas irlandesas. Ela havia feito a alegria daquele casal. Lembrou-se de como ela com aquele sorriso, aquele vestido e aquela guirlanda na cabeça parecia a garota mais linda do mundo por mais que o conjunto de tudo aquilo fosse horroroso.

Ele fechou o chuveiro e abriu os olhos. Estava pensando muito em Hermione. A semana que estiveram naquele país foi cansativa e muito produtiva. Estavam partindo para o sul da Europa e tudo parecia mais certo do que nunca de que finalmente encontrariam Régulus. Permitiram-se gastar as 24 horas que tinham em cada lugar que aparatavam naquela simples pousada do casal idoso para fazer o que a muito tempo não faziam: descansar.

Draco olhou para o quarto e lá estava Hermione de pé, próximo ao chuveiro, carregando uma toalha nas mãos. Quando seus olhos se encontraram ela caminhou até ele, estendeu a toalha e ele a pegou. Secou o rosto, os cabelos e se sentou na beira da banheira enquanto o resto da água lhe escorria pelo corpo.

Ela se sentou ao lado dele, tocou seu braço com cuidado esperando a aprovação dele para ver a marca e ele permitiu. Ela analisou por um tempo o vermelho em torno da caveira de Voldemort marcada nele e então se levantou. Quando ela voltou tinha algo nas mãos que passou sobre o lugar. O alívio completo fez Draco agradecê-la mentalmente. Eles ficaram um bom tempo sentados ali em silêncio.

Você me assustou. – Hermione decidiu dizer com a voz baixa. Ele piscou devagar enquanto suspirava frustrado. – O que aconteceu?

Silêncio.

Eu perdi a magia do professor Dumbledore novamente e Voldemort encontrou a brecha para me presentear com pesadelos.

Hermione hesitou.

Acha que podem nos encontrar? Talvez devêssemos aparatar para outro lugar...

Não. – ele a cortou. – Foi diferente dessa vez. Eu não a perdi toda, eu apenas dei a ele uma brecha. – ela assentiu. – Pode descansar, Granger. Vamos ficar bem aqui.

Silêncio.

Por favor, me chame se precisar de algo. – foi só o que ela se limitou a dizer para não mostrar sua preocupação.

Ele assentiu. Ela hesitou, porém levantou-se e voltou para cama. Draco permaneceu ali por um bom tempo. Quando Hermione achou que ele voltaria para a cama, ele se levantou e saiu do quarto. Ela se sentou. Fazia um tempo significativo que ela havia notado que sempre quando conseguiam dormir ele parecia ficar agitado, mas como quase nunca descansavam de verdade seus pesadelos nunca o levaram para aquele nível. Ela realmente havia ficado assustada.

Levantou-se e foi até a janela. Lá ela pode vê-lo focar o nada que havia na frente da casa que estavam hospedados com as mãos enfiadas no fundo do bolso. E ele simplesmente parou ali. Ela não podia sequer decifrar o que estava acontecendo com ele. Quando tudo aquilo começou e ele ainda não havia praticado os estudos de Dumbledore ela realmente não se importava quando ele rugia de dor pela marca em seu braço. Sentia-se bem quando o via sofrer, mas olhando-o ali por aquela janela ela teve quase que a mesma sensação que tinha quando via Harry se ausentar do mundo e se fechar em sua própria bolha. Ela queria poder ajudar.

Ela voltou para a cama sem poder fazer muita coisa. Não podia invadir o mundo dele, além do mais, tudo que ela sabia sobre Draco Malfoy era incerto, misterioso e ameaçador e ela ainda não sabia ao certo se tinha medo de pisar nesse campo para estuda-lo melhor. Dormiu. Quando voltou a acordar o céu ainda estava escuro, porém anunciava que mais alguns minutos e os primeiros raios de sol surgiriam. Draco estava sentado em seu lado da cama. Ele estava cercado pelos pergaminhos que ela sabia que eram os estudos da magia para conter a ligação que havia entre ele e Voldemort. Ele parecia concentrado em um deles.

Ficou acordado todo esse tempo? – ela perguntou sonolenta enquanto se sentava.

Ele desviou a atenção de seu pergaminho para ela. Um sorriso discreto que ela nunca havia visto no rosto de Malfoy, um que ela nunca sequer imaginara que ele pudesse ser capaz de dar, apareceu em seus lábios. Ele fez que sim com a cabeça mas como se não soubesse o que fazia. Hermione sentiu-se estranha o tempo em que ele ainda manteve seus olhos sobre ela antes de desviá-los de volta para seu pergaminho.

Ela o observou por um longo tempo de silêncio. O quarto foi ficando cada vez mais claro e ela ainda mantinha seus olhos nele que estudava seus pedaços de pergaminho. Ele era bonito. Mesmo com os olhos fundos, cansados e o cabelo todo bagunçado. Não dava pra ignorar que ele era um Malfoy e tudo nele assustava, mas ainda como um bom Malfoy ele também tinha os traços que pareciam ter sido esculpidos com um detalhe de precisão absurdo. Não dava pra negar que tudo nele gritava sua linhagem de puro-sangue, tudo parecia perfeitamente encaixado em seu corpo de uma maneira que em nenhuma outra pessoa é, a forma como seus cabelos caiam mesmo bagunçados, o desenho de seu queixo, o formado do nariz, até mesmo a forma como piscava parecia ter passado por um processo de seleção para ser aprovada se podia ou não fazer parte dele. Ela suspirou. Sentiu-se muito inferior a ele.

Malfoy. – ela o chamou e ele desviou os olhos novamente para ela. – O que Voldemort te fez sonhar? – perguntou com a voz ainda falhada.

Por um segundo ela teve receio do que ele poderia lhe responder, mas lembrou-se de que ali eles eram duas pessoas muito distante das crianças que haviam deixado em Hogwarts.

Ele a encarou em silêncio e permaneceu assim quando voltou-se novamente para o seu pergaminho. Hermione pode notar que ele estava em silêncio não por não querer compartilhar com ela seu pesadelo, mas sim porque não queria se lembrar.

Ele torturava minha mãe. – ele disse finalmente. Disse tão baixo que ela quase podia enxergar o tom de sua voz refletido na escuridão que seus olhos se tornaram. – A culpava por ter criado um filho traidor.

O silêncio.

Você sabe que pode não ser um sonho verdadeiro...

Motivos não faltam a Voldemort para torturar meus pais, Granger! Ele sabe que eles não tem escolha a não ser serem submissos a ele! Sendo verdadeiro ou não, esse pesadelo é tão possível quanto sentir sede e calor no deserto! – ele terminou e o silêncio se instalou entre eles novamente. Ele em seu pergaminho, ela o encarando. Hermione daria qualquer moeda para saber o que se passava na mente dele. – Eu não escolhi ser um traidor. – ele largou seu pergaminho, fechou os olhos frustrado e passou a mão sobre eles. Quando os abriu e a encarou tinham um brilho intenso. – Eu deveria ter matado Dumbledore! Eu, Granger! De repente tudo deu errado e lá estava eu com esse título que não me pertence! Eu não escolhi ser traidor! Se eu tivesse matado Dumbledore eu estaria no ciclo de Voldemort agora, sendo engrandecido por todos, trabalhando para ele! Eu seria de confiança e meus pais certamente não estariam sendo torturados por criarem um filho traidor! Voldemort só não os matou ainda porque precisa da influência do meu pai!

Prefere ser um assassino a um traidor? – ela perguntou quase que num sussurro.

Ele se calou como se nunca tivesse se feito essa pergunta.

Prefiro ser livre. – finalmente respondeu. – Longe da sombra de Voldemort que perseguiu minha família durante toda a minha vida.

Hermione o encarou. Soube que sua resposta era mais do que verdadeira, mas ela enganava sua pergunta.

Não. – ela concluiu depois de um tempo. – Você prefere ser um assassino.

Draco se surpreendeu por não ter sido convincente. Não deveria realmente, havia aprendido que Hermione não era uma garota tão fácil de se tapear.

Eu sou um Malfoy, Granger.

Isso não significa que tem que ser como eles.

Mas eu sou! Eu sou como eles! Sou egoísta, preconceituoso, vingador, trapaceiro, e tenho orgulho disso!

Hermione se calou. Não havia nada que ela pudesse discutir. Ela conhecia seu lado preconceituoso mais do que ninguém.

Faz parte de quem você é, certo? – ela sussurrou.

Ele tinha seus cinzas sobre os dourado dela.

Sim, faz parte de quem eu sou. – ele a respondeu. Eles se encararam. Draco pode ver no brilho dos olhos dela que ela bem sabia quem ele era e que aquilo a machucava. Em qualquer outro momento de sua normalidade ele não importaria, mas seu cérebro tirou foto de cada movimento que ela fez em seguida quando umedeceu os lábios, os apertou em uma fina linha, assentiu com a cabeça e arrastou-se para fora da cama. – Granger. – ele a deteve segurando-a pelo pulso. O contato incomum entre os dois fez com que tudo entrasse em um minuto de pause. O silêncio que se seguiu fez Draco perceber que ele se importava com o que ela sentia em relação a ele e se sentiu incrivelmente incomodado ao saber que o que ela guardava dele não era nada bom. Ele quis pedir desculpas, mas seu orgulho jamais o deixaria. – É só uma parte de mim. – foi o que conseguiu dizer.

Escute, Malfoy. – ela começou. Seus olhos muito longe dos dele. – Eu sei que não quer nem escolheu estar aqui, principalmente comigo. Sei que preferiria seu momento de glória no ciclo de Voldemort. Sei que seria muito mais confortável para você viver como comensal sobre a sombra assustadora de Voldemort do que nesse mundo inconstante que estamos agora, mas... – ela respirou fundo. – Por favor, não me deixe acordar um dia e saber que você foi embora. Que você voltou para o lado deles e me deixou terminar isso sozinha.

Draco ergueu as sobrancelhas. Certo, ele não esperava por aquilo. Seus dedos afrouxaram sobre o pulso dela.

Hei. – ele se aproximou dela, mas parou quando percebeu o que fazia. Hermione notou que ele havia se aproximado e conteve-se para não recuar. – Eu não vou te deixar. – disse baixo e quase não acreditou quando seu coração pulou ao dizer aquilo.

Os olhos dela voltaram a procurar os dele. Por um segundo rápido os olhos dele caíram para a boca dela e seus lábios rosados lhe pareceram absurdamente convidativos, mas como num estalar de dedos lá estava ele com seus olhos se limitando a permanecer focado apenas nos dourados dela.

Não sei se seria burrice confiar na palavra de um Malfoy. – ela disse.

Vou te provar que não é.

**

Draco esperou que o elfo da família Malfoy abrisse com esforço a pesada porta de entrada da enorme mansão que se estendia a frente deles. Perdeu a paciência ao vê-lo sofrer com o peso da porta e a empurrou com as próprias mãos. A casa era exatamente a mesma de como se lembrava. Fazia anos que não aparecia ali. A colossal escada da entrada, os dois cômodos abertos da lateral, os corredores detrás da escada que acessavam a sala de jantar, a decoração em mogno, vermelho vivo e prata, tudo estava exatamente como da última vez que estive ali. O elfo o conduziu para um dos cômodos das laterais, atravessou a pequena sala e abriu uma porta. Draco entrou e encontrou sua mãe.

– Olá mãe. – anunciou sua chegada.

A Sra. Malfoy parecia enormemente ocupada em escolher um novo tapete voador, mas assim que escutou a voz do filho largou as milhares de peças que o vendedor desenrolava a sua frente e virou-se para vê-lo.

– Draco! – ela abriu um sorriso sincero para o filho. – Eu fui a sua sede hoje cedo e a Sra. Miller disse que fazia quase uma semana que não aparecia por lá.

– Mãe, o que eu já falei sobre você indo ao meu local de trabalho. – ele disse enquanto se jogava num dos sofás da luxuosa sala íntima que se encontravam.

– Nunca dá para saber em qual das suas casas você está! – ela voltou-se novamente para o vendedor e passou a mão sobre um dos tapetes que ele mostrava a ela para sentir a textura. – Como vou saber sobre você já que nunca vem aqui? É meu filho e eu me preocupo com a vida que anda levando! Esses daqui vem da china, não é? – ela perguntou ao vendedor e ele tratou de responder que sim. – São lindos! – ela desenrolou um deles. – Não gosto que fique aparatando de um lado para o outro sempre. – ela voltou a falar com o filho – Sabe que não é bom.

– Sou acostumado.

– Você tem que se estabilizar, formar uma família, ter filhos! Pense no nome da família, Draco! Não pode ficar vivendo essa vida para sempre!

– Não incorpore o discurso do meu pai agora, mãe!

Ela suspirou frustrada e foi até o filho sentando-se ao seu lado. Tinha uma feição preocupada no rosto. Demonstrava muito sua emoções para uma Sonserina.

– O que te trás de volta a essa casa depois de todos esses anos? Ou melhor. O que te trás de volta a Inglaterra? Pensei que nunca mais fosse voltar a esse país.

– Estou apenas visitando minha velha casa. Não posso?

Silêncio.

– Eu leio os jornais, Draco Malfoy.

– Então não faça perguntas que já sabe a resposta. – ele terminou.

Ela se calou. A tensão pairou sobre os dois enquanto ele esperava que ela encaminhasse a conversa para o lado que ele não queria entrar. Ele se achou estúpido em pensar que talvez seus pais pudessem ignorar o fato que o havia trago de volta a Inglaterra.

Sua mãe aprumou a postura, apertou os lábios e puxou o ar.

– Bem. – ela forçou um sorriso e se levantou voltando a dar atenção ao vendedor – Já que está aqui porque não me ajuda a escolher um novo tapete para o quarto de hóspedes?

Draco soltou o ar aliviado. Apreciou o esforço de sua mãe e ficou grato por ela ter evitado a enorme discussão que começariam se naquela sala fosse mencionado o nome de Hermione Granger.

– Essa casa já não tem tapetes o suficiente? – indagou ele.

– Eu quero novos. – ela pegou um e mostrou a ele – O que acha desse?

Ele fez uma careta.

– Mãe! Sabe que não tenho bom gosto para essas coisas! – ele protestou.

A Sra. Malfoy riu alto.

– Se lembra daquela vez quando era criança que deixei você e seu pai escolherem novos quadros para sala de jantar e vocês me vieram com um horroroso cheio de frutas?

Draco riu. Não pelo mal gosto em escolher o quadro, mas sim por se lembrar de como ele e seu pai haviam conseguido aquele quadro horroroso e de como haviam combinado nunca contar a verdadeira história sobre ele para sua mãe.

– Pelo menos ele serviu por alguns anos na cozinha.

– Ainda não sei como permiti vocês deixarem aquilo pendurado na parede da minha casa! Mesmo que fosse na cozinha!

Ele riu novamente enquanto se levantava. Foi até sua mãe e estalou um beijo em sua têmpora.

– Vou subir.

– Seu pai deve estar na varanda da biblioteca.

– Vou para meu quarto primeiro.

– Vamos servir o jantar daqui a pouco. Não quer se juntar a nós?

Draco hesitou. Ele não pretendia. Talvez não fosse uma ideia muito inteligente permanecer muito tempo no mesmo ambiente que seu pai pelo que sabia de como os ventos sopravam erroneamente para o seu lado, mas estava muito grato pelo modo como sua mãe havia se comportado ignorando esse fato. Talvez seu pai também fizesse esse esforço.

– Tudo bem. – ele sabia que seu pai não faria.

O sorriso que sua mãe abriu compensou. Ele seguiu o caminho para seu quarto.

– Filho. – sua mãe o chamou antes que ele pudesse sair.

– Sim.

Ela tinha um brilho bonito nos olhos.

– É bom te ter em casa. – ela disse a ele.

Ele abriu um sorriso para ela.

– É bom estar em casa. – e saiu.

**

Ninguém conversava na sala de jantar dos Malfoy. O barulho dos talheres arrastando no fundo do prato pareciam estrondosos para o silêncio incomodo do lugar. Jantares ali nunca foram ao todo de muita falação. Eram uma família fria, entretanto cada um ali naquela mesa sabia o porque evitavam trocar palavras.

Draco pigarreou.

– Recebeu o presente que enviei no seu aniversário? – perguntou ao pai.

– Sim.

– Bem, você não disse nada.

– Estou dizendo agora.

– Gostou?

– Sim.

Silêncio.

O barulho dos talheres arranhando na porcelana novamente pareceu durar horas a fundo até seu pai voltar a falar.

– E como estão seus negócios?

– Excelentes. Rendem bastante já que somos os únicos fornecedores e o produto é raro.

– E quando você pretende fechar as portas?

Draco respirou fundo. Sabia que não havia sido uma boa ideia começar a conversar durante o jantar. Ingenuidade demais acreditar que seu pai pouparia uma oportunidade de lhe por contra a parede.

– Não sei. Talvez nunca. Tem dado muito certo. – respondeu ele.

– E como pretende dar conta dos seus negócios e dos negócios da família? Aliás, quando pretende assumiu os negócios da família?

– Pai...

– A família Malfoy está no ramo de poções por mais de um século! Somos os melhores! Pessoas escrevem livros sobre nós! – ele finalmente encarou o filho. – E estou começando a pensar que vai deixar tudo isso morrer em você...

– Foi você quem sempre me disse que todos esperam algo grande de um Malfoy! O que eu tenho feito está sendo muito bem reconhecido! – Draco estava começando a se irritar.

– O que tem feito não está nos planos da família!

Narcisa Malfoy limpou a garganta forçadamente cortando a discussão dos dois.

– Queridos, não na hora do jantar, por favor. – seu tom foi completamente autoritário.

Os outros dois se calaram. Draco ficou grato pela mãe ter cortado a discussão fazendo voltar o silêncio. Ele esperou que dessa vez ninguém voltasse a abrir a boca, mas como sabia que as coisas com seus pais nunca saiam da forma como esperava a muitos anos, sua mãe voltou a falar.

– Então, Draco, o que tem feito pela Inglaterra? Miller disse que você ficaria aqui por uma semana. Por onde tem andado?

– Cada dia em um lugar. – mentiu ele.

– Quer passar a noite aqui? – sua mãe voltou a perguntar.

– Tenho outros planos, mãe.

– Como se encontrar com Hermione Granger? – a voz do seu pai soou novamente no recinto. Draco parou com o garfo a caminho da boca e sua mãe quase botou para fora o suco que havia acabado de beber. Nenhum momento anterior o havia feito se arrepender tanto de ter concordado em jantar com sua família como agora. – Nada te traria de volta a esse país que não fosse ela, não é mesmo Draco?

Ele viu sua mãe cobrir o rosto com as mãos. Draco largou seus talheres e se levantou da mesa. Ele não era obrigado a passar por tudo aquilo novamente. Por isso não gostava de visitar seus pais, de estar com eles, muito menos de conversar com eles.

– Você não procurou por ela, procurou? – ela perguntou descobrindo o rosto. Ele continuou atravessando o salão para ir embora. Ela se levantou. – Draco Malfoy! – ele continuou andando. – Se encontrou com ela?

– Sim! – ele quase gritou voltando-se para os pais. – Sim, eu a procurei e me encontrei com ela!

– Por que não esquece essa garota?! – sua mãe usou o mesmo tom dele.

– Porque eu a amo! – ele bateu com as mãos no fim da mesa.

Ele viu seu pai torcer a expressão numa de nojo, limpar a boca com seu guardanapo e se levantar.

– Não posso lidar com isso novamente. – e saiu do salão pela porta mais próxima.

– ESSA GAROTA ARRUINOU NOSSA FAMÍLIA! – Narcisa bradou com ódio.

– Tem ideia do quanto ela fez por essa família? – ele vociferou tornando a atravessar novamente toda a mesa para se encontrar frente a frente com sua mãe. – Se não fosse por ela vocês estariam apodrecendo em Azkaban assim como todos os outros comensais!

– Ah, não me venha com essa estúpida historinha novamente! Nós dois aqui sabemos que ela nunca fez nada por nós! Tudo que ela fez foi por aquele amiguinho dela que por sinal, está noivo dela agora!

– POR SUA CULPA! – ele gritou.

Sua mãe fez uma careta.

– Acha mesmo que eu deixaria você ficar com uma sangue-ruim, Draco?

– Ela tem um sangue que vale incontáveis vezes o nosso!

Narcisa riu alto. Seu riso era forçado.

– Acredito que seu pai tem razão quando fala que esta colocando por água abaixo toda a história da nossa família. – ela lançou um olhar deprimente para o filho. – Eu amo você, filho, e nós te criamos para merecer o sobrenome que carrega, mas você está estragando tudo que sempre foi importante dentro dessa casa. – ela aprumou a postura. – A garota está se casando com outro. Vocês não foram feitos para ficarem juntos. Fazem parte de realidades muito diferentes. Está na hora de você acordar, Draco Malfoy. – e saiu pelo mesmo local que o marido.

Draco sentiu o sangue ferver em suas veias. Suas mãos coçaram e no segundo seguinte ele estava jogando seu prato de comida contra a parede. Tudo aquilo terminaria novamente na Travessa do Tranco, naquele quarto pequeno e insalubre do pub do velho, na companhia de todas as suas garrafas de álcool. E assim como as outras noites anteriores, Hermione não apareceria.


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Notas finais do capítulo

Gostando? Me deixe saber! :)