Em Busca da Verdade escrita por Camy


Capítulo 29
O primeiro dia


Notas iniciais do capítulo

Leiam. As. Notas. Finais.



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Ash chegou em casa com pressa. Abriu a porta e ouviu o barulho de vidro rolando. Ligou a luz, e se surpreendeu com a cena que encontrou. Quando saíra naquela manhã, não repara na bagunça que tinha feito. Inúmeras garrafas de saquê estavam espalhadas por toda a sala, e ele sabia que o quarto estava pior.

Suspirou, procurando por alguma que não estivesse vazia. Encontrou uma esquecida ao lado do sofá, e se jogou neste ao beber direto do bico. Passara os últimos doze dias total e completamente bêbado. Fazia quase duas semanas desde que voltara daquela maldita ilha, e ainda se sentia quebrado. Muito mais naquele dia do que em qualquer outro. Sorriu meio abobado. Mesmo com apenas doze dias (quase duas semanas), já era possível saber que Misty estava grávida. Sentiu o pensamento cair sobre si como uma pedra. Seria pai. Não, já era pai.

A cabeça começou a doer e tentou beber mais um gole, porém a garrafa estava vazia. Caminhou lentamente até seu quarto, e pegou uma garrafa pela metade que encontrou em seu criado-mudo. Bebeu e suspirou, jogando-se na cama em seguida.

Por que havia ido mesmo? Ah, sim. Kira pedira. “Eu preciso de você”, ela disse. E agora, que ele precisava desesperadamente dela, onde a menina estava? Com Misty. Sempre Misty. Queria se despedir, dizer que tudo ficaria bem, que a visitaria todos os dias, mas… não podia. Porque a menina não o amava. Sequer desviara o olhar para ele quando descobriu. Apenas correu para Misty e lhe cuspiu palavras ameaçadoras. Bebeu mais dois goles – ou foram três? – e abriu a gaveta do criado-mudo ao seu lado. Sentia nojo de si mesmo pelo que estava fazendo, mas não conseguiu evitar.

Pegou duas fotos. As mesmas que Kira trouxera no dia em que implorara pela ajuda dele. Tentou com todas as suas forças sentir raiva da imagem que o encarava. Tentou sentir raiva da ruiva idiota que o fizera de tolo e lhe escondera a gravidez. Tentou. Mas só conseguiu chorar. Só conseguiu sentir aquela dor aguda que esfaqueava seu peito e o entristecia. Ela não o amava, e aquilo ficara bem claro naquele dia. Soluçou, e bebeu mais um gole.

Queria esquecer. Desesperadamente, queria esquecer a dor que Misty Waterflower lhe fazia sentir.

~~xx~~xx~~xx~~xx

Yukira levou alguns segundos para abrir os olhos. Estava acordada, mas seus olhos estavam muito pesados para que os abrisse. Sua noite fora péssima, recheada de pesadelos já esquecidos. Ela procurou Togepi, mas percebeu, sem surpresa, que ele já fora. Ficaria consigo apenas à noite. Sentiu os olhos lacrimejarem momentaneamente. Estava em um orfanato, longe da mãe.

— Heey, minha linda. Hora de acordar! – Brock entrou no quarto acompanhado de Raki, que lhe mostrara o caminho.

— Titio!

Ela pulou para fora da cama e correu até o tio. Brock a pegou no colo e girou com a menina no ar, com um sorriso no rosto. Raki observou a cena curiosa. Nunca tivera ninguém que fizesse isso por si. Yukira grudou no tio como um carrapato.

— Como você tá? Dormiu bem? – ele perguntou.

— Uhum… e a mamãe?

— Um pouco irritada comigo ainda, por ter contado ao seu pai sobre você.

— Ele não é meu pai. Eu não tenho um pai.

Brock suspirou e beijou a cabeça dela. Não discutiria – ainda – sobre esse assunto. Ele era delicado demais para ser abordado naquele lugar. Kira apoiou a cabeça no ombro dele enquanto Brock acariciava delicadamente suas costas.

— Tá tudo bem, ok? Vim almoçar com você. – comentou o mais velho.

— E vai embora depois do almoço? – ela parecia meio triste.

— Preciso estar no ginásio, querida. Mas não se preocupe, sua tia virá ficar com você.

A menina abriu um pequeno sorriso e o beijou no rosto.

— Vamos. – disse Brock.

Ele saiu com ela no colo, pulando. Yukira ria com os bracinhos para cima, feliz. Por alguns minutos, esquecera-se onde estava. Há tempos o tio não tirava um tempo para brincar com ela. Brock correu até a pequena praça – havia decorado o caminho – que ficava no centro do orfanato, que possuía um formato circular. A praça era bela, com uma pracinha, árvores, bancos e até mesmo um chafariz.

— Pracinha, pracinha, pracinha!

Ela pedia rindo. Brock beijou as bochechas dela e começou a distribuir beijos por todo o rosto rosado, fazendo a pequena rir ainda mais.

— Para, tio Brock! Para!

Brock deu um último beijo estalado na bochecha dela e a colocou no chão.

— Brinque na pracinha com a sua tia. Sabia que já são meio dia e meia? Dorminhoca.

Yukira levou as mãos à boca, surpresa.

— Sério, tio?

— Uhum. Agora vem, vamos almoçar.

A pequena segurou na mão estendida e caminhou ao lado dele. O almoço foi tranquilo, sem grandes surpresas. Sentaram-se sozinhos em uma mesa grande e eles conversaram bastante. Brock contou que Yuri estava com saudades e que era Dayse quem passaria a tarde com ela. Depois de meia hora, encontraram-se no banco próximo à pracinha na qual a menina queria brincar.

— Tio?

— Hm?

— São só três dias, né?

— Sim, minha querida. Só três dias.

Ela sorriu, mais tranquila. Ao longe, Brock viu uma figura que fez seu sorriso falhar por um segundo antes de ficar ainda maior do que antes.

— Querida?

— Hm?

— Acho que não é sua tia quem passará a tarde com você.

Ela franziu as sobrancelhas, confusa.

— Quem, então?

Ele apenas sorriu e olhou para trás dela, onde um homem caminhava com as mãos nos bolsos; estas suavam vergonhosamente. Os cabelos negros estavam despenteados, denunciando as inúmeras vezes que passara as mãos entre os fios. Se chegasse mais perto, poderia ver a leve tremedeira na perna esquerda. A pequena se virou para trás, sua expressão se retorceu e ela foi para trás do tio.

— Não quero ele aqui.

A voz não estava alta o suficiente para que Ash ouvisse, mas a linguagem corporal dela disse tudo. Ele suspirou, com vontade de sair correndo. Mas continuou andando. A briga com Misty ainda martelava em sua cabeça. Tudo o que ele queria era achar algo que o ligasse a ela novamente. Reprimiu o pensamento. Jamais a deixaria saber isso.

— Por favor, Kira, seja legal. Ele só quer se aproximar de você.

— Mas eu não o quero! Não quero um papai. Tenho você.

Brock sorriu e a beijou na testa.

— Seja legal.

Ela suspirou frustrada e o olhou entediada.

— Hm… oi. – cumprimentou o moreno.

Ela não o respondeu, apenas cruzou os braços e olhou para o lado.

— Kira… – Brock a repreendeu.

— Oi… – falou a contragosto.

— Eu preciso ir. Vou avisar Dayse que ela não precisa vir e…

— Não! Ela é pra vim sim. – reclamou Kira.

— Kira! Não. Não precisa. Cuide bem da minha menina, Ash. Ela disse que queria ir ao parquinho.

— Não quero mais. – retrucou a garota, birrenta.

Brock a beijou na testa e acenou para o amigo, que acenou desajeitadamente de volta. Sozinhos, eles apenas ficaram se olhando, sem graça.

— Hm… então… – Ash começou.

— Não quero falar com você.

— Ah… não queria brincar? – ignorou a fala dela.

— Não com você.

— Vamos pra pracinha então. – continuou o moreno, como se não a escutasse.

— Não quero brincar com você!

Ela se sentou no banco de braços cruzados.

— Vamos – ele tentou pegá-la no colo, mas a menina começou a gritar e ele a soltou.

— NÃO. NÃO ENCOSTA EM MIM. SAI! ME SOLTA!

Uma freira veio correndo, preocupada com a gritaria. Era Leila.

— Qual o problema? Você está bem, querida? – olhou repreensivamente para Ash.

— Não. Eu não quero ele aqui.

— Sou Ash. O pai dela. – o moreno se apresentou, constrangido.

— Não é meu pai não!

— Ah, sim. Brock nos avisou sobre você…

Ash sorriu sem graça e bagunçou os cabelos novamente.

— Ainda estamos nos entendendo. – ele tentou sorrir, mas tudo o que saiu foi um falso sorriso, carregado de tristeza.

— Tudo bem. Só não grite, ok, querida? Temos bebês aqui também.

Yukira torceu a expressão facial, contrariada. Olhou para Ash, ainda contrariada. Suspirou e, emburrada, desviou o olhar dele. Leila saiu com um sorriso meigo no rosto, deixando pai e filha novamente sozinhos.

— Vamos, Kira, eu só quero brincar com você.

— Não me chama de Kira! Pra você é Yukira.

Ele suspirou e bagunçou os cabelos novamente. Sentia as lágrimas quererem aparecer, mas as impediu. Sentia estar no pior pesadelo de todos.

— Ok, ok. Vamos na pracinha?

— Não vou brincar com você!

— Você tava tão mais legal lá na ilha… – ele suspirou.

— Não sabia quem você era lá na ilha.

Ash suspirou e, meio derrotado, se jogou no banco ao lado dela. A garota o fuzilou com o olhar e se afastou.

“Você é meu herói” ela dissera, há tanto tempo que parecia quase que uma vida inteira se passara.

— Senhor? – Raki apareceu, tímida.

Raki vinha observando o par há vários minutos, curiosa. Não precisara pensar muito antes de decidir falar com o mais velho. Ela sempre fora uma menina de atitude. Você tinha que ser para sobreviver no lugar onde crescera.

— Sim?

— Eu brinco com o senhor.

Ash quis rir. A menina de doze anos e cabelos rosados que ele nem mesmo sabia o nome parecia querer brincar com ele, mas sua própria filha, de seis anos, não queria fazê-lo. Sentiu vontade de rir da ironia, mas se limitou a sorrir gentil para a pequena.

— Obrigado. Na pracinha?

Raki assentiu com a cabeça e Ash pegou Kira no colo – que imediatamente começou a gritar e a se debater, porém dessa vez ninguém apareceu pra interrompê-los – e a colocou em um banco bem próximo à praça, onde poderia ficar de olho nela.

— Você fica aqui, onde eu posso te ver.

E então ele saiu com a menina de doze anos para brincar de montar um castelo na areia a poucos metros de onde a filha estava.

— Daqui a pouco ela vem. Eu tinha uma irmã mais nova, a única forma de fazer ela brincar com a minha irmã mais velha era quando eu tava brincando com ela.

Ash riu para a menina, encantado com a atitude dela.

— Nossa… obrigado, viu?

— Nem esquenta. Eu gosto dos shows da mãe dela. Sempre assisto pela televisão.

Ash suspirou. Misty. Sempre tinha que ser a Misty! Por que ninguém fazia nada por achar ele um cara legal ou por qualquer outro motivo infame. Por que sempre que tinha que ter a ver com a Misty?!

— Hm.

— Vocês brigaram? – ela tentava manter o castelo em pé.

— Uhum.

— Por quê?

Ash sorriu sem graça. Ele não conseguia explicar as coisas nem mesmo para si, que dirá para uma criança.

— Coisa de gente grande.

— Eu sei bastante coisa de gente grande. Eu te conto por que eu to aqui se você me disser por que brigou com ela.

— Ah… nós brigamos. Entende? Coisa de gente grande, já disse.

— Papai gostava de dormir comigo e ele fez isso – levantou a manga da blusa, onde várias marcas de queimadura se encontravam – com o cigarro. Eu sei coisas de gente grande. Anda, explica.

Ash ficou sem saber o que falar por vários segundos. Observou a menina que estava à sua frente, montando um castelo de areia enquanto conversava sobre os problemas dele.

— Quantos anos você tem?

— Doze. Como você é enrolado. – reclamou ela, emburrada.

Ash retorceu a expressão, exatamente como Kira fizera apenas alguns minutos atrás. Ao longe, a pequena observava a cena emburrada. Não era para ele tê-la deixado sozinha.

— Pra simplificar: Misty teve a Kira e nunca me avisou. Agora eu tenho que, de alguma forma, conseguir fazer ela gostar de mim.

Raki riu.

— Você é um bom fazedor de castelos – ela disse, terminando de fazer as janelas – ela vai gostar de você.

Ash sorriu, encarando a menina sorridente que o ajudava a montar o castelo. Como alguém que passara pelo que ela havia passado – e ele sabia apenas uma pequena parte do passado de Raki – conseguia continuar tão… feliz?

Yukira saiu do banco e empurrou Ash até conseguir sentar no lugar em que ele estava antes.

— Ela é minha amiga.

E começou a ajudar Raki a montar o castelo. Raki riu e piscou discretamente para Ash, que se sentou e observou as duas meninas brincando por quase uma hora. E não se cansou. Provavelmente nunca se cansaria de observar os bracinhos finos se mexerem para tirar o cabelo da boca, de observar a concentração que ela fazia para deixar tudo perfeito. Pela primeira vez no dia, a lembrança de Misty não o fez sentir raiva, apenas saudade. Olhou para a pequena e a viu imitar cada gesto típico de Misty e se maravilhou. Tinha vontade de abraçá-la a cada palavra dita, a cada movimento perfeitamente realizado, a cada… a cada vez que ela respirava. Porque, é claro, a filha dele respirava de uma forma muito mais legal do que as outras crianças.

— Ficou lindo! – Raki comemorou.

Ash sorriu. As duas começaram a rir, felizes com o término do trabalho.

— Eu tiro uma foto.

As duas se abraçaram e pararam atrás da obra-prima. Yukira se esqueceu, apenas por aqueles minutos, de que não gostava do pai. Ash tirou a foto e se sentiu vitorioso. Guardaria aquela foto até o fim de seus dias. A foto em que sua filha ria na direção dele – porque não era para ele – seria, para sempre, sua.

— Ficou lindo, Raki-chan! – comemorou Yukira também, feliz.

— Parabéns, meninas.

Mesmo que ele tenha feito toda a estrutura e elas tenham apenas enfeitado, o moreno ficou mais do que feliz em deixar-lhes com todo o crédito.

— Precisamos de um banho, Kira! – percebeu Raki.

O apelido quase doeu aos ouvidos do moreno. Até mesmo a menina que conhecera na noite anterior podia chamá-la por ele, mas Ash não podia fazê-lo. Era o único proibido de ser carinhoso com Kira e o homem que mais o queria ser.

— Uhum… é.

Ambas se encararam. Completamente sujas de areia, suas roupas estavam encardidas. Nos rostos, apenas sujeira e suor. Yukira olhou para o lado, envergonhada. Até mesmo Ash, que tivera pouquíssimo contato com a filha, sabia que havia algo errado.

— O que foi, Kira? – perguntou.

— Nada que te interesse!

Ash suspirou. A frieza de sempre voltara. Não havia mais euforia por castelo de areia para fazê-la odiá-lo menos. Lado positivo: ela não reclamara do apelido.

— O que foi, Kira? – Raki repetiu a pergunta dele.

— Nunca tomei banho sozinha – admitiu. – Mamãe sempre toma comigo.

Raki riu e segurou na mão da nova amiga.

— Eu te ajudo – prometeu.

~~xx~~xx~~xx~~xx

Misty não soube por quanto tempo ficou simplesmente deitada em sua cama, imóvel. Sentia como se toda a sua força de vontade tivesse sido sugada, e deixou algumas lágrimas escaparem. Fazia apenas um dia, e a saudade que sentia de sua menina era tão forte que chegava a doer.

Lily entrou no quarto com um prato de comida, mas a ruiva nem ao menos desviou o olhar para a irmã. Desde que chegara em casa, não dirigira uma única palavra aos amigos ou às irmãs. O único com quem falara fora Yuri, e o garoto estava na escola. Escola… Kira vinha perdendo muitas aulas, isso não era nada saudável para a garota. Suspirou, e sentiu uma mão carinhosa lhe acariciar os cabelos.

— Vamos, Myst, não fique assim, nós…

Mas a ruiva se levantou e saiu do quarto, deixando a irmã para trás. Apenas de ouvir a voz dela a raiva voltava a crescer. Caminhou até o quarto de Yuri, procurando por alguma roupa da filha. Queria sentir o cheiro dela novamente.

Quase caiu ao ver uma jaqueta azul pendurada na porta do guarda-roupa. O que significava aquilo?! Ah… Ash dera sua jaquetapara a menina lá na ilha, há tanto tempo atrás. Caminhou irritadamente até a peça com a intenção de jogá-la contra a parede, entretanto não pôde. Ao tocar o tecido macio e sentir o cheiro dele misturado ao da filha, tudo o que pôde fazer foi cair ao chão, chorando.

Levou a jaqueta ao seu rosto e escondeu a face ali. Naquele momento descobriu a melhor fragrância de todas. Uma mistura de Ash e Kira. Chorou ainda mais, sentindo o medo de perder a filha consumi-la. Sabia que jamais voltaria a ter Ash, porém não podia perder Kira. Seu coração não aguentaria perder a filha ao mesmo tempo em que perdia, pela segunda vez, o amor de sua vida.

~~xx~~xx~~xx~~xx

Ash, sentindo-se um intruso, acompanhou-as até o quarto. Observou com cuidado cada corredor e cada escada. Olhou para o lugar onde a filha dormia com curiosidade.

— A Kira dorme aqui – apontou, ao ver que a amiga não se movia – a gente já volta, tio.

Ash assentiu com a cabeça sorrindo e sentou-se na cama da filha. Deixou o sorriso sumir e acabou por deitar. Cobriu os olhos com as mãos, incomodado. Ela nunca o aceitaria? Seria tratado com frieza para sempre, sem jamais ser aceito pela filha que tanto amava? Pegou o celular e abriu a foto onde ela sorria. Não era o sorriso que a vira dar com Misty; ela tampouco sorria para ele, mas, ainda assim, Ash sentia-se especial. Porque tinha uma foto dela sorrindo. Sua foto. Sua para sempre. Salvou a imagem como papel de parede. Sorriu para a pequena. Era linda, como a mãe. A imagem não era das melhores, mas os olhos verdes brilhantes ainda podiam ser vistos. Os cabelos negros, como os dele, brilhavam daquele jeito majestoso que só cabelo de filha brilha. E os dentinhos brancos também. Ela sorria. E ele poderia ver esse sorriso quantas vezes quisesse. Naquele momento, resolveu que o veria para sempre. A partir daquele momento, decidiu que o motivo de sua existência seria fazer Yukira, Misty e o filho que estava por vir sorrirem.

Repreendeu-se logo após ter o pensamento. O objetivo de sua vida seria fazer Yukira e o irmãozinho que estava por vir sorrirem. Ou seria uma irmãzinha? Ele sorriu ante a possibilidade. Mais uma menininha para alegrar os seus dias. Seria ela igual à Kira? Torcia para que sim. Ou seus cabelos seriam ruivos? Uma ruivinha de olhos verdes? Oh, não. Kami não seria mau a ponto de colocar uma miniatura de Misty em sua vida. Não, ele seria sim. E então, de repente, sabia como a filha seria. Sim, uma menina igual a Misty. Uma menina com a personalidade quase igual a de Yukira. Mais uma menina que o odiaria. Não. Ele seria presente na vida do segundo filho. Sim, seria. “Ela vai me odiar de qualquer forma. Eu sou um péssimo pai. Ela vai me odiar e vai querer que o Rudy seja o pai dela” pensou em desespero.

Seus pensamentos quase depressivos foram interrompidos pela vozinha que ele aprendera a amar em poucos dias.

— Friiiio.

Ela apareceu apenas com uma toalha. Ash se colocou em pé quase imediatamente e a viu correr direto para debaixo das cobertas. Ele franziu as sobrancelhas.

— E sua roupa? – perguntou.

— Você quem me diz – disse o óbvio, estreitando os olhos, levemente confusa. – Não escolheu nenhuma?

— Eu devia?

— Mamãe sempre escolhe. Ou tio Brock.

— Eu escolho.

Se Misty fazia, então ele também podia fazer. Andou até a mala que havia ao lado da cama e a abriu. Tudo o que viu foi rosa. Era tudo rosa. Rosa ou branco. Ou azul. Sem meios termos. Ou rosa, ou branco, ou azul. Ele pegou uma camiseta de mangas cumpridas na cor rosa e uma calça azul – parecia Jeans.

— Não combina! – Yukira protestou.

— Ah, ok…

Depois de ouvir a mesma reclamação mais cinco vezes, ele percebeu que ela só gostava quando ambos tinham a mesma estampa. Estava começando a entender quando ela se cansou.

— Eu quero a saia e a blusa rosa ali.

— Tá frio demais pra usar saia.

— A mamãe deixa – mentiu. Misty nunca a deixava usar saias no inverno.

— Mas eu não. É muito curto – não havia nenhum menino ali, mas, ainda assim…

— Mas tem a meia-calça branca – apontou para uma calça bem justa, que era uma meia-calça grossa, mas para o moreno era tudo igual.

— E você vai usar isso por baixo?

Ela assentiu com a cabeça. Ele colocou a meia-calça, a saia por cima e a blusa que ela queria usar na cama, como se estivesse em uma boneca imaginária.

— Tem certeza que se usa uma calça E uma saia?

— É meia-calça, bobão. E todo mundo usa.

Ele franziu as sobrancelhas, sem ter muita certeza de que ela estava falando realmente a sério.

— Tá… mas a blusa é muito fina

.— Mas eu quero usar ela!

— Então vai ter que colocar o casaco por cima – disse, pegando um casaco azul.

— Mas não combina!

— E esse? – pegou um rosa.

— Eu não quero usar casaco.

— Ou usa casaco, ou não vai usar essa blusa – Ash ameaçou.

— Eu não quero o casaco!

— Mas tá frio! – obviamente, a ameaça fora vazia.

— Eu não sinto frio.

— Vai ficar doente e seus tios vão me espancar.

— Eu não quero casaco! A mamãe me deixa andar sem casaco.

— Deixa nada.

— Deixa sim! Eu não quero usar o casaco!

Ash suspirou, derrotado.

— Você quem vai morrer de frio.

Ela lhe mostrou a língua, vencedora.

— Eu quero uma calcinha.

Ele ruborizou. Ok, talvez o segundo filho devesse ser um menino.

— Pega.

— Não! Pega pra mim.

Derrotado, Ash pegou uma calcinha da mala.

— Não quero essa. Quero a rosa.

Ele suspirou e ela sorriu. Não se importava realmente com qual calcinha ia usar, só queria que ele soubesse que era ela quem mandava. E ele sabia. Ash faria tudo o que ela pedisse. Ele lhe entregou a calcinha rosa.

No fim, saíram do quarto com Yukira com uma sapatilha, meia-calça branca, saia rosa, blusa sem mangas também rosa e com o sorriso mais convencido que Ash já vira. Ele suspirou, mas sabia que cederia a todos os desejos dela. Assim como costumava ceder a todos os desejos de Misty.

— Kira! Não tá com frio?

A garota de cabelos rosados estava coberta com um casaco.

— Eu não sinto frio – sorriu.

Ainda estava quente pelo banho, mas o ar gelado que tiveram que pegar para chegarem ao refeitório – onde a janta seria servida – lhe arrepiou os braços. Não se deu por vencida. “Eu não sinto frio. Eu não sinto frio. Eu não sinto frio” ficou repetindo para si mesma.

— Sopa! – Ash sorriu ao ver o jantar que teriam.

Kira sorriu e os três jantaram juntos. Raki comeu menos do que os dois e começou a ficar pálida, indo dormir mais cedo do que os demais. Ash percebeu que Kira ainda tremia, e tirou seu próprio casaco e colocou ao redor dela.

— Eu não quero seu casaco! – ela protestou, começando a tirá-lo.

— Está frio, e se não usar eu vou contar pro Brock.

Ela se calou perante as palavras dele, irritada, e voltou a comer. Mas deixou o casaco e Ash sorriu, querendo tirar outra foto. Ash acompanhou a filha até o dormitório desta, onde se despediu na porta.

— Eu vou ir, mas volto amanhã, tá?

— Não precisa voltar, eu não gosto de você – colocou todo o veneno que uma menina de seis anos consegue colocar na voz.

Ash suspirou e se abaixou para beijá-la na cabeça, mas a mesma se encolheu e o empurrou. No fim, acabou desistindo.

— Saaaaai!

— Desculpa. Tchau, Kira.

— É Yukira. YUKIRA. Ok? E não precisa voltar.

Dizendo isso, ela saiu e caminhou até sua cama, torcendo para que Togepi já a estivesse esperando. Estava. Olhou para a porta. Ash já fora. Ela retirou o casaco dele e pegou o seu rosa. Vestida assim foi escovar os dentinhos de leite e percebeu que um estava frouxo. Virou-se para ir contar à mãe e então lembrou que não poderia. A tristeza cobriu o rosto rosado e ela caminhou cabisbaixa à sua cama. Colocou o pijama que usara na noite anterior e se escondeu debaixo dos cobertores, abraçando o pequeno Pokémon que considerava como a um irmão. Seu plano era despejar sobre ele tudo sobre o castelo e o quanto detestava Ash, mas assim que deitou, ela percebeu que estava exausta. Adormeceu poucos segundos depois de ouvir o adorado Pokémon lhe desejando boa noite.

Ash foi para sua casa logo após se despedir da filha. No caminho, uma lágrima idiota e rebelde escapou sem sua permissão. Ser pisoteado e esnobado pela menininha doía bem mais do que ele deixava escapar. Queria que ela o amasse como ele a amava. E pensar que quando estavam indo buscar Misty ela começara a gostar dele. Ela o convencera a ir ajudar a ruiva quando dissera “eu preciso de você”. Olhou para o volante, perdido em pensamentos. Não precisava mais. Quis que Misty fosse novamente sequestrada para que Kira precisasse dele novamente. Ash queria ser necessário na vida da filha. “Sou um inútil” suspirou. Olhou para a estrada, sem realmente prestar atenção por onde andava, apenas querendo chegar em casa logo. Foi com um sorriso que lembrou a primeira vez que ela o abraçara. No Lapras, segundos depois de ele quase a ter deixado cair na água. Sentiu as lágrimas quererem sair novamente. Não aproveitara aquele momento. Ele nem ao menos aproveitara o momento em que ela envolvera os braços ao seu redor e o agradecera. Quis rir. Yukira lhe dissera: “Obrigada, Ash”. Quem diria? A menina que agora não demonstrava nenhum sinal de afeição por ele o abraçara. Ela dormira em seu peito! Por que agora não poderia ser o mesmo? Por que não dormia em seu peito agora? Por que sequer a deixava chegar perto dela? Ah, claro. Misty. Sempre Misty. E novamente seus sentimentos conflituosos sobre a ruiva voltaram a tomar conta. Ele não soube como chegou em casa sem que batesse em algum lugar. Mas agora que começara a voltar no tempo, não conseguia mais parar. Fechou os olhos. A noite em que o irmãozinho dela fora concebido também lhe passou momentaneamente pela cabeça, mas essa ele tratou de esquecer. Não queria pensar em Misty.

Deitou-se em sua cama se lembrando de como impedira Lily de pegar Kira quando chegaram à ilha. Ele a levou o caminho inteiro. Fechou os olhos, lembrando-se dela contra seu corpo. A pequena havia o abraçado bem forte, procurado a proteção dele, como todas as crianças fazem com seus pais. E ela dissera que ele era o seu herói. De todas as lembranças, essa era a mais querida. Sentiu-se ir ao mundo dos sonhos. Como último desejo, ele quis ser aceito. Se pela filha ou pela mulher ruiva que povoou seus sonhos, ele não saberia dizer. Não honestamente. Provavelmente pelas duas.

Continua…


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Notas finais do capítulo

Ok, as notas aqui eram sobre um plágio e um drama que rolou. Eu to mudando porque quer que em busca seja sobre os personagens, e não minha complicada vida de internauta

Hey, quem já tinha lido ela antes percebeu as duas cenas extras que eu acrescentei? (Três, se contar a parte em que o Ash dá o casaco dele - de novo - pra Kira).

Juro que a fanfic já tá quase reescrita (faltam só mais 4), e logo sai o 34. Se tudo sair como eu planejo, talvez ainda nessas férias :33

Revieews? *--*

Bjs e teh + ^3^//



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