Em Busca da Verdade escrita por Camy


Capítulo 27
Mão Mágica


Notas iniciais do capítulo

não, isso não é uma miragem ;3



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/46672/chapter/27

Yukira não conseguia olhar para trás, nem mesmo sabia se queria fazê-lo. Sua pequenina cabeça parecia rodar; estava confusa. Fez a única coisa que sabia fazer quando estava confusa. Correu para os braços de Misty.

Misty abraçou a filha um pouco surpresa e sentou-se no chão na frente de todos, sem se preocupar mais com o juiz, Rudy ou os advogados. Todos sabiam que a farsa acabara.

— Ma… – choramingou a garotinha.

— Tá tudo bem, princesa. Tudo bem. É verdade, meu amor. Mas mamãe queria te contar de outra forma.

Ela olhou ameaçadora para Ash, que apenas lhe retribuiu o olhar de olhos arregalados, aéreo. Acabara de perceber que fizera sua filha chorar. Antes mesmo de ter a oportunidade de conhecê-la direito, fizera-a chorar.

— MENTIRAS! – gritou Rudy, porém ninguém se importava com ele.

— Quieto – ordenou Renji, o juiz. – Decreto o seguinte: os dois farão o exame de paternidade – olhou para seu assistente, que imediatamente se pôs a sair correndo para ligar ao hospital –, e em três dias sairá a resposta. Nesse meio tempo Yukira ficará no orfanato que fica a uma quadra daqui.

— Senhor – Lew foi argumentar.

— Calados todos – rugiu Renji. – Meu tribunal está uma bagunça, isso nem mesmo é um tribunal – irritou-se. – Essa sessão está encerrada, todos podem ver a menina. Menos a mãe, pois ela precisa ser avaliada psicologicamente durante um mês. Depois de eu ter um atestado do psicólogo, tanto de mãe quanto de filha, eu vou dar meu parecer quanto a esta questão. No mais, nos vemos em três dias.

Ninguém pôde rebater – ambos os advogados tentaram –, pois Reiji simplesmente saiu andando. Iria direto para o bar, sabia. Nunca, em todos os seus anos de trabalho, tivera um tribunal tão conturbado. Nem mesmo quando trabalhara bêbado – acontecera algumas vezes apenas. Em sua mente, nem mesmo fora um tribunal. Fora apenas uma comédia que dera errado porque alguns dos atores começaram a rir. Era como via. A cabeça doía. Precisava imediatamente do seu drinque diário.

Os jurados começaram a se retirar lentamente, assim como a maioria das testemunhas. No fim, apenas um vulto ficou no canto da sala, além de Rudy, mãe e filha, Ash e companhia, claro.

Ash ainda não conseguira tirar os olhos de Misty e da filha. Sua filha. Experimentou as palavras em sua mente. Depois repetiu o que fizera algumas vezes no carro.

— Minha filha – sussurrou – Yukira. Kira.

Repetiu como um mantra, tentando se acostumar com as palavras. Sentia como se as tivesse falado sua vida inteira. A ruiva abraçava a filha bem forte enquanto esta chorava a cada momento mais compulsivamente. A pequenina sentia-se mais confusa do que nunca.

— Mamãe brigou com Ash quando estava esperando você – a ruiva tentou explicar.

Mesmo que tentasse, ninguém jamais conseguiria entender o que passava pela cabeça da menininha de seis anos. Estava mais confusa do que jamais esteve anteriormente.

— Mas Rudy? – perguntou magoada.

— Mamãe foi boba, amor. Coisa de gente grande. Gente grande faz um monte de idiotices e pensa que ‘tá certo. Aí mamãe deixou seu papai. Mas não queria que você ficasse sem papai. Então falou com Rudy pra fingir que era seu papai.

— Mamãe… você mentiu pra mim?

A pergunta quebrou o coração da ruiva. Kira sabia a resposta – era óbvio – mas precisava perguntar. Ouvir as respostas da boca da mãe.

— Menti, meu amor. Perdoa a mamãe?

Misty sempre encarou de frente os seus problemas. Sempre. E não era agora que fugiria da verdade que viera à tona da pior maneira possível. Masao sentou-se. Chikao o encarregara de cuidar da pequena e saíra atrás de Reiji. Esperaria todos se acalmarem e então os acompanharia até o hospital.

— Mamãe, por que mentiu pra mim? – perguntou Yukira.

— Mamãe já disse. Mamãe errou. Pode me perdoar? – ela chorava também.

— Em que mais mentiu? – perguntou magoada. – Você não me ama?

— Amo – Misty chorava –, amo, amo, amo, amo, amo – prometeu – amo muito. Foi só isso, mamãe jura.

A menina estava magoada, mas… era sua mãe. Seu porto seguro. A única pessoa em quem realmente confiava. Em quem confiava de corpo e alma. E a surpresa não era assim tão grande; já sabia que Rudy não era seu pai. Entretanto… Ash?

— Tudo bem, mamãe. Eu amo você.

A ruiva chorou mais, agora de felicidade. Kira realmente a perdoara? Assim tão fácil?

— Me perdoou? Mesmo? – a voz era chorosa.

— Mas é claro, mamãe – o choro diminuía – eu ainda confio em você. Mas promete explicar quando eu crescer?

Yukira tinha plena consciência de sua idade, e era isso que fazia dela uma menina tão inteligente. A garotinha nunca realmente se achara capaz de entender as complexidades dos adultos, e sequer tentava. Tudo o que queria, naquele momento, era o colo da mãe e a promessa de que ficariam juntas.

— Prometo, minha princesa. Prometo sim.

A garota se calou, e permitiu que a mãe a enchesse de beijos. Sentia-se estranha. Ash era seu papai. Se houvesse descoberto antes, talvez ficasse feliz – afinal, ele era seu herói –, porém agora eram duas decepções ao mesmo tempo. Além de descobrir que a mãe mentia, também descobrira que o homem que tanto admirava por ter salvado a vida da sua mãe queria separá-las.

— Eu vou pra um orfanato? – agora pensava nas palavras do juiz.

Misty suspirou. Detestava-se por continuar a magoar sua pequenina. Não sabia mais o que fazer. Não podia mais mentir.

— Só por três dias. Tio Brock vai ir te ver sempre. Vai passar todas as tardes com você.

Mas Yukira sabia o que era um orfanato. Era para onde as crianças iam quando eram abandonadas. Imediatamente lembrou-se das palavras de Melina, e sentiu os olhos marejarem ainda mais. “Não sei como sua mãe ainda não te mandou prum orfanato, Kira! Você é tão chata!”.

— Não quero ir pra um orfanato – voltou a chorar.

— Togepi estará com você sempre, prometo.

Para confirmar as palavras da ruiva, o Pokémon apareceu sobre elas, e voou para o colo de Kira, acariciando-lhe a mão. Não se importava mais em ser visto.

— Mamãe, e o tribunal? E depois? Como a gente vai ficar juntas…?

— Shhh – ela ninou a pequena. – Não se preocupe com isso, ok? Isso é problema de gente grande. Você é pequena ainda, filha. Aproveita isso. Não se preocupa com nada, ‘tá? Mamãe ‘tá aqui. Mamãe vai cuidar de você.

— Promete?

— Prometo.

A ruiva beijou os cabelos negros e olhou para frente, onde viu Pikachu. O Pokémon se aproximava lentamente, temeroso. Ash também fixou os olhos no Pokémon.

— Pikachu? – Yukira perguntou confusa. Por que ele não vinha de uma vez, se esta claramente era a vontade dele?

Ele a olhou. Os olhos negros brilhavam. Era filha de Ash. De certa forma, sua irmã – ou sobrinha? Não sabia.

— Ele pode se aproximar? – Misty perguntou por ele.

Yukira apenas assentiu com a cabeça, confusa. Por que não poderia?

Ele se aproximou devagar, sem pressa. Subiu na perna de Misty, pois sabia que a ruiva jamais o rejeitaria. Olhou para Kira. De certa forma, ela era um pouco sua também. Misty acariciou as orelhas do Pokémon. Togepi depositou-se na cabeleira ruiva de Misty e analisou a cena abaixo de si com uma maturidade que ninguém sabia que ele tinha – exceto Misty, claro.

— Faz carinho, filha.

Lentamente, Kira levou sua mão à cabeça amarela. Acariciou. Pikachu sorriu. A pequena sorriu de volta.

— Gosto de você. – segredou Kira.

Misty colocou o Pokémon no colo da pequena, que o aninhou. Misty fez o mesmo com ela. Aninhada e quentinha, Yukira fechou os olhos. Não sabia o quão cansada estava. Os olhos de Pikachu brilhavam. Ele fechou os olhos também. Sabia que Ash sofria, mas o moreno se resolveria, ele tinha certeza. Ash apenas olhou a cena. Sentia ciúmes do melhor amigo e o ratinho sabia disso.

A ruiva não soube por quanto tempo ficou ali. Somente sentiu suas costas começarem a doer. Tocou Pikachu e ele desvencilhou-se dos bracinhos finos. Kira nem se mexeu. Misty caminhou até perto da parede, onde se apoiou. Suspirou aliviada.

Ainda parado, apenas observando, Ash deixou uma lágrima escapar. Ela nem mesmo se virara para vê-lo. Sua filha simplesmente correu para Misty. Sempre Misty. Apenas Misty. Sentiu raiva da ruiva. Quis excluí-la, quis fazê-la parar de existir; quis trocar de lugar com ela.

— Me devolve minha filha! Eu vou levá-la ao hospital agora. – gritou Rudy, claramente perdendo o controle.

Estava tudo dando errado, seus planos estavam desandando, e o moreno jamais imaginara que os acontecimentos seriam daquela forma.

— Pare de gritar, imbecil. Ela dormiu – a ruiva falou baixo.

Rudy sentiu a raiva voltar. Sempre Kira, tudo para Misty se baseava naquela pirralha desgraçada.

— Pois que acorde! – gritou novamente.

Queria atenção. Queria que Misty olhasse para ele da mesma forma que olhava para a garotinha que repousava tão confortavelmente nos braços de sua esposa. O divórcio ainda não fora assinado – e, se dependesse de Rudy, jamais seria.

Mas Misty tampara delicadamente os ouvidos da pequena. Sabia o quanto a filha precisava de descanso. Os próximos dias seriam os piores de sua curta vida. Uma lágrima escorreu pela pele meio amorenada de Misty com o pensamento.

— Cale a boca – Ash ordenou, irritado.

Pikachu não precisou de nenhum comando. O ratinho descarregou energia em Rudy, que caiu desmaiado. Togepi balançou seus bracinhos e o fez levitar; olhou para Brock.

— Vamos Togepi, precisamos deixar esse idiota lá no hospital.

O pequenino assentiu com a cabeça e foi em direção ao mais velho.

— Vão ir? – Ash indagou, sentindo-se subitamente desamparado.

Alternava sua visão entre os amigos e Misty.

— Sim. – Brock remexeu na bolsa que trouxera. – Coloque isso aqui em Kira, ela sempre sente frio quando dorme – entregou-lhe um cobertor cor-de-rosa.

Ash acenou e todos se foram, deixando o casal quase sozinho na imensa sala. Ash não se mexeu por vários segundos, sem saber exatamente o que fazer. Depois de algum tempo, resolveu se aproximar. Apertava o cobertor tão forte que o amassou.

— Não vai ir também? – sussurrou Misty.

Ela não aguentava o silêncio. Não com Ash ali. Não com o garoto mais tagarela que já conhecera. Perto dele, o silêncio era sufocante.

— Vou depois. Não sei se consigo ver Rudy sem matá-lo. – murmurou a contragosto, focando-se na trouxa confortavelmente encaixada nos braços finos de Misty.

Algumas lágrimas escorreram pela face morena, mas Misty não viu. A ruiva tinha os olhos fechados, e um suave sorriso enfeitou seus lábios.

— Então desejo que vá agora.

O moreno ficou em silêncio. Observou atentamente e ex-namorada e a filha. Sua filha. Sorriu por alguns segundos e se abaixou, estendendo o cobertor. As lágrimas ainda brilhavam contra a luz que lhe tocava a face, e Misty sentiu seus olhos marejarem ao vê-las. Mesmo depois de tanto tempo, o sofrimento de Ash lhe era doloroso.

— Coloque – ela pediu.

Ele tentou, mas não sabia como fazê-lo sem acordar a menina ou tocar em Misty. Não sabia qual das opções era pior.

— Er…

— Ela não vai acordar. Dorme que nem uma pedra; puxou isso de você – a ruiva revelou, sorrindo de canto.

Ash sentiu raiva novamente. Ela puxara alguns de seus traços – óbvio – e ele apenas sabia porque, após seis anos, eles resolveram lhe contar. Sentiu raiva dela. Colocou a coberta de qualquer jeito sobre a menina e Misty a ajeitou cuidadosamente. Yukira nem mesmo alterou sua respiração.

Os atentos esmeraldinos seguiam Ash, que caminhava em círculos irritadamente. As lágrimas novamente escorriam pela face bonita.

— Você é tão egoísta – ele desabafou.

A ruiva lacrimejou, porém manteve-se firme. Ouviria. Era a vez de Ash chorar, não dela. Aguardaria pacientemente seu momento de desabar.

— Eu sei.

— Não, você não sabe Misty. Você esteve com ela o tempo todo! Acha que ela vai me aceitar agora? Realmente acha? Ela sempre vai perdoar você, mas nunca vai me perdoar. Porque ela confia muito mais em você. E mesmo que ela me aceite… E os primeiros passos? O primeiro sorriso, a primeira palavra? – as lágrimas escorriam dos olhos castanhos. – Você não sabe como dói ver que sua filha nem olha pra você. Ela me odeia! Odeia!

A ruiva deixou algumas lágrimas silenciosas escaparem, mas segurou as palavras entaladas em sua garganta. Kira não odiava Ash, e a cena que presenciara na ilha apenas provavam isso. Ash limpou os olhos. Nunca sentira tanta raiva em sua vida.

— Eu não acredito que fez isso comigo. Eu pensei que você fosse corajosa, mas não passa de uma covarde. Se você aparecesse com ela seis dias depois, ou seis meses depois, eu acho que ainda ia conseguir te perdoar, mas seis ANOS? Seis anos é muito tempo. Eu perdi toda a vida dela. Ela nem mesmo me conhece! Eu não sei quando ela sente frio, não sei os costumes dela, não sei nada sobre ela! Você é tão extremamente egoísta!

Ela ainda não falava; simplesmente o deixava colocar para fora toda a angústia, toda a raiva, toda a dor que assolava sua alma. E Ash fazia exatamente aquilo.

— Você podia ter mandado uma carta, sabe? Ou dito pro Brock me dizer: “Ah, é, Ash. A Misty está esperando um filho seu”. Podia! Por que não fez isso, hein? Acha que eu ia roubar a menina e fugir? Porque eu sei que é o que você ia fazer hoje. Ou vai me dizer que planejava me contar tudo depois do julgamento? – ele foi irônico – Eu seria um bom pai!

— Eu só tinha vinte anos… – a defesa escapou por entre seus lábios.

— E depois fez vinte e seis e continuou uma criança! – ele se descontrolava, sua voz subindo. Misty agarrou mais forte o corpo adormecido da filha. – Você não se importa com ninguém além de si mesma. É egoísta, mesquinha e mimada. Ser amado por você dói – ele cuspiu as palavras. – Você me amava e quebrou meu coração e as minhas esperanças. Você ama Kira e escolheu um pai que bateu nela – a raiva lhe subiu pela cabeça. – Você ama suas irmãs, e Lily está tão estressada pelos últimos acontecimentos que chega ao ponto de gritar e dormir chorando, segundo o Brock me contou. Ser amado por você é uma maldição.

Quando estamos muito magoados, sempre queremos magoar quem nos deixou assim. Ou então quem quer que esteja por perto, às vezes até mesmo aqueles que querem nos ajudar. E Ash queria muito magoar Misty. Queria que ela sentisse o mesmo que ele sentia. Queria vê-la quebrada do mesmo jeito que ele estava quebrado. E por isso disse a maior mentira de sua vida.

— Eu odeio você, Misty Waterflower. E meu maior arrependimento é ter te salvado do Rudy.

Ela não disse nada, apenas chorou. Seu corpo tremeu e Kira começou a se remexer. A ruiva sabia que a filha estava acordando, porém quando começou a limpar as lágrimas já era tarde demais.

— Mamãe, por que ‘tá chorando? – os olhinhos demonstravam toda a preocupação que seu coração sentia. Ash tentou não olhá-la, mas estava vidrado na filha.

— Nada, meu anjo – ela limpou as lágrimas. – Mamãe ‘tá bem – seu corpo se apoiou contra a parede novamente.

Confusa, a pequena olhou ao redor, ainda um pouco sonolenta. Procurava com seus observadores olhos esmeraldinos pelo culpado pelas lágrimas da mãe, e encontrou Ash. Por um momento, quase pediu ajuda a ele. Entretanto, as palavras de Misty ecoaram em sua mente…

“Se ele soubesse de você, iria te tirar de mim”

… e tudo o que sentiu foi raiva. Uma raiva tão imensa que a fez parecer cinco centímetros maior. Com o cenho franzido, a menina voltou a agarrar-se à mãe.

— Foi você que a fez chorar? – cuspiu acusatoriamente para Ash.

O moreno quase recuou ao ouvir o tom de voz dela. A menina já se excedera com ele, é claro, e já lhe dissera palavras realmente horríveis – tudo por culpa de Misty –, porém Ash nunca pensou que tão poucas palavras pudessem lhe causar tamanho sofrimento. Teve que engolir em seco para que as lágrimas não saíssem.

— Não, anjinho – Misty se adiantou. Ash sentia-se perfurado por facas. – É só uma das besteiras da mamãe. Que acha de irmos ao hospital, hein? Acabar logo com isso.

Ela olhou para baixo, mordendo o lábio inferior. O cobertor rosado já caíra ao chão devido a movimentação da pequena.

— Não quero ir. Vamos fugir – Kira quase implorava.

Togepi voltou. Os olhinhos negros estavam em desespero. Encarava a dona com medo. Voltou os olhos para Ash que franziu as sobrancelhas para ele. Kira não percebeu sua presença. Misty sentia-se tonta, e tentou sorrir para a menina. Não poderiam fugir naquele momento, independente do quanto ambas quisessem fazê-lo.

— Vamos ao hospital, princesa. – pediu a ruiva.

Yukira suspirou e se escondeu contra o corpo dela, assustada. Não queria sair dali, não com Ash por perto. Sentia que o moreno iria simplesmente pegá-la e sair correndo – mais ou menos o que Rudy fizera com a mãe.

— Tá, mas me leva no colo – ela pediu, sussurrando. Não queria soltar Misty nunca mais.

Misty suspirou. Não tinha certeza de que conseguiria se levantar sozinha. Com a filha no colo, era impossível. Não sentia a presença de Togepi, e a dor de cabeça apenas se intensificava. Tentou sorrir, para que Kira não se preocupasse.

— Pensando bem, mamãe está exausta. Por que não ficamos por aqui mais um pouquinho?

Ela escorou a cabeça na parede e fechou os olhos. Logo seu corpo inteiro amoleceu. Ash entendeu.

— Mãe? – a pequena iria sacudir a mãe, porém Ash a impediu.

— Deixe-a dormir. Misty estava exausta.

Não havia mais raiva. Não havia mais ódio. Assim como viera, ele se fora. Como fumaça. Todos os sentimentos ruins que Ash tinha a respeito de Misty desapareceram como se jamais houvessem estado ali.

— Você não sabe nada sobre a minha mamãe – irritou-se Yukira, porém saiu do colo da ruiva. Kira sentou-se ao lado da mãe e segurou a cabeça da mesma. Togepi circundou o corpo da dona e o depositou lentamente no colo da pequenina, que sorriu agradecida. Começou a acariciar os cabelos ruivos, satisfeita.

Antes Misty nanava a filha, e agora a garotinha retribuía o carinho. Carinhosa, a menina pegou seu cobertor e cobriu o torso da mulher. Ash tentou, com todas as suas forças, não achar a cena adorável.

— Devíamos ir ao hospital. – sugeriu Ash.

— Não foi você quem disse que mamãe era pra ficar dormindo? – Kira cuspiu as palavras.

— Ela não precisa acordar, eu a levo – involuntariamente, seu coração acelerou ante a possibilidade de tocá-la novamente. Repreendeu-se.

“Ela mentiu. É egoísta, Ash!”. Porém apenas conseguia pensar na imagem frágil da ruiva deitada no colo da menina de seis anos. Frágil como porcelana.

— Mamãe tem o sono leve. – rebateu a pequena.

— Não tem não, quer ver? – ele a desafiou.

Kira estreitou os olhos.

— Ela acorda antes de sairmos daqui.

Ash sorriu e pegou a ruiva no colo. Sentia o corpo dela mais mole do que nunca. Ele a acomodou melhor, tentando inutilmente ignorar a preocupação que o consumia.

— Vamos? – convidou a pequenina a se juntar a ele.

Kira não respondeu, apenas olhou para frente com o nariz empinado. Togepi repousou nos braços da pequenina, e ela o segurou exatamente da mesma forma que Misty fazia. Apenas o Pokémon sentia o tremor que percorria todo o corpo pequeno.

“Ele não me amava mais” Misty dissera. Então por que parecia tão carinhoso com ela? Yukira não entendia, apenas sentia medo. Medo de ser arrancada dos braços carinhosos novamente. Olhou com receio para a ruiva dormindo tranquilamente no colo do homem que a salvara uma vez. Tinha medo de que ela simplesmente desaparecesse.

Caminharam em silêncio. O hospital ficava em frente ao tribunal, portanto não precisaram caminhar muito. Para atravessar a rua Ash obrigou Yukira a segurar seu braço, porém ela o soltou assim que pisaram na calçada.

— Não gosto de você. Acorda a mamãe.

Ela detestava perder. Ash quis rir; sabia que a promessa que fizera era injusta. Misty não acordaria. Não ainda.

— Acho melhor deixá-la dormindo. Sua mãe passou por muita coisa nesses dias, Kira. É melhor procurar uma cama pra ela e depois quando ela acordar ela vai te ver.

As palavras carinhosas novamente. A pequena estremeceu, e tentou disfarçar as lágrimas que queriam escorrer. Ash não podia ser carinhoso com a mãe, porque ele não a amava, e apenas se é carinhoso com quem se ama. Rudy também era carinhoso com sua mãe. Estaria Ash querendo fazer o mesmo que o outro?

— Não! Quero minha mamãe agora – eles entraram na recepção, onde Brock os esperava – e não me chama de Kira. É Yukira.

Ash suspirou, mas assentiu com a cabeça. A menina estava em dúvida. Corria para Brock ou gritava até Misty despertar?

— O que aconteceu? – Brock perguntou.

— Misty dormiu – ele olhou significativamente para Kira, deixando claro que era o que a menina pensava. – A baixinha quer acordá-la, mas eu acho melhor deixar ela dormindo.

Brock lançou um olhar preocupado para a mulher que parecia descansar tão tranquilamente nos braços de Ash e depois sorriu para a sobrinha.

— Vamos lá fazer o exame, Kira? Depois mamãe vai ver você.

— Mas eu tenho medo de agulha – ela fez manha, torcendo para a mãe acordar sozinha.

Tinha algo errado naquilo tudo, ela sabia.

— Eu vou estar lá. Vamos.

Ele pegou a pequena no colo e Kira foi, mesmo ainda birrenta. Não queria deixar a mãe sozinha com Ash, mas achava que não adiantava falar aquilo para o tio. Por isso se limitou a importunar o mais velho a respeito das agulhas.

Assim que a menina saiu de vista, ele correu até a mulher que parecia ser a encarregada por aqueles que chegavam.

— Ela desmaiou, preciso de um quarto – dirigiu-se à recepcionista, que assentiu positivamente.

Rapidamente ela chamou um médico que o direcionou a um quarto particular.

— Ela pode ficar aqui por um tempo, mas vocês estão pagando por hora – avisou o médico.

Ash bufou. O que era o dinheiro em um momento como aquele? Misty estava pálida, e ele sentia que ela ficava cada vez mais gelada em seu colo. Colocou-a delicadamente na cama, e não pôde resistir à vontade de acariciar os cabelos ruivos. Com tudo aquilo, quase se esquecera de como ela era bonita quando estava tranquila.

— Tranquilo. Vai fazer algum teste? – perguntou o moreno, tentando parecer displicente.

— Sim. Faremos alguns exames.

Ash suspirou. Estava sendo idiota, sabia, porém…

— Faça todos os exames em que conseguir pensar. Eu pago.

O médico o encarou por alguns segundos, pensando que podia ser uma brincadeira de mau gosto. Aqueles exames eram caros, principalmente os desnecessários.

— Há muitos motivos diferentes para um desmaio, senhor e…

— Acelerem os resultados. Vou fazer um exame de sangue com a minha filha. Quero o resultado para depois disso.

O homem arregalou os olhos, e se sentiu quase irritado. Se fosse algo simples, o pedido talvez pudesse ser realizado, porém se a mulher tivesse algo sério, nem mesmo todo o dinheiro do mundo aceleraria os resultados. Estava pronto para rebater.

— Mas, senhor, acelerar desse jeito…

— Eu pago em dobro. Só descubram o que ela tem.

O moreno deixou o médico estupefato para trás e foi em direção à sala onde tiraria sangue. Como não sabia o caminho, pediu ajuda a uma enfermeira sorridente. Ao chegar, ele viu uma cena quase cômica. Todos os adultos estavam submissos à pequena morena que reclamava.

— Eu não quero fazer injeção sem mamãe. Vai doer!

— Kira, mamãe ‘tá dormindo. – Brock tentou convencê-la, porém seu sorriso era tão falso que Ash chegou ao ponto de revirar os olhos.

— Deixe de ser boba, queridinha. É só uma picadinha de mosquito. – prometeu a tia de cabelos rosados.

Dawn, que também ria da situação, olhou para o moreno, apreensiva. Ash sinalizou para ela se aproximar e ninguém percebeu o sumiço da morena.

— Vá ficar com Misty, por favor. Ela está no quarto 396. – tinha planejado deixar a ruiva sozinha, porém não conseguia.

Detestava-se por aquilo, mas estava morrendo de preocupação.

— O que aconteceu? – ela perdeu o ar risonho e deixou que uma expressão preocupada lhe tomasse o rosto.

— Não sei, ela simplesmente desmaiou. O médico vai fazer alguns testes.

Dawn o abraçou rapidamente e saiu. Ele observou a pequena mais um pouco antes de se aproximar com um sorriso no rosto.

— Olha só, querida, Ash vai primeiro, né? – May introduziu o moreno.

Imediatamente a expressão da menina se fechou, e Ash sentiu seu coração apertar.

— Claro – ele concordou.

Ash se deitou na cadeira e esperou outra enfermeira sorridente o ajeitar. Kira ainda não o encarava, e o moreno tentou ignorar a vontade quase irrefreável de prender a menina entre seus braços. Queria abraça-la. Queria poder ser pai.

— Não sinto nada. Nada, nada, nada HEEEY – gritou.

Yukira começou a se debater.

— VIIIU? Dói!

Brock e os outros o olharam raivosos e Ash se espancou mentalmente. Que maravilha, estragara a única chance que teria de se mostrar forte perante a filha. Quase desejou que Misty fosse novamente sequestrada, para voltar a receber um beijo na bochecha e uma frase carinhosa. “Você é meu herói”. Onde estava aquela menina meiga agora?

— Foi a enfermeira, ela que colocou no lugar errado, né? Faz de novo – Ash olhou para a mulher pedindo ajuda. Ela riu e concordou. Não se importava em ser a vilã se isso fosse tranquilizar a garotinha.

— A culpa foi minha mesmo, desculpa. Vamos de novo, senhor Ketchum?

Ash abriu seu melhor pseudossorriso e estendeu a mão para a enfermeira.

— Uhum!

A menina o observou por alguns segundos, sem demonstrar real interesse. “Pelo menos ela não tá falando da Misty…”

— Pronto! – informou a enfermeira.

— Viu? Nem doeu. – disse Ash. E não era mentira.

Odiou-se três vezes mais por ter se distraído novamente ao pensar na ruiva.

— Doeu sim. Você tá fingindo – Yukira acusou.

— Eu nunca faria isso!

— Faria sim!

“Você não sabe nada sobre mim.” Foi o pensamento infeliz que passou pela mente de Ash, porém ele não se deixou abater. Não podia permitir que Misty estragasse aquele momento que era apenas deles dois.

— Sua vez, eu fiz, você também precisa.

— Mas vai doer – disse manhosa.

O moreno pensou um pouco. Seu rosto logo se iluminou.

— Eu tenho um segredo – disse convencido.

— Qual segredo? – perguntou desconfiada.

— Minha mão é mágica. Se você apertar ela, não vai sentir dor.

— Você ‘tá mentindo – Kira acusou novamente.

— Claro que não. Duvida? – Ash desafiou.

— Duvido!

— Então segura – Brock deu sinal para a enfermeira, que entendeu o recado.

Yukira pegou na mão do moreno e o olhou desafiador.

— Isso nunca vai funcionar – murmurou indignada.

Entretanto, a menina não vira a aproximação da enfermeira. Esta sorria, com um vidro cheio de sangue em sua mão esquerda.

— Prontinho – ela sorriu novamente.

Yukira arregalou os olhos e olhou para o vidrinho cheio do sangue dela.

— Não disse? – Ash sorriu convencido.

— Doeeeu – não se deixou abater – só que eu sou forte e não reclamei.

Yukira soltou a mão do pai, que riu da situação. Talvez ela não o odiasse, afinal.

— Quem está mentindo agora, hein? – perguntou o moreno.

Foi então que Kira percebeu que não havia nenhuma cabeleira ruiva para socorrê-la naquele momento. A menina sentiu os olhos marejarem. Onde estava sua mamãe? Se não estava ali com eles, então onde que ela estava?

— Quero minha mãe! – entretanto o pedido mais parecia uma ordem.

Ash suspirou. O momento perdeu a magia. Misty. Sempre Misty.

— Ela ‘tá dormindo. – disse sem vontade.

— MAS EU QUERO ELA! – a pequena gritou.

Ash desviou o olhar, irritado. E a menina percebeu isso. Sentiu aquele estranho embrulho no estômago, e quis ainda mais intensamente estar na presença de sua mãe. “Ele não me amava mais. Se soubesse, teria tirado você de mim”. As palavras de Misty ecoaram com tanta clareza na cabeça da garota que ela olhou ao redor, procurando pela mãe. Quando não a encontrou, pulou da cadeira.

— Se acalma, Kira – Brock pediu e a menina obedeceu, mesmo ainda estando irritada. – Vamos pra casa pegar umas roupas, ok?

Masao invadiu a sala com a respiração ofegante.

— Ainda bem – suspirou aliviado.

Drew começou a rir, finalmente se lembrando da presença dele.

— Como foi o cochilo? – indagou o verdinho

Paul e os outros adultos também começam a rir. Menos Ash. Ash estava irritado.

— Não tem graça – murmurou o policial.

Brock cortou as risadas.

— Como eu ia dizendo, vamos pra casa pegar umas roupas e depois a mamãe vai lá te dar um beijo. O que acha?

— Mas depois eu vou ter que ir com o Masao pro lugar ruim lá – não conseguia dizer o nome –, e eu quero ficar com a mamãe…

Ash revirou os olhos. Sabia que se odiaria depois, porém era necessário. Aquela era a única forma de convencer Kira a ir para casa. Ou, pelo menos, era o que o moreno tentava dizer a si mesmo; parecia um bom argumento.

— Eu vou lá acordar sua mãe e você vai indo com seus tios. Depois eu levo ela lá pra te ver.

A pequena pareceu receosa, mas depois desistiu. Estava cansada de lutar. Cabisbaixa ela estendeu seus braços para Drew, que a pegou no colo. Só desejava, de todo o coração, que Ash não fizesse o mesmo que Rudy. Afinal, se ele o fizesse, quem salvaria sua mamãe? O esverdeado beijou os cabelos negros e Ash ficou com ciúmes, mas não deixou transparecer. Queria poder fazer isso.

Ash deixou os amigos e caminhou na direção do quarto de Misty. Quando ia entrar, o médico saiu de lá, feliz.

— Ah! Que bom te encontrar, senhor! Tenho certeza de que ficará mais do que feliz em saber que sei o que há com sua esposa.

— Ela não é minha…

— Ela está grávida! – sorridente, ele se foi – Te mando a conta por correio – o informou, assobiando.

Ash não ouviu. Misty estava grávida. E ele sabia que era o pai.

Continua…


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

heeey ^^

amores e amoraas *--*

sim, eu voltei nem uma semana antes de ter postado o último *O*

mas é que o apoio de vocês é tão grande e maravilhoso que sei lá *--*

e eu terminei. Ia ficar com ele até domingo, mas não me aguenteeei *O*

geeenteeee o///

qq tão achando? N to conseguindo falar com a Ines-chan... alguém se dispõe a betar a fic? É q ela sumiu... e se ela voltar ae tenho 2 betas, pra disponibilizar a vocês apenas os melhores caps *--*

então, dois caps postados (me sentindo muito culpada, tava em dívida com vocês), agr o próximo eu n sei. N comecei ainda, ok? Começo amanhã ou no fim de semana. Sei lá

grandes emoções nos próximoooos o//

mereço mais reviews?? *--*

amo revieewws *o*



Bjs e teh + ^3^/



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Em Busca da Verdade" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.