Amor internacional escrita por Walker


Capítulo 29
Livrinho básico - Capítulo à parte.


Notas iniciais do capítulo

Oi gente! Queria primeiramente agradecer à todos os comentários, mesmo! Não dá tempo para responder todos, assim como vou provavelmente demorar um pouquinho pra postar o epílogo (também pelo fato de não querer me despedir) mas saibam que eu li, viu?
"Walker, se você vai demorar para postar epílogo, o que você tá fazendo aqui?"
Duas coisas. Primeira, eu queria saber o que vocês esperam para o epílogo.
Segunda coisa: Bem, vocês sabem que eu estou escrevendo um livro. Na verdade, dois, e os dois tem previsão para ano que vem, 2016 no mais tardar. O primeiro é mais sério, pois envolve história e tudo mais. O segundo é sério também, mas envolve apenas minha imaginação e geografia, o que é mais fácil.
Como vocês são muito demais comigo, resolvi postar aqui um trecho do segundo livro. Eu espero mesmo que gostem, deixem suas opiniões (porque só a da mamãe e do papai não rola, né gente?).
Beijoo, espero que isso segure vocês até o epílogo.



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No meu bairro morava um senhor. Daqueles magricelos, ossudos e curvados, como se carregassem o peso do mundo em suas costas. Velho de Soledade era como o chamavam, e não havia quem soubesse de seu verdadeiro nome. Soledade não tinha nada haver com o fato de seu semblante triste, ou do jeito como murmurava aos ventos palavras inaudíveis com o jeito melancólico que já lhe era próprio, mas sim da cidade de onde vinha. E isso era tudo que se sabia dele.

Toda vez que o Soledade passava por minha janela, eu estava lá, meus dedos curtos e gordinhos agarrando o batente da janela com tanta força que os nós ficavam esbranquiçados. Não sabia o porquê de tanto fascínio por aquele senhor que andava lugubremente sem rumo pelas ruas da cidade, em passos curtos e lentos como os de uma tartaruga.

E dias se passavam, um após o outro, em que eventualmente Soledade passava em frente à minha casa, com seu sobretudo azul marinho puído, os olhos semicerrados e a corcunda. A tal corcunda é do que mais me recordo. Não era grande, imensa, mas era o suficiente para despertar minha curiosidade e me fazer supor diversas coisas.

Um dia, depois de meus olhos curiosos seguirem mais uma vez o Velho de Soledade, desci do banquinho que me fazia enxergar a imensidão reduzida do bairro lá fora pela janela e corri desajeitadamente até o escritório. Minha mãe, como sempre, estava lendo um livro.

Ler, ler, ler. Era o que minha mãe fazia o dia inteiro. Eu costumava dizer que seu trabalho era “leitora de livros”, pois na minha ingenuidade infantil não sabia exatamente qual era sua profissão.

Não precisei chama-la, afinal, eu nunca a chamava. Ela sempre percebia minha presença e baixava o livro que estivesse lendo, com um sorriso amável, como se nada pudesse acabar com sua ternura.

“Mãe, porque o Velho da Soledade tem aquela corcunda?” Perguntei, com os olhos ávidos por resposta. Mamãe riu, o som da harpa divina.

“Não sei. Talvez o trabalho que fizesse antes, ou simplesmente sua idade, o tornaram assim.” Respondeu, simplesmente, e cobriu novamente suas feições com o livro.

Aquela resposta não me saciou. Não sei porque a tal corcunda me trazia tanta curiosidade, ela simplesmente trazia, mas o motivo de estar lá eu talvez nunca chegasse à saber. Talvez fosse apenas o peso do mundo que ele trazia em cima de si, o peso de tantas tristezas e desolações que rondavam sua cabeça como abutres famintos. E isso eu desejava que nunca chegasse a sentir.

O tempo passou, e o Velho da Soledade assim como sua corcunda continuavam rondando o bairro como fantasmas. Eu cresci, amadureci, e a minha mente correu para me acompanhar neste caminho. Um dia, quente e abafado após a chuva habitual das três, eu estava alegremente passeando nas ruas. A pressão que eu fazia em meu rabo de cavalo para que balançasse agradava-me a cabeça e eu andava com um sorriso brincalhão tentando brotar em meus lábios, pois adorava andar sozinha. Causava-me aquela sensação deliciosa de liberdade misturada com adrenalina, já que eu quase nunca podia andar só.

Estava indo até a padaria local, a dois quarteirões - veja, dois quarteirões!- de casa, quando trombo sem querer em alguém conhecido. Antes de vê-lo, senti seu cheiro: naftalina e café. Café bom, de final de tarde, daqueles que se bebe com biscoitos açucarados de castanha.

Ao levantar minha cabeça tonta, vi de baixo aquele senhor que fora objeto de minha infantil admiração durante muito tempo. Aquele rosto marcado pela idade, enrugado, com os lábios finos de maneira que sempre parecem crispados. Os olhos negros melancólicos se cravavam em mim do alto, como se eu fosse apenas um bebê, olhando-me com desafabilidade. Encolhi levemente.

Pedi desculpas, trêmula. Estar perto do Velho de Soledade parecia estar perto de alguma superestrela. O tal era alvo de tantas suposições das pessoas que vê-lo de perto, trombar nele, parecia algo surreal. Ele apenas assentiu, solene, e foi embora para divagar novamente, andar sem rumo por aí assim como em todo crepúsculo.

Depois desse fatídico dia, uma barreira imaginária pareceu ter sido quebrada entre nós. Vira e mexe, quando nos encontrávamos na rua, eu era recebida com um cumprimento em forma de “Clarisse, como vai?” e um sorriso cordial. Na maioria das outras vezes, ele apenas continuava andar, quieto e misterioso sem me ver, de seu alto pedestal de sonhos e lembranças.

Quando completei meus tão esperados doze anos, as coisas passaram de apenas cumprimentos para pequenas conversas. Depois, para cafés e lanches em sua casa. E como Antônio, que se apresentara desta vez de verdade para mim, adorava fazer comidas para os lanches, nunca faltavam coisas para comer. Duas ou três vezes ao mês eu calçava meus tênis favoritos em contraste com vestidos e saía de casa dizendo para minha mãe que ia passear na praça. Ela acreditava e sorria com seu habitual sorriso materno que arrebatava de remorso meu coração, mas não minha expressão, que demonstrava maior inocência.

E nós conversávamos muito, as horas passando lá fora à parte das conversas lá dentro. Nos primeiros meses apenas eu falava; falava de minha vida, de minha escola, de minha mãe e meu pai, dos dois e de sua eminente separação. Ele apenas me ouvia com atenção, assentindo regularmente e comendo de vez em quando os biscoitinhos de castanha de caju. Depois, o sentido se inverteu. Uma vez que o Velho da Soledade abria a boca para falar, não parava mais. Contou-me de tudo que havia acontecido com ele de uma maneira que me envolvia como fios.

Antônio havia abandonado o amor de sua vida para ser apresentador de circo. Sinceramente, não sei se tudo o que ele relatava era verídico, mas era ótimo de se ouvir. Quando ele voltara, sua menina já estava casada e com dois filhos. Velho da Soledade percorreu as ruas em busca de emprego até achar em uma pensão sua nova morada e em um bar seu novo ganha-pão. Durante sua infância, ele havia sido um garoto rico, belo, desejado e inteligente. Mas tudo mudou quando sua família sofreu uma grande reviravolta financeira e, de tudo, ele passou a não ter nada. Nem amor de pai nem de mãe, mas isso já não era novidade, sempre havia sido assim. Não se formara. Nunca se casara. Não tinha amigos. Ele era um homem sofrido e sozinho.

Com muito custo conseguiu, depois de anos economizando, dinheiro para comprar a casa que tanto almejava naquele bairro grande de cidade pequena, mas não se engane; aquilo ali era a periferia. O centro se resumia a algumas lojas e casas ricas, muito longe daqueles reles mortais. Ou seja, nós.

Para esquecer suas desgraças, acumuladas por anos e anos, andava por aí. Simplesmente andava, prestando atenção na paisagem que ia lentamente mudando na frente de seus olhos machucados pelo tempo. Se sustentava recebendo doações de filantropos que sentiam pena de sua situação precária.

Ele tratava de si com um tom de ligeira auto piedade, mas para mim ele era alguém maravilhoso. Sábio como ninguém, até mesmo meu pai, que para mim parecia nunca estar equivocado. Mera ilusão.


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Notas finais do capítulo

HOHOHO eu sou má (ou o papai noel), pois isso é só um trecho.
O resto vocês lêem quando lançar. Logo nas livrarias -ou não tão logo assim, né - O jardim de eucaliptos.
Beijoos e deixem suas opiniões.