Juntos Por Ela escrita por Little Flower


Capítulo 13
Dia Especial


Notas iniciais do capítulo

CAPÍTULO EDITADO :)



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[Tobias] 

Estamos bem.

Ela não me odeia mais. Pelos menos não é isso que demostra quando fala comigo, embora que de vez em quando nós nos alfinetamos. Creio que seja porque velhos hábitos nunca morrem. Entretanto é de forma leve, descontraída o que torna a atmosfera na cozinha definitivamente agradável. E Clara ama aquilo tudo.  

Eu gosto de Tris e vejo que é algo real e singelo. Não é a mesma coisa que sentia por Lynn, nem de longe. Com Lynn eu continuava o mesmo babaca, sendo um cãozinho, fazendo tudo o que ela pedia. Inacreditável, eu sei, mas ela tinha um poder surpreendente sobre mim. Antes. Como alguém pode mudar tanto?

Posso sentir uma sensação avassaladora em meu peito ao constatar que finalmente podemos sentar à mesa pela manhã e não ter aquele clima estranho estalado sobre nós, ou os olhares fulminantes.

É claro que uma hora as atitudes de Tris iriam me machucar. Eu já havia aguentando demais. Foi o que aconteceu no dia em que seus pais chegaram para nos visitar, suas palavras proferidas naquela discussão a respeito da brincadeira que fiz foi o estopim para minha paciência acabar.

Ela não havia prestado atenção em minha mudança. Eu compreendo que o que aconteceu no passado tenha deixado consequências graves em nosso convívio, mas eu tentava mostrar de todas as maneiras possíveis e ela não enxergava. 

Doeu, muito, meu coração se encontrava infeliz todas as vezes em que eu tinha que trata-la indiferente. Porém eu não tinha encontrado outra saída para dizer: ei! Você me magoou peça desculpas. Agindo assim eu estava parecendo um moleque. Porém, não queria dar o braço a torcer.

Ainda que eu agisse como se não fosse mais o Tobias bobão. Doeu mais ainda constatar que ela não ligava para isso, para o que eu possivelmente estava sentindo. Eu queria o que? Me perguntei certa vez. Ela não gosta de mim. Ela talvez nem tenha se dado conta que suas palavras me atingiram de forma profunda...

Embora o meu interior estivesse um caos, com tantas perguntas, chegara seu aniversário. Eu havia ficado longe por tanto tempo nesta data, que nem mesmo meu orgulho interferiu, é obvio que ele tentou me impedir, mas eu enfim lutei contra ele e venci.

E ela ficou tão feliz. Ela tentou relutar contra isso, mas consegui ver em seus olhos a gratidão que sentia por cada um que participou. Tanto no café como na festa. Não foi difícil convencer aos seus amigos a ajudar. Porém fiz questão de tirar o meu nome dos créditos. Mas no fim ela descobriu e me surpreendeu com seus atos. E eu soube que naquele dia o seu pedido de desculpas tinha chegado. O seu “obrigada” e o seu sorriso pareciam dizer: ‘perdão por ter agido mal’ ainda que fosse inconscientemente e coisa minha. Ela me desarmou. E depois quando cuidou de mim quando me machuquei no treino, “devolvendo o favor”, certamente era isso que pensava. Eu a perdoei tão rápido quanto fui magoado. Por que isso é o certo a se fazer quando gostamos de alguém.

— Você está linda, minha pequena! — digo arrulhamente para Clarinha em meus braços, estamos brincando no jardim. — com esses dentinhos! — havia crescido dois dentes pequeninos inferiores. E eu estava encantado com aquilo. Bobo estou.

Como alguém pequeno pode me fazer transbordar tanto afeto? Tanto amor. Sim, eu a amo. Demais. Ela foi e é, o motivo de minha mudança, para melhor. Sou um homem de fato agora. Ela me fez amadurecer. Essa linda garota de olhos idênticos aos meus. Não posso me imaginar sem ela, sem ter seus sorrisos que emanam luz, sem ter seu corpinho aconchegado ao meu quando a faço dormir, ou suas risadas gostosas.

— Consegue dizer, Tobias? — eu falo encarando-a, ela cercada por minhas pernas, seu tronco apoiado em meus pés, ainda que eu saiba que ela pode sustenta-lo sozinha. — T.O.B.I.A.S. — soletro suavemente. — T.O.B.B.Y.

Ela balança a cabeça. Indicando que não. E solta uma gargalhada.

— Sim, sim! — afirmo com a cabeça. Fazendo cocegas em sua barriga. — vamos Clarinha, diga! — desde que ensinamos ela dizer sim e não com a cabeça ela não para de fazer quando pedimos algo.

— Tobias! Ana! Hora de meme!

— Comer! — eu vibro levando a garotinha a fazer o mesmo, batendo palminhas errantes. A pego no colo e levanto de uma só vez. Deixo para pegar a manta depois com os brinquedos. Vou fazendo-a flutuar baixinho antes de chegar em casa, pois Tris desaprova aquilo. Mas o som de seus risinhos enche-me de alegria.

Ao chegar na porta dos fundos, eu solto Clarinha no chão para que ela vá até Tris engatinhando, e fico observando encostado no batente. Ao chegar em Tris, ela puxa a barra de sua calça jeans e a loira encara o bebê. Com a expressão de surpresa e encanto.

— Own, minha menina está tão grande! — Ela ignora a vasilha que contém o arroz e pega a criança no colo, depositando vários beijinhos por seu rosto e brincando ao mesmo tempo, caminhando para a mesa devidamente arrumada.

Dou um riso e vou buscar a vasilha.

— Você enviou os convites da formatura para os seus pais? — eu pergunto à Tris durante o almoço. Clarinha sentada em suas pernas. Ela se recusou a coloca-la na cadeirinha.

— Sim, eles me disseram que chegarão aqui ao entardecer na sexta depois do jogo, já que a formatura será no sábado. Viu como não foi tão ruim passar dia e noite mergulhado nos estudos e ficar despreocupado agora? Aposto que seus amigos estão enfurnados na sala de aula nesse exato momento.

— Antigos amigos. — eu ressalto, sei que ela está se referindo à Eric e Peter. — mas sim, foi um sacrifício e tanto, porém estou satisfeito com minhas notas e média final. Obrigado.

— Por nada. — ela diz com certa presunção.

— E além de tudo, eu estaria perdendo o momento que estamos passando aqui juntos. E isso seria muito ruim. — eu digo suavemente e sorrindo, me controlando para não tocar em sua mão e acaricia-la.

— Você não fez nenhuma piadinha... O que aconteceu? — ela diz pigarreando e colocando o bebê no chão, se levantando com seu prato e copo. Ignorando minhas palavras. Eu sorrio. Ela meche no cabelo, é um sinal claro seu de nervosismo. Meu sorriso se estica ainda mais. — pare de sorrir assim!

Eu levanto as mãos em rendição e arqueio as sobrancelhas.

— O nobre Tobias não chamaria você de nerd ou algo assim. E alias você me ajudou a passar. Merece muito mais que um ‘obrigado’.

— Não exagere, Tobias. — ela diz e posso ver o rubor nas maçãs do seu rosto.

Levanto-me com o meu prato também, copo e outros utensílios sujos.

— Obrigada por recolher tudo. Não precisa lavar. — ela diz quando eu ponho tudo na pia.

— Uau! Quem é você e o que fez com Beatrice Prior? — eu digo com as mãos no rosto parecendo totalmente espantado. Ela faz careta, mas acaba por rir.

— Eu também estou mudando! — ela diz, sua voz saindo meio esganiçada.  

— Estou vendo. Isso é brilhante, mas qual é? Somos um time! Você lava eu seco. — eu digo terminantemente. — minha doce Tris. — ela grunhe, mas não pestaneja mais, e acaba até esboçando um sorriso tímido de canto.

Meu coração dá um salto. Sinto um fio de esperança. Talvez seja uma fantasia, eu esteja me iludindo. Eu estou vendo coisas onde não existe. Decido por ignorar meus pensamentos e me concentrar na louça. Apesar de tudo, de ter me perdoado, ela jamais deixaria aberta as portas de seu coração para mim. Isso é tão claro como agua... A constatação desta cruel verdade me leva a sentir uma dor petulante no peito. Fico totalmente cabisbaixo.

De repente escutamos um barulho de algo caindo ao chão e dissemos juntos nos encarando com expressões assustadas:

— Aninha!

— Clarinha!

Correndo em disparada para a sala.

.

[Tris]

— Não te incomoda que as pessoas fiquem te encarando? — Al pergunta enquanto caminhamos em direção ao ginásio.

— Acho que já me acostumei com isso. — eu digo com o bebê no colo, eu preferi por deixar o carrinho no carro e trazê-la nos braços mesmo, ela já senta sozinha em minhas pernas.

— E quando foi que Tris se importou com a opinião dos outros? — comenta Chris agarrada ao braço de Will.

Eu rio e levanto os ombros.

— E além do mais a essa altura todos conhecem a Aninha. As notícias voam! E fofocas surgem também, disseram que o bebê era de Tris e Tobias e que eles esconderam muito bem de todo mundo e foi por isso que ele terminou com a Lynn. — diz Chris com a expressão irritada. 

— Aposto que foi ela mesma quem inventou isso, por ciúme. — diz Will.

— Talvez, mas vamos encerrar esse assunto aqui, não sei como eu abri a boca e contei! — diz Christina.

— Tudo bem Chris, isso não tem nenhuma importância. Ninguém tem nada a ver com a minha vida. — eu digo terminantemente, agarrando a mãozinha de Ana e beijando. — não é mesmo, Aninha? – eu digo olhando para baixo, ela ergue a cabeça por eu ter chamado seu nome e dá uma risadinha.

Ao chegarmos na arquibancada, vejo Urih e Marlene no meio da multidão acenando para nós e com nossos lugares reservados. Quando estamos perto dele, Mar pede Aninha com um sorriso, com as mãos estendidas e ela vai sem nenhum problema. Meus braços estão dormentes. Al me passa a bolsa rosa e eu agradeço à ele.

— Uuuh, o último jogo de nossas vidas. Essa será a última vez que estaremos na Chicago High. — diz Urih.

— Calminha ai, cara. Que ainda tem a entrega dos canudos, ou se esqueceu? Só a festa que será em outro lugar. — Will corta o seu barato.

— Droga, é mesmo! — ele diz cabisbaixo.

Rimos dele.

E então começa. Lynn e seu bando dançam a coreografia para a abertura do jogo, enquanto os times são chamados e apresentados. Muitos olheiros de universidades estão aqui. Talvez Tobias tivesse alguma chance, já que ele não deu a mínima para se inscrever em nenhuma universidade durante todo o segundo grau.

Então sua estrutura se sobressai diante de todos os garotos na quadra. Ele passa os olhos pela arquibancada como se estivesse à procura de algo ou alguém, sinto um frio no estomago e sinto minha respiração pesar, até que eles param em mim, o sorriso que abre é deslumbrante. Era a mim, a mim que ele estava atrás como naquele dia da abertura dos jogos. Ele solta a respiração assim como eu, como se sentisse um grande alivio, talvez ele pensasse que eu não estaria ali hoje. Como não poderia estar? Eu sorrio em resposta e aceno repetindo as palavras que eu disse no café da manhã: boa sorte! Ele assente com a cabeça.

— Dê um tchauzinho para o papai, Aninha! — Marlene diz num arrulho instigando o bebê a mandar um aceno. Ele percebe e manda um beijo no ar para ela, que solta risadinhas encarando-o há metros de distância e se agita um pouco.

Estou petrificada. Marlene disse mesmo aquilo? Fico infinitos minutos estatelada no lugar. Parecem ser horas. A ‘buzina’ que marca o início do jogo soa abafado, estou perdida em pensamentos, encaro minha frente sem realmente enxergar nada. Inspiro e respiro para me acalmar.

Apesar do espanto, eu não posso ignorar os fatos, essa palavra parece ser a mais certa para defini-lo. Tobias é e foi mais pai do que o homem que ajudou a gerar Aninha, quem sabe o que ele fez? Possivelmente era um homem sem caráter que abandonou a mãe de Ana quando soube que esta esperava um filho seu. Não sei sua história, seus motivos de não ampará-la, não a querer, de não estar com ela em seu nascimento, quando ela mais precisou dele, onde ele estava? ... Tobias faz de tudo para que Ana tenha tudo, não somente se tratando de bens materiais, mas de carinho, amor, um lar. Está certo que ele relutou um tanto no começo por causa da estupida ex-namorada e depois o episódio do orfanato, mas logo se encantou com Ana, se preocupou com ela, sem ao menos conhece-la o bastante. E eles se amam. Ele é sua figura paterna. Ele é seu pai.      

Pisco os olhos freneticamente e me concentro no jogo agora. Com um sentimento estranho aquecendo meu peito.

Todas as vezes que ele acerta uma cesta, ele olha para mim, o que arrancou comentários insinuantes dos meus amigos. E sorrisos — odeio admitir — bobos da minha parte. Estou confusa pelo o que eu sinto quando estou perto dele, o que ele me faz sentir. Até um tempo atrás eu não o suportava, eu o odiava com todas as minhas forças, e agora...?

— Ódio e amor andam juntos, eu sabia que isso ia acabar acontecendo! — diz Christina como se lesse minha mente.

Eu a encaro com a testa enrugada. E pigarro, torcendo para que não tenha ficado rubra.

— Além de perita em mentiras você prevê o futuro? — Urih se antecipa na minha frente.

— Há-há! Engraçadinho! Nós mulheres temos algo chamado ‘sexto sentido’. — ela diz impaciente.

— Vou comprar um turbante e roupas de seda para você! Madame Christina. — Al se manifesta, até a pouco estava quieto.

Nós rimos. Aninha que estava andando de mão em mão, está em meu colo agora tomando seu suco de laranja na mamadeira de orelhas.

— Terá volta, Albert, e como terá. — ela diz sendo acalentada por Will.

— Não exagere, Chris. — diz Will abraçando-a mais forte.

— Você quer batatas, Tris? — pergunta Al.

— Eu gostaria, mas... — eu olho para minhas mãos ocupadas.

— Não tem problema, eu dou para você. — ele diz e antes que eu diga algo ele me oferece uma batata na boca. E depois outra e outra.

— Obrigada! — eu digo meio sem graça e volto minha atenção ao jogo na mesma hora que Tobias erra a cesta.

Todos ficam decepcionados, são os últimos minutos de jogo. Ele parece estar tenso também. Fico apreensiva. O time convidado está com dois pontos à frente. Ele precisa se concentrar. Ele é o capitão, o responsável pelos acertos nas cestas. Eu não entendo nada disso. Mas tudo depende dele.

Apesar dos empecilhos e tudo parecer acontecer em câmera lenta. E dos sustos que todo o corpo estudantil levou com os saques errados de ambos os times, dos empurrões, “faltas”, uma mini briga, finalmente nos últimos segundos — como naqueles filmes de adolescente americano — Zeke passa a bola para Tobias que acerta a cesta garantindo assim a vitória dos Dauntless.

Todos vibram e é impossível continuar com o bumbum na cadeira diante daquilo. Os gritos, a felicidade que todos sentem me contagia e eu tenho que me levantar com Aninha em meus braços, que parece estar amando tanto quanto eu. Rio, gargalho. Eles conseguiram.

A cerimonia toda acontece. Eles ganham o troféu e festejam. Tudo poderia acabar, estamos sorrindo, mas ela chega para estragar tudo, antes que eu consiga me aproximar de Tobias e seu time com Aninha, Lynn é mais rápida e como a descarada que é agarra o pescoço dele cinicamente. Ela não entende que não há mais o que fazer!? Sinto a cólera vim.

Sim, eu penso em rumar em direção à porta como uma menininha birrenta, ou me chatear com aquilo, porém não faço isso. Não é ela quem ganha. Não mais. Eu sempre confrontei Lynn e isso jamais mudaria. Ainda mais agora.

Engolindo a sensação esquisita que sinto, arrumo minha postura e continuo andando como se sua atitude não tivesse me atingido nenhum pouco, recoloco o sorriso que eu tinha antes e digo docemente para Aninha:

— Vamos parabeniza-lo, minha pequena!

 Eu tenho sua atenção, por mais que a patética Lynn faça de tudo para que ele olhe para ela, ele não dá a mínima, o que me faz rir por dentro. A sensação queimante passa um pouco.

— Ora, ora, ora, se não é a Careta. — Lynn diz.

— Não vou perder o meu tempo discutindo com pessoas sem cérebro.

— E a bebezinha que arruinou o meu namoro...

— Olha aqui Lynn, porque você não vai encher a paciência de outra pessoa? Tobias não gosta mais de você. Se enxerga! — eu bufo enraivecida, pegando a mãozinha de Ana, uma mania que adquiri. Cuidando para que minha mão esteja ocupada, porque se ela estivesse livre eu tenho certeza que faria um estrago.

— Eu acho que eu mesmo posso dizer isso não é? — Tobias diz parecendo irritado com algo. Sinto um frio na espinha. Ela sorri com o corte que recebi — Lynn, você já deu seu showzinho, pode ir agora. — agora eu quem sorrio.

— Vocês dois ainda verão o que eu sou capaz. — diz se distanciando.

Rolo os olhos.

— Estou morrendo de medo! — zombo.

— O que faz aqui? — ele indaga com um tom gélido se virando para mim.

Por um momento eu perco a voz. Ele não queria que eu estivesse ali?

— Aninha e eu, bom... — pigarreio — viemos lhe parabenizar pela vitória. — engulo o sorriso que eu quero esboçar.

— Hummm, — ele a pega do meu colo e eu tenho que me tranquilizar quando eu vejo que está encharcado de suor. — eu achei que você estava muito próxima daquele seu amigo, Al.

Então é isso. Ele viu quando Al gentilmente se propôs para me oferecer as batatas.

— Bom, ele foi apenas solidário. Eu estava com as mãos... — porque estou me explicando afinal? — não aja assim.

— Agir como?

— Como se fosse o meu o dono ou algo assim! — eu digo totalmente irritada pegando Aninha dos seus braços e saindo dali quase correndo.

Não temos nada. Mas ele age como se tivéssemos algo. Isso é irritante para mim. Mas ao mesmo tempo em que sinto raiva, eu me sinto decepcionada, por não ter nenhum laço que nos una de verdade.

— Tris? — ele chama de longe, e antes que eu consiga sair da quadra — onde não tem mais ninguém —, ele me impede com a mão. — Tris? Me desculpe. Eu só... — respira fundo. A essa altura eu já me viro e o encaro com a expressão não tão boa — você não entende.

— Então me explique. — eu peço.

— Não dá.

— Argh!

— Vamos indo. O pessoal deve estar me esperando... — ele une nossas mãos e eu permito. A raiva se dissipando. Um tanto estranha com a aproximação. Como posso mudar tão rápido de sentimentos? Essas oscilações são meio irritantes. Tobias Eaton, veja que você faz comigo! — e vou fingir que não percebi seus ciúmes. — ele dá uma piscadela e eu torço para que minhas bochechas não me entreguem.

— O mesmo digo a você, Quatrinho! — debocho com um sorriso de vitória quando seus olhos se espremem.

.

— Estou pronta. — eu grito do banheiro para minha mãe que vem me apressar mais uma vez. Eles haviam chegado na tarde do dia anterior e desde que se instalaram não largavam Aninha nenhum pouco. Eles também não resistiam à ela assim como todos que a conhecem.

Havia chegado enfim o grande dia!

Nunca fui vaidosa, ou gostar de ir às compras, na maioria das vezes que fui num shopping foi por necessidades, para substituir minhas calças jeans surradas e blusas manchadas, ou quando minhas amigas apelavam para chantagem emocional. Maquiagem e Tris não combinavam na mesma frase.

Minha mãe aparou as pontas duplas e ressecadas do meu cabelo, como sempre fazia, hidratou, secou e alisou-o, deixando-o cair em cachos leves nas pontas, o resto fora comigo. Embora não fizesse a mínima ideia do que fazer. Foi preciso pedir auxílio via Skype de Christina. 

— Vamos minha filha, já estamos atrasados! — diz Natalie abrindo a porta escancarada. Revelando uma mulher loira tremendamente excecional, num vestido verde-esmeralda de magas curtas, com diversas pedrinhas brilhantes, até o joelho, saltos de tiras prateado, e um choque elegante. Minha mãe não parece ter a idade que lhe diz respeito. 

— A senhora está linda! — eu digo e termino de aplicar aquela coisinha roliça preta que alonga e destaca os cílios, Chris disse o nome, mas não me recordo. — prontinho!

— Obrigada, você também está esplendida, minha filha... Agora vamos, os rapazes devem estar impacientes já. — ela diz colocando a mão em minhas costas. Eu dou uma última olhada no espelho do quarto. Definitivamente aquela não sou eu. O reflexo é de uma garota bonita, alva, num vestido rosa de alças medianas, ele é longo e proporcional ao corpo pequeno dela, sapatos não muito altos, ainda assim bastante exagerado para alguém que não costuma usar, embora tenha perdido tempo demais passando maquiagem no rosto, ela é leve e realça os meus olhos cinzas. O que realmente me agrada.

Minha mãe me “arrasta” para fora quando eu não me mexo e logo descemos as escadas. Enquanto o ritual normal e habitual acontece, percebo alguém me observando, nossos olhares se encontram e é intenso. Por mais que eu diga a mim mesma ‘já está bom, Tris, chega’, eu não consigo desviar os olhos e grande parte de mim não quer, eu quero continuar a encarar aquele mar azul, que a cada segundo me prende, a sensação é boa, sinto meu coração bater irregularmente e eu respiro fundo algumas vezes.

Ao por meus pés no chão. Literalmente. Eu sinto minhas bochechas fervilharem, como se estivessem em brasa. Ele está deslumbrante. Numa blusa social azul-claro, destacando um pouco seus olhos, calça preta, e sapatos sociais, e o cabelo penteado quase num “topete”.

Ele abre um sorriso radiante. Eu retribuo. 

Penso que ele falará algo, porém antes que possa proferir alguma palavra sequer meus pais nos apressam. Ana Clara está no colo do meu pai, com vestidinho lilás de babados, uma fita de laço no cabelo, e usando sapatilha. Dou um beijinho nela enquanto minha mãe nos faz caminhar mais depressa.

O caminho é curto e agradável. Vamos no carro de Tobias com meu pai dirigindo.

Uma vez vestidos com a beca, nos juntamos com os alunos e nos separamos ali, preparados para a entrada e apresentação. Quase não trocamos nenhuma palavra durante a viagem para cá, tento não ligar para o incomodo petulante que sinto. Espero ansiosamente o chamado do meu nome. Vejo que Peter e Eric não estão lá. E é um enorme alivio, na verdade eu nem mesmo os vi no tempo que ainda passei no colégio. A cerimonia toda acontece, o orador faz o discurso épico para nos motivar e tal. Tobias é chamado primeiro que eu. E depois de muito tempo é a minha vez.

— Beatrice Prior! — o diretor chama.

Eu me levanto sendo cercada por diversos sorrisos. Finalmente acabou! É oficial.

Ele me entrega o canudo e posamos para o ‘click’ da máquina fotográfica. Ouço aplausos e desço vendo o sorriso de orgulho dos meus pais. O que me deixa feliz. Vejo que Aninha consegue me enxergar e estica os braços para mim, abrindo e fechando as mãozinhas. Infelizmente não posso voar em sua direção para busca-la e volto para meu lugar. Escuto vagamente o seu chorinho de criança. Deve ser a mesma impaciência que eu estou sentindo agora por não poder tê-la em meus braços.

A cerimonia finalmente termina e somos convocados para comparecer à festa.

Não demoro muito na área de festas, comemos um pouco, tiro algumas fotos com meus amigos, trocamos lembranças, porém é só. Não me sinto bem. No momento em que eu me despeço de todos, e procuro por Tobias para dizer que já vou, eu o vejo dançar com Shauna, eu sorrio mais uma vez a encara-lo, tão belo, ele está contente. Ele parece livre. 

É tão injusto obriga-lo ter tantas responsabilidades. Será que ele deseja mesmo ser o pai de Aninha? Penso. De repente me sinto totalmente tola por pensar isso, é obvio que ele quer, ele é loucamente apaixonado por Ana. Não posso ousar pensar, ou até mesmo dizer isso à ele. Isso provavelmente acarretaria uma discussão e nossa relação está muito bem para arriscar.

Pelo menos desejo que ele se sinta à vontade hoje.

— Tris? — minha mãe chama, eu a encaro. — venha filha! — olho mais uma vez para eles, como se fosse a última vez que o veria e desisto da ideia de ir até lá, como o altruísta que é, ele certamente sacrificaria sua noite por mim. — você disse ao Tobias que já vamos?

Eu nego.

— Minha filha, ele ficará como um bobo procurando por vocês. — ela repreende se referindo a Aninha e eu.

— Tudo certo, mãe, Chris dará a chave do carro e dirá. Mas só quando estivermos longe.

Ela balança a cabeça negativamente.

— Ele virá conosco para querer cuidar de mim, e não quero isso. — explico o motivo.

Minha mãe me fita como se estivesse desconfiada de algo.

— Mas estamos aqui, Tris.

— Ele não vai querer ouvir, mãe... — digo enquanto estamos saindo do salão de festas. — apesar de ter dois médicos em casa, ele iria querer checar se estou bem. E além do mais a febre está passando um pouco...

— Tem certeza?

— Sim. — eu afirmo.

— Tudo bem... – ela diz desistindo.

Pegamos um táxi, Aninha dorme no colo do meu pai, e vamos para a casa.

.

Abro os olhos lentamente, enxergando absolutamente nada. Sinto uma pressão em minha mão que não estava ali antes quando adormeci de uma febre agoniante e garganta seca. Estou bem melhor, depois de tantos cuidados e paparicos dos meus pais e claro os medicamentos certos. Preciso fazer exames para checar minha imunidade.

— Tris? — ouço sua voz na escuridão.

— Tobias? — pergunto incerta e a luz do abajur é acesa.

— Sim, estou aqui... — o tom de sua voz é suave — não acredito que fez isso.

— Isso o que? — não entendo de fato.

— Se mandar sem me avisar. Eu fiquei preocupado quando não os encontrei.

— Eu sabia que viria conosco, eu não queria isso, por isso achei melhor...

— Está certa, — ele me interrompe — eu viria sem problema algum cuidar de você...

— Maneira chata essa sua de me cortar no meio da frase — eu digo soltando sua mão da minha, um pouco irritadiça, mas aquecida por dentro por suas palavras — e meus pais são médicos, ninguém melhor para cuidar de mim...

— Tem razão, mas eu gosto de estar perto ainda assim. — ele diz e afaga minha bochecha direita delicadamente. — você é importante para mim, Tris.

Pronto, bastou isso e meu coração começou a bater descompassadamente, minha respiração ofegante. Aquela frase é tão doce. Eu não tinha ideia de que ele podia me dizer essas coisas, de que havia uma parte tão delicada. Ou então eu não conseguia enxergar. Até agora.

— Vem comigo! — ele diz de repente. Puxando-me, tendo cuidado para não me causar nenhuma lesão ao me fazer levantar da cama. — você se sente melhor? — pressiona sua mão contra minha testa.

— Sim. — eu sorrio em resposta.

— Perfeito!

Ele nos conduz para fora da casa, em direção ao jardim, o céu está maravilhoso. Um azul escuro, a lua redonda e branca, as estrelas brilhantes. A brisa fria me faz estremecer, e rapidamente Tobias me envolve com seu casaco, a única coisa que tive a chance de pegar foi os sapatos.

— O que estamos fazendo aqui? — eu digo.

— Lá, na festa, o DJ ao trocar a música, disse para escolhermos alguém especial, mas quando eu olhei ao redor a procura desse alguém, ela já não estava lá e não havia sentido algum permanecer ali...

Engulo em seco.

— Você quer que eu dance com você? — estou espantada.

— Exatamente. Você está me devendo essa! — ele diz.

— E quem disse que eu quero? — finjo uma expressão irritada.

Ele me olha estático. Passando as mãos entre as mechas.

— Estou brincando.

Ele respira aliviado e solta um risinho.

— Não faça isso de novo, por favor.

— Não prometo nada.

Ele oferece sua mão, eu a pego esforçando-me para não vacilar sobre o que acontece por dentro, ele me gira e puxa com cuidado para sim. Coloco minha mão em seu ombro e ele em minhas costas. E começamos a bailar sob o céu estrelado, imaginando a música soar em nossos ouvidos, a sensação é maravilhosa, meu coração ainda batendo irregularmente. Nos aconchegamos mais, falando coisas triviais e sobre o bebê. Não demoramos muito ali e logo me leva de volta para o meu quarto, ele me cobre e diz um: obrigado. Se os meus pais soubessem disso, iria ouvir pelo resto do dia.

Vagamente, com cautela, ele aproxima o seu rosto do meu, parecendo estudar com cuidado minha reação, sua mão ainda pousada em minha bochecha, então ele deposita seus lábios quentes na minha outra bochecha, me fazendo fechar os olhos, apreciando o contato. Nisso, me sinto tão segura, tão certa que agora o ódio que sentia era irracional, não errado, mas extremo, eu gosto dele, não posso mais negar a mim mesma.

Então, numa atitude totalmente consciente eu viro o meu rosto e nossos lábios se encontram, é suave, doce. Não é voraz ou agoniado, é calmo. Me sinto acalentada. Não se parece em nada com aqueles de cinema, é tão singelo. Respeitoso. Diferente da última vez, aquele dia cujo decido esquecer, aquele cheiro repugnante de álcool, totalmente substituído por hortelã agora. E prefiro pensar como se esse fosse meu primeiro beijo de verdade. A lembrança me faz recuar um pouco, quase imperceptível à Tobias.

“Já passou, Tris.” Eu me lembro.

Dura bem pouco e quando termina o momento fofo, nós nos encaramos com sorrisos radiantes, bobos, seus olhos brilham e aposto que são reflexos dos meus também. Ele me envolve com seus braços e mais uma vez adormeço.


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Notas finais do capítulo

Encham de comentários, please!
Beijokas da Aninha!