Quando Tudo Aconteceu escrita por Mi Freire


Capítulo 4
Capítulo III


Notas iniciais do capítulo

Outro capítulo narrado pelo Bernardo. A partir de agora, deixo as apresentações de lado, para dar um pouquinho de ação a história. Por um momento haverá um pouquinho de emoção. Aguardem.



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Não consigo parar de sorrir atoa.

Passaram-se dois dias desde a vez que em que tive o contato mais intimo com aquela garota que mexe comigo mais até do que eu gostaria, mais até que o normal, mais até que o previsto, mais do que qualquer pessoa acreditaria. Tenho evitado tocar no assunto com meus amigos, até porque, não posso falar sobre uma coisa que não tenho o mínimo de certeza. Pode ser uma fase, pode ser uma espécie de carência. Pode ser tudo, mas pode ser nada também. Mas acima de tudo, sei que eles não entenderiam, porque eu não entendo.

Estamos no Dukes, uma lanchonete, é sexta-feira à noite. A cidade inteira resolveu se concentrar no centro. Onde basicamente se tem de tudo que alguém pode querer para passar o tempo. Estamos juntos em uma mesa circular. Sobre a mesa há salgados e refrigerante.

Marina e Gustavo estão trocando beijinhos. Eduardo está jogando em seu PSP. Miguel está com o pescoço inclinado observando o jogo, porque ele sabe, se o Edu perder, logo será sua vez. E eu estou muito entediado, de barriga cheia, apenas observando o movimento.

Por alguma razão me vejo procurando por ela. Mas sei que ela não vai está ali ou em qualquer outro lugar dessa cidade. Ela não tem amigos, ela não sai, ela não frequenta lugares assim. Então, vejo a Lorena entrar no estabelecimento. Ela esta com a Brenda que é sua melhor amiga desde sempre. As duas são carnes e unha. Tanto que Brenda e o Miguel são padrinhos da Liz, nossa filhinha.

Brenda também é loira, porém os cabelos mais curtos e de um louro mais escuro. Os olhos são cor de caramelo. Ela é magra, quase esquelética. Mas tem seios fartos e ela se aproveita disso para usar decotes. Brenda tem pernas longas, a pele é bem cuidada, ela é muito parecida com Lorena. Mas não melhor, apesar de tentar está sempre ao alcance da melhor amiga.

Quando elas me veem olhando, elas acenam enquanto sentam em uma mesa mais afastada e pequena. Lorena está ao celular. Brenda me olha demoradamente, quase que implorando com os olhos que eu vá até elas. Eu a conheço o suficiente. Meus amigos dizem que ela sempre teve uma quedinha por mim. Mas prefiro não acreditar nisso. Não consigo vê-la com outros olhos.

Vejo quando um garoto entra na lanchonete com seu jeans surrado e uma camisa azul-marinho. Ele é alto, muito forte e tem músculos bem definidos. É o tipo de cara que passa horas na academia. Seus cabelos são muito curtos e louro escuro, ele tem uma barba clara por fazer e seus olhos são cor de mel.

Sei exatamente de quem se trata, apesar de não vê-lo há um bom tempo. É Rafael Monteiro. Um dos primos mais íntimos da Brenda. Ele é da mesma idade dela e os dois cresceram juntos. Ele não mora mais na cidade. Vem de tempos em tempos para visitar a família e passar alguns dias. Há quem diga que Brenda sempre foi louca pelo primo em todos os sentidos, mesmo ele nunca ter dado a mínima pra ela. Mas há muito boatos nessa pequena cidade, não se pode acreditar em tudo. Se bem que quando se trata da Brenda, tudo é possível.

Rafael cumprimenta a prima com um beijo no rosto e Lorena da mesma forma. Ou não exatamente. Ele demora o olhar um pouco mais sobre ela. O que me causa certo incomodo. Ele mal disfarça. E eu sei que os dois já ficaram juntos quando pequenos por causa da convivência, nada de muito sério, mas que não deixa ter uma certa significância. E eu certamente não acredito que ele seja o tipo de cara certo para ela, já que agora Lorena não é só uma ex-namorada, mas muito mais que isso, é mãe da minha filha.

Vou até lá fora respirar o ar noturno sem que ninguém perceba minha saída. Não poderia ficar lá dentro nem por mais um segundo dando uma de ex-namorado ciumento, imaginando coisas que já não têm mais tanto a ver comigo ou importância. Eu não deveria me incomodar tanto, afinal, eu e a Lorena não estamos mais juntos. E apesar de ela ser mãe da minha filha e isso nunca vai mudar, nem que eu queira ou ela queira, eu não tenho porque me intrometer na vida amorosa dela. A única coisa que ainda tempos em comum a se discutir é a vida da nossa filha. O resto é irrelevante.

Automaticamente, como um bicho que me persegue, paro de pensar em tanta bobagem e penso em uma maior ainda: o quanto eu gostaria de ver a Clarissa aquela noite, nem que fosse por alguns segundos, mesmo que de longe. Eu só queria olhar pra aquela carinha de emburrada como se nada no mundo fosse mais importante pra ela do que ela mesma e suas particularidades. Aquela garota não deve nem ter sentimentos, parece do tipo que só pensa em si mesma e o resto pouco importa, o mundo poderia acabar agora, nesse momento, o importante pra ela é que conseguisse se salvar.

Acho que eu estou exagerando em relação a ela. Balanço a cabeça de um lado pra o outro tentando expulsar tais pensamentos. As vezes pode ser só impressão minha. Porque no fundo, algo dentro de mim, tem esperança que ela sinta só um pouquinho, e que um dia seja capaz, de me dar pelo menos um sorrisinho enquanto eu estiver olhando pra ela durante a aula. Isso pra mim, esse pequeno esforço em sorrir, já que seu sorriso é lindo, seria ótimo pra mim, acho até que o resto do meu dia ia ficar um pouquinho melhor depois que ela sorrisse.

Essa noite eu estou mesmo melodramático, muito sentimental pro meu gosto, quem dera se tanto sentimentalismo resultasse em lindos poemas ou texto, mas quando coloco a cabeça pra funcionar, é frustrante, fico olhando para a caneta ou lápis e para a folha branca de papel e não sai nada como eu gostaria que fosse.

Volto para dentro da lanchonete junto dos meus amigos que estavam tão ocupados que nem repararam que eu sai por alguns minutos. Ai de mim se eles soubesse que foi por sentir ciúmes da Lorena com o Rafael ou pra pensar ainda mais na Clarissa. Com isso, pego minha cadeira e mudo de lugar, tentando ficar o máximo possível de costas para a mesa da minha ex com outro e da amiguinha dela que não para de encarar.

No sábado de manhã arrumo minhas coisas para me encontrar no Clube com meus amigos. O Clube é uma das maiores áreas de lazer da nossa cidade, muitos pessoas de fora das cidades vizinhas vêm até nossa cidade justamente pra isso. Temos muitas piscinas de todos os tamanhos, tobogãs, área de esportes e salão de festas com direto a churrasqueira, mesas com cadeiras e freezers.

Volto para casa no comecinho da noite só pra dar tempo de passar na casa da Lorena e ver a minha filhinha. Eu sempre preciso ficar um pouquinho com ela, mesmo que a casa da Lorena me tragam algumas lembranças do nosso namoro, mas as vezes sinto que a minha filha é minha única amiga, mesmo ainda sendo um bebê, sei que posso contar tudo a ela, quero que a nossa relação entre pai e filha comece desde cedo assim, a base de confiança.

O final de semana passa muito rápido. Às vezes é exatamente isso que desejo, só pra ir à escola na segunda-feira e ver a Clarissa mesmo que ela não me dê nenhuma bola. Outras vezes, preferira que o final de semana passasse lentamente, só pra ter mais tempo com a minha filha, isso quando é minha vez de ficar com ela e não com a mãe.

No domingo de manhã me arrumo para ir à igreja com meus pais, é uma espécie de tradição de toda a cidade. Temos só uma igrejinha no centro perto da pracinha. É lá que todas as famílias se encontram no domingo como uma reunião semanal. Quando tenho sorte vejo a Clarissa na igreja com o seu pai e a garota que deve ser sua prima ou sua amiga, elas estão sempre juntos, grudadas no pai. Não trocam nenhuma palavra desde que pisam os pés na igreja e nem olham para os lados. Nem sei se ela já me viu ali aos domingos. Muito provável que não. Eles sempre se sentam a frente, perto do altar, mal conversam e entram e saem e mal cumprimentam as pessoas.

Percebi há muito tempo que as pessoas da cidade têm um certo medo do pai dela. Não sei o que aquele homem alto tem de mais além de ter um cargo muito importante na prefeitura da cidade. Ele não me assustada apesar de parecer um homem muito sério, exigente, respeitador e que segue à risca todas as regras e tradições. Eu nunca se quer nem ouvi a voz dele. Está na cara quem a Clarissa puxou. Mas fico me perguntando onde será que está a mãe dela.

Uma vez, tentei puxar o assunto com a minha mãe, como quem não quer nada, mas ela acabou não me ajudando muito, disse que não sabia de muita coisa sobre eles assim como todas as outras pessoas e que sempre que tem reunião de pais ou algo do tipo, Vicente, era o único quem aparecia para representar a filha.

Eu queria muito saber dessas coisas, desses detalhes, obter mais informações. A única quem poderia tirar minhas tantas dúvidas era a própria Clarissa. Mas ela, por sua vez, não abriria a boca. Não pra mim, acho que ela me detesta, assim como eu chego a detesta-la algumas vezes, mas ainda não sei os motivos certos. Talvez seja porque ela é tão diferente de tudo e isso realmente me encanta nela.

A segunda-feira foi só mais um dia de aula normal e nada de diferente aconteceu. Eu só estava ansioso com o final de semana, contanto cada segundo, para poder ficar com a Liz em casa. Na sexta-feira, fui convidado, assim como todo o resto da escola menos a Clarissa, para uma festa no clube na sexta-feira à noite.

Quando não estou com a minha filha ou não tenho nada de importante pra fazer, costumo frequentar essas festas da escola sempre com os meus amigos. Não sou muito de beber, dançar ou virar a madrugada. Sei que tenho responsabilidades a mais que os outros garotos da minha idade e devo me comportar com tal. As festas são mais uma distração, um momento para curtir com os amigos, um passatempo, descontração. Afinal, ainda sou um jovem garoto com dezesseis anos, mesmo sendo pai, estou no direito de viver minha vida como uma verdadeiro adolescente.

― Será que ela vai? – Miguel perguntou como quem lê meus pensamentos enquanto estou de olho naquela garota, do outro lado do pátio, isolada e sozinha, lendo um livro que aparentemente eu já li.

O Tempo e o Vento.

― Com certeza não. – digo, voltando a realidade, tentando não olhar muito pra ela. Vai que ela acaba percebendo. ― Nem sei se ela foi convidada. Porque perderiam tempo dando convite a ela já sabendo que ela vai a esse tipo de lugar?

Eu tinha razão no que dizia, o meu amigo, ao meu lado entendia bem o que eu queria dizer com aquilo.

― Porque você não convida ela? Tenho um convite à disposição. Não sei se vou poder ir, meus pais querem me levar pra viajar esse final de semana para a casa de alguns parentes na Capital.

A festa não seria a mesma se o Miguel, meu melhor amigo, não pudesse ir. Mas a sua proposta me pareceu tentadora.

― Se eu for até lá convida-la, ela vai me dar um chute na canela ou fazer algo ainda pior, e me dizer a típica resposta: “Não!”

― Não seja covarde. – ele riu da minha cara. ― Quantos “nãos” de garotas você já recebeu em toda a vida? Muitos! Esse não será o primeiro e nem o último.

Outra vez ele tinha razão. Mas quem era ele pra me dizer algo assim? O Miguel é o cara mais covarde que já consegui depois do Edu, o nerd. Ele provavelmente nunca recebeu um não de um garota, porque nunca arriscou em perguntar nada pra nenhuma delas. Ele não entendia que o “Não!” da Clarissa, pra mim, seria pior que qualquer outro que já recebi na vida. Só de perguntar algo assim pra ela, ela seria capaz de me botar pra correr na frente de todo o colégio.

― Não sei não... Mesmo assim obrigado pelo convite. Acho que vou ficar com ele. Quem sabe até a sexta-feira eu crie coragem.

Cada diz que passava e cada vez que eu olhava para a Clarissa me sentia cada vez mais impulsionado a ir até ela e convida-la para essa tal festa. Talvez o receio que ela me rejeitasse me fizesse pensar que ela me faria sair correndo pra longe dela.

― Clarissa! – gritei por ela na saída da escola na quinta-feira chamando a atenção de algumas pessoas. Ela já estava se preparando para montar em sua bicicleta e ir embora pra casa. ― Ei, espera!

Pra minha surpresa, respirei aliviado, quando ela parou.

― Ei. Oi. – corri até ela. Agora mais pertinho dela, impressionado com o quanto ela é mais bonita de perto. Sorrio sem graça pela nossa a proximidade. Não estava tão habituado. ― Eu queria saber... Se você... Não quer ir na festa sexta-feira à noite?

Ela olhou bem pra mim como se duvidasse de cada palavra que saia da minha boca.

― Você está me chamando pra sair? – após ter olhado para um chão por um longo momento que senti minhas pernas falharem, ela voltou a olhar pra mim, quase com um meio sorriso.

― Não. – eu neguei muito nervoso. Acho que nunca fiquei tão desconfortável diante de uma garota. Foi como ter perdido a pratica todo o tempo em que me dediquei somente a minha filha. ― Só queria saber se você não quer ir.

― Não. Espera. – ela sorrio de verdade. Acho até que estava tirando uma com a minha cara. ― Você tá perguntando se eu quero sair com você na sexta-feira à noite, é isso?

― É. – revirei os olhos. O que foi um pouco gay, mas ela estava mesmo me tirando do sério. Eu já estava nervoso o suficiente e ainda sentia que ela percebeu, e mesmo assim, resolveu curtir comigo. ― Você quer ir à festa comigo na sexta-feira à noite? - perguntei de uma vez por todas, se era o que ela queria.

― Hum, agora sim, eu entendi. – ela sorriu de maneira sarcástica. Não sei se a odiava por isso ou se sorria por ela está finalmente sorrindo pra mim. ― Mas porque eu deveria ir com você? Me dê um bom motivo.

Entendi a jogada dela. Ela queria me testar, saber se eu era tonto o suficiente para me entregar com as palavras. Mas eu não sou tão babaca assim e resolvi entrar no seu jogo.

― Ah, eu só achei que você deveria sair mais de casa, aproveitar a oportunidade, conhecer gente nova, fazer amigos, se socializar.

Dei de ombros. Mas não só por esses motivos que eu queria que ela fosse comigo a festa. E eu sabia muito bem por quais mais.

― Ótima observação. Mas não. Eu não quero ir a essa tal festa com você na sexta-feira à noite. – ela voltou a fechar a cara. Foi como se o dia ensolarado tivesse perdido o brilho pelas nuvens escuras avisando que uma tempestade estava por vir. ― Eu estou bem assim.

Sem mais palavras ela virou-se, subiu na bicicleta e saiu pedalando rumo a sua casa. E eu, me sentindo muito ridículo, continuei parado ali, no mesmo lugar, sem acreditar no porque eu tinha me humilhado tanto por um garota estupida como aquela.

― E ai? – foi a primeira pergunta que o Miguel me fez quando eu telefonei para ele aquela noite. Acho que ele estava tão animado quanto eu com a possibilidade que ela aceitasse. Afinal, todos nós queríamos conhece-la melhor e ver que ela não era só uma menina má.

Mas quando acabei contando pra ele tudo que aconteceu, em detalhes, ele riu da minha cara que só me fez senti ainda mais idiota. Só não fiquei chateado ou com raiva, porque sei, por ele ser meu amigo, não tinha más intensões.

― Quer saber? Eu desisto! Eu odeio aquela garota. Nunca mais vou olhar pra ela, nem me importar e nem tentar ser legal.

Eu estava mais para um garoto emburrado todo mimado. O que só fez com o que o Miguel risse ainda mais da minha cara.

― Quer saber? Eu e você sabemos que isso não é verdade. - ele disse.


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Notas finais do capítulo

Continuo? Comentem e me digam o que estão achando. Qualquer dúvida, é só perguntar.



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