Quando Tudo Aconteceu escrita por Mi Freire


Capítulo 16
Capítulo XV


Notas iniciais do capítulo

Tirei um tempinho hoje pra postar esse capítulo. Mas estou muito nervosa, hoje é meu primeiro dia de aula na faculdade e eu não sei o que esperar de tudo isso. É tudo muito novo, e vocês já devem imaginar como é essa coisa de um ano novo, colégio novo, coisas novas. Não é fácil. Mas ta aí.



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Na segunda-feira, eu a Clarissa ficamos sabendo do resultado da nossa prova em dupla. Dez foi a nossa nota. Muito mais que merecida já que nós dois estudamos muito. E como uma das primeiras coisas que fizemos juntos e nos demos bem, foi inevitável, não abraça-la diante de toda a sala. Ela ficou muito surpresa com a minha atitude, mas também não fez nada em relação a isso. Apenas sorrio sem graça sem olhar pra mim.

Meus amigos também tiraram boas notas. Mesmo assim, algumas pessoas insistem em dizer que sou trapaceiro, por ser filho da professora e sempre tirar notas altas. Mas eu nem ligo, já até me acostumei. Eles não sabem o que dizem. E eu estou bem tranquilo, sei do que sou capaz, e parar tirar notas boas é preciso esforço, e eu me esforço muito.

Depois da aula, começamos os primeiros ensaios para o Sarau com os alunos interessados. Foi bem tranquilo, natural e acima de tudo, bem divertido. Acabei conhecendo gente nova e fazendo algumas amizades e simpatizando com alguns desconhecidos até então. Mas enquanto isso parecia ser interminável, eu mal via a hora de ficar a sós com a Clarissa, para conversarmos sobre a festa, o final de semana ou simplesmente passar um tempo juntos. Quando isso aconteceu, por volta das três e meia, todos se foram, inclusive o Diego e diferente das outras vezes, ela nem esperou eu me aproximar. Ela mesma veio na minha direção, ao verificar que éramos os únicos naquela sala, e me abraçou, depois disso, nos beijamos sem parar.

Na terça-feira, tivemos prova surpresa de Química. Ao termino da minha prova fiquei bastante receoso em não tirar boa nota, já que sou péssimo em química. A professora, a baixinha japonesa, não facilita. Mas meu humor mudou assim que as aulas terminaram e continuamos com os ensaios com outra rodada de alunos. Algumas vezes, eu nem parecia ouvir o que eles diziam, eu ficava apenas olhando pra Clarissa, e ela pra mim, sorriamos um para o outro, numa espécie de conexão particular. Naquela mesma tarde eu e meus amigos nos encontramos para passar a tarde toda no Clube para nos refrescar nas piscinas, e por mais divertido que estivesse, eu deseja que a Clarissa pudesse estar entre nós, nem que pra isso fosse preciso fingir que éramos apenas amigos.

Na quarta-feira foi bem mais tranquilo. Diferente dos dois dias anteriores havia poucos alunos para o ensaio. Terminamos mais cedo, e isso era um ponto positivo ao meu favor, já que a Clarissa não teria que ir pra casa tão cedo. Eu, ela e o Diego fomos até o centro, no Dukes, e comemos alguma coisa, conversamos e demos risadas. O Diego, pela primeira vez, não parecia tão preocupado em ir embora mais cedo para fazer alguma coisa importante em casa ou com a ex-namorada complicada. E ele acabou falando mais sobre ele mesmo, e eu gostava cada vez mais dele. O cara é bem tranquilo e gente boa.

Mesmo fazendo sol, um sol terrivelmente forte, começou a chover, para o alivio de muitos. Foi uma chuva rápida e fininha. Havia poucas nuvens negras no céu. E mesmo com a chuva o sol não desapareceu.

O Diego recebeu um telefonema durante uma das nossas conversas e precisou ir embora, alegando que a ex-namorada pediu pra que ele encontrasse com ela não muito longe dali. Pelo visto, ele ainda gosta muito dela. E ela dele. Ou eu não sei o que isso é.

Eu e Clarissa ficamos finalmente juntos depois de tanto tempo.

― Tive uma ideia. – eu disse, após pagar a conta. ― Vamos sair daqui. Quero te levar pra conhecer um lugar. – segurei sua mão.

― Você está me levando para a sua casa? – ela me olhou intrigada. Já estávamos bem próximo da minha casa. No final da rua.

― Não se preocupe. – eu ri, ela parecia preocupada com alguma coisa. ― Eu não vou assedia-la. Também não sou nenhum tarado. Só achei que seria legal você conhecer a minha casa.

― Eu não tenho tanta certeza. – ela retrucou. Encostei sua bicicleta no portão da garagem. ― E o seus pais?

― Fique calma. – tornei a pegar sua mão. Ela estava mesmo nervosa com um simples convite meu. Sua mão suava frio. ― Com esse lance do Sarau a minha mãe fica muito ocupada no colégio até tarde. Bem, e meu pai é diretor, então, basicamente ele sempre fica ocupado. E também, não tem nada de mais eles chegarem e nos encontrar aqui.

Abri a porta para ela entrar. Muito receosa ela entrou na frente.

― Eles vão adorar te conhecer, Clarissa. – fecho a porta. A casa está tranquila e silenciosa. Tudo em seu devido lugar.

― Pode até ser. – ela sorri nervosamente. ― Não duvido que eles sejam legais. Eu só não sei se estou preparada pra isso.

― Boba. – viro-a de frente pra mim com as mãos em sua cintura, puxo-a para pertinho de mim. ― Deixa de besteira, vai.

Beijamo-nos rapidamente.

― Eu só quero ficar com você em um lugar mais à vontade, sem precisar nos esconder das pessoas, ou ter medo de sermos visto. Eu não consegui pensar em um lugar melhor que a minha própria casa. – sorrio, passando meus lábios nos seus. ― Só quero que você se sinta à vontade. – puxei-a, pela mão. ― Agora vem. Vou te mostrar tudo!

Mostrei cada cômodo da minha casa pra ela sem deixar de fora qualquer detalhe. Subimos e descemos inúmeras vezes, tagarelando sem parar. Aos poucos ela ficou mais à vontade, como se realmente fizesse parte de casa. E enquanto olhava pra ela sorrindo, atenta aos detalhes da minha casa, não consegui não pensar se algum dia ela passaria mais tempo ali comigo do que na própria casa.

A ideia parece absurda, mas é o que eu realmente gostaria.

― Que horas são? – ela perguntou ao se sentar à mesa da cozinha. Eu abri a geladeira para pegar alguns ingredientes para preparar um lanche para nós dois.

― Ainda é cedo. São quase três horas. – respondo, depositando tudo sobre o balcão da pia. ― Eu sei que você tem que ir uma hora ou outra, mas por favor, fica um pouquinho mais. Vou preparar um lanche.

― Tudo bem. Eu posso ficar até umas quatro horas no máximo. – ela levanta, se aproximando de mim. ― Quer uma ajudinha?

Preparamos os sanduíches juntos. Notei que ela leva bem mais jeito pra isso do que eu. O que já era de se esperar. Sentamos a mesa e devoramos nossos sanduíches na companhia de uma jarra de suco.

― É inacreditável... Você tem dois quartos! – ela comentou, parecendo muito empolgada.

Então eu contei a ela a verdade sobre os dois quartos. No do andar de cima um quarto normal, bem mais arrumado, onde estão minhas roupas e meus pertences pessoais. O quarto-porão onde a entrada de adultos é proibida, incluindo a dos meus pais, foi um acordo que eu tive que fazer com eles. Lá em baixo é onde fica toda a minha bagunça, os jogos, onde eu passo a maior parte do tempo com meus amigos ou quando quero me isolar do mundo.

― Já que você está aqui – descemos para o quarto-porão. O meu favorito. Qualquer um saberia porquê. ― topa jogar uma partida comigo?

Eu me referia ao videogame.

― Claro que eu topo! – ela ainda olhava por todos os lados, muito encantada com tudo. E olha que foi eu mesmo quem cuidei de toda a decoração. ― Enquanto carrega ai, se importa se eu ligar o som?

― Não, de jeito nenhum. Pode escolher o quiser.

E ela o fez. Ligou o som baixinho. A playlist escolhida foi uma das minhas preferidas. Ela acertou em cheio. E eu não me lembro de ter revelado isso a ela. A primeira música era With Me de uma das minhas bandas favoritas, uma banda Canadense, chamada Sum 41.

Mesmo alegando nunca ter jogado antes, Clarissa se saiu muito bem com o controle do videogame em mãos. No início, ela errou bastante, ficou um pouco nervosa por não conseguir. Então eu pausei, e mostrei a ela os comando básicos para se dar bem. Pouco a pouco ela foi pegando o jeito, melhorando, e por fim, meio que empatamos.

― E qual vai ser o meu prêmio por ter ido tão bem? – ela largou o controle sobre a cama bagunça, sorrindo de lado, e eu entendi exatamente o que ela queria dizer com aquilo.

Não pensei duas vezes em largar meu controle também e me lançar sobre ela, deitando-a pouco a pouco sobre a cama. Segurava seu rosto saboreando as ondas elétricas que percorriam meu corpo todas as vezes em que nos beijávamos.

A minha necessidade de tê-la cada vez mais em meus braços crescia muito rapidamente, dia após dia, não saberia dizer por quanto tempo ainda poderia me segurar.

― Acho melhor a gente ir com calma. – ela se desvencilhou, indo pro lado. Olhando a expressão dela de assustada foi que entendi que tinha ido longe demais com meus beijos desesperados.

― Me desculpe... Eu não queria... Estragar as coisas. – disse, me sentindo muito estupido. Custava muito eu me segurar um pouco mais?

― Ah, não. Tudo bem. – ela finalmente sorrio, e eu pude sentir meu coração se acalmar. E então, ela tocou meu rosto, acarinhando-o.

― Clarissa, eu quero muito, muito mesmo, ficar com você. Já não dá mais pra esconder o que eu sinto. Toda as vezes em que eu te olho me sinto a beira de um colapso. E todas as vezes que estamos perto um do outro não penso em outra coisa. Só quero toma-la em meus braços e fugir, pra bem longe, com você. – acarinho seus cabelos, sentindo a macies do seu cachos dourados sempre tão sedosos. ― Eu quero te propor uma coisa. – só por tocar no assunto, sinto que ela me olha mais atentamente agora. ― Vamos ficar juntos. O que você acha?

― O quê? – ela se sobressalta, abismada. Clarissa senta sobre a minha cama passando nervosamente a mão nos cabelos. ― Não... Não podemos. Ninguém pode descobrir. Ninguém pode nos ver. Meu pai me mataria, te mataria, se soubesse que estamos juntos.

― Você não está entendendo, Clarissa. – sento-me também, me aproximando dela. Seguro sua mão, apertando firme. Meus olhos parecem conectados aos dela. ― Eu te entendo. Eu sei de tudo isso. Por isso, quero te propor, de ficarmos juntos... Escondidos. Você pode confiar em mim. Ninguém além de nós precisa ficar sabendo.

― Além da Marina, claro. – ela diz em tom de brincadeira, o que me faz rir. Ela tem razão. Não tem como esconder da Mari algo assim. Logo ela que está ao nosso favor desde o princípio e daria de tudo para nos ajudar com esse segredo.

Mas eu preciso de uma resposta...

― E então, o que você me diz? Você topa ficar comigo mesmo as escondidas? Um namoro secreto. Só eu e você. Em qualquer lugar, desde que ninguém possa nos ver.

Ela suspira, desviando o olhar. Parece pensar por um momento, refletir. Eu compreendo. Ela deve estar assustada, receosa, e com medo de que nada disso funcione. O que é muito normal. Eu também nunca tive nada parecido. Mas eu só preciso que ela confie em mim. Desde que a conheci não tenho desejo de ficar com mais ninguém.

― E se não der certo? Digo, e se uma hora ou outra não pudemos mais esconder de ninguém? Eu não sei do que meu pai seria capaz de fazer caso descobrisse essa farsa. Pode ser perigoso... E também, como vamos fazer dar certo? Para ficarmos juntos. Já que o único lugar em que nos vemos com frequência é no colégio.

― Eu vou dar um jeito. Prometo. – selei meus lábios nos seus. ― Lembra que eu disse que cuidaria de você? Eu disse também que não decepcionaria, não a abandonaria e nem a deixaria pra trás. Podemos ficar aqui, a tarde, na minha casa ou sei lá, em qualquer outro lugar. Eu vou dar um jeito. Vou pesquisar, pedir a ajudar da Mari. Juntos vamos fazer dar certo, tudo bem? – só de pensar que poderemos tentar, sinto meu peito explodir de alegria. ― Só me diga que aceitar e....

― Pode parecer loucura e insano. Mas eu quero muito tentar! Por você vale a pena arriscar. – ela se joga em meus braços, envolvendo-me com seus braços finos, apertando-me carinhosamente. ― Eu gosto muito de você, Bernardo.

Essa era a resposta da qual eu precisava.

Na quinta-feira agimos como se nada tivesse mudado. Mas basta olharmos um para o outro e sorrirmos para compartilhar secretamente algo só nosso. Após o termino dos ensaios, e quando nos encontramos sozinhos, organizando a bagunça, tiramos o resto do tempo que nos resta para ficarmos juntinhos, em segurança. Sempre fechando a porta e nos certificando de que nada dará errado. Não quero pressiona-la, vamos com calma. Aproveitar que por enquanto está tudo ocorrendo bem. Não chamo a para passar o resto da tarde lá em casa. Eu posso esperar, apesar de toda a minha inquietação.

Marina liga pra mim as cinco daquela mesma tarde, desesperada, pela minha ajuda. Ela não está conseguindo resolver os exercícios do trabalho de matemática. O meu, que aliás, está com o Eduardo que é a minha dupla no trabalho. Mas já que a dupla da Mari é o Gustavo que não está nem ai pra essas coisas, preferindo tirar a tarde para ir à academia, eu vou até a casa dela ajuda-la. Não tenho nada melhor pra fazer. E afinal, é pra isso que os amigos servem.

Já é noite, com insistência dos pais dela que gostam muito de mim e eu deles, eu fico para o jantar. Mas liguei pra casa, para avisar a minha mãe, que não ficasse preocupada com a minha demora. Já estou de saída, um bom tempo depois, já são quase nove da noite. A Mari me acompanha até a porta, chegando lá fora, na varanda, ela me olha intrigada, com a mão na cintura e aquela pose de séria.

― Eu pensei que não precisaria ter que te fazer essa pergunta, e que você fosse me contar sem rodeios, como os amigos fazem um com o outro. Vamos lá, desembucha. Você a Clarissa estão...?

― Sim. Nós estamos juntos, sim. – digo, finalmente.

Ela pula de alegria, batendo palmas e sorrindo atoa.

― Ei, calma ai. É um segredo. – digo, mais baixo. Com receio de qualquer um que esteja passando pela rua possa nos ouvir. ― Só você sabe até agora. E eu não pretendo contar a mais ninguém até a Clarissa me certificar que de que sente segura ao meu lado.

― Ah, que fofos! – ela me olha daquele jeito toda bonitinha. ― Tudo bem. Eu prometo não contar a ninguém. E saiba, eu estou com vocês. Se precisarem de mim, é só chamar.

Abracei-a, e me despedi. Indo embora pra casa.

A semana passou terrivelmente depressa, mas muitas coisas boas aconteceram, e eu tinha motivos reais para sorrir atoa e sonhar acordado. Eu e a Clarissa tentávamos ao máximo agir normalmente, como antes de nos tornarmos “amigos”. Eu ainda passava o intervalo com meus amigos em nossa mesa, falando bobagem e comendo besteiras. E ela ainda ficava do outro lado do pátio, lendo, ouvindo música ou junto da Isabel, sua irmã que algumas vezes lançava-me olhares intrigantes, como se soubesse de algo.

Aquele seria o último dia de ensaio. E ocorreu muito bem. Eu tinha quase certeza de que o dia do Sarau seria memorável de muitas formas, especialmente por ter unido a mim e a Clarissa finalmente. Ainda era inacreditável acordar todas as manhãs e me dar conta de que eu poderia chama-la de minha, como nunca antes eu havia imaginado. Ela me pertencia e eu sou inteiramente dela. Nunca achei que fosse possível estar tão apaixonado em toda a minha vida.

Ela passou uma hora e meia lá em casa, com a casa só para nós dois. Nada de mais aconteceu. Eu a desejava sim, sentia meu corpo arder em brasa todas as vezes em nos encostávamos, mas com ela era diferente, eu sentia necessidade de aguentar firme, de esperar o momento certo para as coisas acontecerem, eu não queria agir com pressa ou sem antes pensar e ter certeza. Com ela não era como quando eu ficava com outras garotas, todas fogosas, que queria sempre avançar, ir mais a diante, e eu, nada boba, dava sempre um jeito de tirar uma lasquinha delas ou me aproveitar.

― Desde que você tirou o resto da sua tarde para ajudar do Sarau nós quase não conversamos direito. – Miguel observou. Estávamos fazendo caminhada juntos daquele comecinho de noite. Como nos velhos tempos. ― Queria conversar com você sobre uma coisa.

― E desde quando você espera o momento certo para me dizer alguma coisa? – dei um soco de leve no braço magro dele. Nós rimos. ― Se queria conversar, porque não me ligou antes? Eu realmente estive muito ocupado com algumas coisas. Mas ainda somos amigos, lembra?

― É um assunto delicado, Bernardo. Tenho criado coragem desde o sábado à noite, na festa. – ele estava começando a me deixar intrigado e bem curioso.

Olhei pra ele para que ele pudesse prosseguir sem eu precisar insistir. Paramos pelo meio do caminho. Já cansados.

― É sobre a Brenda. Por acaso, vocês dois ficaram no sábado? Eu estava curtindo a festa, falando com uns colegas, quando de repente te vi saindo do banheiro, ela surgindo logo depois, e meio que pareceu que você estavam muito entrosadas e....

― O quê? Tá maluco? – eu ri. Ri muito. Isso realmente aconteceu. A Brenda me pegou desprevenido na saído do banheiro quando eu já estava tentando voltar para perto da Clarissa. Ela estava visivelmente bêbeda, muito soltinha, risonha e descarada e falou algumas besteiras e até tentou se aproximar de mim. Mas eu não dei abertura.

Primeiro que não vejo ela como nada além da melhor amiga da mãe da minha filha. Segundo que, não estou afim dela. Só consigo pensar na Clarissa e ter olhos exclusivamente pra ela. Terceiro que, a Brenda pode estar bêbada, drogada, ou até mesmo sóbria, mas eu não cairia na sua lábia. Não mesmo. Em hipótese alguma.

― Não, Miguel. Nós não ficamos. Que ideia! De onde você tirou isso? – continue rindo. Nossa! Meu melhor amigo pensar umas coisas dessas? Sem cabimento ou fundamentos.

Então, de repente, me dei conta de algo. Olhei bem pra ele que tentou desviar o olhar. E tive certeza de uma coisa que eu deveria ter percebido muitos antes. Mas que por alguma razão deixei pra lá.

― Você está afim dela, não é? É claro que está!

― É, mais ou menos isso.

Eu poderia ter dito muitas coisas a ele. O quanto a Brenda não parece ser o tipo de garota certa pra ninguém. Ela é muito solta, livre, maria-vai-com-as-outras, desinibida, até um pouco metidinha, atirada, desmiolada, quase nunca pensa direito. Mas, meu amigo, o Miguel, só de olhar pra ele dá pra certeza que ele está mesmo gostando dela. E o que eu posso fazer contra? Dizer a ele parar descartar essa ideia maluca de gostar da garota errada? Não, de jeito nenhum! Eu, pra começar, nem posso ter certeza disso. E eu não quero dar uma de amigo chato.

Peço a ele que me conte como e quando tudo começou a mudar.

Ao chegar em casa, tomo um banho, ainda mais contente pelo Miguel finalmente ter se interessado por alguém, imaginando o quanto ele deve estar se sentindo bobo como eu por estar apaixonado, mesmo que parece ser impossível alguém estar mais apaixonado que eu. Troco de roupa, desço para jantar, converso um pouco com meus pais como de costume, e aproveitando que não está muito tarde, e não há nada melhor para fazer, vou até a casa da Lorena, pois quero ver a minha filha.

Acho que ela é a única no mundo que pode tirar a Clarissa do meu pensamento por algumas horinhas.

Chegando lá dou de cara com a Lorena e o Rafael no sofá da sala vendo um filme e comendo pizza em plena sexta-feira à noite como costumávamos fazer. Um pouco desconcertado pelo que vi, pergunto pela minha filha, e a Lorena pede para eu suba até o seu quarto. Uma ideia que o Rafael pareceu não gostar, mas eu pouco me importo com o que ele acha ou não.

Liz está no bercinho, dormindo, exatamente como a Lorena disse que ela estaria.

Beijo cuidadosamente sua testinha e seguro sua mãozinha.

― Oi, meu amor. – sussurro baixinho para não acorda-la. Só quero conversar com ela, mesmo tendo a certeza de que dormindo, ela não me escutará. ― Você não sabe o quanto o papai está feliz de ter ver.

Conto a ela sobre os últimos acontecimentos. Especialmente sobre a Clarissa e eu e nosso relacionamento secreto. Liz não se mexe em momento algum. Acho que devo parar de encher o saco dela e deixa-la dormir em paz sem ter que ouvir a minha voz. Apago a luz, deixando somente o abajur cor-de-rosa ligado e vou em direção a porta.

Já estou de saída quando ouço um ruído vindo dela.

Volto a me aproximar do berço dela. Mas ela continua dormindo feito um anjinho e nada mudou. Será que estou delirando?

Como quem responde a minha pergunta, Liz sorri abertamente por alguns segundos como quem está sonhando, e logo depois volta a seriedade e dorme tranquilamente.

Eu a amo, meu Deus, como eu a amo.

Voltando pra casa só consigo pensar em uma outra pessoa que eu gostaria de ver antes de dormir. Mas como não posso, pelo menos há outra coisa que eu possa fazer. Pego meu celular no bolso do jeans e disco seu número que já sei de cor. Ela atende no terceiro toque.

― Só queria ouvir a sua voz.

Conversamos enquanto eu volto pra casa.

Antes de me deitar, no silêncio do meu quarto, penso em escrever algo. Não que eu possa guardar para ler depois, mas algo que eu possa dar para Clarissa guardar e ler sempre que quiser. E para que também ela possa ler e lembrar o quanto eu gosto dela.

Não posso te dizer que eu sempre acreditei nesse lance de almas gêmeas ou metades opostas que se atraem, mas eu acho que a gente se pertence de alguma forma. Às vezes, antes de dormir, eu fico na minha mente listando todas as partes de você. Desde aquelas que eu já cheguei a detestar, mas de alguma forma aprendi a amar, até aquelas que desde o início eu sempre gostei em você. É incrível, mas não há nada que eu mudaria em você.

É tudo tão novo pra mim. Eu nunca pensei que pudesse precisar tanto de alguém como eu preciso de você, nunca desejei precisar tanto de um sorriso como desejo o seu, e nunca esperei tanto por um beijo como eu espero pelo seu. Me desculpe se as vezes eu pareço um maluco, inconsequente, clichê, ou se eu te assusto ou te incomodo com toda essa melação. Ainda é tudo muito confuso pra mim, eu me vejo com medo de você se afastar de mim por algum erro meu. Eu não sei o porquê de tudo isso. Da magia indescritível de quando eu olho pra você e não consigo enxergar mais nada. Não compreendo a imensidão do meu desejo por você, Clarissa.

Após terminar de escrever essa pequena cartinha, dobrei a folha, fiz um envelope improvisado, coloquei nossas iniciais e esperaria, pelo momento certo, para entregar nas mãos delas.


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Notas finais do capítulo

Vocês acham que a Clarissa vai gostar do que o Bernardo escreveu? E o que vocês acharam desse relacionamento secreto dos dois? Comentem! Quero saber da opinião de vocês. É importante.



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