–--(Katniss)---

Dormir não era a melhor das hipóteses mas quando finalmente peguei no sono e consegui dormir um pouco, o sol entrava pelo meio fio da janela. Acordo com o telefone tocando várias vezes porém não atendo. Ainda na cama, olho para o relógio e vejo que já passou das onze.

Estou quase na porta do quarto quando ouço alguém bater na porta lá embaixo e Thor me acompanha nas escadas enquanto refaço minha trança no caminho. Quando abro, vejo minha mãe parecendo surpresa e assustada.

–Katniss! O que... O que aconteceu com você? Liguei aqui várias vezes, ninguém atende. Effie e Haymitch me disseram que bateram aqui hoje de manhã e vocês não estavam. E... -suas mãos param em meu ombro e seus olhos me fitam de cima a baixo. -Filha, olha pra você! -não digo nada, o que faz com que ela continue. -Katniss, estou preocupada! -diz cruzando os braços.

Seus olhos planam por toda a sala e cozinha

–Onde está Peeta? -pergunta.

Enxugo rapidamente a lágrima que desliza por meu rosto mas ela percebe. Sua mão para em meu rosto, levantando-o e seu polegar passa em minha bochecha limapando-a, assim como Peeta fazia.

–Tudo bem, não precisa me contar agora. -diz e me abraça.

–Nós brigamos. -digo. Parecia mais fácil falar sem olhar nos olhos dela. -Ele disse que queria um tempo.

Ela se afasta um pouco e me olha nos olhos, o que me faz baixar o olhar.

–Já havíamos discutido algumas vezes, ele dizia que meu ciúmes era a toa! -sinto meus olhos arderem em mais lágrimas. -Mas na manhã de ontem eu o encontrei dentro da dispensa da padaria com Rosy. Fiquei muito mal!

–Mas eles não estavam fazendo nada de mais, estavam? -pergunta. Balanço a cabeça em negativa, nervosa.

–Estavam conversando mas ela estava sorrindo.

–E o que ele disse para você? -pergunta.

–Eu não quis ouvir. Chegamos brigando e quando ele disse que deveríamos dar um tempo, a única coisa que consegui fazer foi me trancar no quarto de visitas.

Minha mãe não disse nada por um bom tempo, ficou apenas em um abraço comigo. Aquilo era uma das únicas coisas que me fariam ficar bem e também a única entre elas que minha mãe conseguiria me dar.

–Arrume suas coisas, você vai passar um tempo comigo.

–O que?

–Filha, eu não vou deixar você sozinha nesse estado. Você vai passar um tempo em casa, vai ser bom.

–Mas e o Thor? -minha voz quase não sai audível de minha garganta.

–Ele vem com você. Não terá problema, Buttercup quase não para em casa. -assinto limpando meu rosto com a manga da blusa. -Então arrume suas coisas, eu já volto.

Ela está no caminho da porta quando seguro seu braço.

–Onde você vai? -pergunto.

–Eu já volto, é rápido. -diz me dando um beijo na testa -Fica bem.

Quando ela sai decido que é melhor eu arrumar algumas das minhas coisas. Talvez ficar longe da onde tenho mais lembranças seja melhor. A caminho do quarto as lágrimas voltam a cair. Minhas últimas vinte e quatro horas se resumiram em chorar, pensar e tentar dormir sem contar a dor de cabeça que parecia interminável. Eu queria Peeta comigo.

Com o nariz trancado pego minha bolsa e vou colocando algumas de minhas roupas tentando não permanecer muito no quarto em que passei uma parte dos melhores momentos de minha vida.

–--(Peeta)---

O quarto vazio sendo comandado pelo silêncio, o dobro de espaço na cama. Nada disso compensa a falta de Katniss. Não faz sentido estar aqui.

Parte da noite anterior eu consegui usar para pensar e parte dormir quando os pesadelos deixaram. Sempre tentei esconder meus pesadelos de Katniss, só a deixaria mais assustada. Minha tranquilidade voltava quando eu a via e os pesadelos foram muito piores essa noite pois eu não a tinha ao meu lado, não sabia se ela estava bem.

As lembranças de todos os tipos rondaram a minha cabeça como ainda estão fazendo.

Eu nunca quis que ela sofresse e jamais seria minha intenção. Achei que se ficássemos distantes por um tempo ambos conseguiríamos pensar, mas eu estava errado. Me sinto vazio sem ela, sinto sua falta e se ela estiver tão mal quanto eu, nunca me perdoarei por isso.

Me levanto pensando em ir para a padaria, para tentar continuar normal. Chego tendo certeza de que as pessoas ainda me olham de canto. Nenhuma delas sabe exatamente o que pensar sobre os últimos dois dias e penso que é melhor assim, melhor que ninguém saiba pelo que estamos passando.

–Um pouquinho atrasado. -diz Rosy com um sorriso, tentando me animar.

–Pois é, de novo. Devo mais do que uma à vocês.

Cumprimento Tony e Henry e logo sigo para a cozinha onde encontro mais de meus funcionários trabalhando. Meu desânimo era muito grande para que eu tivesse vontade de trabalhar mas eu prometera pra mim mesmo que recompensaria todos os meus funcionários por tudo que estão fazendo por mim assim que conseguisse mas agora só queria me distrair.

Abro a gaveta do balcão onde passei a guardar meu caderno de desenhos e o pego, sem ter uma ideia em mente do que desenhar. Entro na dispensa mesmo não sendo onde queria estar, porém eu poderia ficar sozinho. Com um lápis começo a traçar alguns riscos em uma das folhas e quando percebo, os traços estão formando pessoas quase que involuntariamente. Minha tentativa de distração falhou pois acabo desenhando Katniss e eu abraçados, de mãos laçadas, felizes, antes de eu estragar tudo. O barulho da porta se abrindo devagar desvia minha atenção do desenho e vejo Tony em uma fresta.

–Peeta... Tem uma pessoa querendo falar com você... -ele diz parecendo um pouco preocupado, o que me alarma.

Levanto do chão deixando o caderno em cima de uma das mesas de dentro da dispensa e acompanho Tony. Quando percebo quem me espera meu corpo todo fica tenso como se tivesse levado um choque.

–Bom dia Peeta. -ela diz.

–Bom dia... Sra. Everdeen -tento dizer normalmente.

–Nós podemos conversar? -pergunta. Acho que eu estaria com certo medo de suas palavras se ela não parecesse normal. Assinto enquanto ela me acompanha até uma mesa mais afastada.

–Então... Acho que você imagina sobre o que eu vim falar -assinto confirmando sua suposição -Mas eu não vim defende-la.

Não era o que eu imaginava mas apenas permaneço ouvindo.

–Eu ouvi com as palavras dela o que aconteceu e acho que ninguém tem culpa. Também acho que vocês devem ficar um tempo sem contato.

Suas palavras fazem um efeito conturbante e instantâneo em mim. Esse "tempo" esté indeterminado. Um silêncio se estabiliza até eu criar coragem para quebra-lo.

–Ela está bem? -pergunto antes que eu possa mudar de ideia.

O jeito que ela responde um sim me faz gelar. Meus pensamentos começam a se revirar com tantas possibilidades.

–Eu preciso ir. -ela diz com oferecendo um sorriso de desculpas antes que eu possa falar algo.

Apenas aceno observando-a sair como se estivesse perdendo minha chance de voltar a ver Katniss e só de pensar nisso eu me quebrava por dentro.

–--(Katniss)---

Não havia se passado nem meia hora quando ouço o barulho da porta se abrindo e das patinhas de Thor correndo ao encontro de minha mãe. Coloco a mochila nas costas antes de descer para encontra-la.

–Estou quase pronta. -digo enquanto ensacolo algumas coisas para Thor como sua ração e alguns brinquedos para que não fique depressivo comigo.

–Você comeu? -pergunta minha mãe. Apenas balanço a cabeça levemente em negativa. -Você precisa comer.

–Eu não consigo! -digo e ela me encara com uma sobrancelha arqueada.

–Filha... -ela começa mas eu a interrompo.

–Por favor, não. -minha voz estava fraca e quando penso que não a convenceria, ela apenas assente mas se prepara para falar algo.

–Prometa que vai almoçar então.

Olho para o relógio e vejo que está perto do almoço. Meu estômago afunda só de pensar em receber algum tipo de alimento.

–Que vou tentar... Seu olhar preocupado não muda quando assente e me ajuda com Thor e minha bolsa até lá fora.

O caminho foi mais que silencioso. Eu observava a Vila dos Vitoriosos e como agora estava mais incluída no 12, com ligação direta às outras casas e lugares. Imaginava se Peeta não estaria em uma das casa. Quando chegamos espero minha mãe abrir a porta e entro com Thor no colo. Observando a casa, lembro-me que minha mãe falou que as vezes Robert passava a noite aqui com ela. Na verdade a maioria do tempo mesmo os dois estando trabalhando no hospital e tendo ficado de plantão muitas vezes. Isso me faz pensar porque minha mãe não está trabalhando.

–Mãe, não era para você estar no hospital agora? -pergunto com a voz ainda rouca o que me faz tossir.

–Até era, mas eu fui atrás de você e ficarei aqui o quanto for preciso.

Ela sorri e me beija na testa antes de ir para a cozinha preparar meu almoço. Subo as escadas indo para o quarto que seria meu. O apoio de minha mãe está sendo muito importante para mim. Apoio que faltou por anos mas que finalmente chegou.