O Sangue do Olimpo escrita por Belona


Capítulo 37
Annabeth




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Ela viu o corpo de Octavian ser envolto em névoas, o ursinho restante no chão. Então tudo congelou.

O Tempo havia parado. No exato momento em que Annabeth previra e programara.

Sua respiração estava acelerada, alta, provocando baforadas no frio da manhã. Ela piscou algumas vezes para se acostumar com a ideia de que todo mundo estava parado e que ela tinha horas contadas para fazer o que iria fazer.

Ela respirou fundo, enchendo os pulmões e expirando lentamente. Não sabia por que, mas estava um pouco nervosa.

Annabeth deu uma volta completa em si mesma, perscrutando os arredores. Viu o quanto os campistas gregos haviam crescido, e como o número aumentara. Ela sorriu largamente e lágrimas vieram-lhe aos olhos. Estava em casa... E tinha certeza de que se o vento soprasse, ela poderia sentir o cheiro dos morangos. Havia muito mais chalés, desde Zeus até Hécate, casas para sátiros, náiades e armazéns. A arena estava imponente, a Casa Grande, recém-pintada. Ao longe, ela viu a deusa Lupa parada, e parecia fitar intensamente os olhos de Annabeth. Sua matilha estava presa em um eterno uivo. Mais para o lado, cerca de cem meninas adolescentes, belas, graciosas e letais, com arcos, lobos e falcões, vinham subindo a colina. Liderando-as estava uma garota alta, com cabelos pela cintura, negros e espetados. Ela tinha os olhos azuis delineados em preto, e tinha uma expressão estranha no rosto. Suas sobrancelhas estavam arqueadas, como se ela tivesse feito uma pergunta, mas ela carregava seu escudo medonho e sua lança. Thalia, filha de Zeus.

Annabeth quis passear por ali, entrar no chalé seis e tirar um cochilo, mas não tinha tempo para isso. Ela tinha que fazer aquilo.

Um pesar tomou seu coração. Ela teria que deixá-lo. Annabeth se virou para a direita, onde Percy estava.

Não estava mais. Havia apenas um espaço vazio ali. Annabeth sentiu uma pontada de desespero.

– Foi você, não foi? – Era a voz dele às suas costas. Vagarosamente, ela girou o corpo e o encarou.

– Não. – Ela sentiu como se alguém tivesse-lhe dado um soco no estômago. – Não.

Ela abraçou a si mesma e fitou o chão.

– Annabeth. – Percy parecia preocupado. Ele segurou seu pulso e a abraçou, mantendo-a quente em seus braços. – Ei...

– Desculpe. – Ela murmurou contra seu peito. – Desculpe, desculpe, desculpe...

– Annabeth, já falamos sobre isso. Aquilo não foi...

Annabeth fitou seus olhos.

– Não é isso. – Percy se calou. – É aqui. O agora.

Percy pacientemente esperou ela respirar fundo mais algumas vezes e se recompor. Ela se afastou delicadamente e o encarou.

– Não está fácil demais? – Ela perguntou.

Percy iria perguntar o que estava fácil demais, mas entendeu. Ele assentiu.

– Quer dizer... – Ela sorriu levemente. – Não está nenhum pouco fácil. Passamos a noite inteira lutando e... Mas isso não é importante. Percy, você acha que daria certo dar um sonífero para Gaia, se o ritual já se cumpriu e ela já está com o sangue de dois semideuses?

– Com um pouco de sorte... – Ele ponderou. – Eu diria que sim.

Annabeth fez que sim com a cabeça.

– Exato. Com muita sorte. Só que nem toda a sorte do mundo é páreo para a vontade que ela tem de acordar. – Ela explicou. – Pense... O sangue do Olimpo é uma espécie de veneno. O que precisamos para combater um veneno?

– Um antídoto. – Respondeu ele e o sorriso de Annabeth disse que ele acertara.

– Aham. – Ela continuou. – O sonífero é um antídoto?

Percy pensou por uns instantes e sacudiu a cabeça.

– Não sei.

– Não. Não é. – Ela suspirou. – Se o sangue de dois semideuses é o que se necessita para ela acordar, o que precisaria para que ela voltasse a dormir?

– O sangue de outros dois semideuses. – Ele se deu conta.

Annabeth ficou em silêncio, deixando-o absorver. Os dois ali, parados no tempo, com um timer certo.

– Os dois semideuses eram Nico e Reyna. – Ele falou. – Eles vão fazê-la acordar. Agora, os dois semideuses que irão fazê-la dormir... Somos eu e você.

– Exatamente. – Ela meneou. – E sabe como Nico e Reyna morreram? Quer dizer, vão morrer?

– Vão morrer porque, quando ficam em contato com Gaia, é meio radioativo.

– Não necessariamente. – Ela ergueu as sobrancelhas. – O contato com agulhas... Material hospitalar. Argh. É tão tosco... Mas é a realidade.

– Então Nico, Reyna vão morrer. Eu e você... Também.

Annabeth sacudiu a cabeça.

– Eu coloquei no tabuleiro do Tempo apenas para que eu ficasse parada. Mas algo colocou você aqui também. Percy, não precisa fazer isso.

Ele lançou um olhar magoado para ela.

– Você iria se matar, e não iria me contar. – Ele disse.

Annabeth engoliu em seco.

– Eu iria lhe contar depois que acabasse. Eu não sei ao certo quanto tempo leva para que... Morra... Mas eu iria contar.

– E se você caísse antes? – Ele cruzou os braços. – Como você acha que eu ficaria?

Annabeth piscou para reprimir as lágrimas.

– Se eu contasse antes... Você iria querer vir junto... E eu não posso pedir para que você faça isso. – Sua voz estava embargada. – Você já fez demais por mim... Por todos... Eu achei que você merecia um pouco de paz...

– Paz. Com você morta. – Ele sacudiu a cabeça, descrente. Depois, descruzou os braços. – Onde eles estão?

Annabeth suspirou e começou a andar na direção da Casa Grande. Percy a seguiu.

Ela subiu um lance de escada e entrou num quarto do segundo andar. Lá estavam eles. Gaia deitada no meio. Nico a esquerda, Reyna a direita.

Eles estavam estirados no chão, de olhos fechados. Gaia tinha uma agulha em cada braço, e cada tubo levava ao braço de Reyna e Nico. Estavam de olhos fechados, mas respirando.

Percy ajoelhou-se ao lado de Reyna.

– Precisamos tirá-los daqui. – Ele disse, e Annabeth concordou.

– Espere. – Ela disse. Notou que havia mais uma agulha no braço esquerdo de Gaia, com outro tubinho. Ela segurou aquilo e tentou ver da onde vinha, e avistou uma cadeira de rodas motorizada num canto. O tubo terminava ali, em uma agulha embolada em fita crepe. – Quíron.

– Quíron deu seu sangue para ela... – Percy franziu as sobrancelhas.

– Ele pensou que funcionaria como antídoto... Sangue de centauro é...

– Letal. – Ele completou.

Percy tirou a agulha do braço de Reyna, e Annabeth fez o mesmo com Nico. Percy passou um braço pelos braços dela e um pelos seus joelhos. Ele a levantou, e Annabeth ergueu Nico – que era mais leve.

Eles os levaram ao quarto andar e os colocaram nas camas, perto da janela.

– Aqui... Acho que ficarão bem. – Percy disse.

– Eles estão dormindo... – Annabeth colocou uma mão na testa de Nico di Angelo. – Eles ainda não morreram. Estão num sono pesado.

Annabeth e Percy voltaram ao segundo andar, tiraram as agulhas dos braços de Gaia, colocaram novas e pegaram as pontas opostas.

– Tem certeza? – Annabeth tinha a agulha a um centímetro do antebraço dele.

– Você tem? – Ele inquiriu.

Ela assentiu.

– Então eu também tenho. Somos uma equipe, certo?

Annabeth sorriu e pressionou a pele dele, então colocou sua própria agulha em seu próprio braço. Eles se encostaram na parede.

– Quando tempo? – Ele perguntou.

– Não sei. – Ela admitiu. – Até acharmos o suficiente.

O líquido rubro corria pelos tubos, entrando em Gaia.

– Como se sente? – Ela perguntou depois de algum tempo.

Ele refletiu por um instante.

– Normal. Acho que um pouco sonolento. Mas não é por causa disso. Estaria com sono mesmo sem doar sangue. E você?

Annabeth suspirou e engatinhou até ele, tomando cuidado para não arrebentar os tubos ou fazer com que a agulha pulasse para fora de seu braço. Ela sentou-se ao seu lado e colocou a cabeça em seu ombro. E começou a chorar.

Percy apenas a abraçou e a apertou. Ela nada falou, apenas chorou silenciosamente, soluçando de vez em quando.

Apesar da situação, Annabeth sentiu sono, como Percy falara. Aos poucos ela foi desvanecendo, deixando o estupor a vencer, a dor, a angústia... Tudo aquilo que a sufocava. Então dormiu.

Quando acordou, seu rosto ainda estava enterrado no pescoço de Percy. Seu cheiro de mar era inebriante, e ela queria fica ali para sempre. Mas, como toda vez que isso acontecia, ela tinha que obrigar-se a despertar.

Ela esfregou os olhos e sentiu uma puxada no antebraço. Annabeth olhou aquilo, e viu que enquanto dormia, se mexera e o negócio de deslocara. A agulha havia perfurado demais, machucando e meio que esfolando. Ela observou o tubo, que tinha se deslocado também. Mas quando verificou Gaia, viu que ela tinha recebido uma boa quantidade de sangue. Talvez o dobro do sangue de Nico e Reyna.

Annabeth sentou nos calcanhares e delicadamente arrancou aquilo de seu braço. Não se sentia fraca nem nada do tipo. Mas estava branca. Mais do que de costume.

Ela foi até Percy e o acordou, tirando a agulha de seu braço.

– Dormimos? – Ele perguntou.

– Acho que desmaiamos. – Ela bocejou. – Foi bom.

Ele sorriu perversamente.

– Ei. – Ela protestou e tirou aquela aparelhagem de Gaia. Era tão tosco... Annabeth olhou para ele. – Você vai me achar muito estranha se eu fizer um negócio? – Ela viu-o franzir as sobrancelhas. Ela levantou a mão e esbofeteou o rosto da deusa, deixando uma leve corada em sua bochecha. – Ah, eu precisava fazer isso. – Graças aos deuses, Gaia não acordou.

Percy apenas jogou a cabeça para trás e riu. Ele levantou-se e ofereceu a mão para ela. Percy começou a andar, mas ela colocou a mão em seu peito, detendo-o.

– Estamos bem? – Ela indagou.

– Claro. – Ele sorriu e a beijou.

– Somos uma equipe, certo? – Ela inquiriu.

– Você quer que eu responda “para todo o sempre, querida”?

– Não, isso não seria tipicamente seu. – Ela debochou. – Apenas sorria.

Ele sorriu.

– Isso. – Ela piscou. – Você é o cara. Mantenha isso em mente! – Ela desceu as escadas, e ele a seguiu.

Eles começaram a caminhar para as fronteiras, lado a lado.

– Seguinte, eu não sei de nada. – Ela disse. – Podemos morrer daqui a pouco, mas pode levar tempo. Nico e Reyna estavam lá há algumas horas, e ainda não sucumbiram. Sabemos que morrerão disso, mas...

– Temos um monte de “mas”. – Ele torceu o nariz.

– Tem razão. – Ela concluiu. – Não vamos pensar nisso.

Percy e Annabeth voltaram para seus lugares remotos e se armaram, exatamente como estavam antes.

Eles sentiam-se esperançosos por dentro.

Até que o tempo descongelou, e o primeiro a se mexer foi Quíron.

Ele desabou nas patas dianteiras e caiu no gramado.


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