O Sangue do Olimpo escrita por Belona


Capítulo 30
Percy


Notas iniciais do capítulo

Menos de vinte e cinco dias para O Sangue do Olimpo. Vocês conseguem imaginar isso? Cara, parece que foi ontem que eu terminei A Casa de Hades e fiquei me lamentando por esperar mais um ano. '-'



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Eram duas horas da manhã quando Percy desceu do convés e estava caminhando para sua cabine. Tinha ficado de vigia por quatro horas, e grifos haviam atacado, junto com mais algumas pragas de monstros.

Ele andou pelo corredor escuro, escutando o barulho suave dos motores funcionando e o casco do navio partindo as nuvens.

– Ei, cara. – Percy se virou. Era Jason, que tinha aberto a porta de sua cabine e o chamava.

– Sim?

– Posso falar com você um minuto? – Perguntou Jason.

Percy assentiu e entrou na cabine dele. Não era muito diferente da sua – uma cama de solteiro num canto, um armário para roupas em outro. A exceção era que as paredes eram azul claro.

– O que você quer falar? – Percy instigou gentilmente e se encostou no batente da porta.

Jason comprimiu os lábios.

– Venho tendo uns sonhos... Não muito bons.

Percy esperou. Não era novidade.

– Hera vem me dizendo que sou um sacrifício de apaziguamento para Zeus.

– Hum... – Percy arregalou os olhos. – Hera.

– Você não gosta dela, não é mesmo? – Jason sorriu.

– Gosto dela o mesmo tanto que você. – Ele deu de ombros. – Se bem que o plano dela funcionou.

– Mas nós dois pagamos o preço.

– Todo mundo está pagando um preço. – Percy suspirou e esfregou os olhos. – Eu não daria muita bola, Jason.

Jason devia ter feito uma cara estranha, então Percy se desculpou.

– Ah, que idiotice. Claro que você vai dar bola, e principalmente porque você deve. – Ele cruzou os braços. – Olha... Desde que nascemos somos manipulados pelos deuses. Disseram as regras, disseram que iria ser perigoso... Mas faz uns dezesseis anos, não é mesmo?

Jason concordou.

– Os imortais são limitados por regras antigas. – Jason se assustou quando ouviu aquilo dele, porém lembrou que o amigo de Zeus era Quíron, e Quíron havia passado muito tempo com Percy. – Ela não pode matar você. Quer dizer, ela pode. Veja... Tudo é incerto. Estamos fazendo coisas impossíveis... Que estão se tornando possíveis. Se você não quer que aconteça, não deixe. Algumas coisas parecem que são destino, mas na verdade tudo depende de você.

Percy descruzou os braços.

– As profecias nem sempre se cumprem do jeito que imaginamos. – Percy sacudiu a cabeça. – Talvez você e Leo sejam tempestade e fogo, talvez não sejam. E aquele negócio do juramento... É muito estranho.

Jason riu baixinho.

– Obrigado.

– Não acho que eu tenha ajudado. – Percy disse. – Mas se não que algo aconteça com você, não deixe.

Percy iria abrir a porta, mas Jason chamou:

– Ei, Percy.

– Sim?

– Piper me disse umas coisas... E eu meio que reparei no jantar... Quando falaram de Ogígia.

– Ah. – Percy fechou a porta, sem expressão.

– Você foi para Ogígia, não foi? – Jason perguntou.

– Fui. – Percy olhou para o nada. Um silêncio se seguiu. Ele continuou. – Mas não acho que é só por isso que Annabeth está meio brava.

– Piper falou isso também. – Jason comentou. – Tem algo a ver com...

– ... Tártaro. – Percy sacudiu a cabeça. – Um dia... Naquele lugar, eu e Annabeth estávamos andando por uma floresta, e encontramos Maldições. São demônios... Quando se mata um deles, recebe-se uma maldição de alguém que você derrotou. Annabeth não estava armada, mas matou uma mesmo assim. Primeiro, ela ficou cega. Quando matou a segunda, ela ficou perdida. Os demônios me disseram que tinha sido Calipso quem amaldiçoara Annabeth, e Annabeth ficou cega, perdida, sozinha, em meio aos monstros, achando que eu a tinha abandonado.

Jason engoliu em seco.

– E você fez o quê?

– Eu... – Percy coçou o braço. – Não iria deixá-la morrer. Levantei a espada e matei quantas eu podia. Recebi dezenas de maldições... Uma pior que a outra...

– ... E? – Jason instigou.

Percy sorriu.

– Vamos, cara, é melhor dormir. Tenha sonhos bons. – Ele se despediu e saiu.

Percy entrou em sua cabine, tirou a camisa e as botas e se jogou na cama. Estava naquele estado entre o sono e a lucidez, e sentiu uma sensação boa, como se alguém o tivesse coberto. Achou que estava imaginando coisas, então adormeceu.

Naquela noite sonhou com o Tártaro, com a profecia e com Cronos. Ele não atormentava seus sonhos há muito tempo, mas há muito tempo Percy não sentia uma porção de coisas.

Uma mulher surgiu em sua mente, com um vestido verde-teca e cabelos marrons. Não era Gaia, definitivamente era mais dócil. E tinha algo maternal e meio louco nela. Percy já a tinha visto de algum lugar. A mulher sorriu e limpou as mãos, como se tivesse acabado de fazer um trabalho.

Pegue e prove, Percy.

*

Era de manhã quando Percy acordou. Estava deitado do mesmo jeito que ficara na noite anterior, sem baba.

Ele levantou, se vestiu e saiu para o corredor. A maioria das cabines estava fechada, mas quando estava indo para o refeitório, uma voz falou às suas costas.

– Dormindo bem?

– Na medida do possível, e você? – Ele não precisou se virar para saber que era Annabeth.

– Sinto falta de você.

– De dormir comigo? – Ele franziu as sobrancelhas. – Toda vez que dormimos juntos algo errado está acontecendo ou vai acontecer.

– Não acha que está na hora de mudar isso?

– Algumas coisas nunca mudam. E eu estou com medo. – Ele respondeu.

– De quê? - A voz dela tinha uma leve impregnação de consternação.

– De que alguém entre na minha cabine de novo enquanto eu estou dormindo. – Ele segurou a aba no boné dela e a empurrou para trás, tirando o chapéu da cabeça dela e tornando-a visível. Ele beijou seus lábios.

Annabeth sorriu.

– Queria testar.

– Bem, então me parece que uma mãe olimpiana está feliz. – Percy disse e um trovão ribombou em algum lugar. – Desculpe!

Annabeth riu.

– Pode ser.

– Eu tenho que ir numa missão. – Ele enfiou um pedaço de pão na boca.

– Com quem? – Annabeth indagou.

– Comigo. – Piper surgiu no refeitório.

– Uma mulher? – Percy sugeriu. Piper confirmou.

– Onde? – Frank também entrou.

– Onde estamos? – Piper perguntou para ninguém especial.

– Creta. – Percy respondeu.

– Creta? – Leo tirou a cabeça pra fora da porta. – A do Minotauro?

– Essa mesma. – Frank atirou um pedaço de manga na cara dele.

– É seguro? – Jason apareceu.

– Piper vai cuidar de Percy. – Annabeth o acalmou. – Vai ficar tudo bem.

Piper riu.

– O que temos que fazer?

– Eu não faço a menor ideia. Acho que vamos ter que andar por aí, achar e provar. Foi algo assim que ela me disse. – Percy bebeu um copo de água.

– Provar do tipo provação? – Annabeth divagou.

– Com essa sorte... – Percy deu de ombros.

– Então vocês vão ter que entrar no Labirinto e matar o Minotauro. – Leo estreitou as sobrancelhas.

– Se for isso, não será problema. – Percy assegurou. – Não é mesmo, Piper?

Piper assentiu.

– Acho melhor irmos, antes que seja tarde demais. – Ela falou. – Sempre tem prazos nesses negócios.

Os dois saíram pela rampa e começaram a andar pela ilha antiga.

Era tipicamente grega, com aquelas colunas esculpidas por todos os lados, templos brancos e construções de pedra. Água azul nos arredores, pessoas tagarelando, turistas e uma porção de fantasmas antigos que se afastavam quando eles passavam.

– Então... – Piper o observou. – Matar o Minotauro não vai ser problema?

– Acho que não. – Ele sorriu gentilmente enquanto pulava por cima de um relevo na calçada.

– Você já o matou?

– O Minotauro?

– É.

– Algumas vezes. – Ele inclinou a cabeça.

– Algumas vezes? – Ela se espantou.

– Duas. – Percy falou. Ele não era metido, era modesto, falava com naturalidade, respondendo apenas o que Piper perguntava.

– E se o encontrarmos? – Ela indagou, olhando ao longe uma construção cinzenta que continha uma placa.

– Se o encontrarmos, o matamos. – Ele deu de ombros. – Posso deixar pra você, se quiser.

– Você deixaria? – Ela riu secamente.

– Claro. – Ele foi sincero. – Acho que você conseguiria mais rapidamente do que eu.

Ela o encarou com ceticismo, mas ele não pareceu notar. Estava olhando para tudo, como se esperasse um ataque.

– O que está escrito naquela placa? – Ela murmurou.

– Não faço a mínima ideia. – Percy comprimiu os lábios. – Tenho dislexia.

– E é hiperativo? – Ela pressionou.

– E tenho déficit de atenção. Um semideus de carteirinha. – Ele sorriu de lado, como se aquilo divertisse.

– Roubar BMW está no topo da minha lista de forças sinistras. – Ela ironizou.

– É um bom poder. – Ele comentou. – Presumo que tenhamos que ir para lá, não?

– Aham. – Ele apontava para a construção. Na placa estava escrito “Labirinto” em grego. – Qual foi a coisa mais desesperada que você já fez para matar um monstro?

Piper tinha receio de estar sendo infantil demais, mas ela queria pensar em outras coisas e realmente saber a resposta que ele tinha.

– Passei por cima das górgonas com uma viatura da polícia. – Ele franziu a testa. – Deuses, isso é muito estranho. E você?

Piper riu.

– Conversei com um dragão de bronze. Ou, mais recentemente, casei com uns espíritos.

Eles adentraram na construção. Não tinha turistas, mas tinha faixas e coisas que organizavam entradas.

– Isso aqui não é o verdadeiro...

– Labirinto? – Percy completou. – Não. É só uma construção mesmo.

– Qual é a graça? – Ela pensou em voz alta.

– Talvez haja uma entrada para o Labirinto de verdade no final deste aqui. Hum, Piper?

– Sim?

– Não me leve a mal, mas eu acho melhor não ficarmos muito longe um do outro.

Ela assentiu e chegou mais perto dele. Piper amava Percy, só que era um amor puro, de amizade. Ela o achava muito gente boa, e tinha aquela aura de quem irradiava confiança.

Eles começaram a se enveredar pelos caminhos, trombando em paredes e meio que se perdendo.

– O que estamos procurando? – Ele perguntou. – Não vejo nada para provar aqui. Estamos andando a esmo.

Piper mordeu o lábio.

– Vou tentar uma coisa. Mas não me ache estranha se não der certo.

Ele assentiu soturnamente e enfiou as mãos nos bolsos.

– Labirinto. – A voz de Piper ecoou. – Mostre-nos o que precisamos ver.

O Labirinto respondeu imitando a voz dela contínuas vezes. Um vento frio rastejou pelo chão. No entanto, havia buracos nas paredes. Poderia vir de qualquer lugar.

Estavam quase desistindo quando algo no final do corredor mudou.

Percy destampou a caneta, empunhando sua espada.

– Monstro. – Ele divagou.

– Não, não é. – Piper estreitou os olhos. – Bosta, é sim.

Ela se jogou contra a parede quando um imenso leão saltou sobre seu peito. Percy recuou, e iria abatê-lo quando Piper disse:

– Não! Quieto. – Ela usou o charme na voz o máximo que pôde. – Não seja um menino mau.

O poder da voz dela era tão forte que Percy quase largou a espada.

O leão titubeou, então se sentou sobre as patas traseiras, interpondo-se entre ela e Percy.

– O que você estava fazendo aqui? – Hesitante, Piper acariciou sua juba. Ele ronronou.

– Ele estava guardando alguma coisa. – Percy olhou por cima da cabeça de Piper. – Tem alguma coisa ali. Bem atrás de você. Mas eu não daria as costas a um leão.

Piper engoliu em seco. Ele tinha razão. Aprendera que nunca se deve dar as costas a um felino.

No corredor estava Percy, o leão sentado olhando para Piper, e Piper estava encurralada entre o leão e algo atrás dela. O fim do corredor, muito provavelmente, e o que quer que tivessem que pegar.

– E agora? – Ela fitava os olhos dourados do leão.

– Acho que um de nós vai ter que ir lá. – Percy girou a espada na mão. – Pegar. Provavelmente, você.

Piper assentiu e deu um passinho para trás, ainda encarando o leão.

– Quieto... – Ela sussurrou.

– Mais pra direita. – Percy disse. – Não, agora mais pra esquerda.

Piper deu mais um passo para trás, e o leão tencionou as costas, como se fosse pular a qualquer momento.

– Ele vai pular. – Ela alertou.

– Você está com sua espada? – Percy interpelou.

– Na cintura. Mas se eu me mover, ele pula.

– Vai ter que arriscar. – Percy tinha os olhos brilhantes. – Pegue o que está atrás de você. Ele não vai te atacar. Eu não vou deixar.

Ele falou com tanta convicção que Piper acreditou.

Lentamente, levou a mão para trás e tateou o vazio. Então seus dedos encontraram algo maciço e opaco, sólido. Ela fechou a mão envolta daquilo e puxou.

O leão avançou um centímetro, mas Percy estava de olho nele.

– Percy. – Piper chamou. – Pegue e prove.

– O quê?

– Pegue e prove. Eu também vi aquela mulher. Era uma deusa, não era? Ela mandou provar. Eu vou jogar pra você.

Não era uma boa ideia. Os dois sabiam disso.

Piper segurou aquele cano com ambas as mãos atrás das costas e o partiu ao meio. Com o ruído, o leão se colocou de pé e pôs uma pata a frente da outra.

– Um... Dois... – Ela contou. – Agora!

Piper jogou o pedaço do cano para Percy.

O leão saltou.

Ela se abaixou e rolou no chão, passando por baixo do animal.

– Corra! – Ela gritou.

Ambos saíram em disparada pelos corredores, seguidos do bicho.

Ela pegou seu pedaço e o analisou na medida do possível. Era verde e riscado. Espere... Não era cano. Era cana.

Tinha uma coisa líquida gosmenta saindo do rasgo que Piper fizera. Sem pensar, ela colocou na boca e deu uma longa inspirada. O líquido era aquela coisa doce que sai da cana. Ela engoliu, correndo.

Percy fez o mesmo ao seu lado e parou.

– Vamos ter que matá-lo.

– Atrás de você. – Ela disse.

– O quê?

– Atrás de você. – Ela sorriu.

Percy se virou e viu o leão correndo em sua direção. Ele corria, mas não corria. Era como em câmera lenta.

– Você está vendo o que eu estou vendo? – Ele perguntou.

– Um leão desfilando? – Piper riu. – Ah, estou sim.

Levou dez segundos para o leão saltar sobre a cabeça deles. Seu corpo de trezentos quilos ondulou no ar e explodiu em várias flores vermelhas.

– Que diabos...? – Percy estava tão confuso quanto Piper.

A garota abaixou-se e apanhou uma flor.

– Papoula. Vermelha.

– Deméter. – Percy deduziu. – É a flor de Deméter. A mulher era a Deusa da Agricultura.

Eles se entreolharam.

– Cana-de-açúcar era o presente dela? – Piper estranhou.

– Cana que faz leões correrem devagar. – Percy sussurrou.

Eles voltaram para o corredor onde haviam estado há alguns instantes. No final tinha várias canas, plantadas na pedra, uma ao lado da outra. Com a faca de Piper cortaram todas e as amontoaram nos braços.

– Vocês conseguiram. – Uma voz disse e eles quase derrubaram as canas.

– Quem é você? – Percy perguntou.

Era uma ninfa, nos fins das contas. Tinha a pele verde, orelhas pontudas, cabelos brilhantes. Disse que não era do mal, e que tinha vindo a ordem de Deméter, que estava guardando o presente até que eles viessem.

– Tá. Então a gente faz caldo de cana? – Percy franziu a testa.

– Se quiserem. – A ninfa deu de ombros. – Vocês viram o que ela produziu. Ela não deixou o leão mais devagar, deixou vocês mais rápidos.

– Então essa cana é encantada? – Piper piscou. – Tipo, quando a gente suga ficamos com o poder de desacelerar as coisas?

A ninfa balançou a cabeça.

– A cana é como qualquer outra cana. Tem açúcar. E aquela substância inebriante. Quando vocês comem a cana ou chupam o caldo dela, os efeitos são maiores, porque Deméter as fez assim. O suco da cana libera um produto no cérebro de vocês, que os deixa mais alertas, mais espertos e quase invencíveis. Os seus sentidos ficam mais aguçados. E o mais importante de tudo: vocês não vão cansar no meio da batalha. Seus poderes não irão se esgotar, não haverá limite.

– Uau. – Percy ajeitou o maço embaixo do braço. – Um presente realmente legal.

– E útil. – Piper concordou.

– Os deuses disseram que iriam tentar ajudar. – A ninfa alertou. – Tentar. Eles estão tentando.

– Bem, nós agradecemos. Todos nós. – Piper disse.

Eles estava indo embora quando Percy parou.

– Só uma coisa. Isso aqui não é como ambrósia, né? – Ele indagou. – Tipo, não vou virar fumaça se tomar demais?

– Você já virou fumaça tomando néctar ou comendo ambrósia? – A ninfa rebateu.

– Hum, não.

Ela deu uma levantada nas sobrancelhas e desapareceu.

Percy olhou para Piper.

– Por que meninas são tão complicadas?

– Nós não somos complicadas. – Ela sorriu. – Os garotos é que não nos entendem.


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