O Sangue do Olimpo escrita por Belona


Capítulo 28
Jason




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Jason odiava ser velho.

Suas articulações doíam. Suas pernas tremiam.

Enquanto ele tentava subir o morro, seus pulmões chacoalhavam como uma caixa de pedras.

E ele ficava pensando no que Hazel dissera.

Reyna vai morrer. Nico também.

Apesar de tudo, e ele ainda tinha sentimentos. Pelo filho de Hades ele lamentava. Ele morreria como um herói. Um verdadeiro herói. Com um destino trágico, mas parecia que naquela coisa toda ter destinos trágicos era comum. E doloroso. Jason guardara o segredo – de que ele tinha tido uma queda por Percy Jackson. Jason achava que Percy merecia saber, mas para honrar Nico, ele não contaria. Além disso, até onde sabia, havia outras desavenças no namoro de Percy e Annabeth. Piper lhe contara suas suspeitas de que Percy caíra na ilha de Calipso, e Annabeth sabia disso.

Mas ele voltou. Jason protestara.

Piper sorrira. Eu sei que ele voltou, Jason, mas essas coisas só acontecem uma vez por era, só que surpreendentemente aconteceu de novo. Calipso recebeu visitas de heróis, visitas consideradas muito especiais. Eu não me assustaria de Annabeth brigasse com ela. Só que você sabe que Annabeth é madura. O jeito que ela ficou... Aconteceu mais alguma coisa.

Jason assentira. Piper era filha de Afrodite. Ele não contestaria com ela a respeito dessas coisas.

E tinha Reyna. Reyna morreria também.

Jason queria evitar. No entanto, ele sentia pena da pretora. Ela morreria como uma heroína, do mesmo jeito que Nico. Odiava sentir pena dela, porque sabia que ela não iria gostar. Reyna era toda durona por fora, mas ele sabia que dentro dela havia um turbilhão de emoções. Ele não achava que a traíra ou que fora mau... Bem, ele fora mau. Não lhe disse sim nem não, e ela pensou que poderia ficar com ele.

Até Jason retornar com Piper.

Jason sentiu ódio de si mesmo e pena. E sentiu ódio por sentir pena.

Preciso me concentrar. Depois eu vejo o que posso fazer para honrar a morte dela.

Como Júpiter dissera, Jason não podia resolver tudo. Então era bom começar com uma coisa de cada vez.

Ele não podia ver seu rosto, graças aos deuses, mas seus dedos estavam retorcidos e esqueléticos. Veias azuis abauladas formavam uma teia nas costas das suas mãos. E ainda por cima ele tinha aquele cheiro de homem velho – naftalina e sopa de galinha. Como aquilo era possível? Ele tinha ido de 16 a 75 anos em questão de segundos, mas o cheiro de velho veio instantaneamente.

Booom! Parabéns. Você fede!

– Quase lá. – Piper sorriu para ele. – Você está indo bem!

Para ela era fácil dizer. Piper e Annabeth estavam disfarçadas como adoráveis serviçais gregas. Mesmo usando todas brancas sem mangas e sandálias trançadas, elas não tiveram dificuldade em andar pelo caminho rochoso.

O cabelo cor de mogno de Piper estava trançado em uma espiral. Braceletes prateados adornavam seus braços. Ela parecia uma estátua antiga de sua mãe, Afrodite, o que Jason achava meio intimidante.

Namorar uma garota já era estressante o suficiente. Namorar uma garota cuja mãe era a deusa do amor... Bem, Jason estava sempre com medo de não fazer algo romântico e a mãe de Piper franzir o cenho no Monte Olimpo e transformá-lo em uma pira funerária.

Jason deu uma olhada para o topo da colina. O castelo ainda estava a umas cem milhas dali.

– Pior ideia de todas. – Ele se inclinou em um cedro e enxugou sua teta. – A mágica de Hazel é boa demais. Se eu tiver que lutar, serei inútil.

– Não vai chegar a esse ponto. – Annabeth prometeu. Ela parecia desconfortável em sua roupa de garçonete. Ela ficava arqueando os ombros para impedir o vestido de escorregar. Seu cabeço loiro preso tinha se desfeito atrás e balançava como longas pernas de aranhas. Sabendo o quanto ela odiava aranhas, Jason decidiu não mencionar aquilo.

– Nós nos infiltramos no palácio – ela disse -, conseguimos a informação que precisamos e saímos.

Piper abaixou sua ânfora, uma jarra de vinho de cerâmica onde a espada dela estava escondida.

– Nós podemos descansar por um segundo. Recupere o fôlego, Jason.

Do seu cinto pendia sua cornucópia – o chifre mágico da abundância. Enfiada em algum lugar nas dobras de seu vestido estava sua adaga, Katoptris. Piper não parecia perigosa, mas se surgisse uma necessidade, ela poderia duelar com lâminas de bronze celestial ou atirar mangas maduras na cara dos seus inimigos.

Annabeth jogou sua própria ânfora dos seus ombros. Ela também tinha uma espada escondida, mas mesmo sem armas, ela parecia letal. Seus olhos cinzentos tempestuosos escanearam ao redor, alerta para qualquer possível ameaça. Se alguém convidasse Annabeth para uma bebida, Jason imaginava que ela iria provavelmente chutar o cara na bifurcum (nota: em latim isso quer dizer “forquilha”, mas acho que dá pra imaginar o que quer dizer).

Ele tentou estabilizar sua respiração.

Atrás dele, a Baía Afales reluzia, a água tão azul que parecia ter sido tingida com corante alimentício. A algumas centenas de metros dali, o Argo II estava ancorado. Suas velas brancas não pareciam muito maiores do que cartões postais, e seus noventa remos pareciam palitos. Jason imaginou que seus amigos no convés estavam seguindo seu progresso, revezando-se em olhar através da luneta de Leo, tentando não rir enquanto observavam o vovô Jason mancar.

– Ítaca estúpida. – Ele murmurou.

Ele achou a ilha bonita o suficiente. A coluna de colinas arborizadas eram torcidas para baixo, como se estivessem sendo engolidas. Encostas brancas acabavam no mar. Havia recuos formando praias e portos onde havia casas de telhado vermelho e igrejas brancas.

As colinas eram sorteadas com flores de papoula, açafrão e cerejeiras selvagens. O ar cheirava a floresta. Tudo muito bonito – exceto a temperatura, que era de cerca de cento e cinco graus. O ar estava tão quente que chegava a lembrar uma sauna romana.

Teria sido fácil para Jason controlar os ventos e voar para o topo da colina, mas isso fora descartado. Por uma questão de discrição, ele teria que lutar brutalmente como um cara velho, esforçando-se para subir, fedendo sopa de frango e sentindo dor nos joelhos.

Ele pensou em sua última subida, quando Hazel e ele haviam enfrentado o bandido Círon sobre as falésias da Croácia. Pelo menos Jason estava com força total naquela ocasião. O que eles estavam prestes a encarar seria muito pior do que um bandido.

– Tem certeza de que é a colina certa? – Ele perguntou. – Parece muito... Tranquila...?

Piper estudou o cume. Trançado em seu cabelo havia uma pena de harpia azul brilhante – uma lembrança do ataque da última noite. A pena não era exatamente seu disfarce, mas Piper a tinha ganho, derrotando um rebanho inteiro de senhoras-demônio por si mesma quando ela estava de plantão. Ela minimizou a realização, mas Jason podia dizer que ela se sentia bem com isso. A pena foi um lembrete de que ela não era a mesma menina que ela tinha sido no último inverno, quando eles chegaram pela primeira vez no Acampamento Meio-Sangue.

– As ruínas estão lá em cima. – Ela prometeu. – Vi na lâmina de Katoptris. E você ouviu o que Hazel disse.

– “O maior encontro de espíritos malignos que eu já senti.” – Jason lembrou. – Que maravilha.

Depois da batalha no templo subterrâneo de Hades, a última coisa que Jason queria era lidar com espíritos malignos. Mas o destino da missão estava em jogo. A tripulação do navio havia escolhido errado... Eles seriam um fracasso. E por isso o mundo seria destruído.

A lâmina de Piper, os sentidos mágicos de Hazel e os instintos de Annabeth entraram em acordo: A resposta estaria ali, em Ítaca, no antigo palácio de Ulisses, onde mestres de espíritos malignos se reuniram para aguardar ordens de Gaia.

O truque era esgueirar-se entre eles, saber o que estava acontecendo e decidir o curso do resto da ação. Então sair. Vivos, de preferência.

Annabeth reajustou seu cinto de ouro na cintura.

– Espero que nossos disfarces funcionem. Os pretendentes eram clientes desagradáveis quando eles estavam vivos. Se eles descobrirem que somos semideuses...

– A magia de Hazel vai funcionar. – Piper disse.

Jason tentou acreditar naquilo.

Os pretendentes: uma centena dos mais gananciosos, mais malignos assassinos que já tinham existido. Quando Ulisses, o rei grego de Ítaca, desapareceu após a Guerra de Tróia onde uma porção de príncipes armados tinha invadido seu palácio e se recusaram a sair, cada um com a esperança de se casar com a Rainha Penélope e assumir o reino. Ulisses conseguiu voltar em segredo e matar todos eles. Mas se as visões de Piper estivessem certas, os pretendentes estavam agora de volta, assombrando o lugar onde morreram.

Jason não podia acreditar que ele estava prestes a visitar o palácio real de Ulisses – um dos mais famosos heróis gregos de todos os tempos. Então, novamente, toda a missão tem sido um evento alucinante após o outro. A própria Annabeth tinha acabado de voltar do abismo eterno do Tártaro. Jason decidiu então que talvez não devesse reclamar sobre ser um homem velho.

– Bem... – Ele firmou-se em sua bengala. – Se eu parecer tão velho como eu me sinto, meu disfarce deve estar perfeito. Vamos indo.

Enquanto subia, o suor escorria pelo seu pescoço. Apesar do calor, ele começou a tremer. E, por mais que tentasse, não conseguia parar de pensar em seus sonhos.

Desde a Casa de Hades, eles tinham sido mais vivos.

Às vezes Jason estava no templo subterrâneo de Épiro, com o gigante Clítio pairando sobre ele, falando em um coro de vozes sem corpo: “Todos vocês precisaram se reunir para me derrotar. O que irão fazer quando a Mãe Terra abrir os olhos?”

A Mãe Terra já tinha aberto os olhos. E o resultado não fora muito bom.

Outras vezes Jason encontrava-se na Colina Meio-Sangue. Gaia, a Mãe Terra se levantando do solo – uma figura de um turbilhão de poeira, folhas e pedras.

“Pobre criança”. Sua voz ressoou em toda a paisagem, balançando o chão sob os pés do garoto. “Seu pai é o primeiro entre os deuses, mas você sempre está em segundo lugar. Seja entre seus companheiros romanos, para os seus amigos, até mesmo para sua família. Como você vai ser bom o bastante para si mesmo?”

Seu pior sonho começou no pátio de Sonoma na Casa dos Lobos. Diante dele estava a deusa Juno, brilhando em todo o seu esplendor.

“Sua vida me pertence. Um apaziguamento de Zeus.”

Jason sabia que ele não deveria olhar, mas não poderia fechar os olhos quando Juno se tornou uma bomba nuclear, revelando sua forma divina verdadeira. A dor cauterizou a mente de Jason. Seu corpo queimou em camadas, como uma cebola.

Nico Di Angelo tinha avisado a eles: a Casa de Hades iria agitar suas piores lembranças, fazê-los ver as coisas e ouvir o passado. Os fantasmas deles se tornariam inquietos.

Jason esperava que os fantasmas ficassem longe, mas todas as noites os sonhos pioravam. Agora, ele estava subindo para as ruínas de um palácio, onde um exército de fantasmas havia se reunido.

Suas mãos não paravam de tremer. Cada passo era mais difícil do que o outro.

– Estamos quase lá. – Annabeth disse. – Vamos...

BOM!

A encosta retumbou. Em algum lugar sobre o cume, a multidão gritou em aprovação, como espectadores em um coliseu. O som fez os pelos de Jason arrepiarem. Não há muito tempo, ele lutara pela vida no Coliseu de Roma, diante de uma plateia de fantasmas aplaudindo. Ele não estava ansioso para repetir a experiência.

– O que foi essa explosão? – Ele perguntou.

– Não sei. – Disse Piper. – Mas parece que estão se divertindo. Vamos fazer alguns amigos mortos!


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