Subi correndo para o convés. A chuva era torrencial. Ondas batiam no casco e escorriam pela amurada, fazendo o navio oscilar terrivelmente. O mar estava revolto e escuro, de uma cor semelhante ao lamacento. Raios cruzavam as nuvens, e trovões ecoavam em um volume que eu nunca julgaria possível. Parecia que o céu estava se dividindo.

Em três passos já estava encharcada, mas não liguei. Passei os olhos pelo convés, procurando-a. A chuva dificultava minha visão, mas consegui ver uma jaqueta cinza ao longe.

Deslizei para lá, e encontrei-a.

– Annabeth! – Gritei, para que ela me ouvisse acima das trovoadas e do zumbido do vento. As velas pareciam que se desamarravam das cordas do mastro.

– Piper – Ela murmurou quando me viu.

Agarrei seus ombros.

– Annabeth! Você não pode fazer isso!

– Eu tenho que fazer, Piper!

Um raio iluminou o céu. Minha garganta começou a doer, e percebi que estava chorando.

– Não! Não faça isso comigo, Annabeth...

Ela segurou meu rosto entre as mãos enquanto ambas soluçávamos.

– Piper... Estou fazendo pelo bem de todos. Não tenho escolha! Se tiver amor à vida, deixe-me ir...

A água espirrava de nossos lábios enquanto falávamos. Minha cabeça doía.

– Isso não vai trazer Percy de volta, Annabeth! – Berrei em desespero.

Seus olhos expressavam a mais amarga das tristezas.

– Estou fazendo isso por ele também...

– Não! – Insisti. – Não! Não tenho culpa se ele morreu... Se os monstros o mat...

– Eu o matei, Piper. – Annabeth interrompeu. – Eu o matei.

Fiquei muda, e ela aproveitou a oportunidade. Aproximou-se e me deu um abraço. Ficamos assim, abraçadas, debaixo da chuva e chorando.

– Sinto muito, Piper, se vou ter que te deixar sozinha. Você é forte, garota. A filha de Afrodite mais forte que conheci. Silena estaria orgulhosa de ter você como irmã. – Ela murmurou em meu ouvido.

– Silena?

– Um dia, quando retornarmos ao acampamento, e vamos retornar, peça para te contarem a história dela. Mas agora não importa. Seja resistente. Não confie em ninguém, a não ser a tripulação deste navio.

Meu corpo tremia, mas o frio não me afetava. Uma dor surgia em meu peito, e eu soluçava cada vez mais alto.

– Não sou... não sou forte, Annabeth. Não sei se vou conseguir continuar.

– Ninguém sabe como continuar, Piper. Ninguém. Não estou te pedindo nada demais. Estou pedindo apenas que seja você mesma. Ou que encare tudo como um desafio menor do que ele é. Você é a única entre os sete que tem o poder de convencer os outros apenas sendo você. – Ela segurou minhas mãos e me encarou. – Cuide-se, Rainha da Beleza.

Annabeth sorriu tranquilamente, como se tivesse todo o tempo do mundo. Era um sorriso tão confiante que eu consegui parar de chorar. E era a última vez que eu fazia aquilo. Prometi a mim mesma que nunca mais derramaria uma lágrima sequer.

– Isso... – ela passou a mão em minha testa, tirando os cabelos dela. – Mantenha a calma. Eu farei isso também. – Perguntei-me o que ela se referia. Talvez ao choro. Talvez à calma.

Annabeth se inclinou e me deu um beijo na bochecha.

Observei-a se afastar lentamente e encarar o mar, alguns metros abaixo. Ela apoiou as mãos na amurada. Deslizou primeiro uma perna depois a outra. Por um momento, ela se segurou firmemente. Depois, ela já não estava mais ali. O barulho da tempestade era tão intenso que não ouvi nada. Grata por isso, voltei ao interior do navio, sem nunca olhar pra trás.