Quando Um Estranho Me Olha escrita por Jacqueline Sampaio


Capítulo 1
Capítulo único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/46344/chapter/1

 

Os caninos, lentamente, penetraram o pescoço alvo. A mão do agressor cobria seus lábios, impedindo-a de gritar. A jovem debatia-se em agonia pela dor sentida, dor provocada pelo veneno contido nos dentes do vampiro, espalhando-se como acido por suas veias. Edward, num ato de generosidade, quebrou-lhe o pescoço, matando-a. Ao terminar de secá-la, notou, atrás de si, uma criança que o observava. Esperou pelo grito, que não veio. A menininha sorriu.

Um sonho? Bella não saberia responder. Toda a noite, desde seus cinco anos, aproximadamente, sentia ter companhia no quarto. Às vezes despertava para constatar que estava sozinha, sua janela entreaberta, de novo. O que era tudo aquilo? Agora, com dezessete anos, não julgava a impressão de estar sendo observada uma bobagem infantil, como garantira os pais. Iria descobrir e não passaria daquela noite.

Edward caminhou casualmente pelas ruas escuras, a sede controlada. Mais uma noite em que se postava diante de Bella para observá-la dormir. Uma prática que desenvolveu há anos, desde que Bella o vira matando uma humana e, ao invés de gritar, sorriu. Não entendia o porquê daquele hábito, mas nunca parou para avaliar sua conduta. Tudo o que precisava saber era que observar a humana dormir era um hobby, nada mais. Com um grande salto alcançou o segundo andar da pequena casa. Forçou a vidraça para o lado, entreabrindo a janela o suficiente para entrar. Bella ressonada tranqüila, como sempre. A imobilidade não o incomodava, mas ainda sim o vampiro sentou-se na beirada da cama. A mão branca e fria hesitava, desejando tocar a pele alva e sentir a textura, mas sabia que um único toque despertaria uma reação em cadeira que resultaria na morte de Bella. Edward, inexplicavelmente, não queria isso. O telefone no interior da casa toca. Praguejou pelo barulho, pois significaria que, para não ser visto, deveria sair. Levantou-se.

-Temendo que eu o veja? –A voz disse. Estacou. Virou-se. Bella sentava na cama e agora acendia o abajur ao lado da mesma. O fitava não com assombro, mas com curiosidade.

-Então você é a figura que vem me visitar todas as noites? –Isabella perguntou retoricamente. Ainda não conseguia ver com exatidão o rosto do desconhecido, apenas se preocupava em reprimir o pavor que deveria sentir pelo estranho. Fez menção para que Edward se aproximasse e sentasse ao seu lado. Ele o fez sem hesitar. Quando o olhou mais atentamente, Isabella arfou. Ele era, sem dúvida, a criatura mais bela que já viu, como um anjo. O medo que deveria sentir se esvaiu. A tensão que Edward deveria sentir por ter sido descoberto não mais existia, não com aqueles belos orbes castanhos fitando-o com quase adoração. Algo, um sentimento quase palpável, estava na superfície: o fascínio de uma presa ante seu predador e um caçador desejoso pela presa. Sorriram cúmplices daquele momento tão certo, tão errado.

Edward manteve por alguns instantes seus olhos em Isabella. Os cabelos castanhos, de um tom avermelhado, apesar de estarem caóticos, ainda emolduravam com perfeição a beleza clássica da humana. A pele alva, quase tão alva como sua pele, exalava um perfume floral agradável. Sua garganta protestava pela sede causada, mesmo depois de ter se alimentado, mas era algo que Edward aprendeu a lidar como ninguém após anos observando-a. E ainda sim, mesmo tendo se acostumado com tudo o que vinha da garota, ele sentiu-se desnorteado enquanto era o alvo daqueles olhos castanhos, profundos, que pareciam perscrutá-lo.

-Parece que finalmente fui descoberto. –Murmurou o vampiro e seus olhos desviaram-se para o piso de linóleo branco, as costas encostadas no dossel da minúscula cama. Em momento algum os olhos de Bella desviaram-se do desconhecido. Ele emitia uma frieza corporal, constatou por estar bem próxima a ele, o perfume que exalava era maravilhoso, mas Bella não soube identificar que fragrância era aquela. Por fim desviou seus olhos para qualquer ponto de seu bagunçado quarto. O coração humano batia descompassadamente, a adrenalina do momento fazia isso com o corpo feminino. Estava ciente de que deveria estar apavorada, mas havia algo no estranho que lhe soava familiar.

-Vem aqui há algum tempo, não é? –A voz feminina não tinha potência, mas Edward ouviu sem problemas, embora os batimentos cardíacos de Isabella fossem mais altos que a voz.

-Se eu disser que sim você terá um ataque ou coisa parecida? –Perguntou com a voz levemente divertida, mas apenas isso, a voz. Os olhos rubros ainda no piso de madeira.

-Acho que não. Se fosse assim eu teria gritado assim que ouvi o barulho da janela.

-Então estava fingindo dormir? –Perguntou Edward com espanto. Ele deveria saber se Bella estivesse fingindo, seu corpo iria denunciá-la. Ele a fitou vendo um meio sorriso nos lábios cheios.

-Sim. De que outra maneira pegaria a pessoa que invade meu quarto e me assiste dormir? –O olhou e sorriu. Na penumbra do quarto não pôde olhar os olhos do individuo a centímetros de si, mas sabia que eram claros, quase brilhavam apesar da semi-escuridão do espaço. Tudo naquele ser a atraia, constatou, mesmo não o conhecendo. Como uma planta carnívora que em tudo atrai o inseto e, quando o mesmo cai em sua armadilha...

-Por que vêm aqui? –Disparou. Edward esperava que a moça fizesse tal questionamento, mas como poderia ele responder se nunca havia respondido a esse questionamento para si? Permaneceu calado, os olhos na face de Isabella. Algo lhe ocorreu e, com um meio sorriso de pura zombaria, respondeu:

-Eu não aprecio a programação de TV. Prefiro observá-la dormir, é mais interessante. –Seu sorriso se alargou ao ver a expressão chocada da jovem.

-Nossa, é a desculpa mais esfarrapada que já ouvi! Pensei que diria algo como “gosto de vê-la dormir e ter pensamentos obscenos com você”. Mas isso que disse é... Bom... Estranho. –Bella o fitou, estava claramente confusa. Edward sabia, ela iria questioná-lo até ter sua curiosidade saciada. Curiosa, sempre curiosa! Algo que ele admitira que o fascinava. Não foi a curiosidade de Isabella que o fez se aproximar dela? A curiosidade da pequena criança que escapuliu da vigilância da mão encontrando-o em um beco enquanto se alimentava?

-Acreditaria se eu dissesse que estou tão confuso por meus atos quanto você? –Falou com sinceridade. Claro, Bella não iria acreditar nele, mas era a única coisa que poderia dizer. Levantou-se, precisava ir. Bella o olhou, alarmada, enquanto Edward encaminhava-se para a janela.

-Espere! –Pediu erguendo-se de imediato. Por pouco não caiu na pressa de impedi-lo de partir. Felizmente Edward era rápido, mais rápido do que Bella sonhara. Pegou a jovem antes que caísse de cara no piso envolvendo-a com um braço. Bella apoiou-se, uma corrente elétrica percorreu seu corpo ao entrar em contato com Edward. Edward não foi imune a sensação que perpassou o corpo de Isabella. Ainda assim não se afastaram um do outro. Edward a estabilizou e, quando Bella manteve-se de pé, afastou-se.

-Preciso ir. –Disse com os olhos fixos em Isabella. Era uma humana estranha. Deveria gritar, deveria expulsa-lo de seu quarto e, no entanto, lá estava ela com os olhos ansiosos parecendo tristonha por Edward ter decidido ir. Não conseguiu, porém, locomover-se e simplesmente sair.

Hesitante, Bella ergueu a mão e tocou a fronte masculina. Surpreendeu-se com a frieza e textura da pele, como granito (liso e frio). Edward enrijeceu, não esperava o ato da humana assim como não esperava que seu ato fizesse a garganta arder de forma nauseante. Precisava sair dali, precisava já. Como sair? Como sair quando mãos tão macias, perfumadas e quentes, afagavam sua bochecha com meiguice?

-Você é real? É um anjo ou coisa parecida? –Bella perguntou enquanto sua cabeça tombava de lado. Edward tinha agora um sorriso soturno nos lábios. Anjo? Ele? Que conclusão a se tirar! Mas como Bella não via seus olhos rubros era possível chegar à outra conclusão.

-Se eu disser que sim, teria permissão para retornar? –Perguntou. Isabella afastou a mão colocando-a no queixo.

-Hmmm... Acho que sim. Não me fez nenhum mal em todos esses anos. Acho que não tenho motivos para me preocupar, tenho? –Ao voltar seus olhos para onde Edward estava anteriormente, nada encontrou. Arfante, sentou-se em sua cama. Como era possível simplesmente desaparecer? Seria ele um anjo como dissera? Um fantasma? Ou...

Edward alimentou-se mais do que o necessário. Cinco vidas humanas perdidas para conter a sede que, com um esforço hercúleo, segurou perante a presença de Bella. Mesmo que o fato de Bella tê-lo encontrado pudesse ter revelado algo de sua natureza –o que era um crime perante a realeza vampiresca –não conseguiu sentir nada a não ser ânsia, ânsia por vê-la novamente, ânsia pelos olhos castanhos fixos em sua pessoa, ânsia para ouvir sua voz. Havia outra ânsia que Edward tinha e era inegável pensar enquanto limpava-se dos resquícios de sangue de suas vitimas.

...

            -Bella, está me ouvindo? –A voz soou longe. Foi difícil para Bella sair do torpor e dar atenção a Mike, seu amigo, enquanto o mesmo tentava manter uma conversa com sua pessoa. Estavam na área livre da escola, sentados em banco de piquenique; hora do intervalo.

-Perdão Mike. Estou distraída. O que dizia? –Tentou concentrar-se.

-Estou convidando você para irmos ao cinema esta noite. O que acha? Eu ouvi você conversar com Angela que queria ver um filme de comédia romântica então eu pensei...

Bella suspirou. Há meses o amigo tentava ultrapassar os limites estabelecidos por ela. Tentava dissuadi-lo com muita delicadeza que só estava interessada em amizade, mas Mike era persistente, infelizmente. E se antes Bella não tinha muita paciência para a persistência de Mike, imagine agora que estava chateada pelo desaparecimento do seu anjo? Há dias não o via. Tentava esperá-lo, mas acabava adormecendo um pouco antes do Sol nascer. A privação de sono deixava Isabella mais mal humorada. Mike realmente escolher um péssimo momento para insistência. No entanto...

-Tudo bem. Podemos ir ao cinema hoje. –Disse Isabella, os olhos passeavam pelo jardim ao lado da escola.

-Sério? Que bom! Eu faço questão de pagar nossas entradas e...

-Vou convidar Angela e Ben também. –Viu o rosto de Mike se retrair ante suas palavras. Após alguns instantes vou o rosto de Mike se recuperar, sorrindo alegremente. Claro, pensando que iriam num encontro duplo de casais. Suspirou novamente.

...

Uma obsessão. Era isso o que observar Bella tinha se tornado. Não mais a via apenas ao anoitecer, não bastava. Ele a acompanhava a todo instante, geralmente escondido em algum local escuro, mas próximo o suficiente para vê-la, ou no interior de seu reluzente Volvo prateado. Edward a seguia até a escola, quando esta decidia ir para algum lugar após suas aulas – supermercados, shoppings, lojas – e ainda sim não era o bastante. E coisas que antes não o incomodavam, como a proximidade de outros humanos para com Bella, o enervava de forma homicida. Como agora.

Lá estava Bella conversando com um humano de nome Mike Newton. Isabella parecia distraída, isso parecia enervar Mike. Ouvia com atenção a conversa enquanto se esforçava para não cruzar o pequeno espaço do bosque, onde estava escondido.

            -Bella, está me ouvindo? –Mike exigiu aborrecido pela desatenção de Bella. O modo rude como soou sua voz fez Edward grunhir, as mãos enterradas no caule grosso de um abeto. Bella pareceu despertar da letargia em que estava, fixando seus olhos em Mike, algo que incomodou Edward.

-Perdão Mike. Estou distraída. O que dizia? –Perguntou.

-Estou convidando você para irmos ao cinema esta noite. O que acha? Eu ouvi você conversar com Angela que queria ver um filme de comédia romântica então eu pensei que poderíamos vê-lo. –O que? O humano ousava convidá-la para algo? Edward sentiu a visão nublar em um tom vermelho. Queria dilacerar a garganta do humano! Esperou. O que Bella faria? Ele a ouviu suspirar. Teve esperanças de que Bella o recusasse e aquele suspiro fosse o prelúdio para a rejeição.

 -Tudo bem. Podemos ir ao cinema hoje. –Disse. Foi à deixa. Edward, para não fazer nenhuma bobagem tamanha a ira que sentia, afastou-se. Planejar. O que iria fazer agora que sentia sua menina ser tirada de seus dedos? Ele não sabia ao certo, mas agiria, claro que agiria!

...

            Cabelos penteados, dentes escovados, roupas limpas e passadas. Pegou a velha bolsa jeans e colocou seus documentos e dinheiro. Iria ao cinema com Mike, Ben e Angela. Não estava com muita vontade de sair, mas se sentiu compelida a isso; não por Mike ou seus demais amigos, mas por si mesma. Era insano desejar ver alguém que não passara de um vislumbre, uma alucinação, quem sabe. Ainda sim ela contava que, mais dia ou menos dia, pudesse vê-lo novamente.

-Bella, querida, seu amigo Mike está aqui. –Renée, mãe de Bella, anunciou no andar de baixo. Bella apressou-se em descer. Mike estava encostado em seu subburban, um sorriso nos lábios.

-Espero não ter demorado.

-Não Mike, claro que não! Diga-me: onde está o Ben e a Angela?

-Não conseguiu falar com Angela? Ben não está se sentindo bem. Parece que seremos apenas você e eu. –E havia um tom satisfeito na voz do rapaz. Bella reprimiu a vontade de suspirar e se lastimar. –A não ser que você não queira ir comigo a sós. –A voz de Mike soou tristonha, de partir o coração. Bella tinha um grande defeito que muitos considerariam qualidade: ela tinha o coração mole.

-Não Mike. Você já está aqui então vamos sem Angela e Ben.

-Claro! –Mike abriu a porta de seu carro e Isabella entrou. Pôde ver a silhueta da mãe observando-os pela janela. Sabia que não seria agradável este passeio, Mike parecia disposto a tentar até Bella ceder. Esperou que um milagre acontecesse e o seu anjo intercedesse por ela. Sorriu com o pensamento.

A espreita, a sombra observava a todo o acontecido em frente à casa de Isabella Swan. Não demorou a adentrar seu veiculo e seguir sorrateiramente o casal que dirigia tranqüilo pela avenida. Idéias homicidas nublavam sua mente, a racionalidade se esvaindo. Apertou compulsivamente o volante. O que estava acontecendo com ele? O que era aquele sentimento de posse que ameaçava expor sua natureza a Isabella? Seria por que ele a considerava uma futura presa e não desejava que ninguém mais sorvesse o sangue da jovem? Mas se era isso, por que se preocupar com o humano genérico de nome Mike Newton? Edward queria nomear aquele sentimento, mas tinha maiores preocupações do que refletir sobre sua conduta ou nos sentimentos por detrás de suas ações. Não demorou a chegar ao local escolhido pelo casal (a simples menção do que Isabella e Mike eram o deixava nauseado): o cinema da pequena cidadezinha de Forks. Felizmente não havia preocupação quanto à exposição aquela tarde, Forks era quase todos os dias do ano nublados. Pôde sair sem problemas e entrar no cinema, comprando, claro, o ingresso para o mesmo filme que os humanos alvos de sua obsessão.

...

            -Bella, quer pipoca? –Mike perguntou a jovem ao seu lado.

-Ah, sim. –Os olhos castanhos fixos na tela. Mike levantou-se, aparentemente amuado pela atenção de Bella estar apenas do filme. Verdade seja dita o filme não era o que Bella pensara, parecia mais uma sit.com estúpida dessas que ela evitava assistir. O pior era as tentativas de Mike em estreitar a intimidade que possuíam, por duas vezes tentou segurar a mão de Bella e em quatro tentou colocar seu braço nas costas da jovem. Isso a estava enervando. Pensou em usar a saída de Mike como escapatória para deixar o cinema, mas não iria magoar os sentimentos do amigo, por mais que isso lhe custasse.

...

            Como todo jovem inseguro, Mike escorregou para o banheiro a fim de colocar as idéias em ordem. Não estava tendo nenhum progresso com Isabella, mas isso não iria impedi-lo de tentar mais e mais. Tinha esperanças de que Bella iria ceder, bastava mais algumas horas e seus velhos xavecos para tanto. Entrou em um Box do banheiro para urinar, não gostava de ter espectadores vendo-o fazer algo tão intimo. Após terminar, abrir a porta do Box. Não viu mais nada. Alguém empurrou bruscamente a porta em sua direção, batendo a mesma fortemente em sua cabeça. Desmaiou.

...

            “Onde Mike está?” –Pensou Isabella. O rapaz demorava e, por mais que fosse agradável assistir o filme sem sua companhia, temia que algo tivesse acontecido. Pensou em se levantar e procurá-lo, mas se saísse poderia perder os lugares. Tentou se aquiescer inclinando-se um pouco no banco e fechando os olhos. Sentiu o acento ao seu lado afundar. Um balde de pipoca foi passado para suas mãos.

-Obrigada Mike. –Falou ainda com os olhos fechados. –Hei, por que você...? –Estacou ao abrir os olhos e voltar-se para o seu lado. Como atendendo suas preces lá estava o seu anjo, vestido com esmero, óculos no rosto cobrindo seus olhos. Encantador. Edward sorria. A expressão de Bella espantada era cômica para Edward, não tão cômica quando viu Mike desmaiado após goleá-lo com a porta do banheiro, mas ainda sim provocava riso.

-Como foi que você...?

-Eu sou o seu anjo, lembra-se? É natural estar onde você estiver. –Deu um meio sorriso. E gostava dessa alcunha, a alcunha de protetor da humana. Ela não sabia que por vezes teve de interceder para que Bella pudesse respirar uma vez mais. Bella, pasma pela situação, voltou sua atenção para o filme. Edward, por sua vez, lembrou com angustia das vezes em que teve de agir como anjo.

A jovem caminhava naquela tarde de inverno completamente absorva de tudo ao seu redor, provavelmente deixando complicações diárias toldarem sua mente. Não sabia que mais de um par de olhos rubros a fitavam na escuridão, um deles, no entanto não tinham os mesmos objetivos sombrios dos demais. Bella, a fim de chegar mais rapidamente até a sua casa, fez o que nenhum humano em sã consciência deveria fazer: pegou um atalho por um beco escuro. Edward cerrou os dentes. Por que os humanos sempre faziam o que não devia? Ele já deveria imaginar, pelo encontro que tivera com Isabella quando esta era criança, que ela sempre seguiria o caminho mais perigoso.

-Como cheira bem! Eu vou querer o pescoço! –Sussurrou a voz sedenta do vampiro a alguns metros de onde estava. Cutucou seu companheiro, os olhos desvairados de sede em Bella.

-E eu ficarei com o que? –Reclamou o outro vampiro amuado.

-Pode ficar com o que sobrar, fui eu que a farejei. –Disse o primeiro vampiro. Os dois se posicionaram para saltar sobre Bella, ambos em cima de um velho telhado. Seria rápido e Bella certamente não iria sobreviver. Edward saltou para mais perto dos dois vampiros. Estes o fitaram, surpresos, não o haviam detectado. Edward procurou ser rápido e silencioso. Em pouco tempo os dois vampiros, recém-nascidos provavelmente, estavam em pedaços. Suas carcaças em uma caçamba, queimando.

-Que chateação. Como se eu fosse permitir que imundos tocassem no que é meu. –Sorriu perante o local onde sepultou os vampiros que ousaram cobiçar Bella.

Sem pensar o que seu ato poderia acarretar, Edward pegou a mão de Bella segurando-a no descanso de braço entre os dois acentos. Bella o olhou, mas em momento algum recusou aquele contato, era o que queria afinal. A pele do desconhecido era tão fria, algo a ser pensado. Ele não devia ser humano. Mas se não era humano, então o que ele era? E o que Bella deveria fazer quando descobrisse? Apertou ainda mais a mão do gentil estranho enquanto a testa vincava de preocupação.

-O que há? –Perguntou Edward, os olhos, ainda que cobertos pelos óculos, fixados em Bella. Bella tão logo o fitou, desviou o olhar.

-Nada. Hmmm... Meu anjo tem um nome? –Bella sussurrou, e seus olhos fitavam o chão encarpetado. O filme, que antes parecia prender sua atenção, completamente ignorado.

-Edward. –Disse o vampiro. Viu Bella lançar um olhar confuso para ele.

-Não deveria se chamar Gabriel, ou Miguel, ou Natanael...?

-Não, creio que não seja obrigatório eu possuir um nome de algum anjo citado na bíblia. Não prefere este nome? Edward? –Sorria. Sentia-se estranho, bem, quando estava com Bella. Quase... Humano.

-Não. Eu prefiro o seu nome. É bonito. –Disse e não conseguiu desviar os olhos daquela feição absurdamente linda. Definitivamente Edward não era humano, Bella sabia, sentia.

-Poderia me dizer o seu nome agora?

-O que? Passou todo esse tempo me espionando e não descobriu? –Brincou. Edward acompanhou com doçura a brincadeira.

-De fato eu sei seu nome, mas já que estamos nos apresentando formalmente então seria indelicadeza me referir ao seu nome de imediato. –Edward falou. Sua voz, seu hálito, tudo convidava Bella para algo que nem mesmo ela saberia dizer.

-Isabella Marie, mas gosto que me chamem apenas por Bella.

-Bella... Um lindo nome. Totalmente de acordo com você. –Sorriu deliciado por vê-la enrubescer com suas palavras. A queimação na garganta estava a cada dia mais fácil de ser ignorada. Ouviu barulhos vindos de um determinado ponto da sala de cinema e rosnou. Ao que tudo indicava, ele não havia batido com muita força.

-Preciso ir. –Disse subitamente, levantando-se. Com muito custo largou a mão de Bella. A jovem ficou desnorteada sem entender o porquê de precisar sair tão rápido.

-Espere! –Pediu, mas com destreza Edward se esquivou e desapareceu na semi-escuridão do lugar. Logo Bella avistou Mike caminhando até onde ela estava, segurava papel toalha na testa. Sentou-se cambaleante.

-Mike! Meu Deus! O que houve? –perguntou ao notar o sangramento no local onde ele pressionava o papel toalha.  

-Um cara não viu que o Box do banheiro onde eu estava já tinha gente e empurrou a porta no momento em que ia sair. Fiquei um tempinho desacordado.

-Sério? Que coisa! Você viu quem fez isso com você?

-Não. Não vi.

-Melhor irmos ao hospital.

-Não precisa Bella. Eu to melhor. –Claro que a atitude despreocupada de Mike não a enganaria. Utilizando de seu poder incomum de persuasão, Isabella conseguiu levar Mike ao Pronto Socorro.

...

            Teria realmente Edward envolvimento no incidente de Mike? Bella não sabia. No entanto era fácil supor tal coisa afinal Edward aparecera e desaparecera antes de Mike retornar. Claro que tinha sido bom seu encontro com Edward, mas agora parara para pensar no que era tudo aquilo. Talvez Bella não tivesse percebido que deveria levar aquele assunto a sério e temer toda aquela loucura. Mike se ferira, precisou de pontos da testa. E se tivesse sido Edward a fazer isso? Se nada o impediu de ferir deliberadamente Mike, o que o impediria de feri-la? Estremeceu. Ainda sim, sua mão parecia fria, fria pelo contato com a mão de Edward. Sentia-se extraordinária pela frieza, pela lembrança, por ele.

            “Definitivamente estou louca.” –Pensou enquanto deitava-se melhor em sua cama.

...

A sensação do toque da mão humana fora sublime. Edward queria muito mais do que um simples toque. Privou-se disso por anos, não mais aceitaria o nada. Enquanto seguia para a casa de Bella, pensou nos acontecimentos daquela noite. O surto de ira que sentiu, ameaçando sua exposição, pela proximidade de Bella e Mike foi uma surpresa. Edward sabia exatamente o que era, mas ainda recusava-se a acreditar que nutria qualquer afeição por Bella. Não era algo saudável, nutrir sentimentos para com um ser tão efêmero. Mas tinha de admitir que talvez a solidão estivesse a cada dia mais insuportável. Por décadas conseguiu viver sozinho, sem nem ao menos querer a companhia de seu criador. Agora, após quase um século como um vampiro, carecia de companhia. Por que não ela? Por que não a humana que viu a ele sabendo de suas ações estranhas, mas não parecia temê-lo por isso? Avistou a janela conhecida. Era tarde, Bella devia estar dormindo. Alcançou a janela e adentrou o quarto. De imediato sentou na cama. Mesmo com a semi-escuridão do local, podia ver com nitidez a tudo. Estacou ao perceber que os olhos de Isabella estavam abertos. Bella moveu lentamente a mão ligando o abajur ao lado da cama. Sentou-se. Diferente da outras vezes em que a viu, Bella tinha um olhar cauteloso.

-Imaginei que viria hoje.

-Faço mal em estar aqui? –Perguntou confuso pela atitude quase rude de Bella.

-Machucou o Mike, não foi?

-Mike?

-O rapaz que estava comigo no cinema. Alguém o atacou no banheiro masculino, ele teve que levar pontos em seu ferimento. –Bella dizia, a voz transtornada como que se culpando pelo ocorrido. Edward manteve o semblante plácido.

-E por que acha que tenho algum envolvimento com esse incidente? –Perguntou mostrando-se calmo, mas por dentro estava temeroso. Aquele não era o comportamento habitual de Bella. Ela quase parecia assustada com sua presença, quase.

-Uma grande coincidência você aparecer e desaparecer enquanto Mike sangrava no banheiro, desacordado. –A desconfiança nos olhos castanhos. Edward não gostava disso, não gostava daquele olhar, daquelas insinuações, por mais verdadeiras que fossem. Contar a verdade ou mentir? Sempre fora um bom mentiroso, precisava ser. Seria fácil convencê-la a acreditar na mentira, pelo menos era o que Edward pensava. Ainda sim...

-De que outra forma eu conseguiria minha felicidade emprestada? Eu não poderia simplesmente reivindicar sua atenção com aquele humano patético no caminho.

Bella arfou ante as palavras de Edward. A confirmação de que fora ele a machucar Mike, mostrando frieza, deixou Bella chocada. Edward ainda estava ali, em pé próximo a ela, mostrando total despreocupação. Ele não era um anjo, pensou. Edward era algo inumano, algo mal, algo como um demônio.

-Saia daqui. –Murmurou trêmula. –Não quero mais vê-lo, te-lo por perto. Anjos não machucam pessoas. Você não é um anjo. Não sei que diabos você é, mas não é o ser bom que pensei. –Bella não olhou para Edward. Edward não tirou os olhos de Bella. As palavras o açoitaram como nenhuma outra palavra proferida a ele o fez. Bella nunca saberia disto, ele ainda mantinha a máscara de tranqüilidade no rosto. Um meio sorriso nos lábios que deixou Bella perplexa. Como Edward ousava sorrir? Não entendia a gravidade do que fizera, não entendia a palavra “indesejado”? Mesmo que, no fundo, Bella ainda desejasse sua permanência. Algo errado, muito errado.

-Bem... Acho que aqui acaba minha responsabilidade como seu anjo, mas também eu não desejava estender isso por muito mais tempo. Apenas o tempo para esperá-la crescer e poder sentir em seu sangue um sabor muito melhor do que quando tinha apenas cinco anos. –As palavras de Edward fizeram Bella enrijecer. Com horror, testemunhou algo inacreditável. Edward se desfazia dos óculos que cobriam seus olhos revelando os orbes rubros que tinha. O sorriso sádico revelava os dentes brancos como uma fera. Algo lhe dizia que aquilo não era bom.

Era o fim. Edward sempre soube que faria isso mais cedo ou mais tarde. Se for o afastamento que Bella quer, ele lhe daria, mas também não deixaria que aquela por quem velou por anos tivesse o sangue desperdiçado. Ele daria o fim a tudo, saberia qual o gosto do liquido rubro que corria pelo corpo delgado e perfumado. Esse privilégio seria apenas dele, de ninguém mais. Caminhou lentamente vendo a figura paralisada. Sorriu em nenhum vestígio de humor. Ele sempre soube que Bella reagiria dessa forma quando conhecesse sua verdadeira natureza. O que o fez pensar que ela o aceitaria, que, caso ele oferecesse a eternidade pedindo a ela para ser sua companheira, Bella ficaria ao seu lado? Os seus pensamentos tinham um gosto acre na boca sedenta. Ele se sentou na cama, as narinas infladas. Seria rápido, seria letal, Bella nem teria tempo de sentir dor ou gritar, devia isso a ela. Lá estava a humana, congelada, os olhos muito abertos fixos em Edward. Edward aproximou-se até seu rosto estar a centímetros de Bella. O bote seria certeiro em sua jugular. Quase podia sentir o gosto em sua língua, a boca seca pela sede e cheia de veneno.

-Você vai me beijar? –Ela sussurrou com os olhos fixos nos olhos rubros. E então toda a insanidade e fúria que levariam Edward a cometer mais um assassinato se desfizeram. A faceta da criatura se desfez dando lugar apenas ao vampiro com sentimentos estranhamente humanos. Fechou os lábios e ignorou a sede que sentia. Com os olhos com alguma comoção, Edward disse:

-Sim. Eu vou beijá-la. –E sem mais delongas encostou seus lábios frios aos lábios quentes de Bella. Bella, atordoada pelo ato, apenas se deixou levar. Fechou os olhos e aproveitou aquele momento que tinha um gosto de despedida. Os lábios de Edward eram macios, frios, um gosto indescritível. Era seu primeiro beijo. Nunca antes se permitiu tal contato, mas não pôde negar isso a Edward, ele era seu anjo afinal. Ao abrir os olhos, ele se fora.

...

            Uma droga. Por que não foi suficiente beijá-la, tocá-la. Ele quis matá-la, secá-la e deixar o corpo para que a mãe o encontrasse, mas ao ouvir a voz cálida e o que pensou que iria acontecer naquela noite, Edward esmaeceu. Ele a beijou sem saber o porquê, mas sabendo que as conseqüências do ato seriam danosas. Não se enganou. Mesmo após dias em que não mais estava diante de Bella, o gosto dos lábios femininos permanecia em seus lábios. Ele sabia que tinha trilhado um caminho perigoso para um imortal, apegar-se a um mortal era algo nocivo. Por dias tentou afastar-se, conseguiu tal façanha por quase dois meses. Façanha esta que estava fadada ao fracasso. Ele sempre soube.

            -Acho que voltarei à incumbência de anjo. –Murmurou para si. Desencostou-se da grande janela de sua cobertura, pegou seu casaco, saiu.

...

            Era patético. Por que estava chorando afinal? Por causa de uma ilusão pavorosa que se fora? Enxugou as lágrimas com as costas de suas mãos. Bella tentou, sem sucesso, por varias noites, falar com Edward. Desculpar-se. Apesar do que ele tinha feito com Mike há um mês, não deveria ter sido tão rude quando Edward nunca a prejudicou. Estava feito. Seu anjo nunca mais voltaria. Tal pensamento foi o suficiente para desabar a cabeça no travesseiro e chorar incontáveis lágrimas. Já estava acostumada a isto. Uma coisa que começou a fazer desde a despedida em que seus lábios virginais encontraram os lábios do anjo de pele fria e olhos rubros. O cansaço logo a atingiu a entregou-se satisfeita à inconsciência. A melhor forma de escapar da dor da perda, perda de algo que nunca foi verdadeiramente seu.

As coisas mudam afinal a criatura racional é inconstante, não importa de que natureza ela venha. Enquanto Bella, adormecida, acreditava ter perdido para sempre seu anjo, Edward estava sentado em sua cama, ele a assistia dormir. Ergueu a mão, hesitante, tocando uma mecha do cabelo, acariciando-a entre os dedos. Ah, como era prazeroso aquele ato! Como sentiu falta disso! Inclinou-se tomando cuidado para não acordar Bella. Cheirou seu cabelo e ali depositou um beijo.

            -Edward...

            Estacou. Rapidamente afastou-se, mas Bella não o havia pegado ali, estava adormecida. Tinha o rosto agoniado, moveu-se furtivamente na cama.

            -Edward... –Murmurou novamente. Edward aproximou-se e voltou a sentar na cama. Bella estava sonhando com ele, disso ele não tinha dúvidas. –Me perdoa. –Voltou a murmurar.

Deliciado com as palavras de Isabella, Edward sorriu. Ela pedindo perdão? Não era ele que tinha agido de forma indesculpável?

            -Não me deixe... Edward... –O rosto da jovem contorcido em agonia enquanto pediu por sua permanecia ali. Sentiu algo o atingir com o poder de um soco. Todos os sentimentos que nutria há algum tempo pela humana, que tentou reprimir, veio a toda, duplicado, triplicado. Aproximou seus lábios da orelha de Isabella e sussurrou tão baixo como o barulho do vento que adentrava o cômodo pela fresta da janela.

            -Eu não vou deixá-la. Eu sou seu anjo, lembra-se? Anjos não abandonam seus protegidos, nunca. –E ao afastar-se viu que Bella estava com os olhos bem abertos, quase lacrimejantes, fitando-o. Novamente o grito que deveria vir não veio, nem o pavor mudo de alguém que acorda e se depara com um estranho a centímetros de si.

-Edward? –Perguntou como quem quer uma confirmação. Edward sorriu. O corpo ainda inclinado para Bella; podia sentir o hálito quente humano chocando-se contra sua face.

-Quem mais seria? –Sussurrou. Ouviu o arfar entrecortado de Bella e os olhos castanhos derramarem as primeiras lágrimas. O que era aquilo? Chorava de medo?

Bella ergueu a mão e colocou na fronte masculina. Suspirou ao sentir a textura, ele era real e não uma ilusão. Os dedos frios de Edward tocaram a umidade abaixo dos olhos secando-as.

-Me perdoe. –Disse com a voz trôpega, mas tinha de falar. –Eu não deveria tratar como um monstro o meu anjo.

-E eu não deveria ter tratado minha protegida como uma de minhas vitimas.

-Promete ficar? Cuidar de mim sempre? –Pediu apavorada com a idéia de não ver mais o belo semblante diante de si. Bella não queria isso.

-Você morrerá um dia. Não posso prometer estar sempre ao seu lado. Chegará uma hora em que iremos nos afastar e você irá para um lugar onde não posso segui-la. –E a dor o atingiu, mais uma coisa humana. Tão certo quanto suas afirmações, Edward já sabia que havia se condenado quando passou a amar Isabella.

-Se você não pode me seguir para esse lugar então... Então me deixe seguir você. –E com aquele simples pedido, sem saber, Isabella condenou-se. Edward sorriu largamente.

-Ah, um erro o que está fazendo. Quando quero um único motivo, você diz isso de forma suplicante. –Falou tão baixo que talvez nem fosse sua intenção que Bella o escutasse. –Entenda que, para me seguir, teria de passar pelo inferno antes. A dor de ser atingido pelo fogo, lambido e salivado pelo demônio... –Viu os olhos de Bella se esbugalharem.

-Tenho mesmo que seguir os caminhos que anjos como você não seguem?

-Caso não tenha notado, Bella, eu não sou um anjo. Estou longe de ser, mas... –Acariciou a face humana que enrubesceu abaixo de seus dedos. –Isso não quer dizer que eu não possa levá-la ao paraíso. –E a beijou como quem beija a face de uma santa, adorando-a. Algo tão celestial que quase poderia sentir o corpo pecaminoso que possuía ser purificado, por que era isso o que o beijo de Bella fazia com Edward. E para Bella, sentir os lábios marmóreos sobre os seus, era o que Edward descrevera: chegar ao paraíso pelas mãos daquela criatura que era celestial e infernal ao mesmo tempo. O beijo foi aprofundado graças a Edward e sua ânsia e sentir Bella como um todo. As mãos frias tateavam o corpo quente enquanto os lábios a compeliam a aprofundar o beijo de forma intensa.

Bella soube, mais do que nunca, que o laço criado com Edward era indestrutível e seria seu fim quando o dia em que tal laço se rompesse chegasse. Edward soube que não suportaria ver a humana perecer, seja pelas mãos de outrem ou pelo tempo. Admitindo que não mais iria suportar a distância tomou sua decisão por Bella, por ele. Afastou-se ofegante, embora seus pulmões não precisassem de ar. Bella respirava com dificuldade.  

-Não fique chateado com o que vou dizer... –Bella disse ofegante, um sorriso brincava nos lábios. –Mas sua última frase soou bem piegas. –E ao abrir os olhos, novamente, ele não estava lá. As cortinas tremulavam pelo vento que adentrava a janela entreaberta. Aquiesceu. Ela sabia que ele voltaria. Aconchegou-se em sua cama para ter o sono dos justos. Sonhos bons vieram com a inconsciência, sonhos com seu protetor e amante.

Edward tocara repetidamente os lábios após partir para sua casa. O gosto, um fel. Preparativos a tomar antes do fim, o fim de Bella, o fim de sua solidão. O começo de algo novo, desconhecido, porém prazeroso.

“Seus dias estão contados humana.” –Pensou satisfeito. As mãos novamente nos lábios.

...

As cenas de seu cotidiano pareciam estranhas, como estar em sua vida, mas ser uma mera espectadora. A distração era sua companheira constante, era preciso se policiar e não ficar avoada nos momentos errados como quando assistia a alguma aula, conversava com seus amigos ou com seus pais. Não vira mais Edward desde aquela noite, há cinco dias. Não se desesperou, no entanto. Algo, uma certeza quase tangível, pairava no ar. Logo Edward viria até ela e, após o tão esperado reencontro, não mais se separariam. A incerteza do que viria a seguir, de seu futuro, não mais a assombrava. Era irracional, ela sabia, que estivesse disposta a seguir seu anjo para qualquer lugar, até para o inferno se preciso, desde que ele estivesse ao seu lado.

O relógio marcava o fim de tarde: 4hs e 39min.

“Está na hora.” –Pensou. Nenhum resquício de dúvida. Apanhou a sobrecasaca vestindo a mesma. Seus dias jamais seriam iguais, aquela sexta-feira treze seria um marco. Aproveitando-se da noite escura e tempestade, saiu sem o seu carro. Apenas seus pés para levá-lo aonde mais queria ir, a casa de Isabella.

O relógio marcava o fim da noite: 00hs e 00min.

A janela se abriu lentamente lançando uma lufada de um vento quase ártico no interior do quarto. Os pés tocaram silenciosamente o piso de linóleo ensopando-o. Edward logo avistou Bella, dormia. Sentou-se na cama sem se incomodar em estar molhado. Seus dedos se esticaram até tocarem a bochecha de Bella. Subitamente, Bella abriu os olhos. Edward tinha um sorriso terno nos lábios. Inclinou-se e encostou seus lábios no ouvido de Bella.

-Eu fui paciente, não fui? –Disse. Sentiu o corpo feminino abaixo de si arrepiado.

-Sim. –Murmurou Bella fracamente.

-Se alguma duvida ainda nubla a sua mente, eu sairei daqui e nunca mais retornarei. É isso o que deseja Bella?

-Não. Quero que permaneça aqui. –Edward sacudiu a cabeça aos ouvir as palavras de Isabella.

-Eu lhe disse, eu não posso mais acompanhá-la. Está na hora de você me acompanhar, de uma forma bem mais permanente eu admito. Mas se há alguma dúvida, algum pensamento de que ficará só, está enganada.

-Por que meu anjo não iria me abandonar, não é? –Disse com a voz levemente divertida, os orbes castanhos nos orbes rubros.

-Jamais. –Sussurrou Edward inclinando-se e, com os olhos fechados, encostando sua testa na testa de Bella. Depositou nos lábios femininos um cálido beijo. Ouviu Bella suspirar de contentamento. Alisou seus lábios frios pela extensão da pele macia e quente até encontrar a jugular. Edward beijou aquele local repetidas vezes. Bella se deixou levar. Não importa para onde Edward a levaria, seja o céu ou o inferno, ela iria. Uma dor aguda a atingiu tão fortemente que não encontrou a voz para protestar, uma dor aguda em seu pescoço. Tudo ficou escuro, quente, como o inferno. O grito que queria dar ficou preso em sua garganta, em algum lugar do corpo que queimava.

...

Isabella Marie Swan

Adorada amiga

Amada filha

(1988 – 2005)

            As flores jaziam esquecidas, logo murchariam. Tão bela, tão jovem, com tanto a fazer! Uma vida perdida sem explicações aparentes. Simplesmente retirada de seu quarto, vestígios de sangue nos lençóis. Renée chorava a filha morta e desaparecida bem como Mike, Angela, Ben e tantos outros amigos. A vida é passageira e é em momentos de dor como esse que a frase vem potente para nos assombrar. A observá-los estava um casal, as mãos anormalmente brancas dadas. A moça, linda como a alvorada, sentia a dor da perda, da vida que deixara para trás, mas não sentia o arrependimento dentro de si. A fim de confortá-la, o rapaz e puxou para um abraço, sussurrou em seu ouvido.

-Está na hora. –Afastou-se beijando-a  na testa, nos lábios. A jovem suspirou.

-Eu sei. Eu quero ir. –Disse e sorriu. –Vamos para casa Edward. –Disse pegando firmemente a mão masculina. Edward suspirou de contentamento. Ao contrário de Bella, ele não olhou para trás.

Ninguém notou a presença do estranho casal que acompanhava a cerimônia de um ano de morte da jovem Isabella Marie, eles conheciam a verdade por detrás da morte. Nem sempre a morte é um fim, não para eles.

Nenhuma pegada na grama foi deixada.

 

FIM


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Palavras de minha chefinha do S2:

" Quero te parabenizar pela sua participação no projeto fanfics com a one shot QUANDO UM ESTRANHO ME OLHA que ficou em 4º lugar geral na categoria TWILIGHT.
Eu sei da sua dedicação ao escrever essa one shot afinal você conseguiu escrevê-la em apenas pouco tempo para poder cumprir o prazo. A capa original ficou maravilhosa.
Obrigado pela sua dedicação, paciência e humildade. Você tem um talento extraordinário e fico muito feliz em poder contar com você no projeto.
Parabéns..
Nicaele."