Antagônicos escrita por Runway Ing


Capítulo 8
A cena mais estranha do mundo




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— Como vou contar isso pra Wax?

— Ele vai ter que entender.

— Eu vou tirar, Ringo.

Eu estava chorando no banco do passageiro, enquanto ele dirigia de volta para casa. Tinha ligado para nossa chefe pra avisá-la que eu estava com uma doença e tinha parado no hospital, por isso, não trabalharíamos o resto do dia.

— Obvio que você não vai tirar. Eu vou ligar para seu pai hoje mesmo, Charlie, você vai ter esse bebê.

O nosso vizinho, Patrick, tinha umas idéias sem noção ás vezes. Mas Ringo acreditava em tudo o que ele dizia. Um dia, ele falou que a irmã tinha engravidado, abortou e morreu no mesmo momento. Ringo levou isso pra a vida dele e se eu sonhasse fazer algo com o feto, ele diria a meu pai e eu já podia começar a me desconsiderar parte da família Van Hulzen.

Como será que Wax reagirá?, eu pensei diversas vezes. Ele sempre confiou em mim e nunca imaginaria que eu, a santinha, a responsável, perfeccionista, toda organizada e cheia de manias, engravidaria. DE FRIDRICH. Eu poderia ter engravidado de Will, que só pensava em fazer sexo (e foi por isso que me traiu, eu não sentia atração sexual por ele, logo, não via motivos para estar tendo relações), bebida, jogos de futebol e revistas de mulheres nuas.

Assim que contei, as palavras pareceram sair da minha boca em câmera lenta. Sentei-me no chão e fiquei chorando desesperadamente. Soluços, me tremia toda, coração palpitava fortemente e doía. Estava indo tudo bem, eu tinha o emprego dos meus sonhos, era subchefe do jornal local e podia fazer minhas matérias na minha própria casa. Morava com meu irmão mais velho e meus quatro melhores amigos, numa casa de primeiro andar arejada, com o gramado mais bonito e mais verde que o do vizinho. É como dizia a minha avó: quando tudo parecer estar perfeito, cuidado, é miragem.

Os cinco estavam boquiabertos sentados no sofá enquanto eu chorava. A série Arrow estava passando na tevê, era terça-feira. O dia que nos reuníamos na sala para assisti-la e comentar sobre Oliver ter que ficar com Laurell ou Felicity. Parecia que eu tinha acabado com a vida de todo mundo que estava ali, não só a minha.

— Char. — chamou Duda, olhei-a com os olhos avermelhados. — Calma, mantenha a calma.

— É! — Violet se levantou. — Somos uma família, podemos cuidar desse neném.

— Eu posso escolher as roupas e ensinar ele como cantar as garotas. — riu-se Jane, Ringo empurrou-a com o ombro.

— Eu topo. — Ringo disse sentando-se do meu lado.

Ele me olhou como se eu fosse um bicho indefeso e colocou a mão na minha coxa.

— Posso?

Assenti com a cabeça. Era estranho ter alguém tocando na minha barriga, com os olhos cheios de lágrimas.

— Trate de ser uma garota!

— Não, terá de ser um garoto. — Wax disse fazendo-me sorrir. Levante-me e o abracei.

Só faltava o Friedrich saber, o que seria muito difícil de contar sem que ele me desse um pescotapa, ou uma mordida no braço até arrancar o pedaço. Peguei o celular e escrevi uma mensagem, estava péssima para pensar em algo que não o fizesse pensar que eu queria repetir aquela noite, só que fora da rede.

Preciso ter uma conversa com você, muito séria. Não demore, você mora há duas quadras, espero que esteja aqui em cinco minutos, ou...

Charlize V. H.

Enviada.

Passaram-se quinze minutos e nada do Friedrich. Chegou meia hora depois com uma mochila nas costas. Abriu a porta e se assustou ao ver que estávamos todos na sala numa balbúrdia só.

— Vai dormir aqui? — Wax questionou. Como se Friedrich não chegasse sempre, toda semana, com uma mochila nas costas para dormir na sala.

Ele assentiu com a cabeça e sentou-se numa almofada. Estava com uma expressão nervosa, estávamos todos o olhando e ele já sabia que era algo grave. Ou “você não pode mais frequentar essa casa”, ou “você vai ter que pagar pelo que fez!”...

— Charlize vai lhe contar uma coisa, precisamos que você seja compreensivo, paciente e que não se matem. — falou Ringo.

Aproximei-me dele e me coloquei de joelhos na frente dele. Eu sentia que ele estava querendo me empurrar pra trás e eu bateria com a cabeça no braço do sofá, mas não o fez. Já não bastaria quase ter me matado um mês atrás.

— Escuta — murmurei. Ele me fitava com os olhos pequenos e a boca semi aberta, deixando os caninos a mostra e a barba rala que me atraia muito. Estava com o cabelo mal penteado e com cheiro de sorvete de creme. — Eu... Eu estou grávida.

Ele riu e deu uma tapa na própria perna.

— Olha só no que deu, não se protegeu. Quem é o pai?

Bufei e rolei os olhos. Podia ser menos retardado, pobre do meu filho.

— VOCÊ. — disseram os outros em uníssono.

Ele simplesmente desmaiou.

Esperamos que ele acordasse, o que demorou um episódio inteiro de Arrow.

— Gente, eu tive um...

— Não foi um pesadelo, seu inescrupuloso, foi real, você vai ser pai. — grunhiu Duda.

Ele esfregou a testa e deu um soco no chão.

— Por que você não tomou a porcaria do anticoncepcional?

— Ela tomou. Mas os remédios que tomou no dia que você — Jane enfatizou o “você” — deu-a dois bombons malditos inibiu o efeito.

Ele se levantou, pegou a mochila e me puxou pelo braço.

— Licença, preciso conversar com ela a sós.

Ele me arrastou até o meu quarto e começou a chorar acocorado no chão. Eu entendi como era que Violet tinha sentido no dia em que entrou no meu quarto e eu estava sentada ao lado da porta. Ajoelhei-me de frente pra ele, segurei o rosto dele com as duas mãos e sorri. Um sorriso que dizia “vamos fazer isso juntos, esta tudo bem”, ele ajoelhou-se também e me abraçou.

— Nicholas. — ele sussurrou.

— Nicholas?

— Sim, se for menino. — ele se levantou e caminhou até minha cama, sentando-se. — Se for menina, Christina.

— Não! Eu quero Twiggy ou Cedric.

— Nomes ridículos. Não quero que ele sofra como você e Waxler. — rimos.

— O que você pensou que era quando mandei a mensagem?

Ele olhou para o chão e riu. Balançou a cabeça pra os lados como se tivesse negando algo para si mesmo.

— Melhor eu não falar.

— Fala.

Ele olhou novamente pra mim, eu estava em pé um pouco distante. Ele levantou-se da cama, caminhou até mim, colocou uma mão no meu rosto e outra na minha barriga. Selou meus lábios e depois só ficamos muito próximos, o nariz dele tocando no meu, minha testa grudada na dele. Suspirou.

— Carma. — ele falou quase inaudível e me beijou

Imaginei I See Fire tocando novamente, como se Ed Sheeran tivesse virado trilha sonora pra nos dois. Ele me colocou nos braços e me colocou na cama devagar. O engraçado é que ele era tão bruto, adorava gritar comigo e me pregar peças, mas naqueles momentos, ele me tratava como se eu fosse feita de acrílico. Cuidadoso, carinhoso.

Ele começou a beijar o meu pescoço e desceu até minha barriga. Acariciou-a e uma lágrima escorreu pela bochecha dele. Sorri discretamente. Ele tirou meu vestido e eu tirei a camisa ele. Em segundos estávamos despidos, meus seios na altura do peito dele, minhas pernas amarradas em sua cintura, beijos que pareciam eternos, olhares e mais uma vez, sexo. Estávamos sóbrios e prestes a ser pais. Eu arranhava-o nas costas e gemia no ouvido dele. Realmente, há coisas sem explicação no mundo, imagine alguém que você nunca sonhou que podia estar em uma mesma cama, sentindo prazer e com vontade de nunca mais largar... Freud, onde está você para nos explicar o que estava acontecendo? O que conspirava o mundo para nós dois? E por que nós dois?

Suados, nos abraçamos e dormimos de conchinha. Era a cena mais estranha do mundo.


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