Antagônicos escrita por Runway Ing


Capítulo 15
O "amor eterno" dos meus pais




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O relógio marcava quase meio dia quando acordei. Friedrich não estava mais na cama. Levantei-me devagar e senti que estava mais pesada do que antes; então lembrei que (talvez fosse coisa do meu subconsciente) estava fazendo dois meses.

Desci sem tomar banho e percebi que estava um silêncio incomum. Seria possível que eles teriam me deixado sozinha para ir até o centro? Então me lembrei que era Natal. Reuníamos-nos sempre na casa do caseiro, a mulher dele cozinhava muito bem, por isso era ela quem sempre fazia a ceia.

Kimi era filha dos dois, logo, Kimi estava lá. Coloquei a pantufa e corri até a casa que era nos fundos. Uma nevoa fria pairava no ar. Meu fôlego já estava acabando, maldita casa do caseiro que havia ficado mais distante só porque eu corria por dois. E se Friedrich tivesse flertando a Kimi? Pior, se ele tivesse sendo seduzido por ela, pobrezinho, estaria tentando escapar e eu não estava lá para ajudá-lo.

Eu estava mesmo pensando no Friedrich como alguém indefeso?

— SOCORRO! — gritei com as mãos nos joelhos, respirando fundo.

Eles apareceram na porta da casa, só faltava uma pequena ladeira de grama. Friedrich estava com a cara de paspalho de sempre, me olhando com um sorriso malicioso, como se tivesse lendo meus pensamentos desde o início e ciente de que eu tinha dado aquele berro por achar que ele estava perdido nos braços da ruiva.

— Esse escândalo todo é pra alguém te ajudar a subir essa mini-ladeira? — Wax rolou os olhos, assenti com a cabeça. Ele veio na minha direção, me pôs nos braços e quando chegou á cozinha percebi o porquê de ele estar sendo tão gentil. A expressão no rosto de Kimi era exatamente a de alguém que estava pensando “nossa, como ele é fofo, cavalheiro, cuidadoso.”

— Wax, você não vai sair com aquela sua amiga da internet?

Ele me fuzilou.

— Não.

Duda riu, levantou-se do banco e começou a pentear meus cabelos com as mãos. Jane aproximou-se com um copo de leite e me estendeu.

— O que teremos para o jantar?

— Quiche, — Kimi começou falando e eu quase disse “querida, eu não perguntei a você!”. Friedrich me olhou assim que ela começou a falar, semicerrei os olhos encarando-a. — tomate recheado, bruschetta, salmão, lombo e bacalhau.

— Hm. Legal. Eu posso fazer a sobremesa com a Kimi? — a mãe dela sorriu e balançou a cabeça.

— O que pretende fazer? — Kimi perguntou.

— Torta de maçã.

Ela fez uma careta. Beberiquei meu leite.

— Eu estava pensando em fazer uma torta fudge de chocolate.

Eu sempre fazia as sobremesas. Ela achava que era quem pra mudar essa rotina?

— Infelizmente não será dessa vez. — sorri falsamente.

— Mas — Wax me interrompeu, não seria possível que ele daria preferência a ela, eu estava grávida e ela não, isso dava a desvantagem a ela, não? — você fez essa torta de maçã ano passado, sim, eu adorei, mas Liz, você não acha que poderíamos provar outra sobremesa dessa vez?

— Claro, eu posso fazer cheesecake. — repeti o sorriso falso.

— Digo, de uma chefe diferente. — ele piscou pra ela, que suspirou com ar de vencedora.

Minha garganta fechou. Primeiro, eles me largam em casa sozinha, quando sempre me acordavam pra ajudar na cozinha. Depois, me apunhalam. No plural, pois não vi ninguém abrindo a boca pra dizer que preferia meu cheesecake.

— Podemos ter os dois. — disse Duda. Nem minha melhor amiga me defendeu, ela deveria ter dito que não queria provar esse tal fudge que com toda a certeza, vai ter gosto de papel manteiga.

Naquele momento eu percebi que aquela coisa toda que falam sobre grávidas ficarem extremamente sensível, era verdade. Fiz bico e em segundos, desfiz. Estava tanto sensível, quanto furiosa. Coloquei o copo no balcão de volta com tanta força que ouvi o tilintar.

Saí de lá batendo os pés e antes de fechar a porta ouvi Wax dizer “deixa ela, vai ficar bem, é só muito mimada”.

Voltei para a casa e subi até o quarto do meu pai. Peguei uma caixa empoeirada que jazia debaixo da cama, soprei a poeira e abri. Espirrei algumas vezes e peguei um álbum.

Na cama a seguinte frase: Texer & Robert. Amor eterno.

E aí eu pensei, amor eterno é uma utopia, não só nesse, mas em diversos casos. O que me deixou confusa fora a averiguação que veio a calhar, se aquele dito amor eterno dos meus pais teve um fim, quem dirá o meu e de Friedrich; nem amor era. Era apenas uma mentira. E no fim — que eu suspeitava que seria no máximo até o fim da semana —, eu terminaria sendo uma mãe-solteira. Com uma criança parcialmente parecida com ele. “Parcialmente” seria uma amenização para “exageradamente”. Uma criança com os olhos miúdos e cor de jabuticaba, as bochechinhas rosadas e os dentes brancos semelhantes à de um lobo; assim, todos os dias da minha vida que eu olhasse para o meu filho, eu lembraria que Charlize, a garotinha mimada, única da casa que tinha seguido seus sonhos em relação a emprego, bem sucedida, engravidou de um cara que sempre odiou e, como previsto, foi abandonada, ou melhor, foi trocada! Pela segunda vez.

Se isso parasse na minha revista, daria um bom ibope e uma boa motivação para mulheres que se sentem um lixo e pensariam “ainda bem que não sou tão desgraçada quando essa moça”.

— Toc toc. — ouvi a voz de Friedrich do outro lado da porta. Não me movi. — Normalmente as pessoas só batem a porta, quando pensam na possibilidade da outra que está dentro, estar despida. Mas, como já te vi desse jeito, não preciso mais bater, correto?

Levantei a cabeça para o olhar. Ele estava com a mão na cintura e pensativo. Sentou-se do meu lado e tirou o álbum das minhas mãos.

— Do que você tem medo? — ele sinceramente lia meus pensamentos.

— Não é bem medo... Eu só não queria encarar isso sozinha, nunca.

— Você não vai.

Ele encostou as costas na parede e ficou me vendo olhar as fotos dos meus pais com aqueles sorrisos tão brilhantes.

Ia ser diferente comigo e Friedrich. Só bastava a gente querer.


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Notas finais do capítulo

Milagre! Postei. Desculpem, de verdade :c culpem Arquitetura, ok? Vou postar outro agora.



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