— Todos de pé, pimpolhos! – a voz de tia Dorea soou amplificada pela casa. – Hoje é o dia de retornar a nossa amada Hogwarts!

Sentei-me na cama, bocejando preguiçosamente.

Com todas as coisas que aconteceram desde que eu chegara ali, nem havia me dado conta do tempo passando. Olhei para aquele imenso quarto, que chamava de meu, e tentei guardar todos os detalhes. As paredes em um suave bege, um divã a beira de minha cama, duas mesinhas de cabeceira e um glamoroso quadro do casal anfitrião pendurado ao lado de uma imensa janela de vidro com cortinas brancas. Tinha um péssimo pressentimento que demoraria a retornar àquela casa.

Levantei-me e procurei algo que pudesse me vestir decentemente.

Minhas malas estavam encostadas à parede e resolvi que agora não seria o melhor momento de leva-las, já que um delicioso café da manhã me aguardava em apenas um lance de escadas. É preciso comentar que, apesar de ter uma ajuda extra dos elfos domésticos, a mãe de prongs adorava cozinhar e era simplesmente ótima nessa tarefa. Meu estômago clamava por seus bolos, pudins e assados. As coisas mais deliciosas que eu já havia comido.

Os corredores estavam silenciosos quando eu finalmente sai do cômodo, no entanto não permaneceu dessa forma por muito tempo já que moony e Dorcas saiam do quarto rindo entre si. O loiro ergueu o olhar, vendo-me. Ele sussurrou algo no ouvido da moça e a mesma seguiu sem ele.

— Que cara é essa, pads?

— Eu estou com alguma cara? – retruquei, rolando os olhos.

— yikes! – riu. – Conte-me o que aconteceu.

— Eu e prongs brigamos.

— Sério? – arregalou os olhos, surpreso. – O que foi que você fez?

Essa foi minha deixa para ficar irritado.

Por que eu que teria de ter feito algo?

Expressei em palavras o meu pensamento.

— Porque você está com uma cara de culpado que Deus nos acuda.

— Certo, eu e a Leth... Nós bem, eu comi morangos.

— E por morangos você quer dizer...

— SH! – exclamei, tapando sua boca. – É isso mesmo, agora não abre esse bico.

Prongs passou por mim e lançou-me o mais puro olhar de ódio. Oh, céus, quando esse outro iria me perdoar? Quero dizer, ele sabia que eventualmente isso iria acontecer. Certo, eu entendia o seu ponto de vista. Se fosse minha irmã eu provavelmente faria o mesmo. No entanto, ele tem que ceder em algum ponto do jogo. Não pode ficar me ignorando para sempre. Somos amigos, for God’s sake!

Remus, James e eu descemos as escadas em silêncio, com medo de que qualquer palavra fosse quebrar o momento de controle do pequeno Jim. Não queria ter de explicar aos pais dele o porquê de ter sido atirado escada a baixo pelo mesmo.

A comida parecia deliciosa e não demorei a me servir.

Tio Charlus sentava-se na cadeira da ponta, lendo uma edição do Profeta Diário, enquanto tomava uma xícara de café e Tia Dorea por sua vez comia torradas e conversava animadamente com Emilly sobre algo. Regina estava lendo distraidamente um livro qualquer e copo de suco de limão repousava a sua frente. Finalmente meus olhos se aquietaram por encontrar o que estavam procurando: Lethícia estava sentada ao lado de sua mãe, passando uma boa porção de geleia de framboesa em uma fatia de pão. Parecia tão concentrada em sua tarefa que seria um pecado interrompe-la. Aproveitei a deixa e acomodei-me em uma cadeira à sua frente.

— Bom dia! – disse, recorrendo às boas maneiras.

Todos responderam ao meu cumprimento cordialmente; uns com muita impetuosidade, como Regina. Aquela garota de cabelos ruivos e olhos verdes estava me deixando um tanto desconcertado com seus olhares penetrantes e sorrisos desafiadores. Tentava inutilmente entender seus objetivos, mas ainda era um caminho obscuro para mim.

— Sirius, docinho. – a voz da matriarca soou preocupada. – Aconteceu algo entre você e minha Leth?

O olhar da Potter mirou-me arregalado.

Senti um chute em minha canela que fez-me gemer de dor.

— Ah! – mordi o lábio. – Desculpe-me?

— É que vocês costumam ser tão amigos e mal se cumprimentaram hoje.

— Nada aconteceu entre nós, tia. – disse-lhe e inclinei-me na cadeira, aproximando o máximo meu rosto do dela para completar meu discurso com um sussurro: - Ainda.

Senti novamente minha pobre canela ser chutada.

— Você está sentindo algo, Sirius? – a voz doce da Sra. Potter era agradavelmente preocupada. – Precisa de alguma poção?

Abanei a cabeça, negando.

— Estou bem, é apenas uma dorzinha na cabeça.

A mulher assente, conformada.

O restante da refeição fora bastante silencioso, com exceção dos comentários esporádicos dos familiares. Após que todos os talheres bateram nos respectivos pratos, se iniciava a pior parte de voltar para Hogwarts: a despedida. Dorea estava em prantos e sabia que Charlus estava prestes a subir para se acalmar com uma dose de uísque de fogo.

Aproveitei a deixa para subir e pegar minhas coisas.

— Você foi um garoto muito, muito, mau. – ouvi uma voz sussurrar. – Quase nos meteu em problemas hoje.

— Então eu acho que mereço ser punido. – retruquei, pousando as mãos na cintura da garota.

Ela gargalhou.

— Espere e será. – piscou.

Vi a blusa branca de botões com o brasão de gryffindor demarcar as curvas de seu corpo, incitando-me. A saia, no entanto, foi o que me deixou com o olhar vidrado. Aquela maldita manipuladora estava trajando um pedaço de pano que queria passar como um traje digno.

— Ei, onde pensa que vai com essa saia?

— Já estou despertando os seus ciúmes, Sr. Black? – riu.

— É claro que não, só não acho agradável aqueles fominhas de Hogwarts ficarem olhando para essas pernas. Que são minhas!

— São?

Ops.

Pronome errado.

Permaneci calado, o que fez a morena se aproximar e beijar meus lábios suavemente. Sabia que estava pondo pressão demais em seus ombros e não gostaria de a assustar assim tão próximo do momento em que finalmente a pude ter.

Descemos juntos, despedimo-nos e finalmente aparatamos na estação de trem nove três quartos.

O majestoso trem que nos levaria de volta à escola já estava esperando e não hesitei em entrar. Procurei um vagão que me fizesse sentir agradável e esperei que os outros me seguissem. Queria conversar com James um pouco mais calmamente e tentar enfiar naquela cabecinha que tudo o que estava acontecendo não era tão estranho como parecia. Ele não precisava de toda aquela marra não.

Suspirei, mal sabia o que ainda me aguardava.

~~

— Sejam bem-vindos novamente! – a voz de Dumbledore desejou. – Antes que possamos aproveitar esse delicioso jantar, gostaria de passar alguns informes. Aos senhores Potter e Black, Argus Filch pede que parem de jogar bombas de bosta em sua sala, já que é um ato deveras desrespeitoso e até mesmo nojento.

Uma onda de risadinhas se espalha pela mesa de gryffindor.

— Dando seguimento, eu sei que não é comum aceitarmos alunos fora de época e principalmente de outro ano que não seja o primeiro. No entanto, gostaria de apresentar a vocês as mais novas alunas de nossa escola: Emilly e Regina Gainsborough! Após uma série de longos exames para provar a capacidade destas alunas, não tivemos outras opção senão aceitá-las.

Ambas possuíam sorrisinhos nos rostos.

Ouvi um bufo baixo e um resmungo vindo de Lethícia. Eu tinha em mente que o par de primas e ela não se davam nem um pouquinho bem. A morena as detestava, apesar de terem se mostrado gentis no período em que passamos na casa da família Potter. É verdade que a ruiva devorava-me com os olhos sempre que eu aparecia em seu campo de visão, mas fora isso não via nenhuma anormalidade.

A seleção de casas começou.

Pela ordem, Emilly acomodou-se no banquinho primeiro, permanecendo alguns segundos antes de ser anunciada como uma slytherin. A moça de cabelos pretos curtos rumou até sua nova mesa, onde a aguardavam. Em seguida a ruiva sentou-se. Foi preciso uma pequena quantidade de tempo até que o chapéu finalmente anunciasse sua decisão. Ela viria para gryffindor.

— Oh, you gotta be kidding me. – Lely murmurou, enraivecida.

As duas trocaram poucas palavras durante o jantar e menos ainda no caminho de volta à torre de gryffindor. Ela não estava animada com a permanência das primas ali, no entanto não havia muito a ser feito.

A menina subiu para o dormitório feminino sem ao menos se despedir.

Quis saber, pela primeira vez, porque diabos ela guardava tanta mágoa das duas garotas que compunham sua família. Porém sabia que a resposta estava longe de ser concedida.

algumas semanas depois...

— Dude, esses NIEMs estão acabando comigo! – exclamei, cansado.

— Nem me fale! – James, respondera, e sim, depois de uma longa conversa com direito a alguns socos, ele havia se adaptado a ideia e voltado a falar comigo.

Eu, moony, prongs e wormtail saíramos da sala de Feitiços, onde realizamos nosso segundo dia de avaliação. Realmente condizia com o nome. Estava mais do que exausto e precisava de um descanso. No entanto, como se toda a dor fugisse de meus ombros, avistei a garota que preenchia os meus sonhos. Bosta, here we go again para o clubinho extremamente gay do James.

— Olá, meninos. – ela sorriu.

— Como você pode estar com essa cara tão alegre depois de provas como essas? – indagaram em uníssono James e Peter.

— Estou cansada, mas não dá para morrer. – rolou os olhos. – Bebezões.

Beijou-me rapidamente nos lábios e enroscou meu braço no seu.

Após duas semanas do incidente, nós estávamos grudados um no outro. Aproveitando cada tempo para nos conhecer ainda melhor do que nos conhecíamos. Beijar como nunca e, bem, eu estava comendo muitos morangos durante aquele tempo. O pensamento me fez rir.

Ao longe pude avistar as primas malignas dos Potter e um arrepio percorreu minha coluna. Tive a sensação que nossa iminente felicidade não as agradava e, subitamente, a certeza de que elas fariam de tudo para nos separar me atingiu.

O medo me fez apertar a pequena garota ainda mais forte em meus braços, não queria jamais que ela abandonasse aquele lugar.

O seu lugar.