Além do Sangue escrita por Giullia Lepiane


Capítulo 6
Passeio


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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Régulo não era o primo favorito de Andrômeda, e ela tampouco era a prima favorita dele. A explicação para aquilo era clara – ela se identificava mais com Sirius, e ele, com Belatriz e Narcisa.

Contudo, seria mentira se ela dissesse que desgostava do garoto como desgostava das irmãs. Afinal, na época em que realmente convivia com Régulo, ele não passava de um bebê, e ela fora para Hogwarts quando ele tinha três anos, passando a vê-lo só durante as férias. Não podia desgostar de uma criança com quem tinha tão pouco contato, mesmo que ouvisse Sirius dizendo coisas não muito positivas sobre o irmão.

Assim, podia tentar convencer-se de que não era ruim ter de sair para dar um passeio de vassoura com ele naquele dia. Sim, desejava ficar quieta no canto dela e não tinha vontade de sair naquele dia congelante – tinha inclusive aprendido nas aulas de Voo, no primeiro ano, que tempos como aquele não eram os mais adequados para se voar –, mas pelo menos teria uma distração. E Régulo parecia até feliz, enquanto os dois esperavam no hall de entrada que tio Alfardo perguntasse à irmã Walburga e ao primo e cunhado Orion se eles teriam alguma vassoura para emprestar para Andrômeda usar no passeio.

Foi o próprio tio Orion que apareceu trazendo o objeto, uma impaciência em seu rosto que a garota não identificou. Talvez também achasse bobagem que os dois saíssem para voar naquele momento?

– Aqui está, Andrômeda. Pode usar esta. – Disse ele, estendendo-lhe a vassoura. Não era um modelo muito novo, mas estava em ótimo estado, e algo em sua voz lhe avisava sobre o quanto estaria encrencada que fizesse mal uso da vassoura.

– Certo. – Concordou ela, aceitando-a. Era uma vassoura leve, reparou. Era melhor desse jeito.

– Não vão muito para longe e nem voem muito alto. Régulo tem só nove anos, e você está responsável por ele. – Relembrou. – Também não se demorem. Ainda é Natal, e queremos vocês aqui.

– Certo. – Repetiu, enfim convencendo-se completamente de que o passeio não seria ruim. Melhor do que lidar com toda sua família, como ela sempre dizia para si mesma.

Tio Orion voltou-se para a sala de jantar e Andrômeda e Régulo caminharam com suas vassouras para fora da casa.

– Obrigado, Andrômeda. – Disse o menino, formalmente, uma vez que os dois alcançaram o gramado coberto de neve do lado de fora.

– Não precisa me agradecer. – Respondeu ela, com gentileza, examinando o caminho que teriam de fazer para não bater em nenhuma árvore ou coisa do tipo. Não seria difícil para ela, mas não sabia quanto ao primo. – Muito bem, vamos lá. Vou te ensinar a subir na vassoura, primeiro...

– Mas eu já sei isso. – Régulo cortou. Andrômeda olhou-o, desconfiada.

– É?

– Sim, papai me ensinou. Aí eu gostei e perguntei se poderia ter minha própria vassoura, e agora ganhei esta como presente de Natal.

– Me mostre como é que faz, então. – Pediu ela. O menino assentiu, e montou a vassoura com perfeição, para em seguida voar em um círculo e parar no mesmo lugar. Pelo visto, então, Andrômeda não teria muito a ensinar para ele. – Foi bem. – Elogiou, antes de subir na própria vassoura, mas a descrença quanto a um menino de nove anos voar tão bem ainda devia estar tingindo sua voz, pois Régulo falou:

– Não se preocupe, Andrômeda. Não vou fazer nada idiota, não sou Sirius.

– Qual é a relação entre fazer algo idiota e ser Sirius? – Andrômeda instantaneamente foi em defesa do primo, arrependendo-se ao pensar que Régulo com certeza contaria aos pais e aos tios que ela o tinha feito, se isso o irritasse. Para disfarçar, decolou antes que ele pudesse responder, e o garoto foi logo atrás dela.

Mas por mais que Andrômeda não tivesse gostado da maneira como Régulo tinha falado, ele era mais responsável que o irmão. Ela podia imaginar que, se fosse Sirius no lugar dele, ele teria querido ir rápido, voar o mais alto que conseguisse. Já Régulo só subiu até o ponto em que ela subiu – não mais de três metros acima do chão – e foi na mesma velocidade que ela.

A ideia do passeio estava começando a parecer não só adequada, mas bastante boa. O vento, mesmo gelado e cortante, parecia levar todos os pensamentos negativos e preocupações de Andrômeda embora. Ela nunca entendera a palavra “livre” em sua plenitude, mas voar se aproximava mais do significado que qualquer definição que poderia pensar. Devia fazer isso com mais frequência – costumava ficar meses sem voar, já que a aula de Voo não era obrigatória no sétimo ano e ela tampouco tinha interesse em jogar Quadribol.

Os dois mantiveram-se em linha reta por alguns minutos. Não conversavam, e Andrômeda poderia até ter se esquecido da presença de Régulo se não estivesse mantendo o olhar nele, para poder ver imediatamente qualquer coisa que pudesse acontecer.

Só quando ela viu que já estavam passando a casa dela, pensou que talvez já tivessem ido longe demais. Declarou que era para voltarem, e já não estava mais tão preocupada com alguma coisa dar errado. Tudo já tinha corrido tão bem – só faltava voltarem. Mas foi aí que Régulo perguntou, parecendo ligeiramente embaraçado:

– Como é que faz para dar meia-volta?

– Assim. – Andrômeda foi fazer para que ele visse, mas ele quis imitar o gesto ao mesmo tempo que ela. A vassoura dele ameaçou virar para o lado, fazendo Régulo segurar-se com mais força e Andrômeda levar um enorme susto.

Ela voou para mais perto dele, de forma que suas pernas quase se tocassem. Régulo tinha conseguido se firmar, mas não tinha dado a meia-volta, continuando na mesma direção que antes. Também tinham começado a ir mais rápido, por causa do rápido momento em que ele tinha perdido o controle da vassoura.

– Rég, você consegue pousar? – Perguntou. – Se pousarmos, podemos virar e seguir no outro sentido.

O vento soprava alto em seus ouvidos, e a própria Andrômeda não conseguiu ouvir muito bem suas palavras. Não foi nenhuma surpresa que Régulo também tivesse perguntado:

– O quê?

Estavam indo muito rápido. Mais rápido do que deveriam, no mínimo, e a paisagem deles passava por eles borrada pela velocidade. Andrômeda passou a olhar para a frente, para nada em que pudessem bater surgisse de repente na frente deles.

– Pousar! – Gritou, tentando fazer com que a palavra soasse mais alta que o vento. – Vamos pousar e depois virar!

– Pousar? – Régulo perguntou, e antes que Andrômeda pudesse confirmar, viu que estavam indo em direção à uma árvore. Régulo estava olhando para a prima, logo, não a estava vendo, e Andrômeda não podia arriscar avisar e ele não ouvi-la.

Ela tinha de pensar em alguma coisa, mas não conseguiria naquelas condições. Então, agiu com o desespero: lançou-se na direção de Régulo. Os corpos dos dois se colidiram e eles caíram para fora de suas vassouras.

Antes mesmo que o pensamento de estar caindo alcançasse a mente de Andrômeda, eles já tinham acertado o chão, com tanta força que o ar lhe abandonou os pulmões por um segundo. E ela ainda teve mais sorte que Régulo, pois caiu sobre ele, acabando por ter sua queda amortecida.

Atordoada pela queda, Andrômeda respirou fundo algumas vezes. Tentou, em seguida, movimentar seus dedos da mão, um por vez. Então, suas pernas. Não tinha quebrado nada, apesar de todo seu corpo doer.

Não queria se mexer muito, mas lembrando-se de Régulo sob ela, rapidamente levantou-se, sentando na neve ao lado dele. O garoto estava deitado de lado, seus olhos estavam fechados com força, e seu rosto estava contorcido em uma careta de dor. Andrômeda teve uma luta interna contra o pânico.

– Régulo, você está bem? – Perguntou, segurando-o pelos ombros e fazendo-o se sentar. Nisso, uma pedra afiada que tinha entrado na bochecha esquerda dele se soltou, caindo no chão. A cor escura da pedra não fazia parecer que estivesse suja de sangue, porém, quando Andrômeda passou o olhar dela para a bochecha de Régulo, viu que havia um feio buraco no centro dela, e aquela parte de seu rosto estava inteiramente coberta pelo sangue.

Régulo tinha aberto os olhos, e sua respiração era desregulada, como se estivesse segurando o choro.

Andrômeda tirou sua varinha das vestes, profundamente grata por ela também não ter se quebrado e por já ser maior de idade, podendo fazer magia fora da escola. Apontou-a para o rosto do primo:

– Episkey! – Disse. Então, passou a ponta da manga de suas vestes pelo rosto dele, tentando limpá-lo do sangue e ver se o machucado havia sumido completamente. Nem fez diferença na cor rosa-avermelhada das vestes que estava usando.

Tinha dado certo, mas Régulo continuava parecendo que iria começar a chorar, o que fez Andrômeda começar a fiscalizá-lo, tentando achar qualquer outro ferimento.

– O que foi, Régulo? O que está doendo?

– Estou bem, Andrômeda. – Respondeu ele, desvencilhando-se do toque dela.

– Não é o que parece. – Ela falou, afastando uma mecha dos enrolados cabelos castanho-claros do rosto. Tinha feito uma trança, quando se arrumara naquela manhã, mas o vento a tinha soltado e bagunçado os cabelos que a garota sempre penteava com tanto cuidado.

– Não estou machucado. Mas olhe a minha vassoura nova! – Régulo apontou para frente, e Andrômeda entendeu o que tinha acontecido quando olhou naquela direção.

A vassoura que tio Orion lhe emprestara tinha caído suavemente no chão, há apenas alguns metros de onde eles tinham caído. Já a de Régulo continuara, batendo na árvore de que eles tinham tentado desviar e se partido ao meio.

Nisso, o susto de Andrômeda já tinha passado, e ela podia novamente pensar racionalmente. Assentindo em compreensão, levantou-se e foi até onde o objeto estava, ainda com a varinha em mãos. Tinha quebrado, sim – mas nada que ela não pudesse dar um jeito.

– Reparo! – Exclamou, apontando a varinha para a vassoura, e as duas partes voltaram a se unir, sem deixar uma rachadura sequer. Ela a recolheu, e a levou de volta para Régulo, mas isso não pareceu deixá-lo menos chateado.

– Mas será que ela ainda funciona da mesma forma que antes?

– Claro. Por que não funcionaria? – Andrômeda tranquilizou-o, mas tinha suas dúvidas. Nunca tinha usado o feitiço em uma vassoura antes.

– Bem, vamos testar agora...

– Não. – A negação súbita dela deixou Régulo com uma expressão assustada. – Vamos voltar a pé. Chega de vassouras por hoje.

– Estamos muito longe da minha casa, Andrômeda! – Ele reclamou.

– Mas não da minha. – Ela apontou para o horizonte, onde a casa dela já parecia pequeninha. – Se formos andando, chegamos lá em meia-hora. Então voltamos para a sua casa pela Rede de Flu.

Régulo pôs-se de pé. Assim como Andrômeda, tremia de frio – as vestes dos dois estavam molhadas por causa da neve, e a temperatura do dia não ajudava. Ele segurou a vassoura quando ela a estendeu para ele, e começou a examinar seu cabo em busca de alguma imperfeição enquanto Andrômeda ia buscar a do tio, no chão.

Assim como não tinham conversado enquanto voavam, não conversaram enquanto faziam o caminho até o casarão. Contudo, era diferente daquela vez – antes não conversavam para aproveitar o passeio, agora, havia um clima pesado. A sensação de liberdade de Andrômeda também tinha passado, e ela se sentia tão desconfortável como em qualquer um dos dias anteriores, desde que tinha chegado em casa. Tinha se passado cinco dias, apenas, mas parecia ter sido um mês.

A previsão dela de que chegariam à casa em meia-hora estava correta, e mais ou menos no final deste tempo, eles adentravam o hall. Deixaram as vassoura encostadas na parede, pois não seria muito inteligente segurarem-nas enquanto estivessem usando o Flu. Alguém poderia ir buscá-las, mais tarde.

Andrômeda se perguntou se já estariam preocupados com eles, no Largo Grimmauld, enquanto iam até a sala de estar. Mas no caso, a preocupação teria de durar um pouquinho mais, pois ela ainda queria trocar de roupa. Se continuasse com aquela, iria acabar por adoecer.

– Me espere, Régulo. Vou até meu quarto vestir alguma roupa seca e já volto. – Disse para o primo, que assentiu e foi se sentar em uma das poltronas.

Andrômeda foi até as escadas e subiu-as até a metade, antes de ver o que a fez parar, atônita, onde estava.

Seus pensamentos pareceram muito lentos enquanto ela tentava repassar tudo o que tinha feito antes de sair de casa.

Mas se ela tinha certeza absoluta de algo, era que tinha fechado a porta de seu quarto ao sair, mais cedo. Nunca deixaria de fechar, nem mesmo se as cartas de Ted e sua aliança não estivessem lá.

E no entanto, a porta estava aberta.

Alguém tinha estado lá nas poucas horas em que Andrômeda esteve fora.


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Notas finais do capítulo

E então? Gostaram? Comentários? Recomendações? PAOKAPOKS
Até o próximo capítulo! Agora é que a tensão começa de verdade :3
P.S. Adorei escrever que Régulo estava com a respiração desregulada. Tipo, foi legal de verdade.



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