Tronos de Fúria escrita por Phoenix M Marques W MWU 27


Capítulo 5
Capítulo 5




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            A situação atual do mundo havia sido construída por uma série de fatores. Após a crise econômica de 2008, a economia mundial mergulhou num estado de instabilidade que parecia não ter fim. Alternando altos e baixos, a situação financeira do mundo era influenciada constantemente por fatores geopolíticos que envolviam as grandes potências econômicas e alguns países periféricos. As eleições presidenciais e parlamentares acirradas em países como Estados Unidos, França, Brasil, Portugal, Espanha e Grécia; a morte do líder comunista da Coreia do Norte e a posse do filho deste em seu lugar; a tímida abertura político-econômica em Cuba, promovida pelo enfraquecido regime dos irmãos Castro; a interminável Primavera Árabe; a guerra contra o narcotráfico na América Latina; a questão palestina... Todas essas situações influenciavam as discussões entre os países sobre como resolver a crise.

            Porém, a instabilidade econômica não era o único motivo para a crise. Com os constantes conflitos armados nas regiões que sofrem com a escassez da água, a busca pelo líquido da vida havia se agravado. Algumas nações deslocavam destacamentos enormes de soldados, como se estivessem em guerra, para proteger suas reservas naturais de água potável. A humanidade estava enfim valorizando a água depois de milênios. Porém, a cada dia ficava mais claro que algumas nações possuíam mais água potável do que as outras, e os países com menos água passaram a cobiçar abertamente as reservas de outros países.

            A Organização das Nações Unidas passou a promover frequentes reuniões internacionais com diversos governantes e grandes empresários para debater formas alternativas de distribuição de água para as nações necessitadas. Mas esses fóruns terminavam muitas vezes sem conseguir definir acordos ou metas de fornecimento, pois as opções apresentadas por empresas e governos eram pouco viáveis. Dessalinizar a água dos oceanos ainda era um processo caro, e ninguém podia sugerir que retirassem água das calotas polares porque os grupos ambientalistas se manifestavam em peso sempre que essa questão era discutida. Além disso, as nações com grandes reservas de água passaram a sofrer pressões das nações carentes para que doassem quantidades do líquido para tais países, apesar de as nações com grandes fontes naturais esforçarem-se cada vez mais para proteger sua água, utilizando suas forças armadas para resguardarem suas reservas.

             Surgiu mais um fator geopolítico para agravar a crise. A Primavera Árabe havia feito o mundo inteiro voltar os olhos para o Oriente Médio e, consequentemente, para a questão do petróleo. À medida que os regimes totalitários dos países árabes e muçulmanos iam sendo derrubados, os novos governantes, que, em sua maioria, eram conservadores ligados à religião, aumentavam os preços do petróleo que era exportado e privilegiavam o consumo interno. Países de fora da Liga Árabe, como Rússia, Brasil e Venezuela, passaram a exportar mais petróleo, mas logo os países importadores começaram a pressioná-los por preços mais acessíveis, enquanto os governantes aumentavam as taxas de exportação para compensar a crise financeira corrente no mundo, contudo, tal situação tornou-se uma faca de dois gumes, visto que os governantes queriam obter uma lucratividade maior e os países importadores queriam obter o combustível sem adquirir muitas despesas, uma vez que os exportadores do petróleo de melhor qualidade, os árabes, estavam protegendo seu produto.

            Somando a crise econômica, a crise da água e a crise do petróleo, o mundo passava por um momento de tensão comparável à Crise dos Mísseis de Cuba durante a Guerra Fria. O temor de todas as nações era de que uma nova Guerra Mundial estivesse prestes a eclodir.

            No entanto, surgiu com esse temor um duro questionamento: havia alguma nação capaz de fazer frente ao poderio militar norte-americano? Era sabido que nações subdesenvolvidas como Irã e Coreia do Norte possuíam grandes arsenais nucleares, porém o arsenal dos Estados Unidos era desproporcionalmente maior do que o dos demais países. Além disso, o mundo globalizado estava articulado em torno dos americanos, de modo que se algum país declarasse guerra a Washington, dezenas de nações declarariam apoio ao governo americano, e se os Estados Unidos entrassem em um conflito com outra nação, receberiam o apoio das mesmas dezenas de nações. Uma derrota das Forças Armadas norte-americanas parecia impossível desde a Guerra do Vietnã. Em suma, se houvesse uma guerra, os inimigos dos americanos estariam condenados à aniquilação.

            Porém, à medida que o temor por um enfrentamento direto entre qualquer nação e os Estados Unidos crescia, a tensão a respeito do ódio que muitas nações oprimidas pelos americanos sentiam também aumentava. Norte-coreanos sonhavam com o reerguimento do bloco comunista. Cubanos desejavam o fim do seu embargo comercial. Russos queriam recuperar o posto de potência no campo econômico, político e militar. Japoneses sentiam-se subjugados por chineses e americanos na economia mundial. O Oriente Médio clamava ao mundo para que aceitasse suas diferenças culturais e religiosas. Todas essas nações, e algumas outras, tinham grandes motivações para entrar em conflito com os norte-americanos.

            O clima de tensão que antecedia o conflito também tomou conta do território estadunidense. À medida que a guerra parecia cada vez menos evitável, o governo americano buscou renovar suas alianças com as nações amigas, em especial àquelas da Europa Ocidental e da América Latina. Secretamente, as nações adversárias da Organização do Tratado do Atlântico Norte também se articulavam contra os Estados Unidos. A ONU tentava, em vão, retardar o conflito, buscando a resolução das crises com seus fóruns diplomáticos, chamando os intelectuais de todo o mundo para promover palestras, por vezes gratuitas, que tinham como meta orientar a população mundial sobre como minimizar os efeitos da crise.

            Quando ficou claro que nem os Estados Unidos nem a ONU nem ninguém iriam evitar o confronto, a guerra explodiu: bastou que um dos países do Oriente Médio que era alinhado aos EUA fosse invadido por uma nação vizinha, com o pretexto de obter a soberania sobre as refinarias petrolíferas, para que a Otan retaliasse com brutalidade.

            A nação que invadiu o país vizinho era aliada da Rússia e da China e, vendo-se atacada, não tardou em pedir auxílio. Ao mesmo tempo em que tropas americanas, britânicas, francesas, alemãs, entre outras, desembarcavam no Oriente, forças especiais chinesas, iranianas, sauditas e russas convergiam para as fronteiras dos países árabes, atacando países inimigos e mesmo os neutros pelo caminho.

            O conflito, que começou no Oriente Médio, estendeu-se para a África com a mobilização dos países de maioria islâmica no norte do continente; para o Extremo Oriente, com a intervenção do Japão e de outras nações, que atacaram os dois lados rivais; e para o norte, onde as repúblicas da Federação Russa decidiram pegar em armas para conquistarem sua independência plena, enquanto retardavam o avanço do exército da Rússia em direção ao sul.

            Àquela altura, começavam a ocorrer inúmeros ataques terroristas em vários países, como na Espanha, na Dinamarca e na Suécia. Essas nações, após confirmarem que os terroristas eram de origem árabe, passaram a enviar tropas para o Oriente, algumas indo apoiar os Estados Unidos e seus aliados, outras indo para o lado da Rússia e de seus aliados.

             Países com economias em crise, como Irlanda, Portugal, Itália e Grécia tornaram-se alvos fáceis para os terroristas devido aos levantes populares, às ameaças de deposição dos governantes por meio de golpe e, principalmente, pelo fato de todo o mundo ter voltado suas atuações para o conflito que se estendia do Oriente para o resto do mundo. Assim, as fronteiras europeias também se tornaram instáveis e propícias ao ambiente de guerra.

            Não tardou muito para que as nações apelassem para as armas nucleares.

            Porém, todos os lados temiam usá-las, e sabiam que se atirassem na área do conflito, afetariam suas próprias tropas e seus aliados no processo.

            Então, veio a iniciativa que mudou o rumo da guerra.

            Todas as nações que possuíam reatores nucleares cujas existências eram condenadas pelos norte-americanos mostraram seu verdadeiro poder ofensivo. Rússia, Irã, Coreia do Norte e China, entre outros, lançaram bombas sobre o território dos Estados Unidos e os de seus aliados.

             Por meio da OTAN, os americanos retaliaram à altura, assim como seus aliados, e bombardearam os territórios inimigos de imediato.

            Mas o resultado foi catastrófico.

            Grandes áreas dos Estados Unidos ficaram devastadas, principalmente a Flórida, a região dos Grandes Lagos, e o sudoeste, da Califórnia ao Texas. O México e o Canadá também foram gravemente atingidos.

            Na Europa, a maior parte da Rússia foi pelos ares. Espanha, França, Inglaterra, Alemanha e Itália estavam arruinadas, enquanto as nações atingidas pela crise econômica entraram em colapso. A região norte da Escandinávia havia se tornado um deserto congelado. A Ucrânia parecia ter passado por uma segunda Chernobyl, com uma enorme nuvem de poeira radioativa que atingira as nações vizinhas, se espalhando do Mar Negro ao Mar Báltico. O Velho Continente inteiro estava em ruínas, e mesmo a África e a Ásia não se encontravam em situação muito melhor. Mesmo as nações de economia forte, como Japão, África do Sul, Coreia do Sul, Taiwan e Austrália, estavam arruinadas.

            Na América Latina, as ilhas do Caribe haviam sofrido graves avarias, e a maioria delas, sendo nações miseráveis, acabaram sem recursos de qualquer ordem, e entregues à própria sorte. Os países com problemas políticos, como Bolívia, Colômbia e Venezuela, estavam quase que completamente destruídos. O sul do Brasil e o norte da Argentina, bem como o Paraguai e o Uruguai, pareciam mais áreas pré-desertificadas, devido aos impactos das seguidas bombas lançadas ali. A Amazônia havia sido reduzida a umas reservas altamente protegidas, dada a gravidade das batalhas ocorridas em sua região, do Equador até as Guianas, do litoral caribenho até os limites do Pantanal. As secas da região nordeste do Brasil mataram milhões de pessoas.

            O mundo nunca mais foi o mesmo.

...

...

...

...

            Uma era sombria sucedeu o fim da guerra. Ninguém parecia imaginar algum caminho para a reconstrução do mundo, visto que havia sobrado pouco para ser recuperado.

            Por muitas décadas, o mundo ficou imerso numa era de trevas, com as populações entregues ao acaso e os governos completamente impotentes, sem qualquer previsão otimista de um reerguimento para as nações. Muitos países haviam regredido no tempo e voltavam a apresentar aspectos da Antiguidade ou, em casos extremos, da pré-história.

            Nesse meio tempo, as famílias reais de alguns países começaram a se reestruturar. Os nobres dessas nações se apresentavam como a solução para o colapso do mundo. Era uma geração de novos pensadores e intelectuais, que viram nesse mundo arruinado sua chance de crescer, pois haviam visto como os erros dos governantes anteriores haviam conduzido o planeta à Terceira Guerra Mundial e não tinham intenção de seguir seus passos.

            Rapidamente, as realezas ganharam a confiança da população. Embora a primeira e a segunda geração desses reis já estivessem falecidas ou prestes a falecer quando suas nações começaram a alcançar uma situação estável de reestruturação, seus descendentes, a terceira geração monárquica desses países, souberam dar continuidade ao processo de maneira exemplar. Ainda havia um caminho muito longo a ser percorrido até que a Terra voltasse a ser como era antes da Terceira Guerra, a Guerra Nuclear, mas essas nações estavam dispostas a carregar o fardo do mundo em suas costas, recolonizando e repovoando todos os territórios do globo.

            Os imperadores responsáveis pela reconstrução do mundo eram, atualmente, Daniel, da Alemanha; Gustavo, da Suécia; Matt, da Rússia; Heriberto, da Espanha; Thiago, de Portugal; Aline, da Holanda; Filipe, do Reino Unido; Paulo, da Índia; Marilia, do Japão; Rina, da França; Isabella, da Suíça; Beatrice, da Etiópia; Luke, da Itália; Francisco, do México; Maximiliano, do Brasil; e Marco, da China.

            Porém, os monarcas não conviviam totalmente em paz. As relações entre os países estavam cheias de disputas políticas e econômicas. Era impossível manter a harmonia entre os impérios. Contudo, nunca nenhum dos lados havia cogitado um conflito armado; o trauma da última Grande Guerra ainda estava muito vivo na memória da população mundial.

            Assim, alguns impérios tinham uma situação mais próspera do que os demais e, apesar das diversas reclamações, os demais imperadores nunca esboçaram um movimento contrário a tal situação. Era importante manter a paz mundial, acima de tudo, visto que mesmo os pequenos conflitos internos das nações, fossem elas desenvolvidas, emergentes ou pobres, haviam desaparecido quase que por completo. O mundo gozava de um cenário semi-utópico.

            Os estudiosos mais otimistas afirmavam que a utopia estava próxima de se concretizar para o mundo. Porém, estes eram minoria. A maior parte dos sábios ao redor do mundo sabia que, se os impérios não resolvessem suas divergências, a paz mundial voltaria a ser ameaçada depois de tantas décadas.

            E após aquele fatídico encontro de monarcas em Paris, os intelectuais começaram a acreditar que estavam vendo suas previsões se concretizarem.


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