Entre Otakus escrita por Van Vet


Capítulo 9
Hermione


Notas iniciais do capítulo

Gente, vocês estão lendo?? Não recebo comentários... :'(



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Hermione sentiu-se desanimada por ver o cabeludo desengonçado pela terceira semana seguida. Pediu seus volumes de mangá costumeiros e remexeu na bolsa a procura da carteira, contudo, tentando ganhar tempo e com ele a impetuosidade para perguntar se o ruivo, o tal Rony, não trabalhava mais lá.

Mas porque ela precisava saber disso? Não era apenas chegar e pegar a revista como vinha praticando há meses? Qual a importância de um atendente de balcão em sua vida para se abalar a questionar outra pessoa sobre seu paradeiro? Haveria de ser aquela branda amizade de duas pessoas com gostos em comuns, que ficam trocando suas experiências sobre o dito assunto enquanto acertam as coisas no caixa? Assim, seria natural ela perguntar.

— E o outro rapaz? Saiu daqui?

O cabeludo deveria estar com os sebos do cabelos penetrando pelo cérebro através dos ouvidos, pois ficou muito tempo fitando-a, tentando processar a quem se referia.

— O ruivo de touca... — procurou disfarçar a impaciência.

— Ah, o Rony? — ela anuiu — Nós trocamos de turno, ele quis. Acho que não aparece mais, por enquanto, nesse dia e nesse horário.

— Oh... Diga que falei um “oi”. — a frase saiu desavisada e muito imprudente.

Hermione teve vontade de morder a língua, ainda mais por vê-lo iluminar-se em curiosidade pelo interesse dela.

— Eu... é que nós conversávamos sobre mangás, daí meio que virou costume trocarmos algumas dicas pelo balcão. — quis concertar mal e porcamente.

— Ok, eu dou o recado, mas qual o seu nome? Apenas a garota que falava de mangás com ele?

— Eu sou Hermione. — e penalizou-se internamente, outra vez, por ter levado seu interesse a diante daquele modo...

Como se estivesse interessada no rapaz... Como se fosse efetivamente necessário ter notícias dele. O que aquele cabeludo pensaria de uma moça noiva querendo saber do seu amigo? O que o amigo pensaria dela querendo saber dele próprio? O que Córmaco pensaria de sua noiva querendo saber notícias do cara da banca? E porque, que diabos, ela estava tão desapontada por ele ter mudado seu horário sem parecer se importar se ela vê-lo-ia novamente ou não?

***

Não era muito do agrado de Hermione estar na casa do noivo, porque também era a casa dos pais dele. Certamente o lugar chamava atenção por sua beleza, riqueza e luxo. O conforto era outro destaque da residência, abarrotada de serventes para todo lado, de forma que não se podia espirrar sem que um empregado surgisse munido de uma dúzia de lenços macios, engomados numa bandeja.

A estudante de medicina não ia negar que tudo aquilo lhe encantava, principalmente no início de sua relação com Córmaco. Não seria sincera se fazer de modesta quando pensava o quão prazeroso deveria ser ter alguém para lavar a louça, fazer a comida, arrumar a cama, lavar a roupa, e tantas responsabilidades domésticas essenciais. Por outro lado, a falta de privacidade era perturbadora. A governanta do casarão mancomunava com a Sra. McLaggen para espiar os movimentos de seu filho, de forma a não deixar nada lhe faltar dentro da casa. Assim, Hermione não conseguia deixar de se sentir tão oprimida quanto um funcionário de estado em 1984, de George Orwell*: O grande irmão estava em todo lugar;

Naquela tarde de sábado ambos estavam de folga, de forma que ele a chamara para uma disputada partida de tênis na quadra particular da família.

Hermione era uma boa atleta. Seu corpo magro e leve facilitava a rapidez na captura da bola para definir um rebote, e sua energia acabava apenas depois de algumas partidas extenuantes. Córmaco, em nível de igualdade, tinha o corpo feito para o esporte: alto, forte, músculos ágeis e reflexos primorosos. Parecia um deus de ébano de camiseta polo e short branco, manejando o cabo da raquete do seu lado da quadra. Era loiro de cabelos ondulados, com um queixo quadrado bem masculino e olhos azuis escuros. A loucura, a cobiça de muitas mulheres, inclusive das que se equiparavam a ele em bens fortuitos.

Entretanto, fora a suburbana sem grandes atrativos físicos e financeiros que ele vinha escolhendo para ser sua companheira. Se conheceram numa feira de profissões, quatro anos antes, e desde então estavam juntos.

— Cãibra, Mi. Tenho que parar! — ele ergueu a mão e foi mancando para a cadeira na lateral da quadra.

A morena, muito suada, rebateu a bola na parede, abandonou a raquete e sentou-se ao lado dele embaixo da mesa com guarda sol. Imediatamente a assombração da governanta surgiu com dois sucos cítricos trincando no gelo.

— Você é um molenga. — Hermione brincou, tomando seu suco no canudinho. — Ia perder e inventou uma dorzinha!

— Claro, amor, você está certa. Não vou dormir hoje pensando em como sua raquete quase me subjugou. — sorriu, sarcástico.

Esse era um ponto marcante de Córmaco, seu sarcasmo. Ela apreciava aquele humor negro na grande maioria das vezes, mas quando era para critica-la tinha de admitir detesta-lo, não era o caso ali. Mostrou-lhe a língua manhosamente.

— Nem perguntei, como foi a escolha do bolo ontem? — ele quis saber.

Estava se referindo a mais um dos passeios insuportáveis que teve de fazer com a “tremelique” para escolher o bolo do casamento.

— Muitos doces, muita etiqueta, glicemia* nas alturas e uma esperada insônia — disse naturalmente.

— Minha mãe tá te deixando louca, né?

— Acho que o casamento chega antes da minha sanidade ir embora, então estou confiante. — nunca admitira para Córmaco não gostar de sua mãe, entretanto também nunca falava ao contrário. Gostava de deixar as coisas no ar.

— Mi, você a conhece. Sou filho único, casamento... Isso tá sendo uma terapia pra ela.

Ah, e a “tremelique” tinha um histórico longo em psicólogos.

— Não tô reclamando não. — nem demonstrando satisfação em tanta interferência.

Depois alguns anos junto de uma pessoa é possível conhecê-la sem palavras, e Hermione ficava abismada as vezes, em como Córmaco sabia da sua antipatia a um determinado assunto.

Como um casal se davam muito bem, ainda que de mundo opostos. Ele nunca perderia o jeito mimado e egocêntrico herdado dos pais e Hermione não se adaptava aos costumes aristocratas dos McLaggen com festas de gala, jantares finos e modos falsamente delicados. Contudo, eles iam levando, se equilibrando, se compreendendo, engolindo alguns sapos pelo caminho, mas buscando, sempre buscando, as diferenças diminuírem e a relação continuar a dar certo.

— Eu vou compensar a amolação da minha mãe então! — ele levantou e foi agarra-la.

Os dois continuavam grudados de suor.

— Vai tomar um banho?

— De perfume e te levar pra jantar fora!

— Só não me leve pra comer escargot*, pelo amor de Deus! Aquilo não é jantar...

— Mas Mi, é tão sofisticado! Você tem que se esforçar pra entrar no meu mundo. Em breve será a Sra. McLaggen.

Aquilo mexeu estranho dentro dela.

— Mas você disse que era uma compensação? — chantageou.

— Tá bom, então. Só por hoje comeremos algum lanche gorduroso por aí.


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Notas finais do capítulo

Notas:

*Romance com crítica política e social do autor George Orwell, publicado em 1948. Foi desse livro que surgiu o termo BigBrother, onde os funcionários do governo eram vigiados com câmeras por um suposto líder conhecido como Grande Irmão (ou BigBrother).

*Glicemia: açúcar no sangue.

* Escargot: molusco invertebrado (caracol) utilizado como iguaria em muitos países europeus.



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