Parecia que Gina jamais iria sair da adolescência, foi a conclusão de Harry quando ele entrou um tanto irritado no quarto do amigo. Provavelmente aquela ruivinha meticulosa o destratara depois de ler em algum artigo juvenil sobre táticas evasivas de atrair o pretendente.

Tanto fazia.

Harry sabia que Gina sabia que eles jamais ficariam juntos como um casal. Era inconcebível um “lance” entre os dois pelos óbvios motivos de sempre. E por mais atraente que a garota fosse nada despertava nele. A não ser essa irritação de agora por tê-lo destratado.

— O que tá havendo com a Gina? — Harry entrou com o cenho franzido dentro do quarto.

O santuário do seu amigo não mudara em nada. O quarto de um adulto com aparência completamente adolescente. Pôsteres dos seus desenhos japoneses malucos, pilhas de caixas de jogos de vídeo game amontoadas pela cômoda onde a televisão descansava empoeirada. Prateleiras varrendo quase todas as paredes com centenas de quadrinhos orientais e o armário de porta quebrada vomitando blusas, calças e o que mais estivesse socado sem cuidado ali dentro.

Na cama desarrumada, Rony estava esparramado com o tênis apoiado na colcha para a fúria de sua mãe. Havia pegado sua bola de tênis que servia apenas para rebater contra a parede e capturar na volta.

— O tempo todo ou só hoje? — começou a arremessar a bola com um ar entediado, emendando a observação de Harry.

— É que... — Harry gaguejou — Bem... Deixa pra lá! Sua irmã não vai sair da adolescência nunca. — reforçou pretensiosamente.

— Humrum. Minha esperança é que ela arrume um namorado até o fim do ano agora que entrou no tal curso de dança.

— Curso de dança? — ele relaxou na poltrona próximo a cama.

— Dança flamenca ou algo do tipo. Ela só fala nisso ultimamente. Conhece uns carinhas excêntricos e esquisitos nas aulas e tem um professor dinamarquês pirado. Agora só falta ela se apaixonar por um desses tipos e fazer meus dias de folga menos barulhentos.

— Você não tem medo?

— Do que? — Rony ergue as sobrancelhas, confuso.

— Ah, bem... Esses caras que fazem aula de dança, você sabe o que eles são.

— Tipo o que?

Harry remexeu-se um pouco incomodado no assento. Achou que o amigo captaria rapidamente o que ele tinha insinuado.

—É assim, as mulheres fazem aulas de dança para emagrecerem, manterem a forma, se descobrirem, se sentirem sensuais e essas coisas todas de mulher. Já os caras só existem duas opções: ou eles são gays ou querem tirar uma lasquinha das bobinhas sonhadoras.

— Ah é? — Rony riu com sarcasmo. — Já se escreveu numa aula de dança?

Ele coçou a cabeça e pigarreou.

— Teve aquela vez que os filmes de dança estavam na moda.

— Dirty Dancing?

— Não! Isso era do tempo dos nossos pais!

— Cara, eu tô por fora de filmes de dança, mas conheço alguns mangás...

— Lembra de Dança Comigo? Richard Gere de terno com uma rosa na mão...? Ele e Jennifer Lopes na escola de dança depois do horário de funcionamento?

— Deus! Cadê meu amigo?! — Rony começou a rir a valer.

— Você é o cara mais gozado do mundo, Rony Weasley.

— Engraçado, não gozado! — ergueu o indicador para reiterar a correção. — Pode continuar, não sacaneio mais.

— Só ia dizer que nessa época meu vizinho se inscreveu num curso de dança e transou mais que um coelho num harém cunícula.

— Adorei sua comparação.

Harry relaxou na poltrona.

— Mas não tô com vontade de falar da Gina. A irmã e a responsabilidade é sua, não minha. Como você tá?

— O que tem eu? — Rony voltou a prestar atenção na bolinha que arremessava.

— Sua cara no jantar é um livro aberto pra mim, parceiro, ou esqueceu que tive de aguentar sua companhia por três quartos da minha vida?!

O ruivo olhou de soslaio para seu interrogador e trouxe mais força no arremesso.

— Estou meio irritado comigo, só isso.

Harry teve de forçar para que ele falasse mais. Rony jamais apreciava desabafos íntimos. Um defeito tão grande ao ver do outro rapaz que foi uma parcela muito importante no fim da última relação amorosa dele.

— Deixa eu ver: é a noiva.

— Fico feliz quando você começa do modo mais realista possível.

— Eu achei que você ia evitá-la.

— Eu tentei. — disse num tom mais alto que gostaria. Harry encarou-o curiosamente por cima dos óculos de grau.

— Ah não...

— Ela me abordou no shopping dia desses, em outro horário. Começamos a conversar até que de repente estava convidando-a para irmos numa feira otaku. Achei que ela nem ia aceitar, mas pelo contrário, pediu para que eu tentasse voltar para o turno de antes a fim de marcarmos.

— Ah não...

A bolinha era lançada cada vez mais forte contra a parede.

— Nós ficamos meses trocando ideias sem qualquer tipo de envolvimento. Era só alguém agradável de se conversar naquele tédio. Daí um dia fui infeliz o suficiente para perguntar sobre o que ela estudava e quebrei aquele contato superficial e sadio que tínhamos e...

— Ah não...

— Para de falar isso toda hora! — Rony arremessou a bola para um monte de roupas sujas no canto do quarto e ali ficou.

— Você tá apaixonado pela garota.

— Eu... Não! Posso ter ficado um pouco afim, mas darei um jeito despistar esse clima... e ela. Só não quero ser grosso, ela é uma garota legal.

— Certamente.