Et in Arcadia ego escrita por themuggleriddle


Capítulo 5
In ictu oculi




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No fim das contas, demorou mais do que o esperado para que Tom e Hermione pudessem duelar. Pouco depois da conversa sobre tal assunto, Harry decidiu que seria melhor que eles partissem para outro lugar, já que eles já haviam passado tempo demais parados. A princípio foram parar na Escócia, ao lado de um lago congelado e perdidos no meio de um denso nevoeiro. Eles ficaram por lá por alguns dias, durante os quais Hermione montou guarda, levando consigo a sua bolsinha e não deixando nenhum outro livro, a não ser História da Magia e Hogwarts: Uma História, para que Riddle pudesse ler. Potter ficou mudo durante todo o período em que permaneceram lá. O rapaz ficava sentado na cama, revezando entre observar o medalhão dourado – a horcrux, pelo que Tom havia entendido da conversa dos dois – e lamentar em silêncio pela sua varinha quebrada.

Tom aproveitou o tempo para tentar entender o mundo bruxo. Harry e Hermione tinham convivido com a cultura bruxa por sete anos até então, eles haviam tido uma chance de ver como tudo funcionava enquanto ele tinha que apenas imaginar como tudo devia ser a partir dos livros que Hermione lhe emprestava. História da Magia era uma boa leitura e Riddle achou fascinante a quantidade de eventos bruxos e trouxas que estavam entrelaçados ao longo da história do mundo. Não demorou mais de um dia para que ele terminasse o livro.

“É verdade que as escadas se movem?” perguntou Tom na manhã do segundo dia na Escócia. Potter estava ocupado bebericando uma caneca de chá enquanto Hermione estava lá fora.

“Sim, elas mexem. É meio irritante.”

Aquela havia sido a resposta mais longa que conseguira arrancar de Potter durante aqueles dias, mas Tom ainda dizia para si mesmo que estava melhor do que antes: pelo menos Harry não estava mais sendo completamente hostil com ele.

No terceiro dia eles mudaram outra vez, agora de volta para a Inglaterra. A barraca agora ficava no meio de árvores cobertas de neve e eles podiam ouvir o barulho de água corrente por perto. Tom não gostou desse lugar; ele preferia a Escócia e sua Nevoa e o completo silêncio ao invés daquelas árvores que pareciam os sufocar. Além disso, Hermione parecia mais triste agora.

Riddle já estava convicto de que a garota havia se esquecido do duelo, mas, por alguma razão, não se atrevia a lembrá-la, pelo menos não enquanto ela estava tão melancólica. Ao invés disso, ele se ocupou em praticar magia sem varinha simples e rápida, descobrindo que aquilo era relativamente fácil. Ele já havia conseguido fazer alguns objetos flutuarem, a chama da vela tremular e até mesmo fazer uma pequena onda de choque irradiar pelo próprio cotovelo. O rapaz queria tentar mais coisas, mas tinha medo de fazer algo errado que faria Harry parar de ignorá-lo e começar a acusá-lo de diversas coisas outra vez.

De tempos em tempos, Tom conseguia ouvir os dois amigos conversando sobre coisas que eles de certo não queriam que ele ouvisse. Durante uma noite, depois de ter ido deitar, Harry colocara um feitiço silenciador mal feito ao redor de si e de Hermione e começaram a falar sobre as horcruxes de novo. Mencionaram o medalhão, um anel, um diário, uma taça e uma espada novamente. Infelizmente, o cansaço de Riddle era maior que a sua curiosidade e, depois de conseguir ouvir por alguns minutos graças ao fato de ter conseguido se infiltrar no feitiço de Potter, o rapaz logo caiu no sono.

Depois de um tempo, o bruxo percebeu que não agüentava mais aquele silêncio. Sim, ele gostava da quietude, mas ele queria conversar. Ele queria perguntar à Harry e Hermione como as coisas estavam indo e queria receber respostas decentes. Graças à essa necessidade de comunicação, Tom encontrou as cobras. Na verdade, a cobra. Ele vira a serpente se esgueirando para dentro da barraca e, antes que fosse encontrada, o rapaz a chamou, testando a sua ofidioglossia e se sentindo orgulhoso ao ver que o bichinho o cumprimentou. Eles passavam horas conversando, a cobra enroscada em seu pescoço, sibilando histórias em seus ouvidos. Claro, não era a amizade mais normal, mas pelo menos era melhor do que ser ignorado. Aquilo o lembrava da sua infância no orfanato, apesar de Tom não saber se isso era bom ou ruim.

***

“Da onde veio isso?”

Tom sabia que Hermione estava falando da cobra antes mesmo de chegar no quarto no qual a garota estava. E ele estava certo: a bruxa estava parada ao lado da sua cama, apontando para a cobra verde escura que se enroscava nos cobertores da sua cama. Pela careta no rosto dela, Granger não estava muito feliz.

“Da floresta, é claro.” Ele encolheu os ombros, aproximando-se da cama e pegando a cobra. “Está tudo bem.”

“Você pegou ela?” Hermione cruzou os braços na frente do peito e respirou fundo. “Mesmo depois do que aconteceu em Godric’s Hollow?”

“Ele entrou por conta própria,” ele explicou, colocando a serpente em seus ombros, do jeito que ela gostava de ficar. “O nome dele é Koschei.”

“Você deu nome?” ela perguntou. “E o mesmo nome do bruxo com a horcrux de ovo?”

“Parecia combinar. Estamos caçando horcruxes; por que não dar o nome de um bruxo que criou uma? Aliás, cadê o Potter?”

“Foi dar uma caminhada para olhar os arredores, para ver se não tem ninguém por perto.”

“Claro que não tem. Quem ficaria perambulando pela floresta sem razão?”

“Tem bastante gente que vem aqui acampar,” Hermione explicou, sentando-se na cama e se encostando na parede, antes de puxar os joelhos para abraçá-los. “Eu vinha aqui com os meus pais.”

“Oh?”

“É, a gente já acampou por aqui algumas vezes. É engraçado voltar depois de tanto tempo e vê que está tudo igual... Quero dizer, quase tudo. Eu não sou a mesma.” Ela deu um sorriso triste e Tom aceitou isso como um convite para sentar-se ao lado dela.

“Onde eles estão?”

“Meus pais? Longe,” a garota respondeu e Riddle pôde ver os olhos dela ficarem marejados de lágrimas. “Mas estão a salvo da guerra.”

“Espero que estejam. A última coisa que gostaria de ver é você na minha situação.” Ele sorriu de volta. “Já foi ruim saber que Potter também é órfão.”

Hermione virou o rosto para olhá-lo e Tom aproveitou para observá-la com calma. Os olhos da garota tinham olheiras fundas e escuras os circundando e ela parecia cansada – apesar de que os três pareciam estar em um constante estado de exaustão. O cabelo bagunçado dela também não ajudava: estava preso em uma trança frouxa para tentar disfarçar o fato de que precisava ser lavado, mas vários fios insistiam em escapar do penteado. Enquanto a observava, lembrava-se das várias garotas que já havia visto por Londres: no orfanato, a maioria das meninas tinham um ar tristonho e pobre, mas, quando ele saía para as ruas, era possível ver as moças mais ricas que sempre andavam para lá e para cá com roupas caras, cabelos brilhantes e bem penteados, meias-calças e maquiagem, parecendo bonecas com vida com aqueles cílios enormes, lábios vermelhos e bochechas rosadas. Hermione não se parecia em nada com quais moças naquele momento.

“Foi muito ruim crescer em um orfanato?” perguntou Hermione de repente.

“Bom, depende. Se dormir em camas horríveis, usar roupas de outras pessoas todas comidas por traças, sempre comer comida ruim e ser tratado como pobres miseráveis é algo que você goste, então você iria gostar,” ele falou, nem tentando esconder a agressividade em sua voz. “É uma experiência única. Ainda mais quando tem uma guerra envolvida! Tudo fica mais interessante com uma guerra no meio.”

“Oh Deus, não, desculpa, eu não...” a garota murmurou. “Foi uma pergunta idiota, desculpa.”

“Mas acho que me acostumei com isso. Era a única coisa que eu conhecia, não? Quero dizer, nunca tive noção do que seria ter um lar normal, sabe? Mãe, pai e uma casa,” Tom explicou, sentindo a serpente deslizar pelo seu braço. “Não a machuque.”

“Você realmente não sabe quem são os seus pais?”

“Minha mãe morreu quando eu nasci. Meu pai nunca apareceu. Algumas moças do orfanato achavam que ela devia ser algum tipo de prostituta, porque, de acordo com elas, ninguém se casaria com uma garota como ela.” Ele riu. “A Sra. Cole disse que ela lhes falou que queria que eu parecesse com o meu pai. Ela até deu meu nome igual ao dele.”

“É um nome legal, Tom.”

“Significa ‘gêmeo’, sabia? A Sra. Cole disse que eu não me pareço em nada com a minha mãe, então eu devo ser muito igual ao meu pai. Um gêmeo dele.” Outra risada fraca. “O quão ótimo é ser a cópia de alguém?”

“Ninguém é a cópia exata de outra pessoa. Você pode se parecer com ele, mas aposto que vocês dois são bem únicos.” Hermione apoiou uma mão sobre a dele, olhando rapidamente para a cobra.

“É idiota da minha parte querer conhecê-lo? Meu pai, quero dizer,” ele perguntou, erguendo o rosto para olhar a garota. “Ele nunca veio atrás de mim, talvez nem saiba que eu exista, mas eu sempre tive curiosidade de saber como ele é. Quando eu era pequeno, costumava imaginar que ele viria me pegar no orfanato.” A bruxa franziu o cenho ao ver um sorriso pequeno aparecer nos lábios do outro. “Uma vez eu sonhei com isso. Ele parecia tão real que doeu quando eu acordei e vi que ainda estava no orfanato.”

“Me desculpe...”

“Hermione?”

“Sim?”

“É normal alguém ficar preocupado em ficar sozinho?” ele perguntou. “Certo, muitas pessoas tem medo disso, mas não estou falando de ficar... romanticamente sozinho, sabe?” Tom mordeu o lábio inferior. “A idéia de deixar o orfanato me assusta, por exemplo. Eu não gosto de lá, mas só de pensar em ficar sozinho quando sair de lá me dá muito medo. Eu não vou ter a Sra. Cole, Martha e o Dr. Mazarovsky... Uma vez que eu saia, eu não vou mais estar sob os cuidados deles e eles podem seguir com as suas vidas. Eu vou ser só mais uma criança que deixou o orfanato.”

“Acho que o medo de ficar sozinho é bem comum, Tom.” Ela sorriu para ele. “Não precisa se preocupar com isso.”

“E o medo de ficar sozinho na morte?” ele perguntou. “A Bíblia diz que nós vamos para o Paraíso e encontramos todas as boas almas e anjos, mas às vezes eu fico pensando na possibilidade de a morte ser a apenas... Um enorme buraco negro onde caímos e da onde não conseguimos mais sair. E não tem ninguém lá para nos fazer companhia. Lembro que uma vez visitei o túmulo da minha mãe no Abney Park. ‘Merope Riddle, querida mãe’.” Tom balançou a cabeça, rindo fraco. “Querida mãe. Meio irônico, não? Ela nem viveu o suficiente para amar o filho... De qualquer jeito, é só mais uma lápide entre todas as outras. Ela está lá, sozinha. Não é meio triste?”

“É, mas é assim que as coisas devem ser,” murmurou Hermione, olhando para as próprias mãos. “Você nasce, vive e morre.”

“A não ser que crie uma horcrux,” murmurou Tom, sua voz soando distante.

“Algo que você realmente não quer fazer. Criar uma horcrux envolve não apenas magia negra, mas o pior tipo possível de magia negra, entende?” A garota tremeu de leve e Tom se perguntou se aquilo era o frio ou a menção de tal magia. “Você-Sabe-Quem realmente não queria morrer.”

“Não dá para culpá-lo, não é?” O rapaz inclinou a cabeça para o lado e deu um sorriso amarelo. “Morrer é meio assustador. Parar de existir... Não parece meio injusto? Viver por anos, agüentando toda a merda que a vida joga em você, e um dia você simplesmente... Para de existir.”

“Você não sabe se é isso que ocorre.”

“Claro que não sei. Ninguém sabe, certo? Os mortos não podem voltar e nos dizer como é e cada pessoa pensa que é algo diferente. A Bíblia fala sobre o Céu e o Inferno... Imagine só ficar preso no Inferno? Ainda não sei o que é pior: as punições do Inferno ou ficar sozinho por toda a eternidade,” disse Tom, franzindo o cenho. “Ou talvez o Inferno muda para cada pessoa? De qualquer jeito, é o que a Bíblia e os cristãos dizem, mas às vezes fico pensando se o que somos não está somente aqui.” Ele apontou para a própria têmpora. Nossa personalidade e tudo o que somos. Uma vez que isso aqui é machucado, nós não somos mais nós mesmos. Uma vez que para de funcionar, nós paramos de existir. E se tudo é apenas uma grande massa de células transmitindo informação de uma para a outra... Não há nada lá em cima ou lá embaixo nos esperando depois da morte. Nós simplesmente... Morremos.”

“Acho que a coisa mais assustadora da morte é não sabermos como ela realmente é, hm? Os humanos temem o desconhecido.”

“Exato.”

“Estamos filosofando demais aqui, não acha?” Hermione riu. “E nem é uma boa hora para isso ainda. Essas conversas só surgem de madrugada!”

“Acho que caçar almas faz você ficar meio filosófico em relação a morte.”

“Sim.” A bruxa respirou fundo. “Então você tem medo da morte e da solidão, hm?”

“Do que você tem medo?” ele sorriu de lado.

“De muitas coisas. Tenho medo de perder os meus pais e amigos, de viver em um mundo onde serei vista como algo inferior, de morrer aqui.” Ela parou de falar e riu baixo.

“O que foi?”

“Já leu sobre os bicho-papões?” Ele concordou. “Bom, no nosso terceiro ano nós tivemos que enfrentar um para uma prova de Defesas. O meu se transofrmou na Professora McGonagall me dizendo que eu havia reprovado em todas as matérias. Imagine! Meu maior medo era reprovar!”

O rapaz observou enquanto ela continuava a rir e se permitiu cair na risada também. Era bom, ele pensou, deixar todas as preocupações sumirem por alguns minutos e ficar apenas rindo.

“Como eu era boba,” disse Hermione, suas palavras ainda entrecortadas por risadinhas.

“Não, você era nova. É normal crianças temerem essas coisas.”

“Aposto que você temia coisas diferentes quando tinha treze anos.”

“Hermione?” A bruxa o olhou, a risada finalmente sumindo. “O que acontece se morrermos aqui? Digo, no meio da guerra.”

“Nós não vamos,” ela falou, determinada.

“Depois do incidente da cobra gigante, acho que não é inteligente ignorar essa possibilidade.” Tom deixou um sorriso fraco aparecer em seu rosto. “Sei que não sou seu amigo ou coisa do tipo, mas pode me prometer algo?” Hermione hesitou, antes de concordar com a cabeça. “Se eu morrer, não deixe me enterrarem no Abney Park.”

“O que? Vamos lá, você não vai morrer,” ela falou. “Você está a salvo, acredite. Ninguém sabe que você está aqui.”

“Por enquanto, não? Olha, é só algo que sempre me incomodou. Todas as crianças que morriam no orfanato eram enterradas lá e eu realmente não quero acabar em um túmulo sem nome por lá, como se eu fosse apenas outro órfão qualquer.”

“Certo, nada de Abney Park. Tem algum lugar no qual deseje ser enterrado no caso do impossível acontecer?”

“Não sei. E você?”

“Minha família foi toda enterrada em um cemitério perto da minha casa. Vou acabar lá, provavelmente,” Hermione explicou.

Tom sorriu. Ele não queria pensar sobre o fato de que não tinha idéia de se a sua família – da sua mãe ou do seu pai – tinha um túmulo só deles em algum lugar por aí, então o rapaz apenas deixou os dedos acariciarem as escamas frias da cobra, fazendo-a erguer a cabeça e o olhar com seus olhinhos negros e brilhantes.

“Sabe, você ainda me deve um duelo,” ele murmurou, sorrindo de lado para a menina ao seu lado.

***

Hermione sabia muito bem que não seria prudente duelar com Tom Riddle caso ele soubesse todos os feitiços que ela e Harry sabiam. Por isso mesmo ela propusera o tal duelo, por saber que o conhecimento de Riddle em relação a feitiços ainda era pequeno. Aquilo seria perfeito: ela faria ele praticar magia básica de duelo ao mesmo tempo que testava as próprias habilidades. Claro que um Expelliarmus não era nada perto de um Comensal da Morte, mas praticar os movimentos de duelos já seria bom. A única coisa que não esperava era ver Tom acabando com ela apenas com os feitiços mais simples que havia aprendido até então.

Tom era um duelista por natureza. Ele usava o seu porte pequeno como uma vantagem, correndo de um lugar para o outro e escapando dos feitiços dela sem nem mesmo erguer a varinha. Os movimentos rápidos também eram ótimos para confundi-la: ele fazia os movimentos para um Wingardium Leviosa e, de repente, mudava para um Bombarda. Aparentemente, o garoto também era bom em se proteger com magia. Era quase como se ele conseguisse sentir os feitiços antes de eles o atingirem. Era bem impressionante, na verdade.

Foi apenas depois de alguns minutos que ela conseguiu desarmá-lo. Um bom Expelliarmus silencioso enquanto Riddle se ocupava em rir com mais um movimento para enganá-la fez com que a varinha dele saísse voando para a mão da bruxa. Dessa vez, foi a vez dela de rir da expressão de choque que tomou conta do rosto do garoto enquanto ele olhava para a própria mão vazia.

“Você devia para de se gabar e começar a prestar atenção no oponente!” Gritou Harry, que estava vendo o duelo enquanto ficava sentado na entrada da barraca.

Tom virou-se para olhar Harry e o rosto do bruxo de olhos verdes perdeu qualquer traço do sorriso que antes estivera ali. Hermione preguntou-se o que havia acontecido, mas não demorou para entender. Quando Riddle virou-se para ela, a garota sentiu o estômago gelar: o seu rosto bonito, apesar de cansado, havia perdido qualquer expressão relaxada e agora estava sério demais. Depois de alguns segundos, os olhos dele encontraram a própria varinha nas mãos dela e, em um piscar de olhos, muitas coisas aconteceram.

Primeiro, Tom desapareceu, e seu sumiço foi substituído por um grito vindo de Harry. De repente, Riddle reapareceu, materializando-se logo na frente de Granger como se tivesse acabado de aparatar ali. Foi a vez dela de se assustar e gritar um encantamento, mas aquilo fora inútil, já que seu braço parecia paralisado assim que ela o ergueu para atacá-lo. Hermione sentiu as próprias pernas dobrarem contra a sua vontade ao mesmo tempo que os dedos de suas mãos se abriram, deixando a sua varinha cair no chão. Harry ainda estava gritando e xingando, mas tudo o que ela conseguia fazer era prestar atenção nos olhos de Tom Riddle e como as íris azuis destes pareciam estar se manchando de vermelho, como se alguém tivesse deixado cair gotas de tinta escarlate neles.

Os lábios de Tom se repuxaram em um sorriso torto enquanto ele a olhava; seus longos dedos se enroscaram ao redor de sua varinha, puxando-a da mão da bruxa.

“E eu ganhei, sangu-“ ele murmurou e Hermione sentiu um arrepio correr pela sua coluna ao ouvir a voz dele soar fria e perigosa, antes de ele gemer alto e virar-se para olhar Harry.

“Hey!” O outro garoto tinha uma pequena pedra na mão e a menina só pôde pensar no quão louco seu amigo estava por pensar que poderia derrotar Voldemort com uma pedrinha. O que ele iria fazer? Acertar a cabeça dele? “Sai de perto dela!”

A magia de Riddle ficou mais fraca assim que ele se virou para ir na direção de Harry com a varinha em mãos. A bruxa desvencilhou-se do feitiço que a mantinha presa, seus membros ainda meio travados, e logo encontrou a sua varinha perdida entre as folhas secas no chão da floresta.

***

O barulho do vento frio uivando quase abafava a risada do homem dentro da cela. Uma sombra do que ele havia sido um vez na vida, o velho bruxo parecia mais um esqueleto vivo do que qualquer outra coisa, apesar de que os olhos claros ainda tinham aquele ar de zombaria que ele se lembrava de ver nas fotos do Profeta Diário.

“Tenho certeza de que sabe onde ela está!” disse o velho.

“Diga-me, Grindelwald, diga-me onde está a Varinha das Varinhas!” ele gritou, sua mão pálida agarrando o rosto do outro. “Diga-me se quer continuar vivo!”

O homem explodiu em risadas e ele sentiu a própria magia borbulhar dentro de si. Suas mãos tremiam e ele só queria acabar com a vida daquele tolo o mais rápido possível. Mas ainda precisava dele.

“Então me mate, Voldemort, eu acolho a morte! Mas a minha morte não lhe trará o que deseja... Há tanto que você não entende...”

“Pare de me fazer de bobo, Grindelwald!” Um feitiço vermelho escapou da sua varinha, fazendo o outro bruxo voar para o outro lado da cela. “E me diga onde está!”

“Está com ele, é claro.” Outra risada escapou de Grindelwald enquanto ele se levantava com cuidado. “A Varinha Anciã descansa com o seu último dono, enterrada em seu túmulo.”

“Dumbledore.”

Por um milésimo de segundos, o rosto do velho pareceu expressar algum sofrimento, antes de se acender novamente com um sorriso zombeteiro. E era como se o seu corpo estivesse trabalhando por conta própria: ergueu a mão com a varinha e abriu a boca, chamando a maldição do fundo de si mesmo, sentindo o fluxo da magia passar por todo o seu corpo até escapar pela ponta da varinha na forma de um jato de luz esmeralda que atingiu o outro bruxo no peito.

Mas, até mesmo enquanto olhava para os olhos arregalados e móveis de Grindelwald, as palavras do velho ainda ecoavam em sua mente: há tanto que você não entende...

Há tanto que você não entende.

Há tanto que você...

Há tanto...

“Ouch,” ele gemeu ao sentir uma pontada de dor dentro de sua cabeça. E, aparentemente, ele não era o único com dor, já que ouviu outro gemido perto de si.

“Harry!” Era a voz de Hermione. Ele ouviu passos apressados atravessando o quarto. “Eu disse para fechar a sua mente! E se Você-Sabe-Quem ver onde nós estamos?”

“E daí se isso acontecer? Ele já sabe...!”

“Harry!”

“Você viu ele hoje, Hermione! Pensei que ele iria nos matar!”

Tom abriu os olhos, vendo vários foquinhos de luz dançarem na frente de seu rosto. O garoto gemeu, sentando-se e esfregando os olhos, antes de passar uma mão pelos cabelos para tirá-los da frente do rosto. Depois de alguns segundos, percebeu que Harry e Hermione ficaram em silêncio ao verem que ele acordara.

“O que aconteceu?” Riddle perguntou, sentindo sua garganta muito seca.

Harry o estava olhando com uma expressão raivosa. Ele devia ter feito algo muito ruim... Hermione, por outro lado, o olhava com medo. Espera, ela estava com medo? Dele?

“Seu bastardo! Você tentou nos matar e agora pergunta o que aconteceu!?” Antes que pudesse perceber, Harry já havia se levantado e corrido até ele, seu punho ossudo encontrando a mandíbula de Tom e fazendo a cabeça do garoto ricochetear até bater na parede atrás da cama.

“Que merda é essa!?” Riddle cobriu a própria boca com as mãos, sentindo o gosto de sangue na língua. Ele nem teve tempo de tentar descobrir da onde vinha tanto sangue, pois logo em seguida outro soco encontrou a sua bochecha, as articulações de Harry batendo contra a sua carne com uma força que ele nunca imaginaria que o garoto tivesse.

“Harry Potter!” Tom estava muito ocupado cuspindo sangue para ver Hermione agarrar Harry e o puxar para longe da cama. “Vai lá pra fora! Vai! E me dê esse maldito medalhão!”

Tom tocou os seus dentes com a ponta da língua apenas para sentir um deles meio solto, ainda preso pela gengiva. Os gritos de Potter e Granger pararam e logo Hermione estava na sua frente, uma mão segurando o seu rosto e o fazendo olhar para ela.

“Ele me arrancou um dente,” o garoto gemeu, abrindo a boca quando os dedos da bruxa o forçaram a fazer isso logo depois de engolir sangue para evitar de cuspir e sujar os dois. “Um deles está solto!”

“Não engula, seu idiota,” ela falou, enfiando dois dedos na boca dele. “Fique firme.”

“O qu-?” Ele gritou quando Hermione puxou o dente. “Que infernos foi isso!? Não podia só arrumar com magia?!”

“Eu podia, mas não sei como,” ela falou, abrindo a sua bolsinha e convocando um frasquinho de vidro onde colocou o dente ensangüentado. “E você também mereceu.”

“Você pode, por favor, me dizer o que eu fiz para merecer um soco e um dente a menos?” ele perguntou, engolindo mais sangue.

“Oh, não sei, Tom!” Hermione riu. “Talvez enlouquecido porque perdeu um duelo, me colocando sob algum tipo de magia desconhecida e depois tentado atacar Harry? Se eu não tivesse encontrado a minha varinha a tempo, você teria o matado. Abre a boca. Concrescat.”

Riddle sentiu o sangue parar de fluir, apesar de que o gosto metálico continuava muito presente na sua língua. Hermione suspirou, virando-se para o outro lado e enfiando para dentro do suéter o medalhão que antes estava sendo guardado por Potter.

“Pode me dar aquela poção para dor?” ele perguntou, massageando as têmporas. Os socos de Harry foram o suficiente para piorarem a sua dor de cabeça.

“Acho que você pode agüentar a dor.” Ela se levantou.

“Apenas me dê a maldita poção, Granger!” Tom gritou, vendo a garota pular, assustada, e o olhar com os olhos arregalados. “Pare de agir feito uma criança!”

A bruxa abriu a bolsinha de novo, enfiando a mão ali e tirando um pequeno frasco, jogando-o para o rapaz antes de sacudir a cabeça e sair da barraca. Depois disso, a noite se resumiu à uma coleção de horas sem ninguém dentro da tenda e, apesar de a poção ter ajudado na dor, ela não impediu o seu estômago de se revoltar com todo o sangue engolido. Aquilo era tudo o que ele precisava: ser socado por Harry Potter, perder um dente, ficar vomitando todo o sangue que ele engolira e, no topo de tudo isso, ser ignorado pelas duas criaturas que fizeram ele ficar naquela situação. Simplesmente ótimo.


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Notas finais do capítulo

Mais um. Acho que eu escrevi isso ai mais para colocar para fora a sensação de 1) ter um dente preso apenas pela gengiva, 2) ter o dito dente arrancado do nada e 3) ter o estômago revoltado depois de engolir sangue por causa de um dente arrancado (só que, no meu caso, não foi um soco... ou foi... um soco do chão depois que eu fiz a façanha de desmaiar e dar de cara no chão).