Sabe quando você é muito pequeno, está correndo pela casa, jogando bola e acaba, acidentalmente, quebrando o vaso favorito da sua mãe? Cada segundo depois daquilo parece sufocado pela ansiedade que você sente até que ela chegue em casa.

Rose parecia estar se sentindo muito criança ultimamente, porque era exatamente essa a sensação que tinha. Assim que saíra da Mansão, parecia leve com uma pluma. Sentiu vontade de rir e sim, talvez fosse de nervoso, ao passar pelas pessoas decorando o espaço em que seria o casamento. Mas o importante era que naquele simples momento, algo gritava dentro dela, como se sua vida estivesse começando ali.

Era como se, depois de tanto tempo perdida, ela finalmente estivesse pegando as rédeas da situação. Pela primeira vez em séculos, Rose não se sentia confusa… Ela sabia exatamente o que ela queria, ou melhor, quem ela queria. E, agora, estava disposta a correr todos os riscos que fossem necessários. Aterrorizada, sim, mas ainda disposta.

Deus… Eu cancelei meu casamento horas antes da cerimônia.

Nada poderia parecer mais certo naquele momento, mesmo estando tudo tão errado. Jamais acreditaria que teria essa coragem. Era o tipo de história que se ouvia os outros comentando, e como comentavam, mas jamais pensaria que seria esse tipo de pessoa.

Nada acontece sem um motivo.

Lembrou-se das palavras de Hermione e deixou que lhe trouxesse o conforto que sempre lhe trouxera.

— Motorista - Rose se debruçou no banco da frente do taxi - Você pode fazer uma parada no shopping, antes? Tem algo que eu preciso comprar lá!

[…]

Desnecessário dizer que Scorpius não tinha conseguido dormir depois da discussão que tivera com Rose.

Sentia-se destruído. Mil vezes pior do que qualquer ressaca, daquelas que te deixavam enjoado a cada passo, com a cabeça doendo por horas, com o corpo todo doido e sem qualquer perspectiva de melhora. Porque, por mais horríveis que ressacas pudessem ser, Scorpius sabia que eventualmente elas passariam.

Mas o aperto que sentia no peito, a vontade de chorar e socar tudo que visse pela frente, o estômago se afundando em desespero? Ah, Scorpius sabia que aquilo não desapareceria. E não existia remédio para coração partido.

Ela iria se casar, c-a-s-a-r.

O tipo de compromisso que isso exigia… O tipo de amor. Bom, não para todas as pessoas… Mas, ele sabia, que para Rose era assim.

Talvez ela realmente tenha parado de me amar nesse tempo com Colin… E ela só precisava de um “encerramento”. Foi isso que ontem foi para ela, apenas um ponto final em toda essa história.

Ele suspirou fundo, deixando que as pequenas lágrimas que negaria eternamente ter derramado, se misturassem com a água quente do chuveiro.

Se realmente me amasse, ela não conseguiria casar com ele.

Tudo que conhecia sobre Rose, deixava isso extremamente claro. E o loiro não queria acreditar, não podia, mas havia perdido. Por mais que doesse, era isso que ele tentava se convencer desde que saíra daquele corredor. Toda confiança que Scorpius possuía de que aquilo era apenas medo, se esvaiu. Rose não casaria com outra pessoa apenas por medo de encarar o que sentia. Ninguém faria isso. Não se abre mão de um amor assim e ela teria corrido atrás dele. Mas não correu.

Ainda enrolado na toalha, Scorpius pegou o computador e comprou uma passagem para NY naquela tarde.

Me perdoe Rose… Não sou forte o suficiente para assistir seu casamento.

E ele sabia que estava sendo egoísta em todos os sentidos, mas seria demais para ele. Scorpius não seria capaz.

Já vestido, começou a juntar as poucas coisas que havia tirado da mala. Em menos de vinte minutos já estava tudo pronto e o loiro olhava, sem qualquer saudosismo, o quarto que havia sido seu refúgio nos últimos dias.

Não me leve a mal, mas não sentirei falta.

Scorpius pegou o celular para ligar e pedir um taxi e viu que estava sem bateria. Ótimo. Revirou os olhos.

E batendo a porta atrás de si, com a bagagem em mãos, se encaminhou para o jardim lá fora, se lembrava de ver uma cabine telefônica em algum lugar.

[…]

Sentir-se estúpida estava começando a ser algo frequente na vida de Rose. Não era para menos, afinal ela fez uma série de decisões erradas ultimamente. Bom, não que nada daquilo importasse mais.

Sentia-se estúpida porque Rose achava que cada pessoa que passasse por ela, sabia. Sabia que ela era uma ex-noiva fugitiva que estraga a vida das pessoas. Era ridículo, mas sentia os olhares julgadores. Encarou sua mão direita sem qualquer resquício de ter carregado um anel de noivado ali.

Passou por uma loja de decoração e utensílios de casa.

Quantos presentes nós recebemos no chá de panela que foram dessa loja?

Sacudiu a cabeça em seguida, pois pensar naquilo era tortura e não adiantaria em nada. Lembrou-se então da última vez que estivera numa loja de decoração, ainda em NY.

“— Que tipo de madrinha de honra você acha que eu seria se não te trouxesse numa daquelas enormes lojas de departamento para cuidar daqueles detalhes bestas de casamento?

— Obrigada por fazer isso - ela lhe deu um leve soco no braço - Eu sei, que você acha tudo isso uma bobagem infinita.

— Bobagem? Ah que isso, ninguém consegue se casar sem o jogo de mesa certo para a decoração, o buffet perfeito, o melhor arranjo de flores… São frescuras, Weasley e você sabe bem disso!

Ela não tinha nem palavras para começar a descrever o quão perfeito a composição da mesa estava. Uma toalha branca se estendia pela redonda mesa de madeira, no centro havia uma mescla de delicadas velas vinho e pequenos enfeites pretos com rosas vermelhas, em cada extremidade estavam os jogos de pratos brancos com detalhes finos em prateado seguidos por taças de cristal que eram preenchidas com guardanapos vinhos dobrados junto aos talheres de prata perfeitamente alinhados. Scorpius dava os últimos detalhes na mesa distribuindo algumas pétalas vermelhas.

— Ruiva, se você estiver com a pessoa certa vai ser o melhor dia da sua vida independente dos detalhes. "

Rose odiava que Scorpius sempre estivesse certo. Que o loiro não a ouvisse pensando isso, o ego dele jamais daria descanso depois disso.

Então se tornou mais melancólica do que nunca, porque apenas queria o conforto do abraço dele naquele momento.

Percebendo que estava parada a alguns minutos parada em frente a tal loja de decorações, Rose sentiu a bochecha corar e seguiu seu caminho até que achou exatamente o que estava procurando.

[…]

Se Scorpius não estivesse tão mergulhado em sua própria tristeza ou tão ocupado em sentir pena de si mesmo estaria, nesse exato momento, puto da vida. Havia demorado séculos a mais que o necessário para chegar no aeroporto, um transito infernal.

Sua barriga estava reclamando de tanta fome, então a primeira coisa que fez ao chegar foi procurar um lugar para comer. E aproveitou para colocar o seu maldito celular para carregar já que estava desligado até agora.

O tempo dava todo indício de que ia chover e Scorpius se pegou pensando em como eles fariam com o casamento… seria em espaço aberto, afinal. E, claro, ele poderia pensar que a chuva atrapalharia seu voo, mas não… Ele tinha que pensar nela primeiro.

Talvez fosse inútil tentar esquece-la ou talvez eu fosse apenas muito dramático. Só sabia que o vazio em seu peito era avassalador.

Então seu celular começou a apitar como um louco, provavelmente as mensagens entrando. Não que Scorpius se quer ligasse para elas, mas era melhor do que ficar se torturando mentalmente.

Decidi que não quero mais ser covarde.

Temos uma vida inteira para construir, isso é claro, se você ainda estiver disposto…

Plataforma 9 3/4, 20h. Te espero lá.

— R.W.

E uma passagem havia sido anexada a mensagem.

Scorpius releu uma, duas, três vezes antes de finalmente entender o que aquela mensagem significava. Então disparou correndo, com tanta felicidade explodindo em seu peito que ele sentia-se capaz de voar.

Apenas um único problema. O aeroporto e a estação de trem eram em lados opostos da cidade.

[…]

Rose sentira, claro, a ansiedade o dia inteiro. Aqueles pensamentos acelerados e também as borboletas no estômago. Era óbvio, que queria que as horas passassem.

Mas até que colocasse os pés na plataforma, a ruiva sequer havia pensado na possibilidade dele não aparecer.

E se eu tivesse estragado tudo? E se Scorpius não viesse?

A mão dela coçou, mas se recusou a mandar outra mensagem. Se permitiu, no entanto, entrar na conversa para ver se ele tinha recebido a mensagem. Era pior. Scorpius tinha visualizado, mas não havia respondido.

Seria realmente irônico, não é? Você abandonou o Colin e agora vai ser abandonada também, parece que foi o karma mais rápido do Universo.

Então se sentiu estúpida. Como, com todas as suas paranóias e inseguranças, não havia parado para pensar que Scorpius podia, simplesmente, não aparecer. Largada no banco da estação, Rose se sentiu absurdamente sozinha. E abandonada. Sua mente fez questão de acrescentar.

Passageiros do Trem Noturno para Londres, encaminhem-se para o seu terminal que, dentro de instantes, estará aberto para embarque.

Engolindo em seco, a ruiva colocou sua mochila nas costas e foi andando  até o terminal, determinada a colocar tudo aquilo para trás dela, mesmo que não fizesse idéia de como colar os mil pedaços em que estava se partindo.

[…]

E Scorpius havia xingado muito, tudo e todos. Xingado aquele país, o motorista do táxi, o trânsito infernal e principalmente seu celular idiota que havia acabado a bateria de novo.

Claro, que havia começado a chover e chegar até a estação tinha se tornado muito mais complicado do que normalmente seria. E como se não bastasse o lugar ainda estava completamente lotado, porque além da chuva, era um dos meios de transportes mais utilizados.

O loiro tentou, ao máximo, não esbarrar nas pessoas enquanto corria, mesmo que sua mala torna-se tudo uma missão quase impossível.

Última chamada para o Trem 5972 das 20h com destino a Londres.

Aumentando o passo, suspirou de alívio quando viu o imponente trem negro aparecer em sua visão.  Pode ouvir os motores aquecerem, quando se jogou na primeira porta que apareceu ainda aberta.

[…]

As primeiras lágrimas caíram no segundo que o trem iniciou sua partida. Não podia acreditar. Via as pessoas se tornando cada vez mais distantes, tal como a plataforma que a havia acolhido nas últimas horas.

Ele não veio.

Abraçou seus joelhos e pensou em como queria voltar para a noite passada. Como daria tudo para estar no momento em que escutara a declaração mais linda de sua vida, mais linda até do que aqueles filhinhos românticos que faziam parte da rotina dela.

Eu o amo tanto.

Sua mente parecia, de fato, ser muito masoquista. Porque, de repente, parecia impossível afastar as memórias que transbordavam dentro dela. Seu reflexo na janela, mostrava uma expressão tão doída que sentiu ainda mais vontade de chorar… Os lábios frisados, olhos inchados e marejados, nariz vermelho…

"sabia que você fica linda com o nariz vermelho assim?”

Se se concentrasse o suficiente poderia ouvir a voz dele dizendo aquilo.

"Os olhos verdes dela desceram até o prato dele. Um bolo de chocolate. E algo em seu estômago contorceu, foi mais forte que ela. Discretamente Rose se inclinou para frente e no instante que sua colher tocou o bolo, Scorpius olhou para ela com um sorriso e empurrou o prato para a frente, ajudando-a a pegar um grande pedaço.”

Ela jamais seria capaz de comer uma sobremesa sem lembrar dele e por isso amá-lo era tão difícil. Scorpius estava em tudo, nas pequenas manias, nas brincadeiras, nos seus lugares favoritos, no seu time de basquete, a presença dele parecia sempre inevitável.

“ -Rose Weasley

Scorpius segurou sua mão e lentamente depositou um beijo, a boca fria em contato com a pele quente dela. A ruiva puxou a mão bruscamente.

Sua mão está suada

Ele fechou a cara e estreitou os olhos, abrindo um sorriso logo depois.

E a sua camisola é transparente."

Rose gostaria de poder apagar essa memória, gostaria de pensar que preferiria não ter conhecido Scorpius. Gostaria de acreditar que as coisas teriam sido melhores assim. Mas como poderiam? Scorpius se tornara uma parte tão incrível da vida dela, havia feito que ela se sentisse de formas que jamais imaginaria possível… Não, não teria coragem de apagar uma memoriazinha do loiro sequer, por mais que doesse e machucasse como o inferno.

— Ei, esse lugar está vago?

O coração dela falhou uma batida, talvez duas, antes que sua cabeça pudesse virar em tempo recorde. Sabia que sua mente não lhe traíra assim, reconhecia aquela voz em qualquer lugar.

Foi questão de milésimos de segundo, antes que Rose puxasse-o pela camisa fazendo-o desabar na cadeira ao seu lado, envolvendo-o num abraço apertado.

— Você veio - ela suspirou, mais aliviada do que nunca, aquele perfume tão típico de Scorpius.

— É claro que eu vim - Rose podia estar com o rosto enfiado na curva do pescoço dele, mas sabia que Scorpius havia revirado os olhos - Eu sempre vou aparecer, boba.

Ela desfez o abraço, lhe dando um tapa estalado no braço.

— Você - mais um tapa - Quase me matou de susto, Malfoy! Eu já tava começando a achar que eu virar uma velha solteirona cheia de gatos e reclamando das crianças que entrassem no meu quint…

Mas Scorpius não deixou que ela terminasse, puxou-a para mais um de seus beijos de tirarar o fôlego. A ruiva poderia estar brava, mas não havia nada no mundo que a derretesse mais do que Scorpius Malfoy e apenas um cego não veria isso.

— Eu sei que temos todo o tempo do mundo para brigar - sussurrou com os lábios roçando nos dela - Mas será que podemos começar com as coisas boas?

Rose o beijou novamente, com um meio sorriso marcado nos lábios. E Scorpius se lembrou de como descobrira, a pouco tempo atrás, que sentir o sorriso dela virara uma das suas coisas preferidas no mundo inteiro.

— A sua sorte, Malfoy - ela brincou enquanto mordiscava o lábio inferior dele - É que eu gosto muito dos seus beijos para discordar.

E foi o que bastou para que ele apertasse a mão ao redor da cintura dela e Rose mergulhasse suas mãos nos fios loiros.

O trem mergulhou a todo vapor naquela noite chuvosa, rumo ao destino completamente novo para os dois e o início, do que talvez seria, um belo final a se contar.