– Ele não é o meu pai – sussurrei em meio aos soluços.

– Não podemos negar – disse Raj. A sala parecia mais escura e sombria do que normalmente permanecia. – Veja pelo lado bom, Katharine – ele mordeu o lábio inferior com um pouco de hesitação. – Você encontrou o seu pai.

– Não vejo isso como o lado bom – a secura banal insistia em completar a minha garganta. – Eu quero saber onde está minha mãe, e...

Raj não entendeu. Ponderei lentamente.

– Raj, onde está a sua mãe? – ele pareceu vasculhar sua própria memória. – O que aconteceu com ela?

Ele engoliu seco.

– Eu... Eu não sei – ele deu de ombros.

– Como pode não saber?

– Ora, Katharine, você não sabe onde está Amy, sabe?

– Não, mas... Mas você parece não se importar. É a sua mãe, Raj.

Ele suspirou em um ato demorado.

– Talvez você esteja preocupada demais – disse ele calmamente. – Talvez...

– Talvez o que? – o interrompi. – Nesse momento, ela deve estar mais preocupada do que você.

– Você não entende...

– Entendo perfeitamente o que você quer dizer.

Ele franziu o cenho.

– Entende?

– Não quer se envolver com isso tudo sabendo que pode morrer.

– Não... – por um instante, Raj parou com olhos cerrados. Arqueou as costas e elevou as mãos à cabeça.

– Raj? – mas ele não se movia. – Raj, está tudo bem?

Ele parecia ter uma grave dor de cabeça.

– Raj! – ele abriu os olhos rapidamente com o meu grito. – O que aconteceu?

Ele respirou fundo, se recuperando do ocorrido.

– Nada – disse ele, a voz se encontrava como antes. – Katharine, Victoria quer nos ver na sala de treinamento.

...

Victoria nos esperava com a varinha de luz em mãos, ao lado de Christine. Diana e Jake estavam de pé e eretos.

– O que você quer? – perguntei a Victoria, mas ela não reagiu a minha ignorância.

– Acho que já treinaram o suficiente – disse ela me encarando friamente.

– O que quer dizer com isso? – perguntou Diana saindo da sua posição ereta, porém Jake a fez voltar a esta.

Victoria agarrou em punhos cerrados a varinha dourada. Diana possuía uma rubra, como sangue, Jake, uma verde, Raj, uma azul cintilante, e eu, uma prateada. Era impressionante como cada uma pertencia a alguma área da magia. Peter era para a proteção, porém usada para vários casos. Ainda me pergunto como consegui romper uma prisão de luz como a mesma.

Victoria suspirou com olhos cerrados.

– A ilha de Solaris.

– O que? – Diana parecia pasma. – Você quer que nós... A ilha de Solaris é muito perigosa.

– Pensei que estavam capacitados para isso – disse uma voz sombria e áspera em meio às sombras.

– E estamos – Raj o encarou como se estivesse o convidando para uma luta.

– Não duvido de vocês – disse Richard lentamente, como sempre fazia. – Eu quero as profecias. E não vou parar até encontrá-las.

Um choque percorreu minha mente. As lembranças surgiram como um baque violento. O templo de Lótus fora saqueado, disse o homem da varinha prateada, A pessoa que queria o livro, queria muito, e não iria desistir tão fácil.

– Foi você! – gritei para a surpresa de Richard. – Ladrão!

– Do que está falando sua louca? – ele deu de ombros.

– Foi você quem saqueou o templo. Estava em busca das profecias, não é?

Richard ficou inativo. Os olhos frios e claros fitavam-me intensamente.

– Sim – afirmou ele sem estima. Christine o observava atentamente. – fui eu. E lhe digo uma coisa, Katharine Mayer. Vou continuar a saquear todos os templos. Todos que tiverem a chance de se encontrar o livro de Agatus. Não vou parar, não agora.

Mas... Victoria... Eu vi minha mãe...

– Victoria está com o livro – minhas palavras foram como uma bala de canhão atingindo a moça de cabelos negros.

– O que está dizendo? Não está comigo.

– Como não?Eu vi. Minha mãe o entregou em suas mãos.

Victoria arregalou os olhos azuis, por pouco, não deixou a varinha cair no chão.

– Isso é verdade? – perguntou Richard sem a encarar.

–Não – murmurou ela.

– Eu perguntei...

– Não! Eu não estou com as profecias – gritou Victoria fazendo Richard se enfurecer.

Ele me olhou friamente.

– Aprenda da próxima vez – disse ele. – a não mentir. Vejo que Lucinda não lhe ensinou basicamente nada.

Richard se ausentou praguejando algo. Diana e Jake se entreolharam confusos.

– Tudo bem – suspirou Christine. – A ilha de Solaris não é como a cúpula. Agora tudo é verídico.

– A rainha Solaris não vai com a minha cara – disse Diana com braços cruzados.

– A rainha Solaris praticamente não gosta de ninguém – disse Christine. – Apenas aqueles que a beneficiam. A ilha é um dos lugares mais prováveis de se encontrar as profecias. Solaris esconde mistérios tenebrosos naquela ilha de fogo. Apenas peço que tomem cuidado, a rainha não é muito boa com recepções.

– Entendo como é isso – disse Diana. – E ela nunca vai ser.

– Não queria que fossem – murmurou Christine, fazendo Victoria a encarar seriamente. – É muito perigoso, mas não podemos mudar as coisas.

Victoria se pôs na frente de Christine, murmurando algo em seu ouvido. A mulher de cabelos dourados abaixou a cabeça e assentiu.

– Espero que estejam preparados – disse Victoria se voltando a nós.

– E estamos – se orgulhou Jake.

– Sabe onde é a ilha de Solaris? – perguntou Victoria a Raj, ignorando a altivez de Jake.

Raj balançou a cabeça.

– Não, mas posso chegar até lá – disse ele um pouco enfatizado. – Sabe, eu uso apenas o meu...

– Andem logo – Victoria o interrompeu como sempre havia feito. – Não terão muito tempo.

– Vocês têm apenas um minuto para pegar o que acham que será necessário – disse Christine. – Coragem é um dos elementos.

...

Vestimos as mesmas roupas góticas que usamos na floresta de Alaris, o símbolo de Agatus ainda cintilava nesta. Jake preparou as lâminas e o arco e flecha, Diana com a sua espada prateada, Raj com Ramech e outras varinhas, e eu apenas com Peter.

– Está com medo? – perguntou Raj guardando as varinhas no cinto.

– Acho que sim – ele sorriu. Sorriu como se não houvesse nada. Como se tudo aquilo não existisse. Agatus, Richard, Victoria...

– Eu vou lhe proteger – disse ele. – Ao menos tentar.

– Vamos logo – disse Diana. – Não temos o dia todo.

Olhei para Raj. Respirei fundo sentindo Peter perfurar minha barriga, porém essa dor era um alívio.

...

Victoria e Christine estavam lado a lado enquanto Jake e Diana ainda chegavam à sala de treinamento. Raj parecia nervoso, mas não queria demonstrar isso.

– Raj – disse Christine. – Quando quiser.

Raj assentiu cerrando os punhos. Fechou os olhos em um momento de concentração e disse:

– Fiquem todos juntos – pediu ele. – Por favor.

Diana revirou os olhos e Jake a seguiu. Antes que eu pudesse abrir a boca, um choque percorreu por mim junto a uma tonteira. O mundo havia ficado contorcido e sem cor. Apenas um borrão preto. Não. Não estava desmaiando, era apenas Raj empregando seu poder.

Abri os olhos lentamente. O lugar era uma redoma completamente em chamas. Meus olhos queimavam como minha garganta. Lava rubra desvaía em alguns pontos da ilha flamejante. Um vulcão gigantesco se erguia a minha frente, esvaindo magma fervente.

– A ilha de Solaris – sibilou Jake.

– Isso é praticamente o inferno – disse Diana sacando a espada. Esta brilhava em rubro, refletindo a lava do local.

– Como vamos achar as profecias? – perguntou Raj.

– Apenas se preparem para o ataque – avisou Jake sinistramente armando o arco negro com flechas douradas.

– Mas que...

Gritos estridentes, similares a risadas escarninhas, se misturaram com o som estranho da lava fervente.

– Os soldados de Solaris – praguejou Diana. – Não é possível.

– Esses bichos não morrem – disse Jake acidamente olhando para a tropa flamante. – Tomem cuidado. Não deixem que essas criaturas os toquem.

Saquei Peter quando um integrante do exército de chamas se aproximou de mim. Ele era como um humano, um humano em chamas, feito de magma. Sua boca aberta, em uma expressão de horror, lançava-me um grave temor. Eu queria chorar, correr para o colo da minha mãe, mas isso não era possível naquele momento. Enfrentei os meus medos em um impulso frenético. Peter cortava ao meio todas as tochas humanas que se aproximavam de mim.

Raj lançava todas as varinhas que possuía, era como se seu estoque fosse infinito.

– Katharine – gritou Raj incisando uma das criaturas com um golpe na garganta. – Cuidado!

Girei com Peter em mãos fazendo uma criatura urrar. Alguns destes, não cessavam, caiam mortos, mas levantavam. Jake atirava flechas douradas, fazendo eles se despedaçarem em lava, porém estes, não pereciam.

– Eles não estão morrendo – gritou Diana. – Pragas!

– Eu disse isso antes – praguejou Jake.

Uma luz acendeu em minha mente quando Jake preparava uma das flechas.

– Espere! – ele me encarou com o cenho franzido. – Eu sei o que fazer.

– Não toque no arco – alertou ele em dentes cerrados.

– Mas, Jake... Estou falando sério.

– Eu também...

– Jake! – clamou Diana sendo encurralada pelas tochas ambulantes.

– Droga – outra vez, Jake praguejou, saindo correndo atrás da irmã.

– O que tinha em mente? – perguntou Raj enfrentando um esquadrão de lava.

– Peter.

– O que? – Raj derrubou quase todos de uma vez. Era impressionante como ele fazia isso. – Morram seus... – ele hesitou no que iria falar. – O que você disse?

– Peter, a varinha, ela vai nos ajudar... Apenas preciso do arco de Jake.

– Não sei Katharine – disse ele. – Ele não aceitar isso... Cuidado!

Raj me agarrou com um dos braços e, com o outro, rasgou a face de um monstro de veemência rubra.

– Obrigado – falei tentando recuperar o ar. – Muito obrigado.

– Eu estava lhe devendo – Raj piscou para mim, fazendo-me corar completamente.

– Raj, Katharine! – bradou Jake com Diana nos braços. – Ajudem.

– O que aconteceu? – perguntei, mas fora inútil. O ombro de Diana estava completamente em carne viva. O traje havia sumido naquela região, apenas o símbolo de Agatus estava contornado em sua carne vermelha. Era evidente que um monstro de lava tivesse a tocado. Praticamente, seria em vão perguntar.

– Raj – disse Jake arfando. – Faça um feitiço de cura. Katharine, Você me ajuda.

Diana urrava de dor se contorcendo no chão. Raj se abaixou perto da menina assentindo para Jake. Uma tropa flamejante se erguia das chamas, se aproximando de nós.

– Jake, por favor. Eu tenho uma ideia.

– Diga – sua voz era rígida, mas com um ponto de preocupação com a irmã.

– O arco. Preciso dele.

Jake me encarou nervoso.

– Já disse que...

Sua negação não fora o bastante. Arranquei o arco negro de sua mão, logo sacando Peter.

– Por favor, funcione.

Armei o arco, como vi Jake fazer, apenas não tinha uma flecha, porém, tinha Peter.

– Não! – gritou ele. – O que você vai fazer?

Peter atingiu a tropa em um impacto feroz. As criaturas urraram se ruindo ao chão.

– O que... Como... – Jake ficou inerte. – Por Agatus...

– O que está acontecendo aqui? – perguntou uma voz doce e ardente.

Jake se virou instantaneamente para ver a mulher de cabelos de fogo.

– Rainha Solaris.

– Filho de Agatus – disse a mulher. – O que um grupo de feiticeiros de Agatus iria querer em minha ilha?

Jake engoliu seco.

– Soube que possuí as profecias - disse Jake.

Solaris riu amargamente.

– Vens aqui lutando com a minha tropa em busca de um livro? – as palavras da mulher eram doces e ardis. – Esse não é um comportamento de um filho de Agatus. As profecias não estão comigo. Vocês irão pagar pelos soldados perdidos.

Ela me lançou um olhar tenebroso. Os olhos faiscaram em chamas douradas. Senti meu corpo tontear. Uma ardência encobriu meus olhos, fazendo-me cair de joelhos. Abri os olhos, que faiscaram como os de Solaris. Era tudo diferente. O mundo. Jake. Solaries. Raj e Diana.

– Katharine?– Jake me alertava, mas eu não o ouvia.

Andei sob a lava ardente. Raj me fitava com um olhar espantado enquanto Diana gritava no chão.

– Katharine, o que houve? – perguntou Raj se levantando.

Uma raiva. Uma ira banal pairou em minha mente. Eu quero matá-lo e eu vou matá-lo, eu repetia. Solaris ria mordazmente ao lado de Jake, que permanecia com o olhar assustado e inerte.

– Você causou o caos em minha vida – falei sem conter as palavras. Elas saíam sem que eu pedisse. Eu estava sendo controlada. Isso eu tenho certeza. – Você merece morrer e você vai morrer!

Raj recuou alarmado. A lava se elevava ao meu lado, como os objetos no porão de Victoria. Meus punhos cerrados ardiam.

– Katharine? Por Agatus, o que está fazendo?

– Você não é digno de pronunciar o meu nome! – uma enxurrada de magma se colidiu com o garoto assustado.

– Raj! – gritou Jake. – Você é louca, Solaris. Pare com isso. Pare!

Solaris riu fazendo um gesto de mão.

– Chega – ordenou ela.

Caí com os joelhos no chão. Minha garganta ardia. As faíscas sumiram de meus olhos jundo da raiva por Raj.

– Como pôde? – Jake me ergueu a encarando. – Christine! Ajude-nos!

Ele gritava como um louco para o céu. Raj estava ferido, não havia como voltarmos.

– Não adianta – disse Solaris. – Ela não irá lhe ajudar.

– Por favor, rainha Solaris – implorou Jake, pra a surpresa de todos. – Nos ajude. Eles estão feridos, precisam de...

Um flash o interrompeu. Agora, estávamos outra vez na fortaleza magica de Richard.