Dizer que eu congelei era pouco.

Eu entrei em pânico. E isso nunca acontecia.

Tantas coisas se passavam pela minha cabeça naquele momento que eu não conseguia nem me lembrar do meu nome. E acabei improvisando do jeito mais estúpido que eu poderia.

–AH, olha que céu lindo!- falei forçando uma risada girando meu corpo de forma a chamá-la para longe do mastro. Senti suor escorrer pela minha nuca e eu sabia que Annabeth devia estar me matando mentalmente.

Apate me encarou como se eu fosse idiota. Acima da cabeça dela vi Nico esmurrando a própria cabeça no mastro como se não acreditasse.

–Mas ainda não nos disse... -Annabeth voltou falando mais alto do que o normal, colocando sua melhor expressão de medo.-Qual de nós a Grande mãe precisa?-Ela disse e isso- felizmente- os dois deuses pareceram se esquecer de mim. Suspirei aliviado. Logo depois tampei a boca com as mãos, temendo chamar atenção novamente.

–Ah. -Ela suspirou deliciada. –Os dois mais poderosos. -Disse ela e riu, e pela primeira vez não achei Dolos em lugar algum. Comecei a tremer.

–Então, qual vai ser? Nós podemos ser generosos e deixá-los ter uma morte rápida. -Apate piscou como se fosse a oferta mais generosa a se fazer. Eu sabia que todos tinham os olhos sobre eu e Percy, mas eu tinha que, pelo menos criar uma distração para tirar os outros daqui. O procurei pelos olhos e Percy parecia pensar o mesmo que eu.

–Oh, não. -ela disse e bateu palmas, como se gostasse de nosso impasse. -Um certamente é você, cria de peixe.Mas você- Ela apontou para mim divertida- Sua força é impassível. É uma suíça. Não é tão forte quanto a vida e a morte. -Pisquei algumas vezes e inconscientemente olhei para o mastro. Minhas pernas viraram gelatina quando não encontrei Nico lá.

–Exatamente Jason Grace. -Dolos disse disse movimentando a mão, de pé escorado numa das amuradas. O ar deu uma tremida violenta e a forma de Nico tremulou, como se estivesse ali o tempo todo, com a cabeça pendente para frente como de dormisse. Mas sua mão estava apertada com os nós dos dedos brancos, nada parecido com alguém que está desacordado.

–Nada supera morte. -Apate disse encarando Percy como se divertisse com a cara de babaca que ele fazia e se aproximou de Nico. Tive que usar todo o autocontrole que eu tinha para não correr até ele.

–Mas esse garoto... Ah.-ela inspirou como se o cheiro de enxofre do submundo a agradasse. Coisa que eu não duvidava. -A morte o segue. O toque dele tira vida. -Ela pegou um tufo de cabelo entre os dedos e encarou Percy- E o seu traz vida. Quão irônico isso pode ser?-raspou uma unha na bochecha de Nico e eu fiz menção de avançar, mas alguém me segurou pelo pulso. -Sem dúvida, nossa grande Mãe vai adorar essa combinação. -Acenou com a cabeça fervorosamente, sorrindo feliz.

Pela primeira vez, Annabeth pareceu ficar sem falas. Dessa vez, foi Piper que os enrolou.

–Mas nós somos poderosos, sim. Mas quão melhor poderia ser um sacrifício divino?-perguntou inocente. Não tinha certeza se ela estava usando ou não o charme na voz.

–O que você está insinuando, garota?-perguntou Dolos franzindo a testa, tirando um pouco de sua atenção de Nico.

–Quer dizer, dois semideuses são poderosos, mas e... Dois deuses?-perguntou cautelosa. Annabeth pareceu voltar ao normal e balançou a cabeça fervorosamente, os olhos brilhando de forma calculista.

­Virei minha cabeça para Nico e meio que apaguei a conversa a minha volta. Minhas pernas já não eram suficientes para manter meu peso e eu só não caía porque alguém segurava meu braço para cima. Eu tinha que fazer alguma coisa, qualquer coisa para salvá-lo. Qualquer coisa. Mas nada me ocorria.

E olhar para a sua forma aparentemente desacordada me fazia querer gritar de frustração e chorar de medo. E me bater muito por ficar agindo como uma menininha com medo do escuro. Dentre todas as coisas que aconteciam comigo, perder Nico com certeza seria meu golpe fatal. Eu não podia perdê-lo. Porque qualquer outra coisa que perdêssemos nisso, se ele estivesse comigo, eu conseguiria suportar.

GRACE!

Me sobressaltei e olhei em volta, mas não vi ninguém me encarando. Olhei para cima e continuei sem ver nada. Apertei minhas mãos em um punho e rangi os dentes. Mas antes que eu pudesse amaldiçoar alguma coisa, minha mão estava espetada. Olhei para baixo e aquela maldita planta estava ali. Bufei e quase bati os pés em irritação.

–Dolos, pegue o garoto. Estou cansada disso tudo. -praticamente gritou Apate, me tirando de minha revolta interna. Quando vi os dois deuses encarando Nico, eu simplesmente não pensei antes de tentar novamente me atirar para frente e gritar o mais alto que eu podia.

–Ele nem é um dos sete! Deixe-o! Ele não tem nada a ver com isso! Deixe-o!-gritei num tom descontrolado. Somente agora notei que era Frank que me segurava. Eu sentia os olhos de todos no navio sobre mim, e tinha certeza que se havia alguma duvida para alguém sobre o que eu sentia sobre Nico, Ela tinha acabado naquele momento.

–Oh, que coisa fofa. Ele não é um dos sete, mas é mais poderoso. - Dolos riu como se gostasse de desastres amorosos. Novamente, não me surpreendi.

–Mas Gaia precisa de dois dos sete. Nico não é um deles. Deixe-o ir! Eu tomo o lugar dele!-usei minhas emoções á flor da pele e chamei um raio em nossa direção. O barulho que se seguiu foi profundo e um tanto mais demorado que o normal, parecendo ecoar com minhas emoções agoniadas. Os dois deuses me encararam, parecendo não entender meu desespero, mas depois de um longo tempo, Apate riu e gesticulou com a mão, deixando Nico cair com um baque surdo no chão.

Corri na direção dele e Frank não foi suficiente para me segurar.

Me ajoelhei ao seu lado e levantei seu rosto, mas ele não parecia machucado. Mordi a boca para não gritar em alivio. Coloquei uma mexa atrás da orelha e tenho certeza que alguém falava comigo, mas não prestei atenção. Não até Nico mover uma de suas mãos, que meu corpo facilmente escondia dos deuses e apontar para a rosa e em seguida para sua boca e a minha. Não entendi o que ele dizia até ele puxar discretamente uma das pétalas e arrancá-la. E então fiz uma careta.

Já tinha comido flores antes, e o gosto era terrível. Mas não me opus. Apenas peguei a que ele me estendia e enfiei na boca tentada a engolir sem sentir o gosto, mas ela me lembrou de muito a... Chocolate, madressilva. O gosto de Nico. Franzi a testa e bem quando eu terminava de colocar uma das pétalas sobre sua boca, Dolos me puxou para cima, parecendo ter rido demais.

–Que linda declara... Onde ele arrumou aquilo?-ele perguntou toda a diversão de seu semblante ao encarar a rosa que eu deixei com Nico. Ele até mesmo pareceu empalidecer.

–Comigo. - uma voz sedosa e levemente divertida soou de algum lugar não visível. Olhei em volta e voltei a olhar Nico, que continuava na mesma posição, mas sem a pétala sobre sua boca. Dolos grunhiu como se tivesse levado uma apunhalada nas costas e apertou meu cabelo com mais força antes de me jogar contra a amurada. Tossi algumas vezes antes de conseguir focalizar alguma coisa, e nunca me senti tão feliz na vida ao ver um deus.

–Eros.