No Supermercado escrita por Tynn


Capítulo 1
Capítulo Único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/435576/chapter/1

Era Domingo, 9 horas da manhã, e eu tinha que comprar um açúcar. Engraçado que a pessoa entra no supermercado já olhando para as filas do Caixa. Deve ser para acelerar o consumidor: compre logo antes que a fila aumente ainda mais.

Eu, particularmente, ainda me pergunto o porquê do Caixa de Pequenas Compras. Toda vez que vejo esse bendito caixa, tem uma fila interminável de pessoas irrequietas escondendo o mundo dentro de uma cestinha de compras. Mas não importa, é apenas para comprar um açúcar, segundo Claúdia.

Açúcar, açúcar, açúcar... Onde está você? Passei por algumas prateleiras até encontrar o danado. Pelo visto, só vai faltar mesmo enfrentar a fila enorme. Já me sentia feliz, quando o celular tocou.

– Oi, amor.

– Roberto, está faltando a margarina, queijo prato (é para comprar 10 reais, nem mais nem menos. O que você acha que eu vou comer com pão?). Aproveita e compra o feijão que já está acabando, e 6 polpas daquelas de frutas, bem sortidas...

– Claudinha... Claudinha! - Só então ela parou de falar. - Eu não vou decorar tudo isso, pode falar com calma.

– Faz o seguinte, pega o papel que eu deixei no bolso da sua calça e tem uma caneta no bolso da camisa. - Eu comecei a palpar meus bolsos e percebi que ela estava certa. Quando fez isso? E como? – Pronto! Agora vou repetir tudo de novo. Mas vê se não demora, porque o almoço tem que sair antes das 14 horas, é a hora que mamãe vem para cá. Eu disse que ela viria? É, querido, domingo sempre tem dessas coisas...

E foram preciso mais 47 minutos (sim, o celular registrou) para que ela terminasse de falar. Comentou sobre a queda da vizinha da minha sogra e contou cada detalhe do último episódio de Amor à Vida. Pronto, agora tenho que fazer a feira do mês.

Peguei o carrinho de compras e comecei a colocar tudo nele: uma margarina Deline, de tamanho médio; um pacote de sal sem estar muito duro ou furado, o macarrão para o almoço e... Ué, onde fica a área das bebidas?

– Bem, senhor - O funcionário da loja disse, assim que eu perguntei. Ele tinha os olhos de quem não dormia há 5 dias e os braços finos. - Primeiro você segue em frente, pelo corredor dos salgados, daí você dobra a direita, vai até a rua 15, daí vai encontrar um grande monumento de bis, foram eu e meu colega, Josemiro, que fez. Você dobra a esquerda e segue até a catinga de peixe. Pronto, dá mais 5 passos e chega na área de bebidas. Mais alguma coisa, senhor?

Eu estava zonzo. Apenas sorri e fiz um sinal de legal com as mãos. Aquilo dali parecia mais complicado do que entender A Viagem, aquele filme com Tom Hanks. Resolvi então comprar o sabão em pó, que estava bem na minha cara e não tinha toda essa andança pelo mercado. Me agachei um pouco, o preço do sabão em pó estava minúsculo. Para completar, tinha dezenas de produtos de marcas diferentes misturados, com um único preço para todos. Algo estava errado.

Vi que um rapaz ao lado arrumava os detergentes na prateleira e resolvi perguntar:

– Com licença. Sabe... - Ele automaticamente esticou o braço para o lado, em uma angulação perfeita, mirando com o dedo indicador na máquina que lê código de barras e indica o preço. Seus olhos continuavam fixos nos detergentes e arrumava tudo como um robô maníaco. - Obrigado - eu disse para o vento.

Fui até a máquina e tentei passar o código de barras. Nada. Aquilo dali não estava funcionando, só podia. Girei o sabão para um lado, para o outro, tentei até mesmo aproximar ou afastar o produto, e nada. Quando me dei conta, existiam umas 4 pessoas esperando a vez para ver os produtos. Dei espaço para uma senhorinha passar sua água sanitária na máquina.

"R$ 2,95", apontou a máquina. Como é que é? Aquele produto funcionou e o meu não? Mas deve ser pelo formato, o meu era uma caixa e o dela, uma garrafa. Deve ser isso. Quando me dei conta, todos tinham conseguido ver seus preços com as mais variadas formas, menos eu. Por fim, desisti. Na hora do caixa eu vejo quanto isso custa, quem sabe assim eu não me preocupo se vou precisar ou não vender meus rins para pagar as compras. Ou meu play 3. Não, deixe ele fora disso. Eu sempre achei um exagero ter dois rins mesmo.

Caminhei até a parte de gelados e encontrei o balcão para pedir o queijo.

– Pois não? - Uma senhora perguntou. Ela era redonda, do tipo snorlax-humano. Usava uma daquelas armações para manter o cabelo preso e um sorriso que parecia ter sido tirado de filme de terror.

– Eu vou querer 10 reais de queijo prato, por favor.

– Só isso? - Ela perguntou com a voz anasalada.

– Só.

A mulher virou-se e começou a fatiar o queijo prato em uma maquininha. Todo o seu corpo impediu que eu visse as fatias de queijo caindo. Outro funcionário pediu para eu me afastar e dar vez ao próximo, enquanto esperava. Fiz isso e fui para o lado direito, onde me deparei com os bolos e tortas da loja. Quanta tentação.

– Senhor, deu R$ 26,45. Posso deixar?

Eu olhei incrédulo para ela. A mulher tinha fatiado uma tonelada de queijo com seu sorriso de Chuck.

– Você poderia tirar uma ou duas fatias? - Ou dez?, pensei.

Ela tirou uma fatia, das mais finas, e sorriu.

– Ficou R$ 24,55 senhor.

– Eu pedi 10 reais. - Ela tirou mais uma.

– R$ 22,35, senhor.

– Mas... - Ela deu dois cliques na balança, esperou a máquina liberar a etiqueta com o valor, e colou o preço no saquinho do queijo, já me entregando.

– Próximo!

Se você já foi assaltado um dia, ótimo, eu estava me sentindo da mesma forma. Se não me bastasse, acabei comprando dois brigadeirões que custavam o preço da cara (mas estavam realmente apetiosos)! Procurei então a parte de bebidas e encontrei o refrigerador da coca-cola. Por coincidência, estava ao lado da prateleira com veneno de rato, mas isso não significava nada. Peguei uma garrafa de coca-cola de 2 litros (quem se importa com a saúde?) e coloquei no carrinho cheio de compras. Finalmente, estava tudo lá.

Olhei para a lista de compras improvisada e vi que a maioria dos produtos estava riscado, indicando que já tinha sido comprado. Faltava apenas pagar.

Peguei, como de costume, a fila que andava mais devagar. Isso sempre acontece comigo e sempre acontecerá com qualquer pessoa que for ao mercado. Na fila, uma senhora comentou sobre a vida de todos os seus filhos e netos, enquanto dois rapazes pegava uma revista da Playboy e ficavam dando risadas, tentando ver através do plástico. Foi então que a senhora viu:

– Olha pra isso, essa juventude de hoje em dia... – E assim começou o sermão do “No meu tempo não era assim”.

Quando finalmente chegou perto da minha vez, a atendente olhou para mim e perguntou, como de costume:

– Qual a forma de pagamento, senhor?

– Cartão.

– Do supermercado?

– Exato.

Ela começou a passar as compras e contabilizar o valor total, quando apalpei meu bolso. Cadê a minha carteira? Não estava no bolso da calça, nem na camisa. Não tinha caído, pois eu nunca deixaria isso acontecer. Foi nesse momento que o celular tocou:

– Querido?

– Minha carteira.

– Você deixou aqui... Sabe, eu posso ter tirado quando coloquei o papel e me esquecido de colocar de volta.

– Eu posso?

– Tá bem, eu me esqueci. Mas, me diz, você leva dinheiro fora da carteira, não é?

– Quem é que faz isso?

– Juquinha, da rua de trás. Você nunca ouviu falar nisso? Ele chama de empreendorismo do século XXI, quando o estresse do dia-a-dia faz a memória falhar. Muito útil para essas horas.

– Tchau.

Eu olhei para a atendente, que a essa altura já tinha escutado toda a conversa e olhava para mim com um olhar sério. Parecia que ia pular na minha cabeça a qualquer momento.

– Você tem dinheiro para pagar as contas?

– Ter, eu tenho, só não trouxe. – É hoje que eu morro. Juro que vi algumas veias próximo aos olhos da atendente se dilatarem. – Por favor, não teria como você esperar alguns instantes até eu ir na minha casa e...

– Não! – Ela empurrou todas as minhas compras para o lado e fez sinal para que um garoto de 19 anos começasse a recolher. – Tenha um ótimo dia e volte sempre!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!