Ninguém está pronto para a vida escrita por Kori Hime


Capítulo 10
Ninguém está pronto para: Jantar em família


Notas iniciais do capítulo

Ninguém está pronto para encarar aquela mesa cheia de pessoas querendo te criticar.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/433728/chapter/10

Nico Di Ângelo acreditava que aquela noite seria um divisor de águas em sua vida. Ele estava na cozinha, cortando as cebolas em rodelas conforme Perséfone o orientou. Logo depois, lavou as verduras e legumes que ela usaria e bateu a massa do bolo de amora que seria a sobremesa. Enquanto cozinhava, Perséfone contava mais uma das muitas histórias mitológicas. É claro que suas versões dos fatos eram bastante divergentes, mas não seria Nico o responsável por questionar.

— A verdade é que Ariadne nunca amou de verdade Teseu. — Ela abriu o forno, tirando de lá a assadeira com um cordeiro no ponto. Uma receita que havia aprendido assistindo ao programa Segredos de uma Chef, no Discovery Home & Health. — Ela apenas queria viajar para Atenas da maneira mais segura e confortável, achou que com ele seria perfeito. Mas deu no que deu.

— Você quer que eu corte as cenouras também? — Nico estava de pé ao lado da pia, com um avental amarrado em volta da cintura.

— Sim, querido, por favor. — Ela preparou o molho e a salada. — Está ficando tudo perfeito. E me diga, que horas vai buscar seu namorado?

— Acho que daqui uma hora, ainda está cedo.

— Vai ser um jantar maravilhoso. — Ela enfeitou o cordeiro e pediu para que Nico abrisse uma das garrafas de vinho, serviu então duas taças, mas o rapaz preferiu não beber.

Perséfone não era sempre assim amorosa e solicita, mas a primavera havia terminado e o verão era sempre uma época agradável para o descanso. No entanto, não era muito gentil no outono e inverno.

— Eu não sei se vai ser tão bom assim. A última vez que Percy esteve no mundo inferior...

— Não pense no passado, rapaz. — Ela saboreou mais um gole de vinho. — Agora Perseu faz parte da família. Querendo ou não, vocês são da família.

— Tenho certeza de que meu pai vai fazer alguma coisa para constranger a gente. — Nico escorou as costas na mesa, tirando o avental.

— Eu vou tentar controlar meu marido e minha mãe. Mas você também tem que se controlar. Nada de rebeldia. — Ela sorriu docemente, fazendo Nico pensar se a deusa havia tomado uma dose excessiva de chá com cogumelos e margarida.

— Vou tentar. Mas não posso dizer que o Percy vai se controlar.

Ao crepúsculo, Nico encontrou com Percy na entrada do Mundo Inferior no Central Park. Percy já estava aguardando por ele há alguns minutos, e por isso acabou comprando um saco de pipoca para passar o tempo. Ele jogou o restante da pipoca com manteiga para os pombos.

Antes de entrar no palácio de Hades, Nico parou de frente ao namorado. Ele estava nervoso, Percy notou, mas o que ele não sabia era que Nico Di Ângelo sentia medo de Hades intervir no namoro deles, falando algo sobre aquela história de imortalidade.

— Algum problema? — Percy fez um carinho no rosto de Nico e apertou seu queixo. — Você parece terrivelmente assustado. Mais do que o normal.

— Promete para mim que vai se comportar?

— Como assim? Eu sempre me comporto. Sou um verdadeiro gentleman. — Percy o beijou, mas nem seu beijo pareceu tranquilizá-lo. — Tudo bem, eu prometo. Farei o possível para não entrar em uma discussão com seu pai.

— Meu pai não é o problema. — O rapaz encarou a entrada fantasmagórica do palácio.

Comparando com as últimas experiências de Percy no submundo, aquela era totalmente diferente. Vir no mundo inferior para falar com o pai de seu namorado. Nico o alertou sobre isso. Então, Percy decidiu que seria o genro dos sonhos de qualquer deus do Olimpo.

Assim que eles entraram, Perséfone os recepcionou. Ela vestia uma túnica branca, presa com alfinetes dourados em formatos de flores. Um cinto de fios de ouro e os cabelos trançados com pérolas. Ela sorriu majestosamente. Nico tinha que admitir que a madrasta queria mesmo impressionar.

— Perseu Jackson. — Ela se aproximou abrindo os braços. — É uma felicidade tê-lo conosco.

Nico queria pedir para ela não exagerar muito, mas já era tarde.

— Boa noite, Senhora. — Percy fez uma leve reverência, entrando no clima. — Não me recordava de que era tão bonita.

— Oh! Gentileza sua.

— Claro que da última vez que estive aqui, só tentava sobreviver e... Ai! — Nico deu um cutucão nele. — E então, que bonita a decoração...

Perséfone grudou no braço de Percy e o levou para um breve passeio pelo palácio. Eles viram quadros de guerra e jardins floridos. Vasos antigos, estátuas nuas em posições desconfortáveis para se ver ao lado de uma madrasta, mas aquela não era uma madrasta qualquer. Perséfone era tão linda que poderia tirar a concentração de qualquer pessoa.

E por fim, eles chegaram à biblioteca, ao qual estava tão silenciosa quanto uma das cavernas que Nico levou Percy para um daqueles passeios românticos.

A lareira estava acesa, o que agradou e muito Percy, ele estava sentindo frio, bastante frio.

Sentado numa poltrona, com o Guia de TV em mãos, estava Hades. Ele usava um terno elegante e óculos de leitura. Assim que Nico pigarreou, o deus do mundo inferior ergueu seus olhos e tirou os óculos. O Guia de TV desapareceu em uma pequena explosão, caindo as cinzas no chão.

— Eu não acredito que eles cancelaram a minha série. — reclamou o deus.

— Vão umas ficam outras. — Perséfone lamentou, tentando consolar o marido com um beijo na testa. — Fiquei assim com o final de Beverly Hills, 90210.

— É, nem me fala. Eu não consegui terminar de ler os livros, mas vi os filmes de Harry Potter. E vou dizer uma coisa... — Percy deu uma volta pela sala, analisando a estante de livros, parecia infinita. — Se o Fred morreu mesmo, vou ficar muito bravo. Eles eram geniais.

— Já disse para ler o livro. — Nico falou, antes que a discussão sobre os gêmeos Weasley iniciasse e acabasse com a noite, já que o personagem favorito de Nico era o Remus Lupin.

Bem, a conversa acabou fora de curso, eu sei. Nico não sabia exatamente como começar a conversa, por isso Percy quebrou o gelo.

— Como vai senhor. Muito trabalho aqui embaixo?

— Sabe como são os negócios, às vezes está tudo parado e de repente, um tsunami ou tornado acontece lá em cima. — Hades mexeu os ombros e balançou os braços.

— Meu esposo anda bastante atarefado, depois daquela profecia. — Perséfone estava ao lado da poltrona de Hades, sorridente como uma flor recém desabrochada.

— Imagino. — Percy deu um sorriso nervoso. — Eu ainda não me recuperei da queda no tártaro, sabe. Sinto uma dor nas costas ainda que... — Percy parou de falar porque Nico fazia uma cara de pânico. Ok, era melhor ele não abusar da sorte.

Por sorte, ou azar, a deusa da agricultura apareceu na sala carregando uma cesta de alfaces e agrião. Ela usava um grande chapéu de palha e seu vestido amarelo estava sujos de terra, assim como suas sandálias de tiras.

— Eu não pensei que aquela estufa fosse mesmo uma boa ideia no começo, mas devo dizer que está me saindo melhor do que a encomenda. — Deméter notou que estavam todos olhando para sua cesta, então, com um movimento de mãos, a cesta sumiu, o vestido sujo foi trocado por um vestido verde e seus longos cabelos castanhos, trançados com fitas de palha e uma coroa de papoulas.

— Mamãe, lembra-se de Perseu, filho de uma mortal?

— Sim, sim. A criança de Poseidon. — Deméter olhou-o com o queixo erguido e Percy fez uma breve reverência, capturando a atenção da deusa. — Vejamos. Ele até que não é tão magrelo e esquisito como o filho de seu marido. Mas ainda lhe falta postura meu rapaz. Você não vai a lugar nenhum vestindo essas roupas horríveis.

Percy olhou para suas roupas. Vestia uma calça jeans, sapatos e camisa social com a jaqueta de couro que Nico lhe deu de presente de aniversário. Nico balançou a cabeça, dizendo que ele estava muito bonito.

Sentados à mesa, o grupo parecia mesmo uma família feliz em um jantar especial. Mas todo o clima familiar durou pouco. Deméter não parava de falar, o problema era que ela fazia milhões de elogios à Zeus entre outros deuses. Dando para Perséfone uma lista de quem ela poderia ter se casado e sido muito feliz.

— Você não precisa fazer as mesmas escolhas erradas que seu pai, menino. — Ela falou olhando para Nico, que estava sentado do outro lado da mesa com Percy. — Um filho de Hades pode ter tudo o que desejar aos seus pés.

Percy engoliu um, dois, três sapos ou mais naquela noite. Perséfone então mudou de assunto, antes que seu jantar fosse por água abaixo no Tártaro.

— Nico me contou que você possui uma cafeteria. — A deusa limpou os lábios avermelhados no guardanapo, mais por bons modos, já que sua boca estava limpíssima. E o batom manteve-se intacto.

— Sim, em breve terei que contratar mais mão de obra, já que minha mãe não está dando conta só com a gente. — Percy pareceu mais animado falando sobre culinária com Perséfone, que prometeu passar a receita de seu cupcake de margaridas e ambrósia. Percy Jackson não sabia que gosto teria aquela mistura, mas parecia legal da parte dela se oferecer para ajudar.

— Soube que o filho de Hefesto é um grande inventor. — Estava demorando para Deméter se intrometer na conversa.

Percy a respondeu.

— Todos eles são grandes inventores. Leo é meu amigo, nós trabalhamos juntos, ele também é amigo do Nico. Soube que passaram uma tarde inteira procurando um presente para meu aniversário. — Percy olhou para Nico e sorriu, segurando a sua mão. — Não sou um cara sortudo?

— Deixe eles Deméter. Um caso de crianças apaixonadas, todos nós já tivemos essa fase.

Hades finalmente deu o seu parecer sobre o caso, e ninguém gostou. Digo, Nico e Percy.

— Pai, você prometeu. — Di Ângelo pegou a taça de água fria e bebeu em um gole. Ele estava um pouco (muito) nervoso com o andamento daquela conversa.

— Não, não. Tudo bem. — Percy acariciou a mão do namorado sobre a mesa. — A minha mãe também estava preocupada sobre esse nosso caso. E eu garanti que não era uma brincadeira. É pra valer. Ou eu não estaria aqui, no inferno jantando com todos vocês. — Percy ergueu a taça e propôs um brinde a saúde imortal dos deuses, fazendo uma oferenda para seu pai, Ártemis e claro, para Héstia. Deuses ao qual Percy possuía simpatia e respeito. O que não pegou muito bem, porque havia três deuses na mesa e não receberam nenhuma oferenda dele.

— Você é mesmo filho do seu pai. — Hades comentou, com sua taça de vinho em mãos.

— Não é a primeira vez que ouço isso, senhor. — Percy terminou a bebida e limpou a boca com o guardanapo. — Minha mãe tem um grande problema em vê-lo através dos meus olhos. Às vezes é legal, mas não quando meu Paul está junto. O que eu posso fazer? Todos temos que conviver com isso.

— É como ver Poseidon à mesa. — Hades resmungou, mas com um sorriso cínico nos lábios. — Meu irmão é muito espirituoso. Eu não esperava que nossos filhos se encontrassem novamente...

— Eu não entendi, senhor.

— É um assunto para mais tarde. Então me diga rapaz, não é uma brincadeira?

— Não, senhor. Eu jamais brincaria com um sentimento desse. Ele é muito perigoso, afinal, eu estou na mira da deusa do amor. E já descobri de maneiras trágicas que ela não brinca em serviço. As últimas experiências foram bem marcantes.

— Ótimo. Então se é assim, vocês têm minha benção. — Hades bebeu o vinho.

Depois de ouvir as palavras do pai, Nico conseguiu respirar com mais facilidade.

Percy sobreviveu aquele jantar, não graças a Deméter, que fez questão de ressaltar as qualidades de outros tanto deuses menores. Ele só não entendeu o que Nico tinha com eles.

Após a sobremesa, e de comerem o bolo de Amora preparado por Nico, eles foram para a sala de TV, estava na hora da semifinal do Greek Next Top Model.

— Que tal conhecer meu quarto? — Nico sussurrou ao pé do ouvido do namorado que estava muito interessado na eliminação de umas das gregas do programa. Mas depois do convite, ele ignorou de vez a nereida Calyce de biquíni na televisão.

O castelo tenebroso de Hades não era assim tão tenebroso depois que você passava pela sala de massagem, sala de jogos, corredores e mezaninos com muita arte. Quadros, esculturas, invenções antigas entre outras curiosidades.

Percy encontrou até mesmo uma sala de música. Hades curtia bateria, guitarra, teclados e vários outros instrumentos musicais que o filho de Poseidon nunca havia visto na vida. A porta do quarto de Nico era de metal, Percy fez até uma piadinha falando que ele dormia no cofre de Hades. Mas a piada não causou nenhum efeito. Nico entrou primeiro e depois Percy.

— Ufa! Por um momento achei que você morasse em uma cela no porão. Não em um quarto tão legal.

— Vou levar isso como um elogio, porque fui eu quem decorou o quarto.

O lugar era grande, talvez quase do tamanho do apartamento que Percy morava com sua família.

— Me esclareça uma coisa. Com uma cama desse tamanho porque a gente se espreme na minha pequena?

Percy saltou na cama e deu uma cambalhota, caindo sentado do outro lado, pegou um porta-retratos. A fotografia de Bianca e Nico quando eram pequenos, e uma mulher elegante entre eles, Percy sabia que era Maria Di Ângelo, porque já sonhara com ela.

Estranho, sonhar com a sogra.

Uma das paredes era completamente forrada por fotografias de todos os gêneros. Desde paisagens simples do deserto, lagos congelados, mortos saindo das tumbas, almas penadas e outras coisas muito estranhas ao qual Percy teve a felicidade de não ter visto quando caiu no Tártaro.

— Você que tirou todas essas fotos?

— Sim. — Nico fechou a porta, e sim, parecia a porta de um cofre. — Sabe que eu tenho problemas de sono. Então, às vezes, viajo pelo mundo e tiro fotografias.

Inclusive Percy encontrou naquela parede muitas fotografias dele deitado na cama e sem roupa.

— Você é um tarado. — Ele comentou e Nico ignorou-o, porque nem eram fotos muito escandalosas. — Já pensou em mostrar essas fotos para a Rachel? Ela pode convencer o pai dela expor na galeria Dare.

— Não acho que sejam fotos para expor em uma galeria. Pelo menos não as suas de cueca. Embora eu pudesse ganhar uma grana se vendesse para os irmãos Stoll.

— Você ficaria rico se vendesse minhas fotos pelado. — Percy riu, sem falsa modéstia, depois pegou uma das fotografias da parede. — Isso aqui é o monstro do Lago Ness?

— Pode ser. — Nico pegou a fotografia das mãos dele e colocou-a no lugar. — Não quero parecer bobo na frente dos outros. Eu não tenho um bom talento.

— Você é mais talentoso do que imagina, meu príncipe do mundo inferior. — Percy o abraçou, apoiando o queixo em seu ombro. Nico apenas não tinha mais forças para pedir que ele não o chamasse de príncipe. Era constrangedor, mesmo que fosse brincadeira. Já havia dito para ele parar de inventar apelidos de casais. — Veja, você é incrível. Todas essas fotografias maravilhosas. — Ele beijou Nico no pescoço. — Eu estou orgulhoso de você.

— Está mesmo? — Nico segurou as mãos de Percy, virou para poder olhar no fundo daqueles olhos verdes.

— Sim. — Percy ganhou um beijinho de consolação. — Vamos lá, você pode fazer melhor do que isso.

— Claro, claro que posso. — Ele levou os braços para cima dos ombros de Percy, então se beijaram, Nico os conduziu para a cama.

— Espera. — Percy rompeu o beijo, fazendo uma expressão questionadora. — Tem algo errado.

— O que foi?

— Você geralmente não gosta de fazer isso na casa dos meus pais, mas aqui está liberado? As coisas no mundo inferior são mais liberais? Curti.

Nico deu um longo suspiro.

— Digamos que o antirruído do meu quarto é muito mais eficaz que as paredes do seu apartamento.

— Certo, gostei disso Sr. Eficaz. — Percy tirou a jaqueta que vestia, deixando-a sobre uma poltrona. — Que tal me mostrar até onde esse antirruído é eficaz?

Percy havia dado uma olhadinha rápida na escrivaninha, com uma máquina de datilografia e alguns cadernos. Além da câmera fotográfica que deveria ter uns cinquenta anos ou mais.

— Essa câmera foi da minha mãe. — Nico pegou a câmera em cima da mesa. E tirou a capa de proteção da lente, mexendo na trava e tirando uma fotografia de Percy.

— Eu nunca vi uma dessas pessoalmente. Tira outra foto? Agora uma minha na sua cama. — Ele deu uma piscadela, enquanto tirava a camisa. — O que foi? Só tira fotos minha quando estou dormindo?

— Não. Mas eu gosto quando você está tranquilo, parece imerso em um sonho bom. Eu capto esse momento. É um pouco invejável.

— É? Mas eu tenho algo melhor para você captar.

— Você é muito pervertido. — Nico posicionou a câmera para tirar uma fotografia de Percy, que estava sentado na cama e rindo.

— A culpa não é minha. — Percy Jackson deixou a cama e pegou a câmera. — Você fala tão bem das minhas habilidades que eu fui induzido a acreditar. Agora quero uma foto sua.

— Não. Eu não sou fotogênico. — Nico tentou fugir, mas Percy o encurralou no canto da parede, ao lado da estante de livros.

— Mostra um sorriso bem demoníaco e cruel. — Percy tentou puxar a camisa de Nico, mas não conseguiu arrancá-la. — Eu não vou desistir Sr. Eficaz.

Eles caíram na cama, Percy não desistiu mesmo, mas ele adiou para depois as fotografias. Ele estava sobre Nico, segurando as mãos dele em cima dos travesseiros.

— O que é que você vê em mim? — Nico perguntou com um olhar disperso.

— Eu vejo tudo. — Percy o beijou levemente no nariz. — Eu vejo a minha outra metade, como em um espelho. — Beijou-o na testa também.

— Maldito seja você Perseu Jackson. — Nico fechou os olhos. — Porque você é tudo o que eu realmente sonhei?

— E desde quando isso é ruim?

— Porque... — Nico aninhou-se nos braços do namorado. — Porque eu tenho medo.

— Medo? Eu também tenho. Mas sem medo... tudo seria fácil demais. Não? E coisas fáceis, não são para meio-sangue. — Percy afastou as pernas de Nico, ajeitando-se numa posição mais confortável. — Não daríamos tanto valor ao que temos se tudo fosse fácil.

— Mas porque precisa ser tão difícil?

— As recompensas, pense nas recompensas. — Percy ergueu a camisa do namorado e tirou-a sem problemas. Ele acariciou as cicatrizes de queimadura no peito de Nico, que virou o rosto a contragosto. — Não precisa ficar com vergonha disso, eu já falei.

— Eu não gosto, já disse. — Nico se esforçou para não tirar as mãos de Percy sobre seu peito.

— Não tem motivos para isso. Essas marcas apenas mostram que você é um herói.

— Sim, um que se queimou feio. — Ele girou na cama, infelizmente quebrou o clima.

— Você salvou a vida de sua irmã Hazel. Não foi um bom motivo? — Percy o abraçou, beijando seu ombro. — E tem mais uma coisa...

— O que é? — Nico perguntou baixinho, sentindo a respiração quente de Percy em sua pele.

— Dá um tesão essas marcas.

— Para de brincadeira. — Nico bateu na mão de Percy que escorregava sobre seu peito.

— Tô falando sério. Eu gosto, te deixa com cara de bad boy. Sabe? Como se fosse aqueles caras de gangues e vive se metendo em brigas no metrô. Vai até o hospital todo arrebentado.

— Eu, bad boy? E onde você entra nessa fantasia?

— Eu sou o médico que vai te dar os pontos. — Percy não se deixou vencer, ele ainda acariciava as cicatrizes no peito de Nico. — Já levou pontos? A agulha entra na carne e você se sente uma meia furada sendo costurada pela mãe.

— É um pouco doentia essa sua fantasia. Não?

— Eu ainda não terminei. — Ele mordiscou a orelha de Nico. — Depois eu te dou uma carona, mas você fala que não tem para onde ir, então eu te levo para a minha cobertura. Ah! Sou rico nessa fantasia. Então, te ofereço algo para beber e você aceita uma coca cola.

— Quando é que você tem tempo para fantasiar essas coisas?

— Geralmente no banho. Deixa eu continuar?

— Claro.

— Daí, enquanto você está na sala bebendo a Coca, eu vou até meu quarto tirar o paletó e quando volto, você esta sem roupa no sofá.

— Isso não é muito repentino? — Nico girou o corpo na cama, olhando diretamente nos olhos de Percy. Ele gostava, e muito, dessas conversas na cama, gostaria de passar mais tempo assim com o namorado. Mas não poderia exigir que ele ficasse muito tempo no mundo inferior. Da mesma forma que ele não ficaria lá na casa dos pais de Percy, ou em um motel de três estrelas.

— Eu tenho somente quinze minutos de banho, não posso me dar ao luxo de pensar em todos os detalhes.

Nico riu, o que deixou Percy satisfeito.

— E depois, o que acontece? — Os cabelos escuros de Nico estavam espalhados pelo travesseiro. Ele fechou os olhos porque a voz de Percy era o suficiente para embalar seus pensamentos para um outro mundo.

— Essa é a melhor parte. — Percy acariciou os finos fios de cabelo de Nico, enrolando uma mecha em seu dedo. Beijo-o levemente nos lábios. — Mas eu prefiro mostrar ao invés de falar, se não se importa.

Nico deu um amplo sorriso, ainda que de olhos fechados, podia imaginar a cara atrevida de Percy. E logo depois, sentiu um arrepio percorrer seu corpo. Os beijos de Percy sobre seu peito, passando a língua sobre a cicatriz e descendo por seu abdome. Apesar de confiar plenamente no namorado, ainda assim, Nico possuía uma insegurança normal para sua idade. Tudo bem que ele já havia passado do cinquenta, mas olha só, é um jovem ainda com problemas reais. Mas havia uma única pessoa capaz de fazê-lo se sentir mais forte e, porque não dizer mais, desejado e bonito.

Não basta dizer que é normal sentir isso, é só uma fase. Ele está vivendo aquilo, e consequentemente faz mal.

Ele não notou que seu corpo estava todo enrijecido e seus olhos apertados com força. Percy o abraçou fazendo-o sentar na cama. Olhou em seus olhos negros e deu o melhor sorriso ao dizer que estava tudo bem.

— Me desculpe, eu não... — Nico passou as mãos nos cabelos.

— Não tem o que se desculpar. Eu só preciso saber se está mesmo tudo bem com você.

— Está, está sim. — Nico Di Ângelo queria contornar a situação, Percy estava pela primeira vez ali em seu quarto, o que ele pensava? Não ia ter uma crise existencial logo agora.

— Está tudo bem. Não precisa fazer se não quiser.

— Mas eu quero, quero mesmo. — Nico o beijou, jogando seus braços no pescoço do rapaz. Percy desequilibrou-se, estava sentado sobre as pernas, caiu para trás.

— Que tal se a gente começar tudo de novo? Eu queria saber mais sobre esse lugar, como funcionam as coisas. Você é tipo uma celebridade né?

Nico suspirou.

Assim era Perseu Jackson. Sempre sabendo o que fazer quando ele estava mal. Os dois deitaram na cama, e Nico sentiu os braços quentes e fortes de seu namorado em volta de seu corpo.

— Mais ou menos, eu não sou tão popular como certos filhos de Hades...

— Tem mais? Depois me apresenta?

— Não sei se vai gostar deles, a maioria são megalomaníacos e tentaram de alguma forma destruir a Terra, ou parte dela.

— Certo, então minha cunhadinha Hazel ainda é a única apresentável?

— Por aí. — Nico aconchegou-se nos braços de Percy e em poucos minutos, ele dormiu.

Percy sentia-se mal por Nico ter aquela dificuldade em dormir, mas às vezes ele conseguia relaxar em seus braços e descansar. O problema era que ele, Perseu Jackson, não poderia ir todas as noites no mundo inferior para dormirem juntos, muito menos Nico ir para a casa de seus pais em Nova Iorque. Então aquele peso da culpa o incomodava.

Aproveitou um minutinho que Nico virou-se na cama, soltando-o do abraço apertado, para se levantar. Vestiu a calça, sem nem se dar ao trabalho de fechar o zíper e abotoar. Ele deu uma olhada melhor nos livros da estante. Os títulos de jogos de videogame. Alguns ainda na embalagem. Percy também encontrou as cartas de Mitomagia. Ele sentou na poltrona e abriu um dos cadernos sobre a mesa.

Veja bem, ele não queria ser um intrometido fuçando nos pertences pessoais do namorado, foi mais uma coisa sem pensar. Nem estava prestando atenção no que foi escrito no caderno, apenas os desenhos de Nico e eram muito bons.

O que chamou a atenção de Percy, foi uma fotografia dele próprio colado no caderno. Aquela foto foi tirada no acampamento, na época em que ele conheceu Nico, até mesmo Bianca era viva, porque ela estava ali no cantinho da foto.

A letra de Nico era bem estranha e corrida, Percy não entendia muito bem porque ele misturava inglês, italiano e grego. Deu um nó na cabeça do rapaz. Apenas algumas palavras soltas Percy compreendeu.

“Estranho” “É ele” “Sentimento” “Medo” “Dor” “Porque?” “Amor”

Percy poderia ter parado por aí. Afinal, a intimidade do namorado deve ser respeitada.

Mas você fecharia o caderno e voltaria a dormir?

Eu também não. Vamos lá Perseu.

Percy olhou para Nico, adormecido na cama, ele parecia tranquilo. Não foi fácil tomar essa decisão (mentira), mas ele abriu o caderno novamente e começou a folear as páginas. Muitos textos em italiano. Poucos em inglês. Mas sempre que ele achava um, tentava ler e interpretar usando seu celular, graças a internet 2.0 para semideuses e um aplicativo de tradução, Percy leu uns trechos completo do texto em italiano.

A data combinava com a época em que Nico havia desaparecido do acampamento após Bianca morrer. No texto, Nico estava sofrendo com a perda da irmã, mas também com raiva de seus sentimentos pelo filho de Poseidon.

Ler o desabafo de Nico naquelas páginas não fez Percy se sentir melhor. Ele avançou as páginas para uma data mais atual. Uma outra fotografia, dessa vez Percy se lembrava muito bem daquele momento. Foi Rachel quem tirou a foto, Nico e Percy estavam no acampamento, de frente ao chalé de Hades. (Não sei se é o momento, mas graças aos dois, Sr. D. estipulou um horário de visitas permitidas em outros chalés. Sabe, nada de namorar nos Chalés.)

Percy sorriu com a lembrança daquele dia, mas ler o que Nico escreveu não foi agradável. Nico dizia-se feliz por tudo o que acontecia, mas se soubesse que sua felicidade traria mais rejeição das pessoas, ele não saberia se fora a escolha certa.

Espera. Rejeição? Que tipo de rejeição era essa?

Ah! Percy Jackson, você pouco sabe do que se passa ao seu redor.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Para compensar a demora, eu escrevi um lemon Percy e Nico, baseado no capítulo 07 o aniversário de Percy.
Quem curte, veja aqui: http://fanfiction.com.br/historia/460086/Relax/

Beijos