"Ao que parece, há vários graus de confiança." –Tipo Destino.

Não vou dizer que ignorei Luke desde o incidente do ano novo, mas parei de protegê-lo tanto, de defendê-lo e dirigia a palavra a ele apenas quando era necessário. Permaneceu assim por quase um mês.

–Rach, eu não entendo porque você ainda o mantém em sua casa. –disse Richard durante uma corrida no final de janeiro.

–Eu tenho pena, Richard. Já acostumei com a presença.

–Sei.

–Que bom que você sabe, miguxu. –rebati.

–Estrelinha estressada! –ele disse sorrindo e eu sorri de volta.

O Central Park estava movimentado naquela manhã, cheia de corredores, crianças, pessoas andando depressa aos seus destinos ou vovós e vovôs alimentando os pássaros. Adorava aquele lugar, era como uma fugidinha rápida da movimentada cidade de Nova Iorque.

–Sabe, eu quero comer pizza... –disse Richard, do nada.

–Sério? Hm, agora também fiquei com vontade sabia? –sorri.

–Isso é bom. Vamos jantar em uma pizzaria hoje então. Pode ser?

–Claro!

Olhei para frente e voltei a correr e continuando por mais uma hora e meia, rindo e conversando com Richard o tempo inteiro.

–Acho que nos vemos de noite então, não é? –falei para Richard.

–Sim. Às oito?

–Às oito. –sorri de novo.

✶✵✴

Fiquei deitada no sofá a tarde inteira graças às dores da corrida. Infelizmente isso significava que eu teria que dividir o espaço com Luke.

–Licença? –perguntei após o almoço apontando para a ainda engessada perna de Luke, que estava esticada –não!jura?- em cima do sofá. Ele foi para o sofá menor e eu deitei no grande com um pote de sorvete no colo e Fumaça ao lado.

–Divide o sorvete comigo? –Luke pediu e pela visão periférica pude percebê-lo fazendo cara de cachorro que caiu da mudança.

–Não. –respondi de olho na tela. Nunca gostei de cachorros mesmo.

–Você é cruel.

–Fodas-se. –respondi educadamente, é lógico.

–Amanhã eu tenho que voltar naquele hospital para tirar o gesso.

–Quer que eu vá com você, por acaso?

–É. –ele disse dando de ombros.

–Certo. –respondi.

–Certo. –ele respondeu e revirei os olhos.

–Idiota.

–Chata.

–Burro.

–Sem. Sal. –ele disse entre dentes.

Levantei do sofá e pulei em cima de Luke. Com força, diga-se de passagem e acertando um ponto frágil...

–Aí Rachel! Caralho Carell, assim não vale! Vou cair em cima dos seus seios pequenos e sem graça. Vamos ver se você vai gostar.

Comecei a estapeá-lo. Luke estava precisando urgente de uma surra.

✶✵✴

Após ficar horas definhando no sofá, resolvi levantar para tomar um banho. Afinal de contas, teria que sair naquela noite.

Tomei um banho caprichado, com direito a música e dança. Saí do banheiro enrolada na toalha e caminhei até meu quarto. Abri o guarda-roupa e fiquei um tempo o encarando, pensando no que ia vestir.

Mulheres...

Acabei optando por um dos meus jeans favoritos, uma blusa preta que eu adorava, um casaco que eu também adorava, uma bota confortável e comecei a arrumar meu cabelo e me maquiar. Quase uma hora depois me olhei no espelho, gostando do resultado. Peguei uma bolsa e a chave do carro em cima da cama. Caminhei em passos largos pelo apartamento. Aquele barulho irritante do salto me incomodava profundamente.

–Kate, vou sair.

–Volta hoje? –ela perguntou arqueando uma sobrancelha.

–Claro. Não deixe que Luke ponha fogo na casa, por favor. –falei.

–Como quiser. –ela piscou.

–Sua bobona. Chame a Emily para lhe fazer companhia. –sorri ao sair do quarto e pude ouvir sua risadinha.

–Melhor não. Não quero seu tarado de estimação dando em cima da minha namorada, obrigada.

Estava com a mão na maçaneta, preparada para sair de casa quando senti alguém relar minha perna.

–Tchau, lindinho. Volto mais tarde também? Comporte-se. –eu disse fazendo cafuné em Fumaça.

–Aonde você vai? –Luke perguntou. Ele estava no sofá -para variar- e apenas se deu ao trabalho de virar o pescoço para encarar-me.

–Vou sair, ué.

–Avá! –ele revirou os olhos e eu bufei. Idiota. –Sério que algum maluco te convidou para sair?

–Ah vai se foder, Roach. –rebati.

A opinião de Luke não me importava em nada naquele momento. Nem esperei por sua resposta. Antes mesmo de ele abrir a boca eu já havia batido a porta da frente com toda a força. Ao entrar no elevador, respirei fundo e apertei minha mão com força, quase a machucando. Não ia deixar que Luke atrapalhasse minha noite divertida.

✶✵✴

POV LUKE DEAN’

Ela nem esperou eu dar uma resposta. Simplesmente saiu de casa batendo o pé.

–Mimada. –falei para o vento.

Fiquei alguns minutos no sofá, só passava filme romântico naquele sábado e principalmente naquela hora da noite. Dei uma volta pela casa ainda com a ajuda das muletas. Estava quase ficando maluco por causa delas!

–Miau. –ouvi.

Olhei para baixo e vi o minúsculo gato-com-nome-idiota da Rachel encarando-me. Devia estar me repreendendo por xingar sua dona ou sei lá.

–Não me olhe assim, bicho feio. Sua dona é a mulher mais insuportável que conheci na vida.

–Então porque ainda está aqui? –agora ouvi a voz de Kate.

–Não tenho outro lugar para ir. –dei de ombros.

–Sorte sua que Rachel tem o coração bom e não enxerga o filho da puta que você realmente é. Se dependesse só de mim, você estaria bem longe daqui. –ela disse e me lembrou Rachel na hora. Falou da mesma forma que ela.

–Ok, Kate. Não vou discutir com você. Sabe aonde a mimada-sem-sal foi?

–Saiu com um cara, bem provável.

–Você tem o telefone dele? –perguntei.

Ela arqueou uma sobrancelha e depois riu divertidamente.

–Por que, Luke? Está com ciúmes?

–Me poupe. Só queria avisá-lo que ela é uma mimada chata e que ele não teria grandes recompensas no final da noite, já que Rachel tem carência de seios...

Os olhos da ruiva arderam em chama. Havia alcançado meu objetivo, mas agora não sabia se poderia enfrentá-lo.

–Tomara que o Fumaça urine na sua boca, enquanto você dorme. E não fale assim da Rachel ok? Ou eu quebro sua outra perna, idiota.

E ela deu as costas, entrando em seu quarto.

–Que medinho. –falei baixinho.

Tomei meu banho com a dificuldade habitual.

–Aí gato tarado! Saí fora daqui. Chô! –gritei para a bola de pelos feia que adentrara o banheiro para me observar tomando banho.

Kate ria compulsivamente no outro lado da porta. Ela entrou no banheiro, pegou o gato do chão e lhe fez carinho na cabeça. Ela finalmente olhou para mim. Em meus olhos.

–Fumaça tem bom gosto, jamais viria ao banheiro para olhar você, querido. –sua voz soava irônica. Ela já ia sair do banheiro quando me olhou de cima a baixo, riu mais uma vez e comentou por cima dos ombros: -Engraçado, finge de tão machão e está aí todo arrepiado por causa de um gatinho e com toalhinha cor de rosa na cintura.

Ela levou o gato para seu quarto e o trancou.

Voltei para o sofá –grande novidade!- e fiquei por lá, até ser acordado com o som da porta da frente. Era Rachel.

–Já chegou? –perguntei me espreguiçando.

–Sim né?!

–Foi bom?

–Ótimo! Me diverti bastante, ri demais e mal vi o tempo passar.

–Que bom.

–Vou dormir. Boa noite, Luke.

–Boa noite, Rach. –respondi e fechei os olhos logo em seguida.

✶✵✴

Rachel Carell’’

A noite fora ótima. Assim que cheguei à pizzaria, me sentei e esperei por Richard, que estava mais atrasado do que eu. Quando ele chegou, nos cumprimentamos e começamos a conversar. Conversa que não acabou nem tão cedo. Rimos muito, brincamos demais, conversarmos bastante –sobre muitos assuntos- e a pizza até esfriou, pois acabamos a deixando de lado para conversar. Depois de pagarmos as contas –eu paguei metade e ele metade, Richard não era o tipo cavalheiro. Era uma pessoa fofa, romântica, divertida, engraçada, mas não concorda com certas coisas do “cavalheirismo”.

–Acho isso injusto. Eu posso pagar um dia talvez a conta para alguma mulher, mas será se eu quiser. Não quero pagar a conta ou o que for, porque é uma “obrigação” masculina. Entende?

Eu assentia a cabeça. Não concordava com ele. Não que eu achasse que só homem poderia pagar, ou só homem pudesse convidar para sair ou sei lá, mas acreditava –e acredito- que um homem ao pagar ou fazer um agrado mesmo que pequeno no primeiro encontro já ganha alguns pontos. Pelo menos, esse era um detalhe importante que todas minhas amigas faziam questão de comentar sobre algum cara que estavam saindo.

Depois de horas na pizzaria, ainda paramos em uma sorveteria e tomamos milk shake a aquela hora da noite. Fora divertido. Depois de mais um tempo conversando, levei Richard em casa –ele não tinha carro, porque era contra. Que diabos de pessoa é contra usar carro?

–Tudo que as pessoas fazem com o carro eu posso fazer com táxi, metrô, ônibus ou avião. Não vou me estressar, pagar imposto e me preocupar com algo que eu nem gostaria de usar.

–Richard, morre. Homem esquisito! É por isso que você tem dificuldade em arranjar mulher! Eu vou te deixar em casa, ok?

–Não precisa Rachel. Sou grandinho, sei me virar e como já disse, carro é uma coisa supérflua e...

–Cala a boca, seu veado. Vou te levar em casa e ponto.

E assim fiz. Deixei Richard em casa –putz, como ele morava longe!- e voltei para a minha. Ainda com as lembranças da noite e ainda rindo, abri a porta e me deparei com um Luke sonolento e menos ogro.

–Boa noite, Rach. –ele havia dito com um sorriso involuntário que ele mesmo pareceu não notar.

Ele havia me chamado de Rach.

Rach!