Secret Garden ||♥|| PASSANDO POR REFORMULAÇÃO escrita por chaosregia


Capítulo 6
Certas coisas simplesmente não se pode evitar.




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Naquela noite ele não conseguiu dormir. A imagem da garota tristonha, as lágrimas escapando de seus olhos. Nunca se sentira tão mal em tratar alguém daquela forma, aliás, nunca nem se sentira mal por fazê-lo. Mas aquela garota tímida, inocente e gentil havia mexido com algo dentro de seu peito.

Só agora que a tinha visto tão desconcertada, tão angustiada por ter sido agredida daquela forma é que ele percebera o quão estúpido estava sendo desde o princípio.

A verdade é que ela não saíra de sua mente desde a noite de tempestade. Noite essa onde haviam se visto pela primeira vez. Mas os pensamentos só se intensificaram a cada dia com a ausência dela. Duas noites sentindo uma solidão mais aguda do que a que sentira durante todo a sua vida, desde a morte da mãe.

O rostinho pálido, assustado, iluminado pelo relâmpago que acendia o céu e o seu coração ao mesmo tempo. E mesmo depois de tê-la tratado de forma tão grosseira, ela devia ter pensado nele também e resolvido subir até lá novamente para vê-lo. E ainda tinha lhe levado biscoitos.

Como ele se sentia mal naquele momento... Se pudesse vê-la outra vez, falar com ela... Pediria desculpas pela estupidez com a qual a tratara. A verdade é que, se existia um motivo que justificasse essa barbaridade, esse motivo era pura e simplesmente a solidão.

Já fazia dez anos desde que se isolara naquele quarto. A morte da mãe fora um impacto tão forte em sua vida que ele logo adoecera e nunca mais deixara aquela cama, ou quarto em que se trancara. As únicas pessoas, desde então, que vinham lhe “visitar”, mais por obrigação do que por qualquer outra coisa, era Tsunade, a governanta, e Jiraya, o médico. Nem o próprio pai vinha vê-lo.

Isso o amargurava de tal forma que decidiu numa dessas noites de tempestade, medo, dor e solidão, nunca mais se apegar a ninguém. Amava a mãe, e ela estava morta. Amou também o pai, e ele nunca sequer tinha lhe feito uma visita em dez anos.

Estava destinado a ficar só e quem ele amasse estaria destino a abandoná-lo. Era por isso que ele tinha tanto medo de se relacionar com alguém novo, diferente. Alguém que viera duas vezes vê-lo e na segunda visita ainda lhe trouxera biscoitos.

Lá estava o saco de biscoitos no chão. Talvez jamais ele voltasse a vê-la.

•••

No dia seguinte, Sai não trabalhou. Foram ele e Hinata para o jardim. Tsunade não havia chegado ainda e Sakura resolveu acompanhá-los, já que insistiam em mostrar para ela o lugar. Mas ela não ficou muito tempo, voltou logo para fazer o almoço.

Próximo ao meio dia, já haviam plantado todas as mudinhas que Sai trouxera. Não eram muitas, mas ele prometera trazer mais. Quando entrou pela primeira vez no jardim, Hinata encontrou em meio à bagunça, uma mesa e duas cadeiras de ferro, descascando a tinta branca com há qual um dia deviam ter sido pintadas. Estavam enferrujadas e uma delas estava torta.

Sai tinha trago consigo suas ferramentas e uma lata de tinta branca para deixá-las, cadeiras e mesa, novinhas. Resolveram então pular o almoço e comer os biscoitos e frutas que Hinata fizera questão de trazer, talvez imaginando exatamente o que aconteceria.

Depois de lancharem, a garota ajudou Sai a lixar as cadeiras para tirar a ferrugem. Depois de algumas horas elas já estavam completamente limpas. Sai desentortou a cadeira enquanto Hinata pintava a mesa. Logo pintaram as cadeiras e a mesa já estava seca. Mais alguns minutos e estavam todas prontas.

Sentaram-se então para admirar o trabalho e para se reabastecerem com as frutas restantes. De repente a chuva despencou de uma vez sobre o jardim, mal tiveram tempo de sair correndo e de procurar abrigo. Deixaram o jardim correndo, Hinata trancou o portão, e correram pelo campo rumo a mansão. Sai segurava Hinata pelo braço, mas ele corria depressa demais para ela. Foi quando a garota foi ao chão e consequentemente, ele também foi. Rolaram pelo pequeno morro, apenas alguns metros, até pararem em solo plano, completamente enlameados.

- Hinata, você está... – Sai se virou para a garota para ajudá-la, mas além de um pequeno esfolado na testa, Hinata não tinha nada mais de errado, pelo contrário, ria alto enquanto tentava se sentar. E ela ficava linda daquela forma, Sai admirou.

- Isso, isso foi hilário... – Ela o olhou ainda sorrindo.

- Você... Você fica linda sorrindo. – Elogiou enquanto colocada a mexa solta do cabelo dela atrás da orelha da garota.

- O-Obrigado... – Não pode deixar de sentir as bochechas esquentarem com o comentário do amigo, mesmo estando embaixo da chuva fria e pesada que ainda caía ali.

- Hinata... Eu... – Ele foi se aproximando aos poucos. Cada vez mais constrangida, a solução encontrada por Hinata para fugir do que imaginava estar acontecendo foi atentar Sai para o que estavam fazendo antes de caírem morro a baixo.

- Es-Está frio... Melhor, melhor voltarmos.

•••

A tarde com Sai tinha sido maravilhosa, apesar do final que tivera. Não entendia o porquê de Sai ter tentado a beijar, na verdade, nem tinha certeza de que ele tivesse-o feito. Mas e se tivesse? Será que ele estaria nutrindo algum sentimento especial por ela? Estaria Sai apaixonado por ela, como nas românticas estórias de finais felizes que costumava ler...?

Era uma pena pensar que isso poderia estar acontecendo. Hinata se sentia muito bem ao lado dele, mas era um “muito bem” que não significava nada além de que considerava Sai, além de um grande e bom amigo, como um irmão que nunca tivera. O mesmo que sentia quando estava com Sakura, só que o tempo com ela era menor e mais restrito. Quase não podiam se falar.

Fora eles, as outras pessoas... Com o tio, por exemplo, se sentia em família, mas não tão feliz como se sentia com os amigos. Tsunade e Jiraya eram como estranhos, eles não contavam. Não lhe faziam nem mal, nem bem.

A única pessoa que a fazia se sentir mal, deprimida, rejeita, e tudo o de pior, era o primo, do qual só agora percebeu que ainda não sabia nem o nome. Mas não era necessário nem saber, já que não voltaria a vê-lo jamais. Jamais subiria ao terceiro andar novamente.

E por falar em pessoas, se existia alguém que a fazia se sentir em casa, esse alguém era Tamii. E por falar nisso, onde ela estava?

Desde que chegara em casa não a vira uma só vez. Não estava na cozinha, não estava no quarto... E o prato de leite, assim como os biscoitos no chão ainda estavam intactos.

•••

Quando o rapaz abriu os olhos se deparou com uma cena nada comum aos seus dias solitários. Havia uma nova visitante ali, mas não era a prima, a garota que fizera sofrer noite passada. Era um animal, um gato. Estava deitado próximo ao saco de biscoitos que a prima deixara no lugar.

•••

- Tamii... Tamii... – A garota saiu chamando pela mansão, mas nada dela aparecer. Olhou por todos os cantos, até no escritório do tio, onde Tamii a levara no dia e que encontrara a chave do jardim, mas ela também não estava ali. O único lugar que não procurara, visto que Tamii jamais saia de casa sem ela, era o terceiro andar.

Foi ai que, num flash de memória, Hinata se deu conta de onde Tamii poderia estar: no quarto do primo grosseiro. Elas tinham subido juntas até lá da última vez. Tamii devia ter ficado presa lá. Será que ele a trancara lá com o único propósito de chatear Hinata? Será que ele faria algo de ruim com a gatinha da garota? Não era de se duvidar, visto o gentleman que ele não era, desde o início.

Subiu apressada e decidida a dar uma boa lição nesse garoto malvado que nem a conhecia direito e já a maltratava como se ela tivesse feito algo de errado para ele.

•••

- Ei gatinho. Está perdido? – Chamou a atenção do animal. – Você é sozinho como eu, né? Eu sei como é se sentir sozinho, rejeitado. Ninguém gosta de mim, nem meu pai... – As memórias de anos de solidão, trancafiado naquele quarto o fizeram derrubar mesmo que involuntariamente, lágrimas reprimidas a muito. – Acho que você pode fazer companhia pra mim, e eu pra você. Assim não vamos ficar mais totalmente sozinhos.

- LADRÃO! – A porta se abriu de uma vez e uma furiosa garota de cabelos longos e negros, meio azulados, com seus orbes perolados ardendo de raiva, adentrou no recinto esbravejando.

- O q...

- CALA A BOCA. – O garoto não pode terminar Hinata já o interrompia em toda sua revolta. – SE PENSA QUE VAI FAZER ALGUM MAL A TAMII ESTÁ ENGANADO! ELA É MINHA AMIGA E VOCÊ NÃO VAI TIRÁ-LA DE MIM, NEM MALTRATÁ-LA. VOCÊ PODE ATÉ ME OFENDER, MAS NÃO VAI TOCAR UM DEDO SEQUER NELA, OUVIU? – Avistou Tamii tranquila no chão do quarto, fuçando no saquinho de biscoitos como se nada estivesse acontecendo, e o garoto parado, inerte, na mesma posição, sentado na cama cheio de cobertores, como da última vez em que o vira. Parecia até que ele não havia nem se mexido, nem dormido, nem saído daquela cama até agora. Percebeu então que Tamii não corria risco nenhum, pelo contrário, parecia estar muito bem mesmo, mordiscando agora os biscoitos que Hinata trouxera em sua última visita.

-... – O garoto permaneceu em silencio sem entender o porquê de tanto escândalo. A verdade é que aquela garota, sempre que ela abria a boca o deixava sem resposta, sem saber o que dizer. Mas, ao se dar conta das acusações sem pé nem cabeça que a garota proferia a ela, foi inevitável sua reação. Pensou pouco antes de responder, as palavras saíram naturalmente, ele estava acostumado a agira assim. – Se você gostasse tanto desse animal, não o deixaria esquecido por ai.

-... – Dessa vez quem se calou foi ela. Sabia que tinha agido de forma precipitada, julgando as possíveis ações do primo só por ter provado seu amargo humor nas poucas visitas que fizera.

- Leve esse pulguento pra fora do meu quarto. Sou um garoto doente, não quero me infectar com esse bicho sujo e malcuidado.

- Olha aqui?! – Já não estava mais arrependida. – ANIMAL PULGUENTO E SUJO É VOCÊ! A TAMII É MUITO BEM CUIDADA E TEM A BOCA MAIS LIMPA DO QUE A SUA SEU... SEU...

- VAI! FALA! ME OFENDA E VAI EMBORA. E NÃO VOLTA MAIS AQUI. NÃO QUERO TE VER, NÃO QUERO VER NINGUÉM. SOME DA MINHA FRENTE, AGORA! – Estava tão exaltado que a garota até pensou que ele iria levantar da cama e partir pra cima dela, mas não aconteceu. – SAI! EU TO MANDANDO! VAI EMBORA!

- VOCÊ NÃO MANDA EM MIM!

- MANDO SIM. EU MANDO EM TUDO AQUI. VOU MANDAR MEU PAI TE COLOCAR PRA FORA DAQUI. EU NÃO QUERO VOCÊ NA MINHA CASA, NO MEU QUARTO. VÁ EMBORA.

- NÃO AJA FEITO CRIANÇA, VOCÊ NÃO PARECE NENHUM POUCO COM UMA. – O rapaz naquela cama parecia um homem feito, exceto pela infantilidade evidente em seu comportamento.

- SOME DAQUI GAROTA. VOCÊ ESTÁ ME IRRITANDO. ESTÁ ME DEIXANDO COM DOR DE CABEÇA. SOME! EU TO MANDANDO.

- NÃO VOU! – Bateu o pé e não saiu do lugar, não moveu um dedo sequer. Não iria obedecê-lo, não iria deixar que ele pensasse que podia mandar nela desse jeito.

- EU JÁ MANDEI VOC... – E de repente a voz falhou, as palavras não saiam. Começou a tossir violentamente, seus pulmões pareciam que iam explodir. Levou a mão na boca para abafar a tosse, mas isso só a intensificava. Hinata voltou a sentir culpada, e dessa vez em dobro, por ter sido orgulhosa, persistente, e causado com isso o mal-estar do primo, que só agora lhe parecia realmente doente.

- Vo-Você está...

- V-Va... – Tossindo. – Emb... Embor... – Quanto mais se exaltava, mais tossia. Hinata acabou encontrando a jarra de água que repousava quase cheia sobre a mesa de cabeceira do rapaz, pegou o copo que estava ao lado e encheu.

- To-Tome um pouco de... – Mas sua atitude gentil de nada serviu para acalmá-lo. O rapaz bateu no copo de água fazendo-o cair no chão. Não se partiu, mas ensopou o carpete.

Hinata recolheu o objeto e repetiu o gesto enchendo-o novamente, mas dessa vez não foi complacente com a ignorância do primo. Juntou toda a força que tinha e, que não era maior do que a dele claro, mas foi o suficiente para tirar a mão que ele insistia em manter na frente da boca, e fazê-lo beber a água à força.

Vendo a insistência da garota e a preocupação verdadeira que ela parecia nutrir por ele mesmo tendo a maltratado daquela forma, o rapaz não viu outra forma de agir, senão aceitando o auxílio e o copo de água que realmente o fizeram a tosse passar.

Por um instante os olhos dele, orbes azuis perplexos, indecifráveis, cruzaram-se com os dela, prateados, como duas luas cheias, em seu esplendor e complexidade, o fitando atentamente, cuidando para que ele bebesse toda a água. Não estavam mais assustados, apenas apreensivos. Não o repudiam, condenavam, desprezavam como todos os outros faziam, apenas cuidavam dele, tentavam acalmá-lo para que ele não se sentisse mal.

Uma das mãos da garota segurava lhe o queixo de forma gentil, a outra virava aos poucos o copo para que ele pudesse tomar todo o seu conteúdo. Quando o líquido finalmente se esgotou, ela pegou o guardanapo sobre a mesa e fez sinal de que iria secar os lábios e as gotas que molharam o pescoço dele, mas ao encontrar-se com os olhos do mesmo, a fitando com tanta intensidade, a garota corou e apenas estendeu o pano ao rapaz, constrangida com a forma com a qual ele a olhava.

•••


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