Seeking Shelter escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 3
Alvo




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-O que aconteceu com o seu cabelo? -É a primeira coisa que ele pergunta, depois do professor falar que eu poderia sentar do seu lado na aula, já que era a única pessoa que eu conhecia.

-É natural. -Dou de ombros.

-Não acredito que eu cheguei a pensar que você tinha cabelo preto. -Ele balança a cabeça. -Até a raiz era preta. -Ele olha para a raiz do meu cabelo agora, totalmente marrom. -E esses cachos? Puta merda, Carter. -Ele sussurra, enquanto o professor termina de explicar alguma coisa. Ouvir meu nome saindo da boca de Cyrus é estranho e familiar ao mesmo tempo. -Faz dois anos que eu não te vejo e você volta desse jeito. Wow. -Apenas balanço a cabeça e começo a anotar as coisas, pensando que Ashley ficaria muito orgulhosa de mim se me visse agora, tomando notas e tudo mais. Continuo em silêncio até o fim da aula, me sentindo um pouco mais confortável na escola. As próximas aulas são silenciosas. Ninguém mais me apresenta na frente da sala e eu só consigo falar com Cyrus outra vez na hora do almoço, quando ele me espera na porta da sala. O desconforto volta quando penso no refeitório e ter que ver todo mundo que eu conhecia antes, juntos em um lugar só e fingir que nada mudou ao mesmo tempo em que agir como se tudo tivesse mudado. Cyrus está apoiado na parede, mascando um chiclete e jogando um jogo no seu iPhone. Quando me vê, ele guarda o iPhone no bolso.

-Temos mesmo que ir para o refeitório? -Pergunto, hesitante. Mas então me lembro de Ashley, que provavelmente está me esperando.

-Meus amigos estão lá, docinho. -Ele diz, da mesma forma que falava comigo antes. Não sei se sorrio ou se choro.

-Amigos?

-Fiquei meio solitário depois que você foi embora. Tive que fazer novos amigos.

-Eles são legais? 

-Tanto quanto você era legal.

-São... babacas? -Ele me dá um sorriso.

-Tanto quanto você era legal pra mim. -Melhorou. Eu não era uma babaca com Cyrus, e acho que é o único motivo para eu ainda não ter me ajoelhado e implorado seu perdão por todas as merdas que eu fiz no passado. -E vão gostar de você. Alana vai te amar. Ela meio que adora sua voz e tal, de todas as gravações que eu mostrei pra ela das suas apresentações. E tem um pessoal maneiro, Carter. Um pouco diferente de dois anos atrás, mas são legais. Eles já devem gostar de você.  Aposto seu almoço que todo mundo já sabe que Carter Hallaway voltou para Goode. -Engulo seco. Espero que ele esteja errado. Não quero atenção. Não mesmo. A antiga Carter teria adorado, mas agora só quero passar despercebida.

O que NÃO acontece quando chegamos no refeitório. Porque (1) todo mundo olha para mim e ouço milhares de "Carter" vindos de direções diferentes (2) eu e Cyrus somos os únicos em pé e (3) Ashley grita:

-EI, CARTER! -Da mesa dos tutores, acenando que nem uma louca e eu. Quero. Morrer. Dou uma olhada no refeitório. Pessoas conhecidas junto com desconhecidas. Gente do antigo clube de música. E então vejo no meio de toda a multidão, Max.

Max é o que eu me esforcei muito para esquecer, porque ele era a pessoa mais próxima da Carter dos dias de hoje, na época em que eu era uma vaca. Ele era meu amigo, meu namorado e provavelmente a pessoa que eu mais me importava no mundo. Às vezes, ele até ultrapassava minha família.

Max nunca gostou da minha bebedeira nem das festas, mas me apoiava totalmente na música. Ele me amava, de verdade. E eu amava ele também, mas era uma namorada de merda. Então ele terminou comigo. E o acidente aconteceu e acabou a história.

Quando eu fui para a clínica, para longe dessa cidade, passei a me importar com cada coisa que tinha feito aqui. Cada palavra que eu disse e como eu agia com cada pessoa com quem falava e quanto mais pensava em Max, mais remorso eu tinha, mais vergonha de mim mesma aparecia e com isso a dor de saber que ele era apenas mais uma pessoa que eu havia decepcionado quando fui beber naquele clube. Então é muito, muito difícil olhar para ele agora. Pensando em tudo isso. Nossos olhares se cruzam tempo o suficiente para ele ficar surpreso, como todo mundo, ao ver minha mudança física e então me viro para Cyrus.

-Tenho que ir falar com Ashley.

-Quer que eu vá junto? -Foco somente nele.

-Tá todo mundo encarando ainda? -Pergunto.

-Sim.

-Então, sim. Vamos. -Cyrus passa o braço no meu ombro e grita, para piorar a situação:

-OLHEM PARA O OUTRO LADO, COLEGAS. ATÉ PARECE QUE VOCÊS NUNCA VIRAM CARTER HALLAWAY NA VIDA.

-Eu te odeio. -Murmuro, enquanto cada passo dolorosamente lento me levo para perto de Ashley. Posso quase ouvir a fofoca no ar quando paro na frente dela.

-Carter! Você encontrou Cyrus! -Ela! É! Tão! Animada!

-Sim, claro. -Ela deve lembrar do que ele disse na primeira aula, porque estava lá também. Sinto olhares queimando minhas costas. Não olho para mais ninguém, com medo de cruzar olhares com Max. -Vou me sentar com ele, tudo bem?

-Claro! Vá em frente. Depois conversamos. -Ela pisca para mim, então Cyrus e eu damos meia volta e sigo ele até sua mesa.

-A vadia voltou. -Ouço alguém sussurrar, na mesa do meu lado e paro. Por um mísero segundo, o mundo para também. Ninguém respira, ninguém pisca, todos esperam enquanto eu tento respirar novamente. Alguém lembra da antiga Carter. Da verdade antiga Carter, a idiota. E não culpo a pessoa por pensar assim, mas ouvir em voz alta me causa reações dolorosas. Cyrus, alguns metros na frente, se vira confuso.

-Algum problema? -Olho o refeitório novamente. Todo mundo olhando, analisando, julgando e sussurrando.

Você tem que se acostumar, aquela voz na minha mente diz.

-Nenhum. -Respondo, então volto a andar.

Você tem que se acostumar. Vadia.


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