Lizzie

– Bennet!

Ergui os olhos do livro que eu tentava ler ao ter meu nome chamado, vendo uma garota se aproximar. De início, me surpreendi vendo uma desconhecida exclamando meu nome de forma tão animada, até ver que aquela não era uma desconhecida, mas sim uma amiga de Carrie.

O que é um tanto pior, pensei, suspirando.

Apenas esperava que Carrie não houvesse aberto a boca em relação à nossa noite, afinal o que eu menos desejava era arrumar problemas, ainda mais por isso.

– Hey. – Respondi simplesmente, quando a garota já estava diante da mesa em que eu me sentava.

– O que está lendo? – Ela perguntou, sentando-se diante de mim sem pedir permissão, pouco antes de se inclinar para mim na tentativa de exibir seu decote.

Desci os olhos até ele, e suspirei ao voltar a olhar para o seu rosto. Ela podia ser bonita, mas eu não estava nem um pouco interessada.

– Um livro. – Dei de ombros, sem muita vontade de render o assunto.

A mesma vontade não se aplicava a ela, que riu.

– Você é engraçada.

Sem querer ser indelicada com a amiga de Carrie, corri os olhos ao nosso redor, procurando algum motivo para impedir que aquela conversa, que tinha tudo para não ser interessante, continuasse.

– Eu adoraria… É… – Não, eu não sabia seu nome. – Continuar conversando. Mas preciso falar urgentemente com a minha amiga. Com licença.

– Tudo bem. – Ela respondeu enquanto eu me levantava, saindo sem dizer nenhuma palavra.

Apressei-me na direção de Anne, vendo Jude ao seu lado, e sorri por reflexo ao mesmo tempo em que torcia para que ela não tivesse visto – ou interpretado mal – minha “conversa” com a amiga de Carrie.

– Meu Deus, vocês me salvaram.

– Lizzie! – Anne sorriu, desviando muito discretamente o olhar para Jude, que sorria de um jeito lindo, enrubescendo quando a olhei. – Salvamos? De quê?

Ri baixo.

– Anne, você sabe o nome dela? – Indiquei a amiga de Carrie com um aceno de cabeça.

Os olhos azuis da garota loira endureceram quase automaticamente.

– Aquela… Garota? – Sua voz tinha desprezo. – Ela é Mary Ann. Uma vadia, falsa e idiota. Você não pretende conversar com ela, não é?

Sorri de lado.

– Não, não mesmo. Ela veio falar comigo agora. Vocês me salvaram de toda essa falsidade e superficialidade. Não, Anne. Eu não conversaria com alguém assim.

– Mas ela é amiga de Carrie.

Suspirei. O rosto de Jude estava fechado, mas era Anne quem parecia mais irritada comigo, se posicionando quase defensivamente em relação à minha colega de quarto.

– Eu sei. Mas não quero mais me meter com nenhuma delas.

Vi uma nova luz iluminando o rosto de Jude, ao mesmo tempo em que a expressão de Anne mostrava mais aprovação.

– É uma boa decisão. Elas não prestam.

Concordei, sorrindo.

– Para onde estão indo, que mal as pergunte?

– Lugar nenhum. – Jude finalmente tomou a palavra. – Anne só estava me acompanhando até o chalé.

Sorri de lado.

– E posso acompanhar também essas lindas moças até o chalé que também é meu? – Manti meu sorriso aberto, inclinando a cabeça para Jude e a olhando no rosto.

Vi-a enrubescer com meu ato e meu sorriso alargou-se, agora de satisfação por causar-lhe tal sensação.

– Temos uma sedutora aqui! – Anne riu. – Vou fazer melhor: deixar você com essa ainda mais linda moça. Preciso resolver umas coisas antes do jantar. Até mais Lizzie, e até mais, Jude. – Ela sorriu, voltando a lançar um daqueles olhares para Jude. – Não se esqueça do que conversamos!

Vi a garota ao meu lado corar intensamente com a alusão à conversa, e me peguei divagando sobre qual fora o assunto da conversa.

– Tudo bem, Anne. – Ela se atrapalhou um pouco com as palavras, me fazendo sorrir levemente com aquele jeito meigo que era dela, mal percebendo quando Anne se afastou.

Quando me vi novamente sozinha com Jude, não consegui evitar de olhá-la. Não como eu fazia todo dia, mas como vazia de vez em quando. Observei seus olhos, os cílios longos, a pele lisa e macia, o nariz pequeno, os lábios aparentemente tão doces… Não consegui conter o reflexo, a necessidade de tocá-la. E então, ali mesmo, afastei o cabelo que olhe caía pela frente do ombro, roçando a ponta dos dedos pelo seu pescoço.

Desviando o olhar para mim, Jude não recuou ou se assustou. Em vez disso, ela abriu um sorriso tímido e meigo e baixou o olhar, levemente corada, se aproximando ligeiramente mais de mim.

Com um sorriso de lado, eu vi nosso chalé se aproximar, sentindo o coração bater como há certo tempo não o fazia. Era quase como se eu esquecesse como era gostar e ser correspondida.

Não vi Jude destrancar a porta do nosso chalé, mas quando percebi, estávamos dentro dele. Jude avisou que iria se trocar e eu concordei, com uma palavra fixa na cabeça.

Ser correspondida.

Eu era correspondida?

Até a noite passada, eu acreditava que não. Mas então… O que significariam todas as vezes que Jude enrubesceu ou sorriu automaticamente falando comigo? Sua irritação para com Carrie e a minha saída? A irritação protetora de Anne?

Desviei o olhar para a porta do banheiro, que Jude fechara.

Seria possível? Ela poderia gostar de mim como eu gostava dela? Se fosse verdade, suas pequenas curiosidades fariam mais sentido, como a vez em que conversamos sobre amor.

Suspirei.

Se fosse verdade, eu ainda assim teria trabalho. Jude era tímida, e seria difícil atravessar suas defesas e chegar ao sentimento dela, assim como seria difícil superar as barreiras que a sua extrema inocência criava, mesmo sem querer. Isso sem citar todas as pessoas que nos rodeavam ali, as famílias tão poderosas, e a forma com que os boatos viajavam rápido naquele ambiente…

– Lizzie? – A voz de Jude me tirou do rumo sombrio que meus pensamentos tomaram. – Pode ir. – Ela sorriu discretamente, e naquele sorriso eu fiz questão de afogar todos aqueles receios, que nada tinham de mim.

– Eu já vou. – Sorri em resposta, me levantando da cama.

Jude

No jantar, Anne conseguiu que eu me sentasse ao lado de Lizzie, e tão esmagada, graças ao diminuto espaço no banco, que mal era possível mexermos o braço.

No entanto, eu consegui, ali, sentir o cheiro que parecia emanar dos cabelos curtos e do pescoço de Lizzie. O aroma de seu já conhecido perfume, mas misturado a outro mais natural, como talvez o próprio cheiro dela. Fosse o que fosse, era incrivelmente inebriante, e me despertava o reflexo de me aproximar ainda mais – se é que era possível – e sentir, sem parar.

Diferentemente de alguns dias atrás, eu agora não me preocupava tanto com as reações que Lizzie me causava. Na verdade, até gostava disso. Gostava de admirar a minha colega de quarto, com todos os seus sorrisos e delicadezas que tanto me embaraçavam.

No entando, eu sabia que as coisas não podiam continuar assim. Segundo Anne, Lizzie também gostava de mim, por mais que nada do seu jeito denunciasse isso, na minha opinião. Mas Anne também dissera que eu (ou parte de mim) estava negando esse sentimento, e poderia negar também que ele fosse recíproco. Assim, eu nada tinha de opção além de, por meus próprios meios, saber os sentimentos de Lizzie e fazê-la saber os meus.