POV: KATNISS.

Nós ainda ficamos mais uns minutos parados, eu e Peeta, absorvendo tudo o que aconteceu no dia de hoje. Eu olhava para o nada, para a fumaça que ainda não tinha se dissipado e para as pessoas que tentavam limpar seu Distrito, eu não conseguia acreditar que tudo isso era real, que não era só mais um pesadelo maluco e aterrorizante que me consome todas as noites quando fecho os olhos, aquilo foi real e foi o mínimo que eu pude ver se um real confronto. Pensei nos outros Distritos antes de cederem ás nossas ideias, pensei em todas as crianças que tiveram que apoiar o que dissemos porque simplesmente não tinham escolha, tudo bem que maior parte deles aceitou sem nenhuma hesitação, mas mesmo assim, a Capital interviu em todos os Distritos, eles se machucaram, a Capital os machucou quando percebeu que estava perdendo seus Distritos e escravos, como fez com o Distrito 12. Pensar em meu Distrito natal me trazia uma angústia e uma dor antiga. Nunca mais voltei ao Distrito 12 desde o dia em que ele foi bombardeado, não pretendia fazê-lo, mas sentia falta de tudo o que vivi naquele lugar, do Prego, da floresta, da Padaria e do Beco. Nada voltaria á ser como antes.

– Acho que nós podemos viajar hoje mesmo, já conquistamos nosso objetivo aqui e tenho certeza que a Capital está avisada de nossa capacidade de... Persuasão. Não precisamos mais ficar aqui, tenho certeza que ainda temos muito o que planejar antes de invadir a Capital.- Dizia Coin com um sorriso enorme. Ela estava feliz por termos conseguido vencer o Distrito 2 e eu só queria socar a cara dela até que ela morresse. A imagem de Tysson banhado de sangue não saía da minha mente.

– Talvez esse não seja o momento certo para invadir a Capital, acho que todos vão acabar se rendendo uma hora ou outra. Estão todos apavorados, não vamos precisar fazer muita coisa. Eu sei, eu vim de lá, eu vi de perto. Ninguém quer ficar ao lado da Capital, a maior parte acredita na nossa Rebelião, eles acreditam que vamos conseguir, que vamos derrubá-los e não são tolos: sabem que quanto mais resistirem á nós, mais se machucarão. Eles não estão acostumados á serem machucados então vão concordar conosco.- Disse Plutarco, balançando a cabeça. A sua expressão era, como sempre, fria e impassível. Eu revirei os olhos. Estávamos dentro do Prédio da Justiça do Distrito 2, lugar que nos serviu de abrigo por todo esse tempo. Eu queria ir embora daqui e esquecer o dia de hoje, mas eu sabia que seria impossível.

– Esse não é o momento de confiar em intuições, eu acho muito mais sensato prevenir do que remediar. Concordo com Coin.- Disse Gale, com os braços cruzados com força.

Eu olhei para o homem que Gale se transformou. Gale era meu melhor amigo, eu estava acostumada á saber o que esperar dele, mas ultimamente ele está sendo muito... Irreconhecível. Talvez sua sede de vingança contra a Capital esteja tornando-o uma pessoa terrível e isso me assusta. Me lembro de Peeta ter dito uma vez que a última coisa que ele queria era ser mudado pela Capital, que ele queria continuar o mesmo, mesmo depois de tudo o que aconteceria, ele queria ser sempre o Peeta pelo qual me apaixonei. Parece que o Gale não compartilha do mesmo desejo. Suspirei, balançando a cabeça.

– Colocaremos o assunto em votação, então?- Perguntou Paylor tentando deixar tudo mais estável. Eu gosto de Paylor, ela é uma mulher calma mas firme o suficiente para que todos consigam enxergar sua autoridade, além disso, ela não abusava de seus poderes. Eu a admiro por isso.

– Enquanto estivermos no Aerodeslizador, decidiremos o que é melhor para todos.- Disse Coin, pegando um telefone.- Acho que seria melhor se vocês tratassem de se arrumar, logo partiremos. Sinto falta de casa.

– Eu também.- Suspirei. Não me referia ao Distrito 13, é claro. Sinto falta do 12, do meu pequeno e pobre Refúgio. Olhei para Peeta e ele mantinha uma expressão cansada no rosto. Deu um pequeno sorriso e pegou minha mão. Juntos nós fomos organizar as poucas coisas que trouxemos conosco. Juntos.

– Tudo parece tão... Errado.- Peeta disse de repente. Eu olhei para ele. Estava confuso.

– Tudo o quê?- Perguntei, avaliando a sua expressão melhor. Ele estava confuso, bravo e cansado.

– Isso... Invadir Distrito, machucar pessoas, bular um plano para derrubar a Capital.- Ele disse, passando a mão no cabelo.- É como se algo dentro de mim dissesse que isso pode ser tão perigoso ao ponto de não valer á pena o que vamos passar, isso parece uma loucura.

– Acho que você só está muito chocado com tudo o que está vendo, você não é o único.- Eu disse, passando a mão no rosto dele. Ele concordou com a cabeça.

– Eu não quero pular fora agora, eu quero continuar com a rebelião, mas acho que eu não serei capaz de ir em frente se me deparar com outra cena como a dessa noite.- Ele disse, fazendo uma careta. Eu concordei com a cabeça me lembrando de Tysson que era só mais um inocente, mais uma vítima da nossa rebelião, como tantas outras pessoas que morreram hoje.

– Eu sei o que quer dizer com isso, ás vezes eu sinto que posso entrar em combustão á qualquer momento. Cada palavra deles faz meu estômago revirar. Eles falam dessas pessoas como se estivessem falando de animais, e mesmo que fosse animais, ainda acreditam que mereçam um pouco mais de consideração.- Eu disse, balançando a cabeça. Peeta concordou.

– Estão prontos?- Finnick perguntou, aparecendo atrás da gente. Sua expressão era de notável exaustão.

– Onde você esteve?- Perguntou Peeta, colocando nossas mochilas nas costas e me dando a mão. Lado á lado, nós três andamos para fora do Prédio.

– Eu fui ver o garoto, o Tysson. Ele está sendo cuidado por uns médicos da região, eu não acredito que ele vá sobreviver mais do que 3 dias, á menos que mandem médicos da Capital para cá. Já estão providenciando tudo.- Finnick balançou a cabeça insatisfeito.

– E você não está feliz? Quero dizer, vai ficar tudo bem com ele, isso não é ótimo?- Perguntei, confusa. Johanna era a única que ainda estava do lado de fora do aerodeslizador. Sua cara era de poucos amigos e não parecia estar nada feliz de sua tarefa de nos esperar.

– Estaria se não soubesse o quanto que a sua vida mudou hoje, acho que preferia morrer á viver a vida dele. Quero dizer, se ele tiver algum descanso não é? Vão todos cair pra cima do menino que fez os nossos corações amolecerem e o dos moradores do Distrito 2, todos vão querer saber dele. Pobre Tysson.- Disse Finnick, suspirando. Eu concordei com a cabeça. Não tinha pensado por esse ângulo. Pobre Tysson, concordei mentalmente.

– Ah, que bom que decidiram aparecer. Coin e Gale estão uma fera, Coin até disse que deixaria vocês 3 aqui se ficaram tão felizes com o Distrito, disseram que voltariam quando fossem invadir a Capital, Gale não concordou com ela e eu sabia que vocês não gostariam de ser recebidos por Gale, decidi esperar vocês então, sozinha.- Disse Johanna quando nos aproximamos. Sua expressão pareceu suavizar.

– Obrigado por ter nos esperado e não ter deixado o Gale ficar, tenho certeza que não iria ter o que falar para ele.- Disse Peeta, balançando a cabeça. Johanna revirou os olhos.

– Eu sei que você vai superar o choque, você ainda não viu nada do mundo cruel e absolutamente humano em que vivemos, garoto.- Disse Johanna, balançando a cabeça. Finnick suspirou.

– Um mundo que não vai mudar se essa rebelião der certo, ás vezes me pergunto pelo que estamos lutando.- Disse Finnick, balançando a cabeça.

– Acho que estamos lutando para salvar nossa própria cabeça e dos entes queridos.- Eu disse, dando de ombros. Peeta concordou.

– A única certeza que eu tenho é que de jeito nenhum essa rebelião significa paz em Panem ou igualdade para todos, de jeito nenhum essa rebelião significa mudanças boas e significativas, de jeito nenhum nós vamos ter paz ou uma vida boa, de jeito nenhum seremos felizes, não se continuarem matando os nossos.- Disse Peeta no mesmo instante que Gale jogou uma escada para nós e acenou para que subíssemos no Aerodeslizador.

– É, vamos lá ouvir mais ideias doentias e podres.- Disse Johanna sendo a primeira á subir a escada.

(...)