Eu Não Preciso De Amor escrita por Hanna Martins


Capítulo 18
Peças que faltam


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado AnwenPEJ e a Rebeca Miranda! Muito obrigada suas lindas pela recomendação!!! Saibam que elas me deram muito animo para terminar este capítulo e posta-lo o mais rápido possível! Obrigada!!!!



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— Peeta... eu... – não sei o que fazer, muito menos o que dizer, as palavras não querem sair da minha boca.

O que fazer em uma situação destas? Maldito esbarrão! Ele deve ter percebido minha presença após ouvir o barulho.

— Katniss, olha... – Peeta se levanta e começa a andar pela sala.

— Sim, eu escutei tudo – falo após respirar fundo.

Estou tão cansada de fingir, de contar mentiras. Quero ver até onde Peeta vai com suas mentiras. Resolvo tomar o controle da situação, atacar. Vamos ver até onde vai o truque de tutor “bonzinho”.

— Eu sei que você se vendia – minha voz sai firme, surpreendendo até a mim mesma.

Peeta me olha confuso, perdido. Deve ter se surpreendido por minha atitude. Aposto que ele esperava que a frágil garotinha negasse tudo. Não vou deixar ele tomar o controle da situação.

— Katniss... isso é coisa do passado. Eu sei que tomei um caminho não muito correto, mas... Katniss, entenda, precisava sobreviver.

— Sobreviver, Peeta? – meu tom é extremamente sarcástico. – Tomando dinheiro de mulheres ricas? Johanna tem razão, você é um gigolô barato mesmo!

Minhas palavras são como veneno, cheias de ódio e menosprezo. Lanço um olhar envenenado para Peeta. Esperava encontrar em Peeta uma expressão de ódio, mas não é isso o que encontro. No lugar de ódio, há uma imensa dor.

— Katniss, por favor, pare! Katniss, por favor, me escute!

— Escutar o quê? Seus casos amorosos com mulheres ricas?

— Katniss – sua voz é apenas um sussurro, a personificação da dor.

Peeta se aproxima de mim e tenta colocar suas mãos sobre meus ombros. Porém, eu as repilo bruscamente, não permitindo que ele me toque.

— Você me causa nojo! Não me toque!

Peeta se retrai confuso e ferido. Reconheço em seus olhos a dor.

— Katniss, eu nunca quis fazer isso, explorar mulheres ricas, mas foi a única maneira que eu encontrei para viver. Meus pais morreram muito cedo. Após a morte de meus pais, fui morar com meus tios na Suíça. Mas eles nunca se importaram comigo, para eles eu era um fardo pesado. Quando eu fiz dezesseis anos, sai da casa de meus tios...

Deixo que ele fale sem o interromper. Embora eu saiba que Peeta é um belo mentiroso, neste momento as palavras dele me parecem verdadeiras.

— Não era fácil viver sozinho... Passei fome. Havia dias em que eu me perguntava se eu iria conseguir sobreviver. Mas algo me manteve vivo... – faz uma pequena pausa – Conheci algumas pessoas... Eu sou bonito, tenho um belo aspecto, e seduzir mulheres ricas seria uma tarefa fácil para mim. As mulheres... amavam meu corpo...

Neste momento ele para de falar e me lança um olhar furtivo, diria até que envergonhado.

— Mas elas sempre me viram como um objeto. Um corpo bonito, um lindo acessório. Para elas eu nunca fui mais que um belo corpo.

— Peeta – minha guarda abaixa e por um momento, uma pequena fração de segundo, não odeio Peeta.

Ele senta-se no sofá e apoia o rosto nas mãos. Me aproximo dele. Peeta está tão ferido, tão magoado, estendo minha mão e ela quase pousa em seu cabelo. Não termino meu gesto, as imagens de Peeta planejando minha morte e uma vingança, da qual nem sei o motivo, vêm a minha mente. Não, Peeta está me enganando novamente. Não vou cair em seus truques baratos, não mesmo!

— Peeta, quanto elas pagavam por seu corpo? – a voz sai como um espinho.

Ele me olha e eu me arrependo imediatamente por ter falado isso. Em seus olhos há a mais profunda dor que um ser humano já teve.

— Katniss – sua voz atrai minha atenção para seu rosto. – Por favor, compreenda.

— Não, Peeta, eu não posso te compreender – saio da sala.

A única coisa que desejo é dormir e me esquecer de tudo. Se eu pudesse dormia para sempre, jamais despertar novamente para este mundo cheio de dor e tristeza.

Tranco a porta do meu quarto. Prefiro enfrentar meus pesadelos sozinha do que aceitar a ajuda de Peeta. Não vou permitir que ele entre em meu quarto. Me jogo sobre a cama e durmo.

Novamente, os pesadelos perturbadores vêm me visitar. E desta vez ele é mais medonho do que todos os outros pesadelos. Acordo com um grito terrível.

— Katniss! – escuto as batidas de Peeta em minha porta. – Katniss! Katniss! Você está bem? Me deixa entrar! – pede.

Não respondo. Estou assustada, minha respiração é irregular.

— Katniss! – insiste. – Você está bem?

Continuo sem responder. As batidas repentinamente cessam.

Estou tremendo, suada, e o medo me invade totalmente.

Lá fora uma tempestade rasga o céu, formando um festival de trovões e raios. Os trovões, o barulho da chuva que se choca contra a janela de meu quarto, colaboram para tornar o cenário sinistro. A imagem do pesadelo ainda está muito nítida em minha memória. Tudo isso faz com que eu me sinta sufocada. A sensação é horrível. Preciso sair daqui.

Pego meu celular. Não posso ligar para Rue, a casa dela fica quase meia hora distante da minha. No entanto, há uma pessoa que mora a menos de cinco minutos de minha casa, Gale. Sem pensar duas vezes, me vejo ligando para ele.

— Alô – atende com a voz sonolenta.

— Sou eu, Gale, Katniss – digo de maneira rápida.

— Katniss? Tudo bem? – sua voz transmite espanto e demonstra que agora está totalmente acordado.

— Por favor, Gale, venha agora para minha casa! – suplico.

— Aconteceu alguma coisa? – indaga preocupado.

— Por favor, venha! – peço com uma voz lacrimosa.

— Estou indo!

Desligo o celular.

Não quero ficar mais nenhum segundo nesta casa. Sinto uma urgência terrível, que me consome toda, de fugir.

Descalça, apenas vestindo o meu pijama saio do quarto.

Não há sinal de Peeta no corredor.

Saio da casa, quando percebo estou debaixo da chuva, no portão, esperando por Gale. Seu carro não demora a aparecer.

Vou correndo em direção ao carro de Gale e abro a porta.

— Katniss? – me olha espantando ao ver meu aspecto, entro no carro toda molhada e descalça. – Aconteceu alguma coisa?

— Me tire daqui! – minha voz sai mais como uma ordem do que um pedido.

— Ok – diz Gale dando partida no carro.

Coloco os pés em cima do banco e envolvo as pernas em um abraço.

— O que aconteceu? – insiste. – Você está toda ensopada e tremendo!

— Tive um pesadelo – respondo com uma voz fraca.

— Katniss, você está me escondendo algo!

Fecho meus olhos e nada falo.

Logo estamos na casa de Gale. Durante o percurso não trocamos mais nenhuma palavra. Ele me leva até seu quarto e me entrega uma toalha e uma muda de roupa.

Vou até o banheiro e visto a roupa de Gale. Elas ficam enormes em mim, por isso preciso fazer várias dobras.

Quando volto ao quarto de Gale, o encontro com uma caneca na mão.

— Beba este chá, vai te aquecer – me oferece a caneca.

O quarto de Gale é grande, mas sem muitos móveis. No centro, há uma enorme cama. Inúmeras mulheres devem ter passado por esta cama. Há também uma escrivaninha perto da cama. Perto da janela, há um divã marrom. E uma estante com cds completa os móveis do quarto. As roupas ficam em um closet separado do resto do quarto.

Sento no divã.

— Está mais calma? – pergunta preocupado.

Balanço a cabeça, enquanto tomo um gole do chá quente.

Ele se senta ao meu lado no divã.

— Vai me contar o que aconteceu? – pergunta com uma voz terna.

— Não foi nada... apenas tive um pesadelo – tento sorrir.

— Sabe que pode contar comigo sempre, não sabe?

Somente faço sinal afirmativo com a cabeça. Enquanto dou outro trago no chá.

— Tem certeza que está bem?

— Sim, estou... – olho para ele, para seus olhos acinzentados que lembram os meus.

No fundo, eu e ele temos muitas coisas em comuns, somos duas pessoas solitárias. Gale tenta suprir sua solidão com mulheres, e eu, bem, eu tento sobreviver neste mundo do meu modo.

— Obrigada – murmuro.

Ele sorri e bagunça meus cabelos, como um irmão mais velho faria com sua irmãzinha que acabou de fazer uma travessura. No entanto, sua expressão sorridente muda ao tocar meu rosto.

— Katniss, você está queimando de febre! – fala, preocupado. – Vou pegar um remédio para esta febre baixar – levanta-se do divã e sai do quarto.

Sinto o cansaço me dominar. Me deito no divã, me aninhando como uma pequena bola de lã.

Adormeço.

As coisas ficam confusas a partir deste ponto. Gale entra no quarto e me faz beber algo. Ele me cobre com uma manta de lã.

Não sei se estou dormindo, ou é algum delírio provocado pela febre, escuto a voz de Peeta.

— Vou levar ela para casa!

— Mas ela está doente – protesta Gale.

— Por isso mesmo vou levá-la para a casa. Eu sou o tutor dela.

— E eu sou o namorado dela!

Não ouço mais nada, apenas sinto alguém me erguendo em seus braços. Todo o meu corpo dói, não consigo raciocinar direito. Nem ao menos sei o que se passa ao meu redor. Não sei se estou sonhando, ou se isso é real.

Depois disso, não me lembro de mais nada.

A primeira coisa que vejo ao abrir meus olhos são seus olhos azuis. Ele coloca a mão em minha testa.

— A febre baixou – diz.

Noto que sua mão ainda está em meu rosto. Com um movimento rápido a retiro de minha face.

— Katniss...

— Sai daqui, Peeta! – falo o mais forte que posso, porém ainda estou sem forças, por isso a voz sai débil.

Peeta finge não se importar com meu protesto.

— Você precisa comer algo.

Ele está sentando na beira da minha cama. Viro meu rosto para o lado oposto e fecho meus olhos.

— Tudo bem, coma mais tarde. Vou deixar você descansar mais um pouco...

Adormeço novamente.

— Katniss! – alguém me chama.

Abro meus olhos lentamente e me surpreendo ao encontrar Mags me observando.

— Coma isso – coloca uma bandeja em cima da cama. – Você está muito fraca, precisa comer algo.

Com alguma dificuldade me sento na cama. Olho para o caldo de legumes de onde sai uma fumaça. Meu estômago se revira diante do prato de comida.

— Não quero – digo afastando de mim o prato.

— Katniss, você precisa comer! – insiste. – Você passou o dia inteiro dormindo e não comeu nada desde ontem.

Olho para o caldo de legumes, tento levar uma colherada até a boca. Porém, meu estômago protesta, acabo devolvendo a colher ao prato.

Mags olha para mim com uma expressão preocupada.

— Vou ter que acordar o Peeta – lamenta. – Com muito custo consegui convencer ele a ir descansar... Ele passou a noite inteira cuidando de você. Disse para ele que assim que você acordasse eu iria avisar.

— Mags, não chame ele – tento falar de maneira resoluta, mas minha voz soa débil.

Ela não me escuta e sai do quarto.

Olho para a parede branca do meu quarto, tentando ordenar meu caos e me preparar para a batalha. Sei que não agi muito racionalmente. Na verdade, deixei a razão de lado. No entanto, agora preciso ágil friamente, neste momento, preciso da razão mais do que tudo. É isso o que vou fazer, usar a minha razão.

Analisando a situação friamente, até que isso pode me ajudar. Era de se esperar que eu tivesse uma reação assim. Sim, seria estranho se eu aceitasse que Peeta foi um gigolô sem questionar.

O meu inimigo é alguém extremamente racional e que sabe mentir como ninguém, todo o cuidado é pouco. Se quero continuar com este jogo preciso ser racional. E ontem quase me deixei ser presa (por um segundo) em seu jogo de garoto arrependido.

Não sei quanto do arrependimento dele é real. Será que existe algum arrependimento? Quando ele falou com Johanna, e depois comigo, ele realmente parecia arrependido e cheio de dor.

Mas... Pensando racionalmente. Ele não poderia levar sua velha vida aqui. Não sendo o tutor da herdeira Everdeen. Qualquer passo em falso e... tudo iria pelos ares. Por isso, ele precisou atuar em frente a Johanna.

E depois quando percebeu minha presença, seu cérebro deve ter agido rápido e arquitetado um plano, toda aquela história...

Ele sabe mentir muito bem, atuar como ninguém. Naquele momento, ele poderia estar atuando.

Será que sua dor era real? Minha porção racional diz que não, mas... há uma pequena porção minha (que tento suprimir com todas as forças) que diz que aquilo foi real. Não, aquilo foi uma farsa!

Preciso parar de questionar isso. Preciso me focar no que realmente importa aqui, descobrir mais coisas sobre Peeta. Neste momento tenho uma arma nas mãos e preciso usá-la da melhor maneira possível.

Peeta logo aparece em meu quarto. Seu aspecto não é dos melhores, está visivelmente cansado.

— Você está bem?

Não respondo a sua pergunta.

Ele se aproxima de mim. Pega o termômetro e mede a minha febre. Não olho nenhuma vez para ele, enquanto ele executa a ação.

— A febre está baixa... – diz, observando o termômetro. – O médico disse que você precisa apenas tomar o remédio que logo estará boa...

Ele olha para o caldo intocado por mim.

— Você precisa comer. Faça um esforço, sim?

Continuo sem falar e sem o olhar. Ele solta um suspiro.

— O quer que eu faça para você comer? – me encara por um longo segundo.

— Peeta... – minha voz é quase inaudível.

Ele me olha animado.

— Sim?

— Meu pai... – paro de falar para observar sua expressão, mas não consigo ver nada.

— O que tem ele?

— Ele gostava muito de você...

Esta é uma das perguntas que sempre ródea a minha mente. Meu pai amava Peeta, e acredito que o amava até mais que a mim. A única vez que o vi sorrir de verdade foi quando ele mencionou uma visita que fez a Peeta. Então, se meu pai amava tanto Peeta, por que ele quer se vingar de meu pai? Já criei milhares de suposições, porém nenhuma que eu veja como verdade.

— Gostava? – ele diz um pouco surpreso.

— Você era o filho que ele sempre quis ter.

Olho para ele. Peeta começa a mexer no caldo e apanha um pouco com a colher, levando em direção a minha boca. Penso em recusar o caldo, porém quando percebo a colher já está em minha boca. Ele retira a colher da minha boca e apanha outra colherada de caldo. Repete o gesto, mas desta vez eu não abro a boca.

— Seu pai era um homem interessante – diz enquanto mantém a colher no ar perto de minha boca.

— Sabia que meu pai e sua mãe iriam se casar? – pergunto de supetão.

Peeta aproveita para colocar a colherada de caldo em minha boca.

— Já tinha ouvido sobre isso – ele não parece surpreso.

— Poderíamos ter sido irmãos...

Peeta detém no ar a colher que estava levando, novamente, a minha boca.

— Irmãos?

— É, quem sabe, se meu pai tivesse casado com sua mãe...

— Que ideia, Katniss! – sorri. – Se minha mãe houvesse se casado com seu pai, nem eu e nem você existiríamos. Além disso, minha mãe realmente amava meu pai. Acho que ela nunca se casaria com outro homem que não fosse meu pai – fala enquanto coloca a colher de caldo em minha boca.

Olho para ele surpresa. Como assim, a mãe dele amava tanto o pai dele que nunca pensou em se casar com outro homem? Eu sempre ouvi coisas vagas a respeito do passado de meu pai. No entanto, algo era bem nítido, a paixão que ele tinha por Maysilee. E a paixão que ela tinha por ele.

— Não se preocupe, nós nunca seriamos irmãos – sorri, porém, logo seu rosto fica sério. – Você nunca teria um irmão como eu... Você não merece isso.

Peeta deposita a colher no prato.

— Conversamos mais tarde, agora descanse – diz, retirando a bandeja de cima da cama.

Faço sinal afirmativo com a cabeça. Volto a me deitar na cama, enquanto Peeta sai do quarto.

A cada dia descubro mais peças deste quebra-cabeça. Será que conseguirei juntar todas elas e formar uma figura? Neste momento, sinto que ainda faltam muitas peças para o quebra-cabeça ficar completo.


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Notas finais do capítulo

Odiaram? Gostaram? Concordam com a teoria da Katniss de que tudo não passa de uma atuação e que ele não está arrependido coisíssima nenhuma? Ou será que o Peeta foi verdadeiro com a Katniss e ela o está mal interpretando? Mas uma coisa é certa há muitas peças que faltam neste quebra-cabeça para ele ficar completo.