Crônicas Do Olimpo - O Último Olimpiano escrita por Laís Bohrer


Capítulo 31
A Lenda do Olimpo




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Uma fonte mistura de dois lados. Uma intensa combinação de dois poderes.

O fardo era muito mais do que eu poderia aguentar, meu corpo inteiro queimava com fogo negro. Raios de escuridão tocavam as nuvens, deixando-as mais escuras como em um dia de tempestade. Aquele era o poder do monstro. Sem nem ao menos perceber eu também convocava água de mim mesma. Rajadas de água me circulavam, um Kinitrus gigante de água ainda rugia para o céu em um barulho perturbador capaz de apavorar até mesmo todos os monstros do Tártaro. Eu perdia o controle aos poucos e de algum modo eu me sentia bem, não... Eu me sentia invencível.

Quando eu gritei para o céu, o Olimpo estremeceu de novo, eu podia dizer que a batalha lá em baixo havia parado para ver o espetáculo, mas eu não me importava. Tudo o que eu queria era acabar com aquilo que comecei. Eu queria matar um certo titã do tempo.

Eu podia ouvir a risada de Cronos:

– Finalmente saiu para brincar? – eu sabia que ele não estava se dirigindo a mim.

O Kinitrus de água rosnou mais uma vez, exibindo toda a sua fúria. Era como se todo aquele poder tivesse vida própria. O punho de água do monstro socou a cabeça do titã e ele foi empurrado para baixo como um prego, deixando apenas a sua cabeça de fora, o titã ainda exibia seu sorriso mesquinho. Ele levitou a si mesmo para cima.

– Então, vamos...

Meus membros não obedeciam à única parte consciente da minha mente, eu corri na direção do titã em uma velocidade sobre humana, o punho de água me deu um solo e se ergueu me levantando junto, eu soquei o titã, tudo ocorreu em câmera lenta e dessa vez eu soube que Cronos estava mexendo com o tempo de novo. Ele deu um peteleco na minha testa e eu fui jogada para longe, meu corpo chocou-se contra uma parede que teve um gravíssimo dano, mas eu ainda estava inteira e com raiva, mais do que nunca e a besta dentro de mim não estava muito diferente.

Eu vou... Dividi-lo em três! Nós dizemos juntos.

Dessa vez, o Kinitrus de água atacou de novo, como se fosse uma marionete do monstro original. Suas dez caudas perseguiam o titã. Seus dois punhos socaram o chão dos dois lados de Cronos criando uma longa rachadura. Cronos ergueu as mãos para os punhos, paredes de força atingiram dos dois lados, mas os punhos mal se moveram, mas Kinitrus ficou bem mais bravo.

Cronos riu erguendo sua foice, ele correu na minha direção, eu sorri de modo psicopata e corri em sua direção o que teria sido muito, muito idiota mesmo, tipo, correr na direção de um titã com as mãos vazias? Mas no momento em que o titã ia aplicar o golpe com sua lâmina eu a interceptei com minhas mini-garras, o titã parecera surpreso por um momento, eu não dei-lhe tempo para uma expressão facial, eu simplesmente o acertei em cheio com um soco, ele voou para longe como um boneco de pano.

Eu estava completamente louca, insana, fora do meu juízo perfeito. E em nenhum momento Cronos deixara de sorrir, como se estivesse feliz por ter algum desafio finalmente. Eu sabia que Anaklusmos voltara ao meu bolso, mas eu não ligava a mínima para isso. Cronos erguera sua foice e atacou de novo, no momento ele que ele chegou eu bati em sua foice com minhas próprias mãos e a arma foi jogada para longe, caindo na lareira em chamas.

Você está morto... – eu disse, mas aquela voz não parecia exatamente minha, era rouca e assassina. Demonstrando uma enorme sede de sangue.

Cronos sorriu.

– Isso... Era isso – disse ele, Icor escorrendo do seu lábio – Esse é o ódio que eu queria ver!

Era a minha imaginação, ou todo o corpo dele estava brilhando, virando ouro?

O titã ergueu a mão na minha direção e antes que eu pudesse lhe acertar com outro golpe, uma nova parede de força se chocou contra mim, mas dessa vez eu apenas cai para trás. Ele procurou por sua foice, mas estava na lareira, brilhando entre as brasas. Ele cambaleou na direção dela.

Eu me coloquei de pé, mas Kinitrus foi mais rápido, seu punho cortou o caminho de Cronos. Eu estava pronta para entrar no caminho deles, eu que tinha de matar Cronos. Foi quando minha visão dobrou.

Eu acredito em você... Em você... Ecoou a voz de Percy.

Ou você doma esse monstro, ou esse monstro doma você... Disseram as palavras de Héstia na minha mente.

Eu via meu reflexo no chão encharcado por água, meu olho esquerdo completamente escuro e cheio de ódio, e o direito estava normal... Verde como sempre, verde e cheio de dor. A imagem da marionete de Kinitrus estava mais fraca, porém com igual força, ainda encurralando o titã como se brincasse com ele. Partes dos meus membros ainda teimavam em obedecer, forcei minha mão a mergulhar no bolso, agarrei Anaklusmos e retirei a tampa. A caneta transformou-se em minha fiel espada. Se eu for morrer agora, preferia que agisse por conta própria.

A morte acolhe aqueles que a procuram, conhecida Megan Jackson. Dissera Daniel.

Eu hesitei. Eu realmente estava pronta pra isso? Eu realmente era a criança da profecia? Sendo ou não sendo...

– Que se dane... – eu murmurei e corri na direção do titã que estava nas mãos de Kinitrus.

Pare com isso... Agora. Eu disse mentalmente ao monstro, mas ele não respondeu e nem mesmo agiu. Queira ou não, nós somos um só, você não pode sempre agir por conta própria... Eu aprendi isso, você terá que aprender também...

Nada. Kinitrus não dava a mínima para mim. Lembrei sobre o que Percy havia dito: Até mesmo alguns monstros tem coração. Perguntei-me sobre tudo o que Kinitrus poderia ter passado. Sendo rejeitado de hospedeiro a hospedeiro. Sendo tratado como um simples fardo. Sozinho sempre, sem ninguém que o entendesse ou o aceitasse como ele é. Pela primeira vez eu pude pensar que nós não éramos tão diferentes. Mesmo que Kinitrus tivesse muito orgulho para admitir, nós éramos iguais, a diferença era que um dia eu fui aceita, mas ele não.

Eu fechei os olhos, me concentrando, me pela primeira vez indo por conta própria até a coisa – tenho que parar de chamá-lo assim: Monstro, coisa, besta... – quando vi, eu já estava diante da sua cela, seus olhos arregalados para mim.

Por favor... Chega. Eu pedi. Você esteve hospedado na minha mente por todos esses anos, hora de pagar o aluguel, então pare.

O monstro hesitou.

Porque eu faria isso?

Eu mordi o lábio.

Por que você está me ajudando? Perguntei. Você não gosta de mim, certo? Porque está me ajudando?

Se você morrer, eu também serei destruído... E terei que esperar mais um século no Tártaro. Explicou, mas não me pareceu convincente o suficiente.

Eu respirei fundo.

Eu não irei morrer então não se preocupe que você não será destruído eu disse. Eu vou apagar o ódio...

Você não pode.

Como?

Kinitrus me analisou com seus olhos gigantes e negros.

Heróis vêm tentando apagar o ódio no mundo, mas eles mesmos se rendem a esse inimigo. Disse. Humanos, deuses, titãs... Acha que você poderia ser diferente? Você acabou de provar ao contrário.

Eu ri e sacudi a cabeça.

Foi você que acabou de provar ao contrário. Eu corrigi. Sabe Kinitrus... Um dia eu quero apagar todo esse ódio que você guarda também, mas até lá, vou começar apagando o meu próprio.

Então eu virei às costas, sem esperar uma resposta.

Quando cheguei até Cronos, parte de mim ainda estava sendo dominada por Kinitrus, mas eu já conseguia agir por mim mesma, pelo menos agora. Eu ataquei o titã com Anaklusmos. Eu dei um doloroso passo à frente. Meu corpo pesava sobre mim, toda a força que eu tinha usado tinha me desgastado por completo. O punho de Kinitrus agora apenas encurralava Cronos, mas eu daria o golpe final.

Foi naquele momento em que a ponta da minha espada tocou no pescoço do titã.

– Você tem razão – eu disse. – Eu não te odiava o suficiente.

Então ele engasgou como se não pudesse respirar.

– Jackson... - Mas não era a voz do titã. Era a voz de Luke.

Enquanto isso, o corpo de Luke virava ouro, o titã tomando sua verdadeira forma.

– Ele está mudando. Ajude. Ele... Ele está quase pronto. Ele não precisará mais do meu corpo. Por favor...

JACKSON! – Cronos berrou.

Eu forcei Anaklusmos no seu pescoço.

– Luke... – eu murmurei.

Raiva passou pelo rosto dele. A voz de Luke murmurou:

– Rápido... – Luke murmurou. – Você tem que fazer isso... Ele vai quebrar o meu controle.

Ele estava definitivamente brilhando agora, sua pele começando a soltar fumaça.

Eu estava confusa, eu não sabia o que fazer, mas eu sabia que Luke estava sentindo a mesma coisa que eu senti fazia pouco tempo. Ele tinha razão, eu tinha que ser rápida, o único problema era que eu não sabia o ponto fraco de Cronos.

Luke soltou as tiras da armadura, expondo um pequeno pedaço da sua pele logo abaixo do seu braço esquerdo, um lugar que seria bem difícil de atingir.

– Por favor – Luke rosnou. – Estamos sem tempo. Megan...

Ele segurou a mão em que eu segurava Anaklusmos.

– Por favor...

Eu mordi o lábio então assenti para ele, então esfaqueei a área que ele indicou. Não era um corte profundo, mas Luke uivou. Os olhos dele brilharam como lava. A sala do trono tremeu, me fazendo perder o equilíbrio e cair. Uma aura de energia cercou Luke, ficando cada vez mais e mais brilhante. Eu fechei meus olhos e senti a força de algo como uma explosão nuclear pinicar minha pele e rachar meus lábios.

Fez-se silêncio por um longo tempo.

Quando abri meus olhos, eu vi Luke estendido na lareira. No chão ao seu redor estava um círculo enegrecido de cinzas. A foice de Cronos tinha se liquefeito em metal líquido e estava brilhando entre as brasas da lareira, que agora brilhavam como um forno de ferreiro.

O lado esquerdo de Luke estava sangrando. Os olhos dele estavam abertos – olhos azuis, do jeito que eles costumavam ser. Sua respiração arquejou profundamente.

– Parabéns – ele me disse, então estremeceu de dor. – Eu vou esperar Thalia... Megan, e você?

Eu respirava com dificuldade, mas olhei para ele.

– Eu sinto muito pelo Percy – ele tossiu.

– Luke... – eu hesitei.

Outra tosse.

Ele agarrou a manga da minha camisa, e eu pude sentir o calor de sua pele como se fosse fogo.

– Ethan. Eu. Todos os indeterminados. Não deixe... Não deixe acontecer de novo.

Seus olhos estavam raivosos, mas suplicantes também.

– Não deixarei – eu disse. – Eu juro pelo rio Estige.

Luke assentiu e sua mão se soltou, e ele morreu.

Eu fiz força para ficar de pé, meus pés doeram no mesmo momento e eu cai. Uma leve chuva tocou o solo da cidade eterna. Eu olhei para o corpo de Silena, sabia que ela ainda estava viva, isso... Eu ainda podia salva-la. Eu prendi a respiração. Apoiei o queixo no chão e o usei como forma de me arrastar até ela, eu gemi a cada movimento, cada osso do meu corpo reclamava.

Eu estava quase lá... Quase... Apenas alguns metros.

Eu me apoiei no chão com as minhas mãos, eu esqueci que ainda segurava Anaklusmos, mas eu não a soltara ainda. Um último esforço, então eu cai ao lado de Silena.

Soltei Anaklusmos entre nós duas.

– Grande... Luta. – ela disse com a voz rouca.

Eu tomei fôlego.

– Sim...

Ela sorriu para mim.

– Você tem muita história para contar... – disse ela.

Eu assenti.

– Vamos contar juntar.

Seu sorriso esvaiu-se.

– Me perdoe... Por tudo. – ela pediu suplicante.

– Eu te perdoei. – eu disse. – Faz tempo...

– Jura... – ela falou, como se cada palavra doesse, suas mãos estavam sujas com seu próprio sangue. Seu rosto sujo de fuligem, sua armadura amassada e inútil. Mesmo assim, ela conseguia estar linda. – Jura de mindinho?

Eu ri quando ela estendeu o dedo mínimo para mim, então eu enrosquei o meu dedo mínimo no dela.

– Juro de mindinho. – eu disse.

Ela sorriu.

– Adeus, Megan... – ela disse.

Eu sacudi a cabeça.

– Você não vai morrer, Silena – eu disse, meus olhos estavam cheios de lagrimas. – Eu prometi que ia te salvar...

Ela ergueu minha cabeça e jogou minha franja para trás, como havia feito naquele dia.

– Você me salvou, Megan – ela falou, seus olhos com um brilho fraco. – Eu não quero que você se culpe de nada, está bem? Quando alguém se vai a culpa é somente desse alguém.

– Cale a Boca – eu bufei e ela riu de novo. – Clarice Lispector.

Ela riu mais e olhou para o céu, eu fiz o mesmo. Eu podia ver todas as constelações, Hércules, Perseus, Hidra, Pegasus... A constelação da caçadora, em homenagem a uma velha amiga. E a estrela de Megan que dera origem ao meu nome. Não havia estrelas menores e nem maiores, haviam apenas estrelas.

– Elas são lindas, não são? – disse Silena. – As estrelas... Eu costumava olhar para elas antes de dormir, faço isso até hoje, e essa é a última vez.

Eu não respondi. Nossos dedos mínimos ainda enroscados um no outro, ambas nós duas segurávamos fortemente como se fossem nossas vidas.

– Não é a última vez, eu prometo. – eu disse.

– Não faça promessas que não pode cumprir... – ela murmurou então fechou os olhos. – Você fez um bom trabalho, Megan... No final você era mesmo a heroína.

– Eu não me sinto a heroína – eu a cortei.

– Ainda não – ela disse abrindo novamente os olhos para olhar as estrelas. – Mas logo você verá, porque hoje, Ariana Jackson, você será conhecida como a Lenda do Olimpo.

Eu ri e a encarei.

– Diga a Percy que eu mandei um oi. – eu pedi.

Ela assentiu fracamente antes que não pudesse mais me responder. Seus olhos grandes e azuis perderam o brilho, sua respiração parou e quando eu percebi, ela havia ido embora para sempre e dessa vez, eu não poderia trazê-la de volta.


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