Voltando

PRIMEIRAMENTE, não tive reação nenhuma. Apenas o encarei, os olhos totalmente escuros e o peito que subia e descia. Então, num impulso, estava agarrada em Jamie.

Meus dedos se enrolaram automaticamente nos cabelos dele, afundando-o contra mim, e ao mesmo tempo afundei meu próprio rosto em seu pescoço. Meu corpo inteiro o abraçava: as pernas de cada lado do seu quadril, um braço apertando sua camisa e o outro segurando seu rosto.

E eu chorei, desabei em lágrimas desesperadas e espasmos descontrolados no calor dos braços dele, com tantas emoções brincando dentro de mim. Eu me tornei um trapo emocionalmente. Não conseguia aguentar mais muita coisa.

—Ei. —Seu riso soou tão leve e suave ao meu ouvido, tão irreal. —Está tudo bem.

Eu me afastei dele só um pouquinho e as lágrimas continuaram escorrendo mesmo quando franzi as sobrancelhas.

—Seu inútil! —Bati com força no peito dele. —Como você faz isso comigo? Primeiro banca o herói e me salva, depois some e quando consigo lhe recuperar, se tranca a sete chaves na própria cabeça. Você quer me matar?! —Dou um ultimo golpe, fraco, com o pulso, e perco as forças. —Se queria, quase conseguiu. Foi por pouco. —Solucei. — Quase que eu te perdi, e... Você voltou. —Respirei fundo, com tanta coisa na cabeça que não consigo decifrar uma sequer. —Como você conseguiu?

Ele segurou meu rosto, ainda sorrindo, e tocou minha testa na sua.

—Não sei. Eu apenas ouvi sua voz.

Apertei os olhos e o abracei, escondendo o rosto na curva do seu pescoço ao mesmo tempo que Jamie beijou meu ombro.

Não demorou muito para que eu sentisse outros braços ao meu redor, pequenos e grandes, bronzeados e pálidos, todos se esticando para poder tocar em Jamie. Peg enfiou o rosto nas costas dele, os braços presos atrás do meu pescoço e Ian também nos abraçou. Alice pulou no catre e se enfiou no meu colo, e minha mãe cobriu meus ombros com os braços. Até Doc foi puxado para aquele grande abraço, mesmo desmaiado. Houve algumas lágrimas, mas muitos sorrisos, e o calor do momento marcou a volta de Jamie da melhor maneira possível.

Quando todos conseguiram se aquietar e soltar Jamie, o que pareceu um pouco difícil para Peg, que insistia em cair às lágrimas cada vez que via o rosto dele, Jamie sentou-se com as pernas para fora do catre. Ele era tão grande que, mesmo com a bunda no catre, os pés tocavam o chão. Hesitou alguns instantes antes de se por de pé. Seu corpo ficara muito tempo parado, e não havia como saber o que ainda estava funcionando.

Ele bamboleou um pouco para a esquerda, mas o segurei.

—Bem... —Ele arfou. —É mais difícil do que parece.

—Vamos com calma. —Disse minha mãe. —Um passo de cada vez.

Mantive os braços firmemente apertados ao redor de Jamie quando ele apoiou o peso em uma perna e esticou a outra, apoiando o pé e dando um passo pequeno. Conseguiu se firmar, apoiando os dois pés do chão.

—Muito bom. —Murmurei.

Jamie precisou de quinze minutos andando de lado para o outro com apoio, hora meu hora de Ian, até conseguir andar sozinho. Testou os pés e alongou os braços, e até arriscou uns pulinhos.

Nesse meio tempo, Doc despertou. Não tive muita pressa em olhar para ele, envergonhada pelo fato de que, se não fosse Jamie, eu teria vitimado a Doc uma overdose.

—O quê... —Ele resmungou. Peg foi ajudá-lo. —Jamie...

Escutei quando ele se pôs de pé e começou a tagarelar com Peg aos sussurros.

—Doc! —Jamie se desequilibrou quando deu um solavanco em direção ao doutor. —Oi!

—Jamie. Eu... —Então senti seus olhos fritarem minha nuca. —Ashley...

Dei uma olhadela sobre o ombro para ele.

—Hm... Desculpe? —Arrisquei.

Doc limpou as roupas e não olhou mais para mim.

—Acho que ele ficou zangado. —Sussurrei.

—Você quase o matou. Queria que ele fizesse o quê? Agradecesse de joelhos? —Respondeu Jamie.

—Eu o impedi de te matar. Você que deveria me agradecer de joelhos.

Jamie deu um meio sorriso, encarando a parede.

—Mais tarde, talvez.

Joguei meus ombros para cima, para soltar o braço dele, mas Jamie segurou meus braços. Não consegui reconhecer a intenção em seus olhos antes de seus lábios tocarem os meus, mas tive plena consciência dele em seguida. Quando estava certa de que cada centímetro do meu corpo explodiria, Jamie separou o beijo para me abraçar. Senti a umidade de sua boca no meu pescoço, mas meu corpo sentiu a ausência do momento anterior. Senti-me ansiosa e angustiada, como um cão abocanhando o ar antes de agarrar algo concreto. Por um momento, vacilei sob meus pés, afastando-me de Jamie. Mas ele pressionou a mão na base da minha coluna e preencheu o espaço vazio entre meus lábios com os dele, resumindo a ansiedade e a angústia a puro e intenso fogo.

Jane limpou a garganta, e meio que acordei e empurrei Jamie levemente. Alice estava com as mãos na frente dos olhos, o que me fez rir.

—Já chega por agora. —Minha mãe mandou-me um olhar sugestivo, que me fez ruborizar. —Deixem a agarração para mais tarde. —Corei ainda mais.

—Já entendi, mãe.

Abandonei os olhos no perfil de Jamie. Por que ele nunca ficava ruborizado com essas brincadeiras sugestivas? Descansei a cabeça no peito dele por um instante.

—Muito bem, então. —Doc bateu as palmas. —Jamie, você precisa de um banho, um prato de sopa de galinha e de uma boa noite de sono como um humano e não um morto vivo. Amanhã, nesse horário, venha até aqui para que eu possa lhe examinar.

—Tudo bem.

—E... Ashley. —Ergui meus olhos para Doc. —Ajude Jamie a testar se todos os músculos estão funcionando na maneira correta.

Mais rubor.

—Pode deixar.

Ajudei Jamie a ir até a cozinha e apoiei a cabeça no meu punho enquanto ele devorava os três pratos transbordantes de comida que lhe ofereceram, com mais um litro de água atrás. Ele conseguiu se manter de pé quinze minutos depois, quando a comida chegou ao seu estômago e deu nova energia a seus músculos.

—Vou tomar um banho agora, você me espera no quarto?

Ele pressionou levemente os lábios nos meus.

—Nu-hum. Vou ficar aqui, esperando.

—Está se oferecendo para tomar banho comigo?

—Jamie! Eu só disse que...

Ele riu, segurou meu cabelo na altura da minha nuca e me puxou para mais perto. Parecia um cachorrinho carente, pelo modo como ele evitava me soltar.

—Estou brincando, Ash. Não precisa ficar vermelha. —Quanta insistência. —Eu volto já.

—Okay. Vou ficar bem aqui.

—Okay.

Ele riu e lhe ofereci um sorriso, antes de Jamie sumir na penumbra da câmara de banho. Sentei-me na boca da caverna, com as costas eretas na parede. Lola me achou em poucos minutos, dando um jeito de se enfiar no meu colo. Eu sorri e a acariciei, ciente de que tudo no meu mundo parecia estar voltando aos eixos.