The Surviver 2 escrita por NDeggau


Capítulo 21
Capítulo 20 — Retomando


Notas iniciais do capítulo

BRAHAHAHAHAHA AÇÃO!
Desculpem a demora, estou terrivelmente sem tempo. Mas aqui está, um capítulo com vários acontecimentos. Finalmente vou colocar essa história pra frente.
Espero que gostem!



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Retomando

O AR ESTAVA DENSO. Seco. Difícil de respirar. Fazia tempo que não chovia, e tudo cheirava a poeira, diferente do cheiro úmido das cavernas. As montanhas de marfim se estendiam até a autoestrada, uma marca cinzenta deixada em meio ao dourado das areias ao pôr-do-sol. O céu estava pincelado de cinza e laranja, sem nuvens. Algumas estrelas começavam a piscar ao leste, às minhas costas. Era bonito.

Eu não sabia que ainda era capaz de enxergar beleza no nosso mundo. Fechei os olhos por um instante. Tudo era silêncio, apenas o som do vento e o uivo de um coiote saudando a lua ao longe.

Uma mão tocou meu ombro.

—Está pronta? —Perguntou Ian.

Assenti com a cabeça.

—Eu nasci pronta para isso.

Então, olhamos um nos olhos do outro e ele contou até três. E eu corri. Desci a ladeira, desviando de pedras e pulando algumas plantas secas. Eu corri.

Segui até a trilha, onde o chão era plano e firme, e acelerei a velocidade. Meus músculos reclamaram – não estavam mais acostumados a tanto esforço – mas eu não pararia; eu não pararia.

Redobrei o esforço nos joelhos e subi um monte de areia. Os grãos finos se enroscaram em minha roupa e pele, salgando minha boca, mas não parei. Desci a ladeira na maior velocidade que conseguia e deixei se formar; uma espécie de uivo, grito e urro, que se formou na boca do meu estômago, rasgou minha garganta e se libertou com fúria, como um animal selvagem muito tempo preso.

Inclinei meu quadril para a direita e me joguei, apoiando o peso do corpo com as mãos e impulsionando para ficar de pé de volta, dando uma volta completa – uma estrela – e não me dei tempo de me firmar, apenas bamboleei sobre os pés e continuei correndo. Era bom. Era selvagem. Era libertador.

Subi um amontoado de pedras, e algumas cortaram a pele sensível da parte interno dos braços, mas não liguei. A dor era parte de mim, não poderia fugir dela. Sentei-me na pedra mais alta, admirando o escuro que se aproximava, os pontos brilhantes ao norte, e Ian me alcançou. Ele arfava com mais força do que eu, e ficou na base das pedras, se apoiando.

—Muito esforço, vovô?

—Se eu... —Ian puxou o ar com força. —Se eu ainda tivesse dezoito anos, você iria ver.

Dei uma risada, e observei o sol que se punha. Apenas alguns últimos resquícios de luz contornavam as montanhas no horizonte, lançando sombras abstratas na areia, garras negras se esticando a cada segundo. A lua se apresentou, deixando a penumbra azulada.

Senti uma mão tocando a minha e puxei Ian, dando-lhe espaço. Meu coração ainda estava acelerado, jogando o sangue com força nas veias.

—É bonito. —Sussurrei.

Ian seguiu o contorno da montanha com os olhos, escurecidos pela pouca luz, e sorriu.

—É muito bonito. —Concordou, e voltou os olhos para mim. —É o suficiente?

—Sim. Ah, com certeza. Eu estava precisando disso.

Disso, a liberdade, a força, a adrenalina. Eu não podia ficar encarcerada, precisava de espaço.

—Excelente. Quer dizer, é ótimo que você esteja bem novamente.

Baixei os olhos. Não me considerava bem; apenas renovada. Pronta para cair novamente.

—Talvez devêssemos voltar. —Murmurei. —Antes que fique muito escuro.

Desci as pedras, aterrissando com força, e antes que Ian me alcançasse, voltei a correr. Afundando meus pés na areia, errei a trilha propositalmente, dando-me alguns metros a mais para correr. Acidentalmente, pisei num amontoado de chollas. Caí, e os espinhos me feriram, a areia fazendo os cortes arderem.

—Ei, tudo bem? —Ian já estava me içando para cima novamente.

—Estou bem. —Esfreguei os braços. —Não vi esses chollas idiotas. Apenas vamos voltar.

Eu estava com um péssimo pressentimento.

Fiquei observando o corpo de Jamie enquanto Doc tratava meus braços. A respiração fazia seu peito subir e descer lentamente, e nada mais.

—Jamie está demorando. —Pronunciei, hesitante. Não queria admitir, a verdade era difícil.

—Esse é um assunto que preciso falar com você. —Doc passou algodão sobre os cortes para retirar as sujeitas, e aplicou o Curar. Percebi que ele evitava meus olhos. —Os... Os níveis de hidratação e nutrição estão baixos e... Os músculos podem se atrofiar, há muito tempo não são usados. Vamos precisar... —Seus olhos se ergueram, e estreitei o olhar. —Vamos precisar reinserir Matthew.

Puxei o ar pelo nariz. Doc esperava uma reação mais alarmante, talvez uma explosão de gritos e gestos agressivos, mas me mantive sentada, parada, impassível.

—Certo... Quando?

—Amanhã cedo. —Realmente havia surpresa na voz de Doc.

—Está bem. —Baixei meus olhos para evitar que descobrissem a angústia presente neles. —Eu preciso de um banho. E de uma noite de sono. Já terminou?

Meus braços estavam prontos, curados. Apenas linhas róseas de pele nova estriando a pele pálida antiga, onde antes estavam os cortes.

—Vá descansar. —Doc me sorriu, mas não retribui. Estava me sentindo meio traída.

Desci do catre e esfreguei meus braços, não apreciava muito a sensação dos medicamentos de Alma, mas estes eram práticos. Encaminhei-me até o corpo de Jamie e puxei seus cabelos para cima, beijei sua testa.

Então virei às costas e parti, desejando que um milagre acontecesse e Jamie voltasse essa noite.

Na manhã seguinte, Doc estava limpando o bisturi quando cheguei. Era cedo, o sol tinha acabado de raiar. Melanie estava lá, sozinha. Jared havia saído com um grupo em uma incursão, e retornaria hoje.

Apoiei-me em um dos catres vazios e bocejei.

—Vamos logo com isso. —Reclamei, impaciente.

Melanie estava com o cenho franzido, uma mão em cada lado do rosto de Jamie. Parecia tão impaciente quanto eu, mas procurava não demonstrar.

—Temos que esperar por Peg. —Mel me respondeu, mas seus olhos continuaram fixos em Doc.

—Hum. —Tamborilei os dedos no meu antebraço. Estava com vontade de correr até o quarto dela, arrancá-la dos braços de Ian e colocar Peg onde ela deveria estar, aqui ajudando Jamie. Mas eu estava procurando ser uma pessoa melhor. —Tudo bem. Espero que ela não demore.

Não demorou.

Alguns minutos depois, Peg entrou apressadamente no consultório, seus compridos e enrolados fios loiros presos num rabo de cavalo desajeitado, as mangas do moletom cinza caindo sobre suas mãos.

—Desculpem-me. Eu demorei a dormir noite passada.

—Sei bem o que você fez noite passada. —Sibilei, e minha insinuação fez as faces dela se avivarem.

—Sem mais delongas... —Começou Doc, e Peg se posicionou ao seu lado.

Não consegui observar a inserção por completo. No momento que Doc abriu a pele de Jamie com o bisturi, fui dominada por um pânico tão cruel e sufocante que tive que deixar o cômodo. Sentei-me no chão, as costas rentes à parede e os joelhos contra o peito, e só me mexi quando Melanie veio me chamar, quinze minutos depois.

Encontrei Matthew sentado no catre. Ele esfregava a nuca e sorria, enquanto Doc lhe fazia perguntas para garantir que estava tudo bem. Ele assentia ou negava, e parecia concentrado em mover cada músculo do seu corpo, até que me viu.

Odiei seu olhar. O modo como seus olhos, antes escuros, agora transformados pelo reflexo, brilharam. Odiei como todo seu corpo respondeu à minha presença, e como ele abriu um sorriso que provava que eu era a pessoa mais importante de todas para ele. Todos esses gestos, que eu estava tão habituada, tudo roubado da mente de Jamie.

Não medi esforços para desfazer minha carranca.

—Oi, Ashley.

—Oi. —Eu deveria ser mais gentil, deveria. Mas não consegui.

—Nós lhe recolocamos no corpo de Jamie afim de que você tente encontra-lo. Acha que consegue, Matt? —Disse Melanie. A voz dela soava mais esperançosa do que a minha.

—Sim. —Aqueles malditos reflexos continuavam pregados em mim. —Vou tentar encontra-lo.

—Ótimo. —Nada de gentileza. —Quanto mais rápido isso acontecer, melhor para nós. Para todos nós.

Finalmente consegui fazer com que Matthew desviasse os olhos, colando-os no chão.

—Você deve estar com fome, Matt. —Peg acariciou o ombro dele. —Talvez queira companhia até o refeitório?

—Tudo bem. —Matthew lhe sorriu, a Peg esticou sua pequena mão para que ele segurasse.

—Qualquer notícia que tivermos, eu aviso vocês. —Soprou Peg com sua voz de passarinho, e ambos deixaram o consultório.

—Você realmente acha que isso vai funcionar? —Doc se referiu a Melanie.

—Tem que funcionar. —Ela respondeu, os olhos esquecidos no ponto onde Matthew desaparecera. —É nossa última chance.

—É nossa única chance. —Concordei, e fechei os olhos, apoiando-me no catre. Estava cansada de depender de tão poucas oportunidades.

—Não há nada ainda. —Murmurou Peg.

Estávamos Peg, eu, Mel e Doc no consultório mais uma vez, discutindo sobre Jamie.

Os outros estavam descarregando os carros; Jared havia voltado da incursão.

—Ele não consegue sentir nada, nenhuma lembrança sequer. Ou Jamie está muito bem trancado ou... —A voz de Peg minguou. Ela mordeu o lábio e a frase se perdeu no ar.

—Talvez ele esteja se bloqueando. Talvez só esteja pensando que Matthew está lá, no meio das Almas, e que corremos perigo que ele se revelar.

—Talvez. —Doc coçou o queixo. —Peg, se não estou enganado, quando você era nova aqui, suprimiu Melanie sem querer e... Conseguiu trazê-la de volta. Como fez isso?

—Bem, eu... —Por que Peg ficava corada com tamanha frequência? —Eu... Tive que fazer com que ela se sentisse sobrepujada.

—Ela agarrou Jared. —Resmungou Mel, mas de repente seu rosto se iluminou com uma ideia. Seus olhos saltaram até mim. —Sobrepujada...

—O quê? —Todos os outros partilharam do mesmo pensamento, pois três pares de olhos estavam fixos no meu rosto. —O quê?

—Talvez você consiga fazer com que Jamie volte. —Murmurou Melanie. Ela parecia bolar um plano, olhando para o nada.

—O que quer dizer com isso?

—Ele tem que se sentir... Sobrepujado. —Novamente a maldita palavra. —E, bom, ele ama você, então, se você ficar com Matthew...

—Melanie. —Meu coração deu uma palpitada forte. —O que você quer dizer com isso?

Agora seus olhos estavam presos nos meus, com tamanha intensidade que recuei.

—Talvez, se você ficar com Matthew, o reconhecimento que o corpo terá, a reação, chegará até Jamie. Isso pode trazê-lo de volta. Isso pode salvá-lo!

—Não. —O murmúrio saiu da minha boca, quase inaudível. Eu sabia qual a linha de pensamento dela, e apertei as palmas contra as bochechas. —Não, não, não. —Sobrepujado. Eu deveria ficar com Matthew, beijá-lo, dormir com ele. É uma possibilidade. É uma chance de encontrar Jamie. Mas eu não podia; eu não podia. Eu teria coragem de ter minha primeira vez na tentativa incerta de encontrar Jamie? —Não! Isso é... Isso é... Inadmissível. Eu não posso ficar com ele de tal modo, Melanie, sabendo que ele não é Jamie. Isso é... Tão flagrantemente injusto. Eu estaria... Usando meu próprio corpo em busca de algo tão incerto, eu...

—Ashley. —Peg interrompeu meus devaneios loucos. —Você está querendo dizer... Que nunca ficou com Jamie daquela maneira?

Seus olhos cinza perfuraram os meus, aguardando por uma resposta. Mordi meu lábio para evitar que tremesse. Não, não, não, eu nunca havia dormido com ele. E talvez nunca venha a dormir.

Estava prestes a fugir dali quando me retesei.

Urros. Gritos insanos e desesperados, ecoando pelos corredores, se aproximando do consultório. Doc esticou o corpo, alerta, e adotei uma postura defensiva, deslocando o corpo em direção à porta.

Um corpo desconhecido, de cabelos castanhos e olhos âmbar furioso, uma menina jovem se esperneava e chutava, enquanto Jared tentava segurá-la e guia-la para dentro. Sunny o seguia, as mãos esticadas na frente do peito, como um gesto de autodefesa. Jeb, Kyle e Ian vieram logo atrás, todos com olhos curiosos.

—O que aconteceu? —Perguntou Doc.

—Pegamos ela para que você retirasse a Alma, Doc, e ela acordou no meio do caminho.

—E simplesmente... Surtou. —Complementou Ian.

—Longe de mim! Longe de mim! —Gritava a garota, as palavras modificadas por um carregado sotaque sulista, e uma ira impressionante.

—Alguém apague essa criatura! —Exclamei, soltando meus punhos.

Os gritos cessaram, puxando minha atenção para a desconhecida, que tinha o cenho totalmente franzido e os olhos fixos em mim. Ela se pôs de pé devagar, tão calmamente que Jared a soltou, ninguém tendo a audácia de pará-la. Aproximou-se de mim e me estudou. Ela era pequena, mas com ombros e quadris largos, e aparentava ter quinze anos apenas. O nariz estava vincado enquanto ela me avaliava, e só inclinei a cabeça para trás e ergui uma sobrancelha.

Sua mão se projetou em direção ao meu rosto, o punho cerrado, mas o segurei no último milésimo. A menina avançou novamente, os punhos cerrados e os dentes à mostra.

—Você! —Segurei seu pulso, mantendo-a longe de mim, mas ela persistiu. —Você!

—Ei! Alguém... —A menina se debateu, tentando me dar uma cabeçada. —Alguém tire essa garota de cima de mim!

Jared a agarrou pela cintura, mas ela cravou as unhas em seus braços, lutando com unhas e dentes para se livrar. Era estranho uma Alma se portar de tal modo e...

Aproximei-me dela e segurei seus cabelos na altura da nuca, mantendo seu rosto parado. Ela arfava, com um ódio mortal nos olhos. Os olhos totalmente âmbar, totalmente humanos.

—É. —Jared percebeu minha expressão. —Só percebemos isso quando ela acordou.

—Você é humana. —Murmurei. —Como? De onde você é?

A menina não respondeu, sacudiu a cabeça para se livrar da minha mão e voltou a chutar, tentando partir na minha direção.

Girei o quadril para me desviar de um golpe dela e joguei o cotovelo sobre sua nuca. Ela bamboleou e caiu, e pisei sobre suas costas. A menina se debateu como uma barata prestes a ser esmagada.

Doc pegou um frasco de Adormecer e borrifou nela assim que a soltei, mas a garota ainda arranjou forças de se virar e me olhar, e seus lábios assopraram algumas palavras.

—É tudo culpa sua. —E desapareceu.

Fiquei olhando para o corpo inerte da menina por minutos. A respiração dele estava lenta, tranquila, e era a única coisa que eu ouvia.

Então, veio o caos.


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Notas finais do capítulo

PAM PAM PAM Eu faço isso de propósito.
Amorzinhos, comentem, qualquer coisa mesmo, apenas comentem, por favor. Comentários me deixam feliz hehehehe. Não desistam de mim!
Posto o próximo capítulo em breve, prometo ♥



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