Dona Distância - 1ª Versão (HIATOS) escrita por Capitã Sparrow


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada a todos que estão lendo! Estou transbordando de felicidade com os reviews de vocês!! Esse capitulo vou dedicar ao divoso Mugiwara, que recomentou Dona Distância o/ Muito obrigada!!!



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Distância acordou e percebeu que ainda estava sobre o tapete do quarto. Seu corpo doía e sentia seus olhos inchados. Viu Bola de Pelos dormindo profundamente encolhida perto de seus pés, fez um leve cafuné na pequena que mexeu as orelhinhas e permaneceu roncando baixinho.

Levantou e seguiu o corredor vermelho que a guiou ao banheiro. Quando olhou seu reflexo, viu que estava jovem novamente. Odiava essa mudança constante. Sentiu uma lágrima quente escorrer e xingou Tempo em pensamentos.

Deixou que os cabelos brancos caíssem soltos quase tocando o chão. Jogou as roupas num canto do banheiro e seguiu descalça os azulejos floridos que a conduziram até sua “banheira” natural. Percorreu o comprido corredor, passando por diversos espelhos e três portas coloridas com formatos engraçados que estavam à sua esquerda. Uma era roxa, outra amarela e a última era azul. O teto era feito de tijolos amarelos e nele estava apoiada uma única porta que estava de ponta cabeça, à sua direita. Esta era uma mistura de cores, como se alguém tivesse misturado as tintas da paleta de um pintor.

Distância sentiu uma Brisa envolvê-la, como se quisesse acolher seu coração. Os Distantes, como eram conhecidos seus súditos, eram muito carinhosos com ela, davam-lhe as forças que seu corpo havia perdido há muito tempo. Tempo. Como podia ficar tão confusa sobre alguém que a havia abandonado? Não conseguia entender seus próprios sentimentos, não entendia como aquele amor podia estar intacto e cravado em seu coração partido. Como podia amar aquele que foi capaz de ir embora quando mais precisou?

Sentiu as lágrimas começarem a escorrer novamente, mas Brisa ainda estava ali para secá-las, uma a uma, quantas fosse preciso. Ao alcançar a entrada, teve a impressão de escorregar e se segurou como pode na parede ao seu lado. Sentiu os braços da Brisa envolvendo seu corpo magro, mas não sentia seu toque. Sentia apenas o calor. E aquilo era suficiente.

— Obrigada. — sussurrou fazendo Brisa sorrir docemente e voar em direção à sua amada Cerejeira.

Atravessou a fenda na parede e continuou seguindo as lajotas floridas até sentir a água cobrindo seus pés. Pode parecer estranho um banheiro sem porta que termina de frente para uma lagoa ao ar livre. Mas Distância não gostava de portas. Afinal, qual é o significado delas além de impor limites e barreiras?

Optar. Ela preferia essa palavra: optar. Optara por não ter limites, por ser livre.

Continuou entrando na lagoa até seu corpo estar parcialmente submerso na água cristalina. Alguns peixinhos dourados nadavam em volta de si, fazendo–a sorrir tristemente. Velhas lembranças fizeram-na mergulhar num passado remoto, que a fazia querer nunca mais acordar...

“Estava sentada na beira da lagoa, balançando os pés na água. A sua volta havia apenas grama e uma pequena árvore, que ele havia plantado para ela.

Tempo. Como um nome era capaz de fazer todo seu ser estremecer e delirar de paixão? Distância não sabia responder, mas era isso que sentia. Como se tivesse perdido o controle de seu corpo, de seu coração. Ela o havia entregado por completo. Tempo era dono de seu coração hoje e para sempre.

Seus pensamentos fizeram-na corar levemente e sentiu o coração acelerar quando ele abraçou-a por trás afundando a cabeça em seu ombro.

—Lonjura, esse lugar está praticamente desolado! Precisamos habitar seu reino. — disse sorrindo maliciosamente.

— Humpf! Primeiro: Pare de me chamar assim! — disse empurrando a cabeça dele para trás e, cruzando os braços, inflou as bochechas numa careta brava, fazendo Tempo gargalhar, o que a deixou mais brava. — Segundo: PARA DE RIR DA MINHA CARA! Não sou palhaça. — gritou indignada e mostrou a língua para ele.

— Eu só acho você muito fofa. — disse carinhosamente e se aproximou seu rosto do dela, fazendo-a corar. Tempo riu. — Você é linda, sabia?

Distância sentiu um incomodo arrepio em sua nuca e seu coração parecia prestes a explodir dentro de seu peito.

— Não tente me confundir. E-eu não terminei! — gaguejou sem jeito. — Terceiro: Não vou deixar você trazer mais nada para cá! Ninguém merece viver num lugar tão remoto e longe como esse... Esta tudo bem assim. —completou sorrindo para ele.

Ela não fazia ideia do quanto aquele simples sorriso desmontara Tempo. Ele se sentiu incapaz de pensar, de ser lógico como costumava ser. Ela parecia ter esse magnetismo sobre ele, que não o permitia pensar em nada além dela.

No dia seguinte, ou talvez apenas algumas horas depois, Distância se deparou com a lagoa cheia de peixinhos dourados, nadando felizes e brincalhões.”

Distância lembrou-se do quanto discutiram naquele dia, mas Tempo a convencera de manter os peixinhos, afinal tudo que eles queriam e precisavam era de água limpa e fresca.

As lembranças começaram a fazer um nó tão grande em sua cabeça, que ficou perdida nelas e adormeceu encostada na beira do pequeno lago. Não percebeu que uma sombra se aproximava cautelosamente.

***

Uma garota vagava pelas ruas movimentadas de Tokyo, acompanhando uma adolescente de cabelo roxo. A primeira vestia um moletom muito grande para seu corpo magro, era de um marrom “morto” que lembrava a cor das folhas secas do outono. Cobria seu corpo até a metade da coxa, como um vestido. Seus cabelos escuros alcançavam a cintura e estavam armados e secos, muito mal cuidados. Andava descalça segurando levemente a mão da outra que parecia não sentir seu toque.

Nana, a segunda garota, tinha cabelos compridos e ondulados, tingidos com um tom púrpura escuro. Seu vestido era preto. A saia era de couro com pregas no estilo colegial e a parte de cima era de renda com alcinhas finas. O sapato preto de bolinhas brancas tinha um delicado laço de cetim na lateral. A garota parecia uma boneca de porcelana ambulante.

Solidão segurava a mão de Nana, deixando-se conduzir pela capital japonesa. Arrastava os pés e encarava o chão, sentindo algumas gotas geladas começarem a atingi-la. Poderia facilmente evitar os pingos, mas não sentia vontade. Queria apenas não querer.

***

Distância acordou com uma estranha sensação de estar sendo observada. Olhou ao seu redor, mas tudo parecia normal. Sentiu a barriga roncar saindo do lago e voltando pelos quadrados floridos. Pegou uma toalha e enrolou-se, sentia os cabelos pesados puxando seu corpo para trás, o que a deixava mais sonolenta.

Seguiu o corredor que a levaria até a cozinha. Pequenos pedestais de mármore se estendiam pelo caminho, sobre eles descansavam vasos de todas as cores, tamanhos e formatos, presentes que Distância havia ganhado de Tempo. Sempre que viajava a lugares distantes e desconhecidos trazia consigo um exemplar e dentro dele, um único girassol. A coleção de Distância passava dos três mil jarros.

Quando finalmente alcançou a cozinha, abriu o armário e pegou a vasilha flutuante, dentro dela estava escondida a última nuvem que possuía. Deu uma grande mordida sentindo a água doce escorrer. A nuvem estava suculenta e fofinha, bem do jeito que Distância gostava. Preparou-se para dar mais uma mordida quando ouviu risadinhas atrás de si. Notou com surpresa as visitas que não via há muitos anos. As gêmeas siamesas observavam-na com atenção, uma delas estava séria e tentava abafar as risadinhas eufóricas da irmã caçula com a mão.

***

Solidão já estava encharcada quando algo passou pela sua mente, uma ideia que poderia ser a solução para seus medos e incertezas. Conhecia o único com poder suficiente para alterar o curso das coisas. Destino.

Imediatamente se concentrou no ser, fazendo com que o mesmo a sentisse e se materializou no jardim central de seu reino. A garota se viu cercada por diversos tipos de estátuas. Algumas, que estavam mais próximas, chamaram a atenção do sentimento.

A primeira que viu era feita de pedra. Um guerreiro com vestes similares a de um gladiador, que segurava uma lança sobre a cabeça e um escudo a frente do corpo, presa ao braço esquerdo. Havia uma única imperfeição naquela estátua. Estava quebrada na base, onde ficava o calcanhar do homem.

A segunda era uma mesa de ouro, ornamentada com rubis, safiras e pequenos diamantes. Sobre ela uma rosa carmesim, que parecia flutuar, estava protegida por um recipiente arredondado de cristal. A flor era tão perfeita que Solidão poderia jurar que acabara de ser colhida.

A terceira era um homem alto e magro feito de mármore. Seus cabelos curtos estavam escondidos sob um grande chapéu de praia. O rosto fino era enfeitado por um imenso sorriso, extremamente insano e assustador. As roupas pareciam a de turistas durante o verão, bermuda larga, mostrando seus finos tornozelos, e uma camisa florida. Uma câmera fotográfica envolvia seu pescoço e em sua mão direita, uma pistola apontava diretamente para Solidão, que deu um passo para trás receosa.

A última estátua que notou eram três homens e três mulheres, todos de mármore, e eram um tanto incomuns. Carregavam um imenso caixão feito de uma pedra preta que Solidão não conhecia. A primeira mulher era uma jovem de cabelo bagunçado com um ankh pendurado no pescoço, havia um pequeno espiral sob seu olho direito. Ao seu lado estava outra garota que parecia mais jovem ainda, metade do seu cabelo estava raspado e tinha olhos delirantes. Atrás delas estava a terceira mulher, uma gorda imensa, com olheiras profundas e não usava roupa alguma. Do outro lado estava um homem forte, barbado com cabelos longos e presos em um rabo. Carregava o que parecia ser uma trouxa em um dos ombros, segurando o caixão com a mão livre. Atrás dele estava um ser que Solidão não conseguiu definir se era um homem ou uma mulher. Seu rosto tinha feições masculinas e femininas, e usava um terno social. Por último estava um homem com o rosto coberto pelo capuz de seu manto e seus pulsos estavam acorrentados a um grande livro.

Passou pelas estátuas com a sensação de que “acordariam” a qualquer segundo. Continuou apressando o passo e encontrou Destino escrevendo em seu livro sob uma imensa macieira.

***

As gêmeas siamesas usavam um kimono colorido, pareciam normais até a cintura, onde eram grudadas. Dividiam o mesmo par de pernas o que podia ser um grande problema quando tinham diferentes opiniões. Enquanto a primeira tinha a pele vermelha, um olhar singelo e um sorriso acolhedor, a outra tinha a pele azul e olhos um tanto ácidos, sob o óculos levemente oval. Encarava Distância friamente, como se a mesma tivesse feito algo muito ruim.

As duas eram conhecidas por suas constantes brigas e extremos pontos de vista. Razão e Emoção eram sentimentos muito peculiares e distintos. Eram muito semelhantes fisicamente, mas tinham opiniões completamente opostas.

— O-Olá... — cumprimentou Distância receosa.

— Que saudade de você, Lonj... — começou Emoção, mas foi interrompida pela irmã mais velha.

— Vamos logo ao que interessa. — disse Razão rispidamente. — Você sabe muito bem por que estamos aqui. — disse um tanto arrogante. — Você precisa impor limites para o Tempo, ele não tem nenhuma ligação com você e não tem direito de entrar em seu reino quando bem entende.

Antes que Dona D. pudesse falar qualquer coisa, a vermelha foi mais rápida:

— Por que impor limites? Ele a ama, assim como ela. O amor não deve ser mantido em cativeiro ou separado de sua outra metade! — argumentou.

— Como sabe que ele a ama? E se ele estiver brincando com ela? Tratando-a como uma simples marionete descartável? Você irá protegê-la de mais uma decepção?

— Ela não vai ter decepção alguma, pois o amor está entre nós. Posso senti-lo em todo meu corpo! Bom... Pelo menos em minha parte. — Emoção sorriu docemente e piscou para Distância. — O amor nos faz bem, nos faz flutuar. Tudo que precisamos é amar! — exclamou erguendo os braços e acidentalmente batendo no nariz da irmã, fazendo com que seus óculos caíssem no chão.

Razão bufou, abaixando-se para apanha-los, mas como as duas eram grudadas, Emoção se abaixou também, um tanto atrapalhada, e sem querer, ou talvez querendo, acabou chutando o objeto para longe.

— Oh! Desculpe...

— Sua idiota! Como quer aconselhar alguém se não consegue ter controle sobre o próprio corpo? Ou melhor, sua parte dele?

— Eu não preciso de controle, senhorita sabe-tudo, o amor irá me guiar pelo caminho certo! — falou como se fosse a maior verdade do universo.

— Não, Em. Eu que vou leva-la até o lugar correto. — Razão deu ênfase no “eu”, como se quisesse que a irmã se lembrasse de algo.

— Você só me leva porque eu deixo!

Começaram uma longa discussão deixando Distância embasbacada e sem reação. Sempre foram um pesadelo, e agora vendo as duas depois de tanto tempo, não sabia o que falar. Tudo estava confuso em sua cabeça também. Não viu o sapato vermelho voando em sua direção, sendo atingida em cheio. Sua visão ficou borrada até escurecer completamente.

***

— Eu sabia que viria me procurar, Solidão. — disse o homem sem levantar os olhos do livro.

— Só você pode me ajudar. — encarou-o, por baixo da estranha máscara de couro. Parecia um bico comprido de uma ave, com furos onde ficavam os olhos. Ela estava presa por um pedaço de couro ajustável, que deixava seu cabelo um pouco bagunçado. Aquela máscara havia sido muito usada durante a idade média, o sentimento a conhecia muito bem... Bem até demais.

Destino usava um sobretudo preto médio que cobria o colete com vários botões. A camisa era branca e a calça era social preta combinando com os sapatos da mesma cor. Pendurado no sobretudo estava um pequeno relógio de bolso, com um Triskle em alto relevo.

“Tempo? Não. Não. Ele não pode vir até aqui.” Solidão refletiu.

Destino usava luvas, mas Solidão sabia que seu braço esquerdo era cibernético. Todos souberam de seu castigo, quando desobedeceu as regras. Ele segurava um livro velho e grosso, aberto ao meio. Escrevia nele sem descanso.

— O Destino já esta traçado. Não há nada que eu possa fazer.

— É óbvio que você pode! — protestou. — Você pode fazer o que bem entender! VOCÊ É O DESTINO, ORAS! — esbravejou irritada.

— Não erga a voz para mim, Sentimento insolente! — Destino aconselhou em tom de ameaça.

Alguns metros dali, olhos astutos observavam a situação com um sorriso malicioso.


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Notas finais do capítulo

Ia acontecer mais coisa nesse capitulo, mas como ele ficou grande decidi separá-lo em dois ^^ Eu terminei ele de madrugada (agora) então se deixei passar alguma coisa me avisem :) Espero que tenham gostado! o/
* Curiosidade: Optar é um anagrama de porta ^^ Por isso a frase meio sem sentido no começo do capitulo rss Ah!! Quem descobrir todas as referências das estátuas, manda uma MP pra mim o/ Valendo um cap especial de Dona D!!
Bjinhoooos ^^