A Mecânica Dos Anjos escrita por Misty


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

A lembrança da sepultura da minha família foi o único momento
Que eu usei para experimentar o amor verdadeiro
Amor esse que permanece infinito

O que resta para um bis?
É a mesma velha canção do menino morto
Cantada em silêncio

Nigthwish



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Cantis Shard era uma bela cidade, meus dias estavam sendo tão loucos que tinha até mesmo me esquecido de apreciar a paisagem. Eu e Ian andamos pelas calçadas de pedras gastas e cinzentas, desviando facilmente das pessoas que vinham em nossa direção.

- Obrigada -disse por fim -Sabe por me pegar quando estava caindo...caindo dos céus -falar isso era estranho, como se tivesse lhe contando um sonho estranho que tive. Ian apenas assentiu, enquanto olhava para longe e chutava pequenas pedras do seu caminho -Aliás, o que foi tudo aquilo com as asas?

Ele riu para si mesmo e notei com curiosidade que seu sorriso formava belíssimas covinhas em seu rosto, mas desviei meu foco para sua história. Eu estava começando a amar e odiar algumas delas.

- Aquilo eu tinha ganhado quando tinha uns 15 anos, estava jogado no fundo do meu armário, Susan se lembrou e lá fui eu.

Lhe fiz uma careta, enquanto tentava não tropeçar nas lacunas das ruas.

- 15 anos? E como sabia que iria funcionar?

- Eu não sabia, foi por sorte -então se virou para mim, me fazendo uma careta enquanto arcava as sobrancelhas -E não venha ficar brava, eu também corri um grande risco lá em cima, então estamos quites -ele pareceu pensar e mordiscou os lábios inferiores -Certo?

Cruzei meus braços enquanto deixava meus olhos vagarem para um prédio grande, um bloco pintado de branco com uma torre alta, havia um pequeno sino que badalava de vez em quando, uma estranha musica em meio ao barulho de toda cidade abaixo.

- Tudo bem, quites.

Ele sorriu, como se orgulhoso de si mesmo por conseguir que eu falasse tal coisa e começou a andar novamente.

- Venha, vamos terminar nosso passeio.

Saímos da rua movimentada para ir em uma direção ainda estranha por mim, mas dessa vez nada de bordéis ou casas de ópio. Apenas belas casas de madeira, com árvores cheia de flores vermelhas se desabrochando, tudo me lembrava um park, sem tecnologia apenas ar puro e cheio de verde. Mas em alguns postes, com luminárias apagadas havia um papel cor de terra colado, onde um desenho de um homem envolto pelas sombras estava atacando uma mulher de olhar assustado,abaixo dizia:

“ PROCURADO: Se alguém souber o paradeiro desse homem, informar o centro de policia mais próximo”

- Ninguém, nem mesmo vocês sabem quem pode ser ele?-perguntei a Ian enquanto deixávamos o cartaz para trás, e seguíamos para um caminho de cascalho solitário.

- Agente não faz idéia -ele se sentou em um banco de madeira e fez um gesto para eu me sentar também, quando o fiz ele olhou para o céu -Susan e eu moramos com Madame Lovalece, mas há mais de nós, eles estão em patrulha, espalhados pela cidade, eles são Markers como nós mas ainda não sabem de nada, sem pistas alguma.

Assenti em silêncio, enquanto passava meus pés pela grama.

- Tio Charles é um também?

- Pode até ser, mas ele nunca aceitou, depois que seus pais morreram ai sim que ele se nega a entrar para nosso “grupo” mas ele nos ajuda criando algumas coisas e descobrindo tantas outras.

- E Susan, ela é que seu? -sim eu estava mortalmente curiosa sobre isso, por fim ele apenas sorriu.

- Eu a conheço desde...bem desde que meus pais se foram, ela então ficou como minha guardiã, uma irmã mais velha e terrivelmente temperamental.

Desviei o olhar e mirei no lago cristalino, que parecia brilhante no sol da tarde, que aos poucos estava sendo escondido por nuvens escuras.

- Ela parece ser muito legal -comentei por fim, sentindo um estranho vazio se apoderar de mim, me lembrando de que Tom estava por ai, só que muito longe para ser alcançado.

- Ela é sim -ele suspirou, então ficamos em silêncio, um silêncio que nenhum de nós dois tivemos coragem de quebrar, pois era um momento de reflexão, estávamos perdidos em nossos próprios mundos, tais eles completamente diferentes.

Um trovão rugiu acima de nós, escondendo por fim o sol em nuvens negras, mesmo assim e eu e Ian não fizemos menção de nos levantar. Estava no meio de um suspiro, quando meus olhos pegaram algo estranhamente familiar perto do tronco de uma árvore torta e musgosa, senti meus olhos se arregalando enquanto aos poucos a imagem de Tom sorria para mim.

Algo dentro de mim tremeu, mas eu estava em um estado de êxtase estranho demais para perceber.

- Tom! -disse alto demais, me levantando e por pouco não correndo em sua direção, quem me impediu fora Ian, segurando meu braço com força -Me largue! Olhe lá, é Tom, ele...ele me chama!

Ian estava sombrio, de uma forma que me causou um pouco de medo, seus cabelos rebeldes pelo vento caiam sobre seus olhos negro, enquanto o mesmo me fazia uma careta.

- Nora -ele disse baixo, quase em um sussurro, colocando toda a concentração de seus olhos nos meus -Nora olhe para mim, e escute aquele não é seu irmão.

- Como não! -gritei por fim, me sentindo frustrada e cansada, eu tinha perdido tudo e ganhado apenas loucuras em minha vida, eu tinha a chance de ter meu irmão de volta! -Não disseram que sou uma visora, eu teria visto outra coisa se fosse!

- Você não entende...

Mas já era tarde demais, em um momento de distração consegui me livrar de seu aperto e corri pelo park, que notei por sorte estar vazio. Meus olhos ardiam com lagrimas frias, que pareciam queimar minha pele, mas isso não importava, pois Tom corria também em minha direção, ele sorria enquanto abria os braços.

Ian gritava algo ao longe, mas eu não me importava, eu estava finalmente em casa, estava com o resto da lembrança que sobrou da minha antiga vida.

- Nora! -ele disse em uma voz abafada quando me choquei com seu peito, o apertando, não tento certeza se era ou não real -Meus Deus, como estava a sua procura.

- Estou aqui...eu...Tom! é você...mesmo -minha voz estava terrivelmente entrecortada, entre as lagrimas e a angústia, eu era uma explosão de emoções -Onde esteve?

- Com nossos pais -nessa hora arregalei meus olhos, os arregalei tanto que eles poderiam cair para fora das minhas órbitas, mas me obriguei a ficar calma, enquanto me afastei um pouco e o encarei melhor. Tom, meu adorado irmão, nos éramos como gêmeos, mas esse Tom...havia algo de estranho em seus olhos terrivelmente doentios e acabados, ele sorriu, ele cheirava a morte e podridão, tudo começava a aparecer...como se sendo descoberto por um fino véu -Aliás eles estão com saudades.

- Nossos pais -repeti tentando armar um sorriso, me afastei por completo, mas ele segurava minhas mãos. Por fim sua mascara caiu por completo e eu reprimi um grito, quem estava a minha frente era agora uma criatura do tamanho de um homem, cabelos brancos e olhos de órbitas vermelhas, com dentes podres e uma clavícula rachada, havia muitas cicatrizes sangrentas em sua pele escamosa. Ele não pareceu notar que eu por fim, tinha visto seu rosto, o verdadeiro.

Eu queriam me chutar, me ver sangrando enquanto o grito de Ian voltava para minha mente.

- O que aquele garoto que com você irmã?

Engoli em seco, tentando não parecer nervosa.

- É meu...meu amigo, vou...deixe-me falar com ele por um minuto.

Mas ele segurou minhas mãos ainda mais forte, fazendo uma dor queimada passar por meu braço, e sorriu.

- Não irmã, agora não vamos nos separar nunca mais.

Tarde demais, ele já sabia. Gritei alto, enquanto me impulsionava para trás e por um milésimo de segundo caia na grama, gatinhei para ficar de pé, mas a coisa agarrou meu vestido, me tirando do chão. Gritei novamente, debatendo no alto e percebendo com assombro, que ninguém parecia perceber essa minha luta.

- Nora! Se segure! -Ian então estava ali, um tanto ofegando com algo pontudo nas mãos, se parecia com uma espada, mas era mais fino e se parecia mais perigoso, mas havia um estranho brilho azulado na ponta. Eu tentei agüentar firme, mas em meu pulso, onde a criatura tinha segurado com força havia dois furos vermelhos e isso fazia minha cabeça rodar. Percebi que eu gritei, quando Ian jogou aquela coisa afiada em direção a besta, acertando peito e fazendo tudo tremer, mas antes que ela caísse ao chão, ele esticou seu braço agarrando Ian pela camisa e o jogando logo em seguida de encontro a árvore.

Me debati com força, enquanto a besta aos poucos se tornava mais leve e seu aperto em minha volta se tornava mais fraco, com o resto das forças que me sobrou toquei na lamina afiada que ainda estava cravada no ombro da besta e aprofundei ainda mais em seu âmago, a criatura gritou se tornando nada mais que fragmentos de chamas e cinzas.

Arfei de dor, enquanto rolava sobre a grama úmida, já que tinha começado a chover e fui em direção a Ian, que estava se remexendo de forma dolorida para ficar de pé.

- Não se mexa! -disse entre dentes, percebendo com terror que ele parecia tão pálido quanto seu cabelo, eu estava em desespero -Desculpe...eu....

- Nora! -ele disse alto, com um gemido de dor-Apenas...tente...tente encontrar Susan.

- Mas eu...-não sabia o que fazer, estava com vontade vomitar e desmaiar, minha cabeça estava pesada, e ver Ian naquela situação não ajudou em nada. Percebi com mais terror que em seu peito, onde a camisa de rasgou havia um grande corte, largo e profundo ainda sangrando com as beiradas queimadas e isso me fez afastar -Fique comigo! Ian!

Mas já era tarde, ele tinha desmaiado e isso me alarmou, fiquei de pé rapidamente sentindo uma dor avassaladora apertar todo meu corpo, tentei correr para chamar alguém, qualquer um, mas nem mesmo tinha afastado alguns centímetros e eu apaguei.

Mergulhei na escuridão, talvez para nunca mais voltar, mas quem sabe fosse melhor assim, eu não saberia viver com a culpa de ter matado alguém que tinha salvo minha vida.


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Notas finais do capítulo

?? Sei..sei que Nora está um saco nesse capitulo, um tanto louca com tendências suicidas MAS ela irá ficar melhor, ser chata assim é necessário ;)