Existiam duas pessoas naquele corpo.
Ivan Braginski e Rússia.
Uma delas, ele amava.
Já a outra... não sabia definir bem o quê sentia.

Ivan era uma criança em corpo de adulto.
Frágil. Inocente. Doce. Medroso. Carente.
Uma criança que não tivera infância.
Uma criança que desde que nasceu teve que aguentar os horrores da guerra.
Uma criança cujo único sonho era ter um amigo.

Rússia era um país frio e cruel.
Injusto. Maldoso. Psicótico. Ditador. Covarde.
Uma nação deformada pelo sangue e pelo ódio.
Uma nação sofrida que de vítima passou a algoz.
Uma nação que escraviza as pessoas em nome do "bem"

Ivan Braginski...
Era aquele homem que buscava conforto nos seus braços nas noites de inverno.
Era aquele homem, que quando triste, soluçava em seu peito, abafando os gritos de desespero ao ver tantas pessoas morrendo.
Era aquele homem que cuidava dos seus ferimentos, murmurando palavras de desculpa. Palavras sinceras de desculpa.
Era aquele homem que prometia, com um olhar sonhador e um sorriso meigo, um lugar pacifico, cheio de girassóis onde somente os dois viveriam.
Era aquele homem que, horrorizado, jogava-se aos seus pés, pedindo que voltasse quando ele foi embora com Alfred.
Era aquele homem a quem amava.
Era aquele homem, aquela grande criança, com quem se divertia nos poucos momentos de sol, fazendo a história de uma infância nunca vivida.

Rússia...
Era aquele país implacável que o procurava durante a noite para satisfazer seus desejos sexuais violentos.
Era aquele país implacável que quando zangado com os soldados inimigos, o espancava.
Era aquele país implacável que, sorrindo sadicamente, lhe dava mais e mais cicatrizes nas costas com um chicote.
Era aquele país implacável que recitava sonhos maníacos de dominação mundial de forma eufêmica.
Era aquele país implacável que, ao se ver abandonado, prometeu que iria trazer sua posse de volta. Roubar das mãos do inimigo seu brinquedo favorito.
Era aquele país implacável a quem... odiava (?!)
Era aquele implacável país, gigante por natureza, que em noites muito frias, fazia com quê o inferno parecesse um ponto turístico.

Ivan.
Era o nome que suspirava e gemia enquanto, deitado na cama, sem vestes, sentia o prazer consumi-lo.

Rússia.
Era o nome que clamava e gritava enquanto, deitado no chão de cimento, quase sem vestes, sentia o chicote de couro lambendo sua pele.

Ivan Braginski.
O homem que jurou protegê-lo em troca sua amizade.

Rússia.
O país que o dominou, exigindo sua lealdade.

As duas faces da mesma moeda.
Da mesma pessoa.
O médico e o monstro.